Nascido Do Sangue escrita por Viúva Negra


Capítulo 91
Minha Doce Criança!




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Numa tarde, uma das empregadas estava ajudando Damian a tomar um bom banho, já fazia alguns dias que não sentia a água morna envolvendo seu corpo, aquecendo sua pele, espantava-se ao tatear seu braço e absorver nada mais que o frio que ele próprio emanava.

Sentia o toque cálido e suave das pequeninas mãos da criada, aquele toque o fazia lembrar-se de Viorica, um aperto veio lhe sufocar o ar, como estaria sua doce menina? E Ionel? Há tempos que não os via, queria pôr seus olhos em ambos novamente, pelo menos mais uma vez sorrir com eles, mas parecia que isto ficaria apenas em seus planos imaginários.

Havia uma barreira, algo invisível, porém extremamente forte que o segurava naquela mansão, trancafiado como um prisioneiro, não poderia mais sair, tinha medo, um medo desconhecido, mas tão poderoso que o devorava de dentro para fora, um medo atordoante.

Aquelas mãos passeavam por seu corpo, o sabão auxiliando para que os dedos corressem mais rápidos, um arrepio se propagava quase que o levando a rir, Damian sabia que ainda estava vivo.

Mas não era só o toque das mãos da empregada que sentia, havia um perfume distinto no ar, algo tão refinado e doce que seria tolice e quase um ultraje colocá-lo em um frasco e comercializá-lo, não haveria uma razão para fazê-lo, pois todos possuíam este aroma.

Damian sentia-se andando por um jardim, as flores desabrochando sob um sol cálido e ameno, tão jovens, tão delicadas, suas narinas aguçavam-se, havia milhares de odores misturando-se no ar e o ferreiro podia sentir cada um deles, era como se entrassem em seu sistema respiratório e seu cérebro pudesse distingui-los, um a um, não errando nunca.

Quantas flores! Quantos perfumes! Todos tão atrativos, tão convidativos, deliciosamente delirantes! O cheiro estava lá para tentá-lo, ah aquela nuvem branda afagando seus pulmões e propagando-se por todo seu corpo! Fazendo-o arder de desejo.

Eu quero... Eu quero... Eu quero!

___ Senhor Petrescu, algum problema?

Os olhos azuis se abriram, deparando-se com o rosto confuso da criada o encarando de modo surpreso, seus lábios estavam tão perto do pescoço dela, sentia ambos os corações batendo num ritmo excitante, por que parar?

___ Nada, perdoe-me.

___ Quer que eu o ajude a se secar?

___ Não, não é necessário, pode ir.

___ Como quiser, senhor, estarei na cozinha se precisar.

___ Tudo bem.

Assim que a empregada deixou o quarto, Damian levantou-se da banheira expondo um corpo esguio e pálido, o mesmo corpo que tivera vergonha que Rosalind encarasse, enrolou-se numa felpuda toalha e sentou-se na beirada da majestosa cama do aposento inteiramente seu.

Aquilo foi bom, um banho quente e relaxante, mas não fora isso que o fizera sentir-se vivo. O toque, o cheiro, como era gostoso colocar seus sentidos para funcionarem, era assim que Petrescu sentia-se vivo, quando seu coração batia mais rápido, quando sentia a vida de outro alguém em seus lábios...

Damian passara a tarde debruçado sobre o macio colchão, as lembranças iam e vinham, isso já não era mais uma novidade, nem um motivo para se alarmar, parecia um evento cotidiano, mais uma vez, no mesmo horário, lembrar-se das tragédias que marcaram sua vida nos últimos meses. Era como um afazer do qual não podia fugir.

Todos os afazeres viravam rotina e toda rotina era tediosa, as perdas, as lágrimas, a dor, tudo começava a ser encarado como tédio, nada de novo, nada de anormal, apenas os mesmos pensamentos, sentimentos, tormentos, nada que não soubesse.

À noite, o mordomo lhe informara que Benjamin estava na sala de estar e queria vê-lo, o garoto não se demorou a descer, estava começando a se convencer de que, não só seus sentidos extremamente apurados eram o que o mantinha vivo, a presença de Grigore naquela casa era essencial, não saberia o que fazer se o amigo fosse embora.

Damian abriu as portas do local e encontrou o rapaz sentado tão elegantemente numa poltrona, o olhar ia ao encontro do de Petrescu, aqueles olhos tão semelhantes aos seus, mas Damian tinha certeza que os dele não coriscavam tanto quanto os do amigo, o jovem sorriu dizendo:

___ Queria me ver?

___ Eu não o vi o dia todo. Onde esteve?

___ No quarto.

___ Como tens coragem de desperdiçar o dia enfurnado em um quarto que guarda lembranças tão fúnebres?

___ Deve ser por isso que quero ficar lá.

___ Damian querido ___ disse Ben ao se levantar ___, este não é você.

___ Claro que é, sempre foi.

___ Oras, não diga bobagens, meu amiguinho. Onde está aquele garoto alegre e sonhador que me recepcionou numa noite na ferraria?

___ Ele morreu, Ben.

___ Não é verdade.

___ É claro que é.

Grigore via o modo como Damian tentava sufocar o pranto, aquilo o fez cerrar o punho sentindo as pontas de suas unhas alfinetando a carne da palma de suas mãos.

___ Tudo acabou, o que eu posso fazer?

___ O que acabou, meu querido?

___ Minha vida.

___ Está enganado, sobre tudo. Damian, pare de se martirizar, meu garoto, um anjo tão jovem e tão desiludido assim, chega a fazer o Céu chorar.

___ Por quê?

___ Um anjo está sofrendo, não há outro argumento. E quando um anjo sofre, todos sofrem com ele, sentem suas dores, ouvem seus lamentos, aspiram todo o fardo que você carrega.

___ E eles enviam outro anjo para ajudá-lo?

Benjamin segurou o semblante esmaecido de Damian entre suas mãos, viu que o outro não mais se incomodava com a frieza delas, a pele de sua face também estava esfriando, mal podia sentir o contraste de temperatura, o qual quase não existia.

___ Eu estou aqui. Eu estou aqui com você, Damian, e nada irá lhe acontecer, eu prometo.

Damian o abraçou e Benjamin teve o privilégio de sentir as cálidas lágrimas do jovem escorrerem por seu pescoço, seus pálidos e longos dedos se perderam entre os fios de cabelo negros como a noite e quase como um sussurro, Ben falou:

___ Meu menino, eu estou aqui. Não chore, por favor, não chore.

Por mais que Grigore pedisse para Damian cessar o choro, findar as lágrimas, não era realmente isso que queria. Se aquele momento acabasse, o martírio seria dele, a dor penetraria em seu peito, não queria que Petrescu se desprendesse de si, não queria que parasse de chorar, o tinha somente para si, ele era seu, apenas seu.

___ Minha doce criança...


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