Nascido Do Sangue escrita por Viúva Negra


Capítulo 77
A Escuridão Após o Completo Deleite




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Não demorou muito para que o lorde entrasse no veículo ordenando o cocheiro para que seguisse rumo à mansão Voiculescu, repousou seu olhar sorrateiro sobre o garoto ao seu lado, as sobrancelhas enrugadas e contraídas, os olhos fixos em suas mãos entrelaçadas, seus dedos apertando uns aos outros num lânguido nervosismo, de tempos em tempos umedecia os lábios, ainda trazia neles a cor avermelhada do sangue da frágil órfã. Após a rápida análise, o homem nada disse, somente permaneceu quieto e ereto como lhe era de costume.

O coração de Petrescu estava disparado, mesmo com o som perturbador dos cascos dos cavalos tocando o chão de terra ainda ouvia as batidas aceleradas, apertava tanto uma mão contra a outra que poderia esmagá-las a qualquer momento, mordia o lábio inferior e inevitavelmente ainda sentia o gosto agridoce do sangue dela, não somente em sua boca, mas em cada centímetro de seu corpo inquieto, ela estava dentro dele.

Mal podia controlar a respiração e doía-lhe tentar manter-se calmo, Viorica estava em sua mente, o rosto dela tão nítido, a última vez que a viu estava assustada e nervosa, ansiosa com tudo que acabara de acontecer e inocentemente deixou-se levar. Ainda sentia desejo por ela, a queria mais que qualquer coisa e se Benjamin não tivesse chegado naquele exato momento, provavelmente estaria morta.

Estava desesperado, pois ao se lembrar de suas ações tão recentes, sentia uma estranha paz em seu interior, ao lembrar-se do gosto do sangue dela seu coração diminuía a batida, sua respiração desacelerava como se mergulhasse em um sono profundo, como se a chave para toda a sua dor e algo que pudesse preencher o vazio angustiante que vivia dentro de si seria apenas o sangue, humano ou animal não realmente importava, mas precisava ter aquele rubro líquido misturado às suas lágrimas para que tudo se tornasse mais doce e por um momento no qual a escuridão cobria seus olhos, fosse inteiramente feliz.

Estava lutando para não chorar, pelo menos não na frente do amigo, o julgava tão forte e imponente que, se fosse fraco a ponto de chorar como uma criança assustada, não esperaria o que Grigore fosse pensar a seu respeito. Sempre era tão frio e calculista, com um ar de que nunca houvesse ouvido falar em sentimentos, quanto mais senti-los a flor da pele, olhava para tudo e todos de forma tão enojada como se não passassem de lixo, escória da humanidade.

Não era somente por isso que não queria chorar, uma parte de si estava gritando, martirizando-se por cometer tal brutalidade, julgando-se uma pessoa anormal e temendo que se Ben contasse a alguém sobre aquela noite, seria condenado à morte pelo vilarejo, coisas terríveis já aconteceram com assassinos que cometeram crimes mais leves, mas Damian não era um assassino... Ou será que era? A outra parte permanecia imutável, paciente e sóbria como uma estátua de mármore, não se importando com o que aconteceu ou tão somente com o que poderá acontecer, estava confuso.

Grigore o observou durante todo o caminho, queria tanto dizer ao jovem o quanto estava lindo naquele momento, os traços de culpa e medo em seu rosto delicado, o branco de sua cútis misturando-se ao rubro do sangue de uma virgem inocente enquanto os cabelos negros tentavam ocultar esta magnífica obra-prima, lágrimas silenciosas e brilhantes escorriam forçosamente pelos estupendos olhos tão azuis quanto as mais preciosas safiras.

Aquela imagem era um completo deleite para os olhos de Benjamin, a bruta e pura beleza que irradiava de cada canto micro ou macro do corpo de Damian era o alimento que fortalecia a alma de um lorde com gostos aparentemente tão refinados.

Queria tocá-lo, absorver tudo o que Damian demonstrava sem pudor, queria saber como era ser aquela criaturazinha amuada pelo menos por uma fração de segundo, ter aquela bagunça emocional pulsando bem dentro de suas veias.

Relutantemente decidiu apenas vislumbrá-lo, com cautela para não perceber, se bem que, Petrescu pouco se importava com o que estava ao seu redor naquele instante, decidiu contemplá-lo ali, recolhido com sua dor, uma dor que se fazia presente e ausente em intervalos indeterminados.

Chegaram à mansão, estava quieta e escura, ouvia-se apenas o som das ferraduras tocando o chão e as rodas da carruagem passando por entre os pedregulhos, assim que pararam, o lorde saltou do veículo quebrando o silêncio ao dizer:

___ Pois bem chegamos, meu de tineri, lar doce lar!

Sorriu ao observar a majestade daquela casa de aparência antiga, porém muito elegante, entretanto desfez o sorriso ao observar que o adolescente nem sequer se movera, continuou petrificado apertando as mãos uma contra a outra, lutando para sua dor não implodir no silêncio do mórbido remorso.

___ Meu caro?

Damian olhou para o rapaz alguns anos mais velho com uma expressão vazia, como se não fizesse ideia de mais nada.

___ Chegamos, venha!

Lentamente, como um animalzinho assustado, Petrescu saiu da carruagem ainda cabisbaixo e calado, Benjamin o envolveu com um dos braços e o ajudou a seguir até o interior da mansão, se não o fizesse era certo de que o ferreiro passaria a noite enrijecido diante do palacete.

O sujeito o ajudou a subir as escadas e o levou diretamente para o quarto principal, onde apenas há duas noites ainda dividira a cama com Andreea, provavelmente o cheiro do corpo e dos cabelos dela ainda estariam impregnados nos lençóis. Sentou-o na cama ajoelhando-se diante do moço e disse com voz branda:

___ Durma, amanhã será um novo dia, uma oportunidade para esquecer.

Voltou a ficar em pé e empurrando delicadamente o tronco de Damian para trás o deitou em um dos macios travesseiros de penas de ganso, retirou algumas mechas de cabelo do rosto dele e pronunciou baixo e sorridente sem tirar seus olhos dos do garoto:

___ Não tenha medo, draga mea, assim que acordar o mundo estará esperando por você.

Pôs-se a caminhar vagarosamente até a porta e então a fechou ao sair, deixando o rapaz no silencioso e pérfido escuro.


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