Câncer escrita por judy harrison


Capítulo 3
Uma vida que valeu a pena




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Bete estava apenas sonolenta, mas disse que se lembrava bem de mim.

Marta já estava acordada e me chamou para mostrar como preparar o café de sua mãe. Era simples, apenas pão torrado com leite e café solúvel. A parte que eu considerava difícil era levar Bete para a mesa. Olhando para ela não dava para imaginar que ela pudesse sair da cama, mas podia. Com a ajuda de um dos netos ela se levantou lentamente, deu dois ou três passinhos até a cadeira de rodas e se sentou. A dificuldade com que todos aqueles movimentos foram realizados me deixou penalizada, mas eu entendo que numa atividade como cuidar de uma idosa enferma a última coisa em que devo pensar é a pena, pois isso atrapalharia em muito, e ela não queria minha pena, e sim meus cuidados.

Já à mesa, Bete conversava com seu genro, o qual a tratava como mãe, eu a observava, acanhada por estar ali pela primeira vez. mas eles agiam com naturalidade, sem me provocar constrangimentos ou mal estar.

Bete voltou para a cama e dormiu por toda a manhã, enquanto eu permanecia intacta numa cadeira ao lado da cama sem nada para fazer, um rádio ligado bem baixinho na estação que eu gostava, e na casa um silêncio perturbador, uns estavam fora, outros no quarto. Outra sensação que tive foi enquanto Bete dormia, eu tinha vontade de acorda-la e dizer: Aproveite seu tempo...

Enfim na hora do almoço ela acordou. Não quis comer muito, dizia que não sentia fome. Certamente seu estado afetava o paladar também. Mas aquela tarde foi muito proveitosa. Bete estava esperta e conversava comigo. me contou que visitou Paris com suas amigas, que provou um dos melhores perfumes que o lugar já ofereceu. Disse que foi o melhor até hoje, e quando perguntei se não tinha um perfume preferido da marca mais famosa do Brasil ela disse que não, que nem sequer comprou um só produto. Eu ri, nunca conheci uma mulher que não tivesse usado qualquer produto da Avon. Bete era diferente.

Sua filha Marta também passou a conversar conosco e me contou muitas coisas sobre seu pai e filhos. Cheguei a uma conclusão sobre eles: Bete construiu um alicerce forte para sua família, fez vidas e criou pessoas do bem. Era uma heroína! Seu esposo foi professor como ela e seu neto David era professor de História. Um ambiente nada mal pra mim, quem gosta de conviver com pessoas sábias e bem instruidas, para aprender com elas. E eu aprendia.

Não que não houvesse defeito. Marta me disse que tinha uma irmã.

– Ela morou aqui um tempo, mas foi irresponsável, fez dívidas e tivemos que intervir. Agora ela diz que me odeia, odeia meus filhos e não virá mais aqui enquanto estivermos presentes. Perceba que minha mãe quase não fala sobre ela. Foi em agosto que tudo aconteceu e em setembro ela teve essa recaída.

Aquilo era triste de ouvir. Pensei nas desavenças que tive com minha mãe e como o destino pode mudar um conceito alterando todo o estado de coisas.

Sai de lá quando já era noite. Tinha um sorriso no rosto e a convicção de que voltaria no outro dia para ouvir mais conversas sobre a vida de Bete. Mas, por quanto tempo eu poderia ?


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