Meu Doce Irmãozinho escrita por Gemini Yaoi


Capítulo 3
Capítulo 3




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Após o banho, os gêmeos se vestiram apropriadamente para as atividades da tarde. Saga estava incumbido da vigilância de Poseidon nos últimos tempos, e para tanto deveria ir completamente armado. Já Kanon não tinha uma tarefa definida, e portanto pediu para acompanhar Saga.

- Hum... tome cuidado, Kanon. Pessoas estranhas não podem vê-lo.

- Está bem.

O gêmeo de Saga mal disfarçava sua indignação ante todos aqueles protocolos, mas decidiu se conter e disfarçar. Afinal, já tinha todo um plano delineado em sua mente...

Foram ambos pelos caminhos ermos, os quais o caçula sempre tomava. Não muito tempo depois, chegaram ao local do posto de Saga: o Cabo Sunion. Em tempos mais antigos, aquele local era conhecido por ser o limiar entre os domínios de Poseidon e de Atena. Ao lá aportarem, o primogênito fez o que sempre fazia ao ser encarregado da vigilância: postou-se na parede rochosa e... vigiou.

Kanon esperou para ver se ele faria algo diferente, mas não fez. Ficaram ali, praticamente imóveis, por duas, três, quatro horas. Aquilo aborreceu o espírito ativo e dinâmico de Kanon. E aproveitou o ambiente para começar a articular seu plano...

- Que coisa chata, Saga! É isso que faz durante quinze horas diárias?

- Se Atena ordena... sim, é o que faço.

- Tenha dó, Saga! Um homem tão forte e capacitado, colocado pra fazer um monte de nada o dia todo?

O mais velho olhou severamente a seu gêmeo.

- Não é "monte de nada". Rumores dizem que algo no Reino de Poseidon se agita e quer sair. Caso esse "algo" saia, a região deve estar bem guardada.

- Sabe o que é "logo" aos deuses e a todos esses Altos Sacerdotes? Pode ser hoje. Pode ser daqui há uma década ou um século. E se for daqui há um século? Terá jogado sua vida fora em quinze horas diárias de espera por algo que nunca terá ocorrido? Vamos, Saga! Treinou comigo durante cinco árduos anos para se resumir a um mero vigilante?

- É um trabalho muito honroso, Kanon!

- Honroso! Sei! É honroso e está jogando toda a sua juventude fora! Imagine alguém no pleno vigor da força física, experiente em técnicas variadas, com um mente brilhante como você... apenas vigiando! É por isso que chega morto em casa: exaurido por esta rotina frustrante e sem maiores significados!

- Pois bem, Kanon! Se deseja se ausentar de tal rotina extenuante e tediosa, volte a treinar sozinho! Assim você pode destruir pedras, reverter a maré, fazer toda a atividade física que seu "vigor da juventude" exige!

- Não... sozinho não... afinal, são quinze horas sem você...

Kanon aproximou-se de Saga e acariciou sua face esquerda. O mais velho não se demonstrou muito disposto, afinal o irmão havia acabado de insultar seu trabalho. Mas quando o caçula o beijou nos lábios, não se retirou ou resistiu.

O suave ósculo logo se transformou numa imensa e intensa demonstração de carinho e desejo. O caçula passou a abraçar e acariciar o corpo de Saga, mesmo coberto pela armadura como estava. No entanto, o mais velho não deixou as coisas irem muito longe. Afastou Kanon de si e voltou a seu posto.

- É hora de trabalho, Kanon. Não devemos ficar nos acariciando agora.

- Hora de trabalho? Chama isso de trabalho? Ora! Confesse: a única hora do dia em que sente prazer de viver é quando está comigo. E não falo apenas de quando fazemos sexo. Você sabe a liberdade que minha simples presença lhe inspira!

- Já chega, Kanon! Mas que inferno! Vive sob a proteção de Atena e do Mestre, e não sabe reconhecê-los!

- Não, não sei! E como saberia, vendo você se tornar isto? É praticamente impossível ser "grato a eles", Saga!

- Para quê então permanece neste serviço? Vá embora! Viva a sua vida longe daqui. Sendo um Cavaleiro formado como é, não precisará dar satisfações a ninguém quanto à sua saída.

- Eu já lhe disse... sozinho não posso ir!

- Não conte comigo. Eu pertenço ao Santuário e à Atena.

- Mais do que pertence a mim? Ama-os mais do que a seu irmão, Saga?

- Digo-lhe apenas que prestei um juramento divino quando tomei esta armadura pela primeira vez. O mesmo juramento que você fez! E portanto, digo que abandonaria a meu irmão por eles.

- Você... me abandonaria?

- Sim, caso fosse necessário.

O olhar e as palavras austeras de Saga fizeram as pernas de Kanon fraquejar. Até suas mãos tremeram de uma forma singular, como se houvesse levado uma facada no peito. No entanto, o olhar e postura doloridos de Kanon logo foram substituídos por uma raiva repentina e intensa.

- Filhos da puta! - gritou ele, sem se importar com decoro ou boa linguagem - Eu os odeio, sem precedentes! Eu os odeio!

- Odeia quem, Kanon?

- Odeio o Mestre e Atena! Sim, odeio! E se fosse você, com todo o acesso que tem aos aposentos de Atena, mataria os dois sem titubear!

Em sua raiva, o caçula revelou de súbito todo o seu plano. Antes de "cozinhar bem" a mente de Saga. E este foi seu maior erro...

Mal Kanon havia terminado a frase, sentiu um soco certeiro em seu rosto. Foi ao chão num baque seco, sem poder esperar o impacto. Ele havia feito aquilo? O irmão em quem tanto confiava havia batido em si fora de um treino?

- Repita o que disse, Kanon!

O mais novo sentia-se cada vez mais ferido pelas palavras duras e sem compaixão de Saga. Seu gêmeo querido havia sido tanto a si, e por tanto tempo, que não podia conceber perdê-lo. Mas a raiva por senti-lo se esvair para Atena enfim o despertou, e ele reagiu.

- Sim, matar ao Mestre e a Atena recém-encarnada! Aquele velho tolo não soube reconhecê-lo! Eu, sendo idêntico a você na aparência, poderia até mesmo ajudá-lo. Já imaginou? Nunca mais teríamos trava alguma nos impedindo de ser quem somos, e de dominar a todas essas forças disponíveis, as quais estão nos sendo privadas!

Um novo golpe interrompeu as palavras dele. Kanon não pensou: apenas se levantou e encarou o irmão.

- Saga! Você quer isto, o poder! Não apenas vigiar e vigiar, mas usar efetivamente o poder que lhe foi conferido. Quanto mais você nega seu anseio, mais se vê que o brilho presente em seus olhos é igual ao meu!

Um terceiro e derradeiro golpe atingiu Kanon, e nao somente o derrubou, mas fez com que desfalecesse. O mais novo dos Cavaleiros de Gêmeos não podia crer... sua mente, antes de se apagar por completo, só conseguiu pensar em Saga. Mas não naquele algoz que lhe afligia naquele exato momento: pensou na figura consoladora e sorridente de apenas algumas horas atrás, doando-lhe energia na banheira que seria, pos mais de seis anos, o último ninho de amor dos dois. E num último suspiro interno, o qual não teve tempo de se externar pelos lábios de Kanon, ele finalmente perdeu os sentidos por completo.

Quanto a Saga, tomou o irmão nos braços. Seu rosto ostentava uma expressão severa, mas os olhos fraquejavam. Afinal de contas, era seu irmão... seu amor... seu companheiro inseparável desde o ventre da mãe.

- Infelizmente não posso deixá-lo solto - disse ele, de si para si, após algum tempo lembrando-se enfim de seu dever como Cavaleiro - Ele aparentou falar sério; e se qualquer coisa suceder a Atena por causa dele, eu serei cúmplice caso não faça coisa alguma para impedir.

Resoluto e ainda com o gêmeo nos braços, rumou para um local perto dali onde, sabia, Atena estaria a salvo. Mas não Kanon.

OoOoOoOoOoOoO

O caçula dos gêmeos começou a despertar. A princípio não abriu os olhos; apenas sentiu o familiar cheiro de saga, pois sua cabeça estava deitada sobre o ombro do irmão. Por um momento pensou estar acordando ao lado dele, pois dormiam juntos e abraçados. Mas a dor no abdômen, causada pelo último soco de Saga na discussão, o fez lembrar de tudo num único lampejo de memória.

Pensou estar sendo carregado para casa por um Saga meio arrependido, mas se enganava. antes de se resolver a abrir os olhos ou reagir, sentiu-se jogado ao chão sem cuidado ou delicadeza, fazendo um "baque" com o impacto. Isto foi o suficiente para acabar de despertá-lo, mas não o salvou... pois seu irmão logo fechou a grade do local onde se encontrava, e nada mais poderia abrí-la. Nem mesmo o próprio Saga.

Kanon se levantou e percebeu tudo. Aquela era a famosa Cela do Cabo Sunion, local onde os antigos prisioneiros de Atena eram acondicionados.

- Saga! - bradou Kanon, postando-se nas grades inutilmente, tentando arrancá-las - Está louco? Nenhum ser humano pode destruir esta prisão através de meios próprios!

- Eu sei disso. E é por esta razão que o trouxe para cá. Apenas aqui você e suas mãos poderão ficar longe de Atena, ou de lhe fazer mal.

- Mas, Saga! Você sabe... sabe que este local está abaixo do nível do mar, e que sequer um Cavaleiro de Ouro pode viver sem oxigênio caso... caso a água invada e cubra toda a cavidade!

- Foi você quem escolheu assim.

- Não! As mãos que me aprisionaram foram as suas! Saga, me tire daqui!

- Isto já não me compete. Você apenas sairá daí caso os deuses assim queiram, e o libertem.

- Eu morrerei, e você sabe bem disto! Seu... miserável orgulhoso, como eu o odeio! É tão orgulhoso que nem geme quando está prestes a gozar comigo na cama!

O caçula deu uma cusparada para o lado, como para simbolizar seu desprezo pela atitude "dúbia" de seu irmão. Saga permaneceu indiferente, ou assim pareceu que foi.

- Quem colocará em meu lugar em sua cama enquanto eu agonizar aqui e depois finalmente morrer? - disse Kanon, num acesso abrupto de raiva - Hein? Quem! Ao menos me realize este último desejo!

- Ninguém. Você sabe que odeio sua atitude, mas amo sua pessoa.

- Mentira! Quem ama não fere, não mata! Tolo desprezível, eu odeio ainda amar você!

- Tolo é você, Kanon! Pois qualquer homem sabe que alguém apenas ama de fato quando é capaz de abdicar da pessoa amada. Se faço isso, é para tentar salvar sua alma em detrimento de seu corpo!

- Salvar minha alma! Quando não é sequer capaz de salvar a sua! Sim, ó orgulhoso Saga, pois apesar de toda a sua pose, você também deseja tudo que eu desejo. E quando tal sombra finalmente o dominar... será tarde demais para aceitar meu plano! Pois estarei morto!

- Ora cale-se, difamador!

E num último esforço, o primogênito voltou-se e foi embora tentando não olhar para trás. Mas nesta hora um acesso louco, intenso, sem controle, tomou a mente de Kanon e ele gargalhou. Seu riso tenebroso reverberou pelas pedras e pelas paredes rochosas, como se elas lhe respondessem em desafiante maldade. Neste fatídico momento, o mais velho virou para trás e o viu, condenado e poderoso, preso e livre, louco e lúcido, belo e terrível. Kanon.

Sabia que já não era mais seu. Mas ao mesmo tempo um "fio" mórbido, de gêmeos, os unia como um cordão umbilical. E através dele Kanon, e somente ele, viu os olhos vermelhos da criatura que Saga criara em si com suas frustrações e energias estagnadas, e tal ser pérfido lhe sorriu.

Num controle tênue porém ainda presente, a face benigna de Saga fez com que o corpo dele, agora disputado por duas personalidades igualmente poderosas, virasse as costas e enfim fosse embora. A partir daí, a morte tomaria conta do coração de Saga em seu corpo vivo, e o entregaria ao delírio: ele, em seu vazio imenso, cumpriria exatamente a vontade de seu irmão ao matar o Mestre e tentar matar Atena, embora pensasse já ser "tarde demais"...

Mas Kanon não saberia daquilo; sequer naquela hora, onde apenas enxergava morte iminente. Após seu delírio louco, onde viu plenamente o que a alma do irmão escondia, caiu em si diante da visão da realidade. Saga o estava deixando, e para morrer.

- Saga... Saga, eu sei que quer voltar! Saga, a sua imagem no espelho se partiu a partir de agora! Não conseguirá trilhar seu caminho sem mim, eu sei! Maldito seja, você é um ordinário! Nós nascemos juntos, e é capaz de me deixar aqui só enquanto a noite chega, para se deitar sem mim! Saga!

Grande parte do "discurso" de martírio de Kanon não foi ouvido pelo mais velho, já bastante longe da Cela, caminhando sem parar, mas o último brado foi ouvido: seu nome brotando dos lábios desesperados de seu gêmeo e espalhando lamento pelas rochas e pelo mar. Tal grito foi o que fez a face perversa de Saga alimentar-se o suficiente para ser maior do que a própria personalidade de Saga, e dominar por completo o corpo do Cavaleiro de Gêmeos.

Mas o prisioneiro, após aquele grito, sentiu o real peso do abandono total sobre seus ombros, e pela primeira vez. Havia sofrido muito em sua breve vida, mas em cada momento difícil havia o ombro amigo de Saga para o acolher e consolar. E naquela hora... não apenas havia a ausência de Saga, mas também a consciência de que ele o havia entregado a tal maldita situação.

Suas forças enfim esvaíram-se. Ele escorregou ao chão e ali ficou por horas que não soube contar. A noite enfim chegou, a primeira sem seu irmão desde quando haviam sido concebidos no ventre da mãe. A obsessão o prejudicara grandemente: se Saga havia sido a Vida até então, o que seria Kanon sem ele?

Não precisava de tal resposta, pois segundo seu próprio julgamento, morreria em breve. Mesmo assim, lutaria pela Vida até o último momento. Não entregaria sua vida facilmente; não para a deusa que tirara tão cruelmente seu irmão de si!

A maré começou a chegar, e ele teve de se levantar. O mar, inexorável, subia, subia... e pensar que antigamente suas visitas ao Mar o enchiam de esperanças... agora sobrava apenas a Morte, e no limiar de uma noite tão escura...

Kanon tentou se concentrar nos bons momentos. De que adiantaria pensar em coisas ruins? Se pouca vida lhe restava, que ela fosse prazerosa na medida do possível... se é que poderia haver prazer em uma tortura semelhante à de ser enterrado vivo.

Pensou no Saga que conhecera na infância e na adolescência, e ainda na idade adulta jovem, a qual mal havia começado a viver. Era aquele Saga de quem queria se lembrar... era aquela a última memória que gostaria de ter.

"Sim...", pensou ele, quase sorrindo, a água chegando quase em seu pescoço. "Pensarei que morreu ou viajou hoje à tarde, logo após nosso banho juntos. Pensarei que o maldito Grande Mestre, ou um de seus asseclas, me prendeu aqui. É melhor... e pensar em como seria bom morrer com Saga triste, impossibilitado de me salvar, porém desolado em me ver morrer... e guardar a lembrança e o calor de cada abraço seu, e de cada vez em que ele disse me amar... e acreditar que é perfeitamente impossível que tenha sido ele a me punir."

Duas lágrimas solitárias escorreram pelo rosto de Kanon, e caíram na água do mar, e se perderam na imensidão salgada para sempre, não podendo ser lidas por pessoa alguma.

"Acreditarei", continuou ele, de si para si em pensamento, "Acreditarei até o último instante que Saga ainda está comigo... minha última lembrança será dele sendo o meu bom, conhecido e doce irmãozinho..."

"Meu doce irmãozinho...!"

FIM

OoOoOoOoOoOoOoOoO

Ai gente... me apertou o coração agora! Sabemos que o Kaninho não morreu, mas essa cena final ficou triste pra caramba, né?

Mais uma fic concluída! Espero que tenham gostado!

Beijos a todos e todas!


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