Não podia ser. Não, definitivamente não! Aquilo não poderia estar acontecendo com ela, ainda mais naquela hora, daquele jeito.

E a faculdade em andamento? Seu emprego? Meu Deus, não tinha nem dois meses no novo emprego. E sua família? Como reagiria aquilo tudo?

Só podia ser um sonho, ou melhor, um pesadelo.

Ela enfrentaria toda barreira, todos esses obstáculos, afinal não estaria sozinha. Era o que a encorajava.

Mas toda essa coragem deu lugar ao medo. Medo, dor, um total sentimento de incapacidade.

Não queria chorar mais, se desesperar mais. Sabia que aquilo não a ajudaria em nada, além de poder prejudicar a vida que crescia dentro dela.

Uma vida inocente que assim como ela, não tinha ninguém. A partir de agora uma teria apenas a outra.

Os pensamentos a atormentavam tanto que não percebeu que estava atrasada para a aula. Pegou um caderno e correu para o ponto de ônibus. Quando se aproximava do mesmo, pode ver ao longe seu ônibus dando a partida e indo embora.

Como se não bastasse estar atrasada e perder o ônibus, teria que esperar pelo menos 15 minutos até a chegada do próximo, isso se tivesse sorte dele não se atrasar como sempre acontecia.

Enquanto esperava aquelas palavras duras voltavam a ecoar na sua mente. E como machucavam!

Graças a Deus o ônibus fora pontual dessa vez. Durante o caminho os pensamentos e as lembranças ainda a machucavam.

Ao descer no ponto em frente a faculdade sente um embrulho no estômago, acompanhado de um gosto amargo na boca. Aquela sensação já estava sendo familiar a ela.

Conseguiu correr até uma praça próxima e vomitou em um dos arbustos. Um alivio tomou conta dela com o fim daquela sensação. Limpou os cantos da boca com uma das mãos e voltou para seu caminho.

Enquanto seguia para a entrada da faculdade podia ver casais abraçados, se beijando, não tendo vergonha de esconder o que sentiam um pelo outro. Estavam felizes. Felizes como ela chegou a imaginar que seria um dia.

Estava enganada.

Mais uma vez sentiu os olhos arderem. Não conseguia evitar. Começaria a chorar novamente, mas não queria que ninguém a visse daquela maneira. Foi bom ter chego atrasada, afinal todos estariam nas salas de aula e ninguém a veria chorando como uma boba.

Andou em passos largos até chegar ao banheiro, no mesmo andar da turma que estava no quarto semestre de administração. Sua turma também.

Estava com saudade dos amigos. Reconhecia que nos últimos meses se afastara deles, mas queria aproveitar todos os momentos possíveis com o namorado. Seus amigos entenderiam isso, afinal estava apaixonada, feliz com seu primeiro namoro sério.

Os olhos ardiam ainda mais, a garganta ardia também. O choro já era certo.

Ela entra correndo no banheiro e acaba esbarrando em uma garota que saia de lá. Pode perceber que a jovem não gostou, mas sequer pediu desculpas para amenizar as coisas, apenas correu para um dos boxes e se trancou lá, esperando aquela agonia passar para que enfim pudesse assistir à aula.

Uns dez minutos depois ela lava o rosto e enfim se dirige para a classe. Ela entra discretamente e nota que os colegas de turma copiavam algo passado pelo professor.

Senta em uma cadeira da fileira da porta, era a única vaga ali, além também de ser uma onde não atraia muito a curiosidade dos demais.

Ela pega seu caderno e começa a copiar automaticamente, mas nem sabe o que escrevia. Estava aérea, tanto que sequer percebeu que a garota em que esbarrou no banheiro estava sentada atrás dela.

Abriu a boca apenas na hora da chamada.

Pouco tempo depois a sala é dispensada para o intervalo, mas ela continua lá, quietinha no seu canto, sem falar e sequer olhar para ninguém, escondendo o rosto com as mãos.

Quando sentia que estava prestes a voltar a chorar, ouviu uma voz se dirigindo a ela.

 - Oi.

Ela responde amigavelmente um "oi, tudo bem?", tentando sorrir, mas um nó na garganta não permitia.

- Comigo sim, mas já com você... Porque está chorando? Está se sentindo mal?

Quem era aquela? Como percebeu que ela estava chorando? Quer dizer, sua cara realmente não estava das melhores, mas nem seus amigos vieram falar com ela, provavelmente porque não haviam percebido nada de estranho.

- Não, não é nada, está tudo bem. – disse mesmo sabendo que era mentira.

 - Tem certeza? – insistia a garota sem parecer acreditar nela.

- Tenho sim, está tudo bem, mas obrigada por perguntar. – diz torcendo em seu interior para que a garota parasse de perguntar, pois sabia que se ela insistisse provavelmente começaria a chorar de novo.

 - Ok, tudo bem então. – diz a garota naturalmente pegando algo no bolso da calça enquanto voltava para a cadeira em que estava.

As horas seguintes pareciam não passar, apenas aumentando a agonia dentro da jovem.

Enfim a aula termina e sem olhar para trás, ela pega seu material e sai correndo da classe. Tinha medo de que a jovem de algumas horas atrás voltasse e recomeçasse a lhe fazer perguntas que ela não estava pronta pra responder.

 O que ela mais queria era sua cama e seu travesseiro. Sabia que aquela noite seria longa, aonde o sono não viria e as lágrimas que insistiam em cair molhariam todo o travesseiro, o único para o qual ela contaria o que a fizera ir do céu ao inferno em poucos meses.