I Can't Feel You escrita por Nihaxy


Capítulo 12
XII. Not a date


Notas iniciais do capítulo

Era pra ter ficado maior, mas aí eu demoraria ainda mais pra postar u_u

Nem peço mais desculpas pela demora, também .-.

Anyways, hope you like it :3



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Não era um encontro.

Na verdade, o plural seria mais apropriado, Maura pensava, enquanto terminava de costurar a incisão em Y. Já passava um pouco do final de expediente, e ela aproveitava a calmaria proporcionada pelo necrotério vazio para organizar seus pensamentos.

Então, retificando: não eram encontros.

Sim, ela e Kate saíam para jantar. Constantemente. Às vezes, almoçavam juntas. Se bem que, Maura pensava, isso provavelmente acontecia por ambas estarem no mesmo lugar, na mesma hora. Questão de conveniência. Ou, talvez, porque a agente não quisesse ir sozinha a um lugar completamente desconhecido, numa cidade desconhecida, e ela só acontecera de estar presente nas horas em que a morena decidia sair para fazer as refeições.

No começo, ela ficara receosa. Depois de ver sua amizade com Jane desmoronar como uma torre de blocos – pecinha por pecinha sendo tirada, uma de cada vez, enquanto elas lutavam precariamente para manter a estrutura equilibrada, até que simplesmente não conseguiram evitar que tudo desmoronasse. Casey apenas fora a última peça. Aquela que permitia um balanço incerto, mas acabaria com tudo assim que fosse puxada – mesmo que isso acontecesse da maneira mais delicada possível.

Seus sentimentos foram os outros blocos. Todas as vezes que ela encarava os lábios e refreava a vontade de beijá-los. Todas as vezes que ela desviava o flerte por medo de ele ficar pesado demais. Todas as vezes que, quando elas dormiram na mesma cama, a loira se controlou para não correr livremente as mãos pelos cachos bagunçados completamente espalhados no travesseiro a seu lado. Todas as vezes que ela deitou, acordada durante as madrugadas, seu cérebro trabalhando incansável enquanto lutava para não pegar o celular, discar o número já tão conhecido e deixar os sentimentos correrem. Todas as vezes que ela detivera as três simples palavras para si mesma, e as impedira de sair, por medo de destruir o pouco que tinha. A cada vez que algo assim acontecia, mais um bloco era puxado.

Talvez, se ela soubesse que não dizer nada teria inevitavelmente feito o mesmo efeito, ela não teria se refreado. A amizade ainda estaria destruída, mas ao menos a pressão do ar ao redor de si não pareceria inaturável.

Então, é claro que ela não estava procurando nada que se assemelhasse a um relacionamento – em qualquer que fosse a esfera, física ou emocional – tão logo depois desse pequeno apocalipse. A primeira vez em que ela se permitira sentir, se permitira se aproximar, a tinha levado a onde estava agora, não? Precisaria de tempo, muito tempo, para que conseguisse voltar a um semblante de normalidade, a uma rotina em que a ausência de sua melhor amiga não fosse tão agudamente notada todos os milissegundos do dia.

E, embora tivesse repetido para si mesma tantas e tantas vezes esse mantra, de que devia manter uma distância segura entre ela e qualquer pessoa e de qualquer tipo de conexão mais significativa do que as necessárias ao trabalho, todas as vezes ela se achava impotente e incapaz de juntar três letras em negativo ante aos olhos brilhantes de Katherine Connors quando a pedia alguma coisa ou a chamava para lhe acompanhar.

Da primeira vez, aceitara única e exclusivamente para fugir, ainda que por apenas uma ou duas horas, da agonia opressiva e vazia que se abatia sobre ela todas as vezes que colocava o pé dentro de casa e percebia que enfrentaria mais uma noite de solidão – a companhia de Bass e de revistas científicas não contava, e, por algum motivo desconhecido, até mesmo Angela diminuíra a frequência de suas visitas. Talvez estivesse num encontro com Sean ou algo do gênero. Talvez estivesse fazendo turnos extras no café. Talvez a estivesse realmente evitando. De qualquer modo, a legista se mal-acostumara à presença de pessoas ao seu lado. Tanto que não conseguia mais manter o sentimento de solidão à distância, como tinha maestria em fazer quando era mais nova.

E, enquanto ria de alguma coisa que a agente dissera, quase se esquecendo do seu frango ao curry – que ainda jazia quase intocado no prato -, ela realmente conseguiu sentir a risada fluir naturalmente, o sorriso espontâneo no rosto – completamente diferente dos repuxares forçados de lábios que ela se obrigara a dar nos últimos dias.

E quando, na noite seguinte, Kate sugeriu o restaurante chinês um pouco mais distante, Maura – apesar de sentir a conversa que tivera com si mesma na noite anterior, assim que voltara do jantar, ecoando em sua cabeça e apresentando a lista de várias razões por que isso acabaria dando errado – não conseguiu não dizer sim.

A palavra simplesmente escapou.

E assim continuou, noites e noites consecutivas. Às vezes, também acontecia de elas acabarem almoçando juntas, embora isso fosse menos recorrente. Kate a explicara que, se o assassino mantivesse seu modus operandi condizente com o que acontecera até então, haveria um intervalo de três semanas e dois dias entre o segundo e o terceiro assassinatos. Enquanto isso, infelizmente, não restava mais nada a fazer que não se aventurar por becos sem saída que pareciam pistas sólidas, ficar rebatendo teorias como se jogassem ping-pong e evitar abrir toda e qualquer correspondência não identificada que aparecesse endereçada a qualquer um trabalhando no caso – ao invés disso mandando o envelope para uma análise laboratorial que não mostraria nada de útil ou que já não fosse sabido.

Talvez, até por estar emocionalmente sensível e ainda sentindo falta da presença praticamente constante de sua melhor amiga, Maura tenha se deixado encantar tão fácil.

Ela não parecia precisar fazer esforço para iniciar ou manter a conversa. Tópicos surgiam do nada e, mesmo que levassem ao lugar nenhum e não tivessem nenhuma relevância prática, Maura se pegava ansiando por esses momentos de conversa fluida entre elas. Sim, o impasse com Jane ainda martelava incessantemente, mas ela conseguia dar-lhe um pouco menos de importância enquanto passava tempo com a agente. E, quando Kate a induzia a testar teorias – e gargalhava de sua total recusa a fazer suposições não embasadas pela ciência – ela se sentia um pouco mais útil. Um pouco mais viva. Um pouco menos vazia.

Nada nem ninguém poderia substituir Jane, é claro – e nem ela queria pensar que isso pudesse acontecer. Não se pode simplesmente substituir, mesmo que mal, a relação mais importante de toda a sua vida. Mas, às vezes, ela conseguia se sentir um pouco menos socialmente inapta, um pouco mais normal. Os detetives ainda lhe chamavam de apelidos quando pensavam que ela não estava ouvindo – e quando tinham certeza que Jane estava a pelo menos uma milha de distância -, mas Kate parecia conseguir entendê-la, de um jeito extremamente parecido ao de Jane. Perigosamente parecido.

Mas, já ciente do que acontecera da última vez, ela se controlou. Quando sua amizade com Jane começara, a legista, completamente desacostumada à presença de alguém que pudesse ser classificado como mais que um conhecido, se deixara levar pela conexão instantânea que formaram. Analisando todas as consequências, Maura podia notar que, abrindo-se do jeito que se abrira para Jane, emocionalmente, compartilhando medos e angústias e situações e pensamentos no geral, ela também se permitira enfraquecer. Ela voluntariamente mostrara à detetive o caminho pelo labirinto que construíra ao redor de si, mostraram como derrubar a bolha de distanciamento que a protegia do resto do mundo. Ela não faria isso de novo. Doía demais.

Ela podia continuar saindo e socializando, mas faria isso de modo a se manter avulsa. De modo a se manter segura.

E, mesmo que parecessem encontros – todos esses almoços e jantares e tempo passado juntas -, Maura listou as razões por que não o eram.

Não eram encontros quando Kate se adiantava para abrir a porta e a segurava, apenas esperando ela passar, ou então puxava a cadeira para ela se sentar.

Não eram encontros quando, do nada, o assunto sumia e o silêncio reinava enquanto elas se encaravam por segundos intermináveis, um contentamento infantil brilhando nas orbes que se prendiam às dela, e foi num desses momentos que Maura se pegou estudando – seria analisando uma palavra mais adequada? – as íris azuis à sua frente. O tom era verdadeiro e puro – o espectro não era transpassado por nenhuma outra cor -, extremamente vivo, fugaz, energético. Realmente notável. E, assim como sumira, o assunto voltava de novo, como se nunca tivesse havido uma pausa.

Não eram encontros mesmo quando os jantares ocorreram praticamente todas as noites livres da semana – e até mesmo uma em que ambas só deram uma pausa e voltaram à delegacia logo depois para resumir o trabalho.

Não eram encontros quando ela sentia a mão delicadamente colocada na sua lombar, todas as vezes que entravam em algum lugar. Quase como se estivessem guiando-a, e ao mesmo tempo passando a mensagem da presença de alguém ali, do lado dela.

Não eram encontros quando, na quarta-feira, Kate fez um comentário sobre a jaqueta que ela vestia. Nem no sábado, quando mencionou o quanto a cor do vestido realçava o verde de seus olhos e o corte lhe caía bem.

Não eram encontros quando, em vez de chamá-la e apontar quando queria lhe adereçar e mostrar alguma coisa, a agente tocava levemente seu antebraço, e trancava o olhar no dela antes de norteá-la ao que quer que fosse o motivo para chamá-la em primeiro lugar. E o toque, mais frequentemente que não, perdurava por frações de segundo a mais do que o necessário.

Não, não eram encontros. Maura repetia isso todas as vezes que se pegava pensando no assunto, e sua justificativa final parecia ser a única coisa capaz de convencê-la de que esse comportamento não indicava um tipo latente de atração e uma tentativa educada de cortejá-la.

E, todas as vezes que ousava pensar no contrário, que cogitava a possibilidade de esse ser o jeito de Kate demonstrar interesse, Maura se lembrava que Jane agia exatamente do mesmo jeito. E, seguindo a lógica, se eram encontros com Kate, também teriam sido encontros com Jane.

Mas ela e Jane eram apenas amigas. Melhores amigas, sim. Mas apenas amigas.

Então, não. Não eram encontros.


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