Finalmente em casa, deito-me em minha cama. Assassinatos inexplicáveis têm ocorrido com frequência na região onde fica meu ateliê, ou melhor, onde ficava. Corpos eram encontrados estraçalhados, com as tripas completamente para fora. Por ora terei de mudar de local, talvez começar a fazer as bonecas em casa. Depois de ter empacotado todas as bonecas, e trazido-as para casa em plena noite de sábado fico contente de estar segura em meu aconchegante lar e minha confortável cama.

Fecho meus olhos, e ouço barulhos de passos no andar de baixo. Levanto-me, coloco minha pantufa, mesmo meu subconsciente dizendo que eu devia ficar quietinha no meu canto.

– Tem alguém ai? – pergunto ao chegar na soleira da escada. – isso não tem graça.

Ouço passos mais próximos, e recuo, acabo caindo e bato minha cabeça com força depois de rolar escada abaixo. Olho para cima, tudo que vejo é a escuridão, tento alcançar o interruptor, mas pequenas mãos me interrompem.

– João, isso não é nem um pouco engraçado.

João era meu vizinho de dez anos de idade, ele adorava fazer essas pegadinhas e invadia minha casa sempre que podia.

Não ouve resposta, congelei. Geralmente quando eu o descobria se dava por vencido!

– Isso realmente não tem graça. – choraminguei parecendo uma criança de cinco anos depois de roubarem meu pirulito.

As mãos me largaram e eu pude me levantar, alcancei o interruptor, mas as luzes não acendiam.

– Temos almas! – uma voz falou do nada, me assustando.

– Quem está ai? – perguntei.

– Vamos te devorar. – ouvi a voz novamente, ela era cínica e completamente doentia.

Comecei a correr, mas não sabia para onde ir, estava tudo escuro e nenhuma das luzes acendia. Fui para a cozinha, e senti algo passar de raspão em minha cabeça, uma faca. Havia um assassino psicopata em minha casa. Corri mais rápido, mais facas eram atiradas em minha direção, mas não me acertavam. Tentei abrir a porta e correr para o jardim, mas a mesma se encontrava trancada. Comecei a chorar, meu desespero estava claro!

– Por favor, me mate de uma vez então. – minha voz soava falha, e eu não possuía mais fôlego.

– Não vou lhe matar, vou devora-lhe, o gosto da pele e do sangue humano é delicioso.

Deu um grito quando uma faca passou pelo meu rosto e arrancou um pedaço de minha pele, sentia o sangue escorrer pela minha face.

Ouvia passos há minha frente, mas não parecia ser somente uma pessoa, parecia ser várias, isso só ajudou a aumentar meu desespero.

– Temos almas, e iremos devorar-lhe.

As luzes se acenderam, rapidamente vi minhas próprias criações, manchadas de sangue vindo em minha direção. Minha boneca favorita, a que eu mais adorei criar estava sem um olho, completamente coberta de sangue, e uma serra elétrica ensanguentada estava em seus braços, apontando diretamente para mim.

Restos de corpos, destroçados, poças de sangue e tudo que sem pode imaginar estava derramado pelo meu chão.

Sangue de gente inocente que foram mortos por bonecos, bonecos demoníacos... Criados por mim, e eu seria a próxima...

Tudo que consegui deixar escapar foi um grito, misturado de medo, dor e agonia.

– Essa será nossa vingança. – disseram.

As luzes se apagaram novamente, tudo o que via eram pequenos olhos vermelhos em todos os cantos. Minha primeira alternativa foi correr, correr o mais rápido que minhas pernas me permitiam.

Vi uma luz dourada tomar conta do ambiente, e um barulho de explosão. Vi as chamas crepitarem em torno da casa, e o fogo engolir tudo o que me há de mais precioso.

Como pode seres tão maravilhosos, criados com cuidado e carinho, viraram aquilo?

Uma música sinistra começou a ecoar em pleno pelo ambiente, uma música macabra e um tanto desgastante. Do tipo que se ouve em filmes de terror quando uma tragédia e um banho de sangue estão a se aproximar. Belisquei-me, desejando que você apenas um pesadelo horrível. Mas aquilo era um pesadelo real, que parecia não possuir fim.

Tropecei em algo e cai com um estrondo. Metade da mansão já estava destruída, e os pequenos passos se aproximavam pouco a pouco, não ousei mexer um músculo para eles não me verem. Sentia o cheiro da morte sentia a escuridão e o medo.

O barulho da serra elétrica me fez dar um salto, indicando o lugar onde eu me encontrava. Minha morte estava perto! Ouvi o badalar do relógio, indicando a meia-noite, senti a janela se abrir com força, fazendo um eco enorme no que sobrará da casa. Cada badalar do relógio indicava que eles estavam mais próximos.

Uma luz interna se acendeu, não saberia dizer de onde veio. Pude ver os pequenos corpos dos bonecos destroçados vindo em minha direção.

Minha criação favorita, Lily, chegou mais perto, um arrepio passou pela minha espinha e a senti me cortar ao meio com sua cerra elétrica.

Escutei gritos, sim eram meus próprios gritos. Meus olhos começavam a se fechar, e ouvia a risada demoníaca ecoar em cada canto de minha mente! Vi chamas alaranjadas brilharem, senti o ar fresco bater na janela. Vi meu próprio sangue em volta de meu próprio corpo. Senti-me sendo devorada...

E depois disso, só a escuridão.