Contagem regressiva

Era uma cidade bem ao sul do reino, não que Gildarts soubesse disso, afinal direção não era exatamente seu forte. Coçou a nuca quando entrou no limite urbano se perguntando onde estaria. Olhou para os lados e viu um par de moças cochichando enquanto o olhavam em sua direção, será que estava tão ruim assim?

Olhou para suas roupas simples, okay que não estava tão apresentável depois de duas semanas caminhando sem nenhum contato com a civilização, mas não era tão ruim!! Caminhou mais e achou a fachada de um lugar que não mudava muito em qualquer que fosse o lugar: um bar.

Empurrou as portinhas e assim que entrou ouviu as típicas conversas de bebedores. Sorriu para o conforto que isso lhe lembrava e foi indo para o balcão, então avistando um amontoado de pessoas numa mesa ali perto. Gritavam coisas desconexas, mas parecia uma espécie de aposta. Ignorou. Não era um local então pouco deveria lhe importar.

Sentou-se na barra e um barman veio perguntar o que desejava. Pediu uma cerveja bem gelada e virou-se para observar aquela confusão, não teria observado mais do que cinco segundos se seus olhos não tivesse visto a peculiar figura de mulher.

Cabelos castanhos presos para cima com um nó despojado, vestido azul com ombros caídos e muitas pulseiras prateadas nos braços. Ela encarava com sorriso gatuno nos lábios e segurando um pequeno copo de vidro repleto de algo que imaginou ser tequila.

O homem a sua frente deveria ter o tamanho do Clive ou talvez fosse até mais corpulento, mas definitivamente não estava bem, parecia prestes a desabar. Entretanto, corajosamente virou mais uma dose e toda a plateia virou-se para a mulher a espera de sua reação.

A bela morena por sua vez sorriu e segurando o pequeno copo apenas com os dentes virou toda a bebida no gesto mais sexy que Gildarts viu em toda vida. Fez-se um silêncio sepulcral e de repente o adversário levantou e caiu lamentosamente para trás. Os espectadores começaram a rir e gritar cercando a bela mulher tentando e tentando conseguir alguma coisa, mas aparentemente ela não estava muito a fim de qualquer papo.

Apenas encheu seu copo novamente e continuou a beber tranquilamente com uma mão debaixo do queixo com o olhar distante. Essa situação permaneceu até que um dos caras aparentemente se ofendeu com a falta de atenção dela e puxou-lhe um dos braços com violência.

O mago da Fairy Tail não a conhecia, mas não aceitava quaisquer tipo de violência contra mulheres! Estava prestes a se erguer e tomar o partido da bela dama quando o barman o segurou pelo braço e impediu com um gesto de negação.

- Mas...

- Cornelia-san não precisa de defensor, se entrar lá ela vai acabar chutando seu traseiro também.

Então o nome dela era Cornelia.

Ainda sob aviso, o mago continuou a beber só observando.

A bela morena apenas olhou-o com desdém e as sobrancelhas franzidas em arco, o aperto em seu braço continuou e Gildarts já estava prestes a pular do banco em defesa dela quando num gesto rápido ela sacou uma carta mágica.

- Elektra. – ouviu o silabar e aparentemente o corpo feminino tornou-se um condutor de energia que eletrocutou o cidadão que caiu duro – Tsk...

Os demais arregalaram os olhos e saíram correndo o mais rápido que suas ebriedades permitiram deixando-a sozinha com sua bebida e ela sorriu melancolicamente. O Clive sorriu abobalhado, quem era aquela mulher?

- Cornelia-san é uma maga muito famosa por essas bandas, é da Guilda Heart Kreuz... Entre indas e vindas de missões ela para aqui para beber.

- Oh sim... Heart Kreuz... Eu acho que já ouvi esse nome... – disse coçando a nuca –

- É a guilda da ex-maga santa Blair Wood, dizem que em bons tempos ela já foi da Fairy Tail...

Oh sim, Gildarts se lembrou da maga amiga de Makarov.

Voltou os olhos para a mesa e ela agora jogava cartas antigas sobre a mesa metodicamente como se fosse algum ritual. Ficou observando o que conseguia mesmo com ela sentada, aparentemente era muito esguia e tinha pernas lindas. Ela espalmou a mão na bochecha revelando o tom rubro das unhas vermelhas.

Parecia tão entediada...

Ela foi virando carta por carta com expressões que variavam de um sorriso até caretas engraçadas.

- Sabe, já faz um ano que toda vez que ela vem aqui e senta no mesmo lugar, vence alguém numa competição de beber e depois lê seu tarô... Estão dizendo que ela leu seu futuro aqui...

O mago Crash já não escutava muita coisa, estava encantado demais por aquela mulher.

E foi então que os olhos violetas o fitaram.

Violeta!? Como assim ela tinha olhos violeta?? Um sorriso simples formou-se em seus belos lábios e ela permaneceu a encará-lo de uma maneira quase constrangedora! Céus!! Que olhos eram aqueles?? Era um misto de mistério e obliquidade... Quando seu sorriso alargou mostrando os dentes corretamente enfileirados o coração do Clive quase parou.

Um raio de tristeza cortou a face seguido de um novo olhar para aquelas cartas antigas das quais Gildarts jamais viria entender a lógica. Juntou-as com os dedos finos, guardou em uma bolsa e ergueu-se revelando toda a majestade de porte que emanava.

Com o rabo dos olhos viu as garrafas caídas ao redor dela... Qualquer um, até mesmo ele, que bebesse metade daquilo entraria em coma alcoolico, como alguém tão pequena podia beber tanto?

Pernas ante perna aquele monumento veio caminhando em direção ao balcão onde debruçou-se de maneira quase indecente apesar do vestido não revelar nada que não pudesse ser revelado... A manga esquerda caiu revelando um ombro alvo com uma marca de cicatriz levemente marrom que não tirava uma gota de beleza.

- Oe, Mizuko-kun... Eu já vou indo, Blair me quer na guilda até o meio dia de amanhã, vou ter que sair cedo, tudo no esquema?

- Oh claro que sim, Cornelia-san, a adega está preparada para recebê-la!

- Obrigada... Você sabe que aquela velha da hospedaria não gosta de mim!Tsk... Acredita que ela tava querendo que jogar numa fogueira...?! – e Cornelia riu quase deixando o grande homem ao seu lado babando –

O barman riu já acostumado com o jeito avassalador da maga enquanto enxugava alguns copos.

- Mas você também não facilita, Cornelia-san, jogou uma praga nela da última vez que passou por aqui!

Outra risada.

- Oh... não sejam idiotas! Sou cigana, não macumbeira!

E então aqueles olhos dissimulados fitaram Gildarts novamente, tão intensamente que ele quase sentiu a força da magia.

- Pensei que meu baralho tinha mentido...

- Nani?

- São quatro arcanos, um para cada fase da nossa vida... O começo do fim, bem vindo, a roda da fortuna começou a girar!

- Er... An... Er...

- Eu acho que vale a pena, ou pelo menos que assim seja!

A mão pequena com unhas rubras acariciou de leve a pele do rosto naquela época jovem do Clive que fechou os olhos para receber o carinho.

Existem forças que estão além de nossa compressão, mas ela não nos impedem de fazer escolhas e naquele dia Cornelia Alberona podia simplesmente ter ido embora e mudado seu destino, mas ao olhar para aquele homem, teve certeza que uma vida longa e tranquila não valia o preço de jamais conhecer o amor.

O mundo tinha uma lógica insana, mas quem liga? Aquele foi o primeiro encontro de sua contagem regressiva... E não podia estar mais feliz.

Gildarts Clive seria o grande o amor de sua vida, mas infelizmente nunca passaria de mais uma história na vida dele.

Owari...