Canon Malfoy escrita por Bella P


Capítulo 4
Herança




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/33418/chapter/4

HERANÇA

 

Draco encolheu o ombro de pavor quando ouviu o som estalado e agudo ecoando na sala e lentamente virou-se na cadeira na direção do barulho, já antecipando o desastre que iria encontrar. E não deu outra. Lá, no canto do escritório, com a expressão mais inocente no rosto infantil estava o seu filho. Em uma mão ele segurava a cabeça de um cavalo feita de cristal enquanto os olhos azuis miravam curiosos os cacos de vidro entre as suas curtas pernas rechonchudas.

- Papa... quebou. - balbuciou o menino de dois anos e meio e o loiro soltou um longo e sofrido suspiro.

- Eu estou vendo. - rebateu o homem entre dentes, tentando manter a calma. Scorpius tinha desenvolvido de uns tempos para cá uma fascinação absurda por magia, mais do que uma criança bruxa comum, e como ele ainda não tinha controle dos próprios poderes, costumava incitar manifestações mágicas nos outros.

Como?

Sua tática preferida era de quebrar, destruir e arruinar coisas apenas pelo prazer de ver os pais sacando a varinha e fazer a mesma emitir aquelas luzes coloridas que ele tanto adorava. Ou então, atormentava os elfos-domésticos até que os mesmos ou iam correndo bater com as cabeças na porta do forno diante da frustração, ou atendiam as demandas do jovem herdeiro.

Astoria havia perdido a conta de quantos vestidos manchados teve que recuperar, quantas porcelanas, vasos quebrados e tapeçaria queimada teve que restaurar - e nesse caso a mulher nem queria imaginar onde o seu bebê tinha conseguido encontrar fogo para queimar o carpete - ou quantas vezes teve que limpar as paredes do corredor da ala de dormir da mansão pixadas pelas canetas coloridas de Scorpius.

Com isto, cansada das travessuras do filho e com as costas atoladas de processos provindos do Departamento de Regulamentação e Leis Mágicas, a advogada resolveu dar folga a si mesma da maternidade e jogou o filho nas costas do marido, sumindo logo cedo para o Ministério e ordenando aos seus subordinados que não responderia a nenhuma chamada de casa, bloqueando todas as tentativas desesperadas de Draco de tentar contatar a esposa a procura de ajuda.

O loiro não estava acostumado a passar muito tempo na presença de Scorpius. Não que fosse um pai ausente ou preferisse entregar a criação de seu filho a elfos-domésticos, não depois de todo o sermão que recebeu da esposa durante a gestação dela dizendo que ela se recusava a deixar outra pessoa que não ela mesma e Draco a criarem o filho. Os elfos-domésticos existiam para auxiliar nas tarefas de casa, mas não para substituí-los em certas responsabilidades.

Com isto, o jovem Malfoy aprendera os horrores de trocar uma fralda, o desespero de passar noites insones e em como Scorpius era manhoso e por qualquer coisa chorava querendo a atenção dos pais. Narcissa costumava rir dizendo que o neto era extremamente parecido com Draco quando pequeno e Draco se recusava a aceitar saber que era uma criança tão mimada e dependente.

Entretanto, o casamento com a jovem Greengrass que tinha como objetivo recuperar o prestígio dos Malfoys estava rendendo frutos e nos últimos anos a família tinha conseguido várias associações valorosas para os seus negócios, o que transformara Draco em um homem ocupado. Havia também o fato de que há um ano Astoria encerrara a sua licença maternidade e voltara a trabalhar no Ministério, o que colocava em terra os planos dela de deixar a criação de Scorpius para os pais em vez dos elfos.

A mulher até que tentava compensar, preferia não pegar casos difíceis para assim não ficar muito tempo presa no escritório até que o filho fosse uma criança mais independente. Trazia trabalho para casa e fazia questão de ter o domingo de folga, mesmo que o horário tão agitado a estivesse estafando. Não era fácil ser uma mãe com uma carreira profissional. Narcissa insistia que a nora, sendo uma Malfoy, não precisava de carreira, apenas de uma boa posição na sociedade. Astoria retrucava com veemência que quando aceitou o acordo de casamento com Draco havia deixado claro que não iria desistir de seus planos e que o marido tinha concordado.

Claro que Draco tinha concordado naquela época. Afinal, era extremamente lucrativo ter uma advogada como esposa e sendo que a mesma trabalhava na área legal do Ministério, o auxiliava e muito a combater a burocracia do mesmo quando o assunto era expandir os negócios e ter os planos barrados por causa do preconceito contra a sua família e sua associação com o Lorde das Trevas.

Hoje, no entanto, enquanto ele via Scorpius girar a cabeça do cavalo de cristal entre os dedos arredondados, daria tudo para ter uma dona-de-casa como esposa em vez de uma mulher de carreira.

Outro estalo tirou Draco de seus devaneios e ele viu com pesar que agora a cabeça do cavalo de cristal não era mais uma única peça, mas sim duas. Os olhos azuis de Scorpius miraram com curiosidade a própria façanha e o garoto soltou uma risadinha infantil diante do feito. Malfoy apertou as mãos em um punho. Aquela coleção de cavalos de cristal estava na família há gerações. Fora de seu tataravô que tinha como hobby fazer esculturas em vidro. Agora décadas de história dos Malfoys havia sido destruída pelas mãos do descendente mais novo.

E o pior de tudo, Draco não sabia como Scorpius conseguia fazer isso. Óbvio que depois de cada travessura dele o casal Malfoy fazia questão de colocar feitiços protetores na peças consertadas, mas o menino parecia ter um dom nato de transpassar todas as barreiras mágicas com uma facilidade absurda e fazer um estrago maior do que o anterior nos objetos recém restaurados.

- Cabalo fez pop! - novamente o balbuciar infantil e Draco esfregou os olhos com as palmas das mãos para ver se conseguia dissipar uma dor de cabeça que começava a atormentá-lo. - Pop, pop, pop, pop! - Scorpius começou a repetir incessantemente, batendo ora palmas, ora batendo o que restava do cavalo sobre o carpete do escritório da mansão.

- É isso! - o loiro soltou irritado, erguendo-se de sua cadeira num gesto rápido e fluído. - Eu também estou tirando férias da paternidade! - e com isso caminhou a passos largos até o filho, o erguendo do chão e o prendendo em seu quadril. Os grandes e brilhantes olhos azuis da criança miraram o pai com confusão e antes que ele pudesse dizer qualquer coisa, o estalo característico da desaparatação soou no escritório.

Assim que pai e filho aparataram no saguão de entrada do Ministério, passantes curiosos viam um Malfoy segurando no colo uma versão miniatura sua, só que menos loiro platinado e menos olhos acinzentados, e que batia palmas animado enquanto gritava:

- Má-ica papa! Di novo! Má-ica! - insistia o garotinho.

- Nada de mágica fedelho. Eu to desertando e te deixando a cargo da sua mãe. Ela que pariu, ela que crie! - resmungou, indo a passos apressados na direção do elevador e entrando rapidamente no mesmo, apertando o botão do andar que levaria ao Departamento de Regulamentação e Leis Mágicas.

Durante todo o trajeto do elevador Draco teve que sofrer com as miradas curiosas e divertidas de outros bruxos e os gritos excitados de Scorpius cada vez que a porta se abria e memorandos interdepartamentais adentravam o cubículo. Quase soltou um suspiro de alívio quando a voz no elevador anunciou seu andar e praticamente se projetou para fora da máquina, ignorando mais olhares curiosos sobre a sua pessoa.

- Astoria! - chamou assim que entrou no escritório da esposa, assustando a mesma e a fazendo derrubar uma pilha de pergaminhos que estava em sua mesa no chão.

- Draco. - a mulher rebateu depois de recuperada do susto, estreitando seus olhos verdes na direção do homem com a criança no colo. - Há algum motivo para você estar na minha sala com Scorpius... usando apenas uma cueca? - a morena sibilou entre dentes e Draco piscou os olhos e mirou o filho apenas para reparar que o garoto vestia somente uma roupa íntima branca com desenho de ursinhos.

- Ele manchou toda a roupa com a geléia de amora das torradas que os elfos prepararam para o lanche dele...

- E por que você não trocou a roupa dele? - a mulher o interrompeu no meio da explicação e isso pareceu fazer o homem explodir de vez.

- Porque ele não deixou! Cada roupa nova que eu colocava ele sujava alegando que não queria trocar de roupa, queria ser limpo com mágica. E você sabe muito bem que isso é ciclo vicioso, se eu começasse a usar mágica a situação iria piorar e ele iria fazer coisas piores para me obrigar a usar magia e... - Draco parou no meio da sua reclamação, fechando a boca em um estalo ao ver que pela expressão que ostentava, Astoria estava se divertindo com o desconforto dele.

Mordendo o lábio inferior ele caminhou a passos largos até a mesa da mulher e sem cerimônia depositou Scorpius sobre uma pilha de pergaminhos. O menino apenas sorriu para a mãe e as suas mãozinhas curiosas rapidamente foram na direção do pote de tinta para as penas. Em um gesto rápido Astoria tirou o objeto do alcance do garoto e fixou seu olhar irritado no marido.

- Toma que o filho é teu! - falou o homem.

- Meu filho? - respondeu a bruxa em um tom anormalmente calmo.

- Essa atitude absurdamente lufa só pode ter sido herdada de você. Então enquanto ele estiver nessa fase de "destruir tudo para ver como magia funciona" ele é o seu filho. - rebateu o loiro contrariado.

- Ah... agora ele é meu filho Malfoy. - Draco segurou-se para não retesar os ombros e recuar um passo. Quando Astoria o chamava de Malfoy era porque logo em seguida feitiços e azarações voariam na sua direção. - Ele não era meu filho quando você o exibia com orgulho como herdeiro dos Malfoys para os seus associados. E muito menos meu filho quando você resolveu batizá-lo de Scorpius. - o loiro rolou os olhos.

O nome de Scorpius era uma discussão antiga entre o casal. Astoria simplesmente não engolia até hoje o fato do marido ter registrado o filho deles com um nome que ela discordava e achava ruim. Draco simplesmente retrucava dizendo que Scorpius era um nome nobre, de uma constelação, como o dele, e digno de um Malfoy. Astoria rebatia falando que Scorpius parecia nome de doença de pele e só para irritar o marido fazia questão de colocar vários apelidos no menino.

- Não me interessa. O que me interessa é que já devolvi o que é seu e portanto vou seguir o meu caminho. - a cortou antes que ela continuasse reclamando e virou sobre os pés para ir embora, mas um jato de luz alaranjada passando sobre o seu ombro e o grito de Scorpius de "Má-ica!" o fez parar em um instante.

Com um estalo a porta o escritório trancou-se e Draco virou-se para ver Astoria apontando a varinha na sua direção.

- Draco Lucius Malfoy... - a mulher sibilou e o loiro teve a impressão de que a cada segundo ela parecia crescer mais além dos seus 1.67 m de altura por causa da raiva. - Você vai pegar esta criança, voltar para casa e cuidar dela até eu chegar. - ameaçou entre dentes, com a ponta da varinha brilhando perigosamente. - Sem dizer um "ai". - continuou e calado Draco foi até a mesa da esposa, recolheu Scorpius e o colocou novamente apoiado em seu quadril.

Conhecia Astoria o suficiente para saber que quando ela realmente perdia a compostura, eram pernas para quem te quero. A jovem podia ser uma ex-lufa, mas era uma ex-lufa com um conhecimento assustador de azarações e outros feitiços traiçoeiros que daria inveja até ao mais orgulhoso dos sonserinos. Resignado e com a expressão ainda fechada, ele girou sobre os pés e saiu como um furacão do escritório, retornando as pressas para a Mansão Malfoy.

Assim que chegou em casa, Draco depositou o filho sobre o carpete da sala de visitas, mirando seus olhos cinzentos nos azuis do menino e se perguntando o que fazer daqui para frente. Não conseguiria se concentrar no trabalho porque ficaria preocupado com o que Scorpius estaria aprontando, também não queria deixá-lo com os elfos sabendo que as criaturas não conseguiriam domar a faceta matreira e levada da criança. Então, a única coisa que restava era deixar tudo de lado e dedicar-se a entreter o menino até Astoria chegar.

- Você venceu fedelho. - falou, sentando-se na frente do garoto e puxando a varinha de dentro das vestes. O rosto de Scorpius se iluminou.

- Má-ica! - gritou entusiasmado.

- Isso mesmo, vamos fazer algumas mágicas até a mamãe chegar. - Draco respondeu, começando a soltar feitiço atrás de feitiço para entreter o garoto.

Horas mais tarde, quando o sol terminava de se por atrás dos montes de Whiltshire, Astoria acabava de aparatar no solário da mansão, percebendo com estranheza que a casa parecia quieta demais para um lugar que abrigava uma ativa criança de dois anos. Em um estalo, um elfo-doméstico surgiu ao seu lado, recolhendo a sua pasta e o seu casaco e a mulher se virou para encará-lo.

- Onde estão Draco e Scorpius? - perguntou enquanto desabotoava os punhos da sua camisa social.

- Mestre Malfoy e pequeno mestre estão na sala de visitas. - respondeu o elfo, desaparecendo em um estalo e Astoria seguiu caminho para a dita sala, parando prontamente sob o beiral de entrada da mesma ao ver uma cena que a fez sorrir levemente.

Draco estava deitado sobre o tapete perto da lareira com o seu peito subindo e descendo por causa da respiração compassada. A varinha estava presa entre os dedos da mão estendida ao lado do seu corpo enquanto o outro braço atravessava as costas de Scorpius que dormia sobre o peito do pai e cujo corpo pequeno e envolto no casaco de Draco subia e descia de acordo com a respiração do homem.

A sala por si só estava decorada com faixas, brinquedos, bolhas de sabão e qualquer outro adereço infantil que Astoria sabia ter sido conjurado por magia apenas para poder agradar o pequeno herdeiro. Ainda com o sorriso, a mulher tirou os sapatos de salto e a passos lentos caminhou até a dupla, ajoelhando-se ao lado deles e aos poucos abaixando o corpo até estar deitada ao lado de Draco. Com cuidado, pegou o braço do homem que segurava a varinha e o passou sob o seu pescoço, o fazendo prontamente de travesseiro.

Tal gesto pareceu acordar o loiro que virou um pouco a cabeça apenas para mirar a mulher que se aconchegava ao seu lado. Em movimentos lentos ele deu um beijo na testa dela, voltando a fechar os olhos com um suspiro e retornando ao seu sono, sendo logo depois acompanhado por Astoria.

Na semana seguinte, a mania de Scorpius de querer ver todos usando magia parecia ter finalmente passado para o alívio dos pais. Entretanto, dois dias depois o garoto começou a insistir que queria porque queria aprender a voar... sem usar uma vassoura. Com isto, Draco fez questão de colocar um elfo-doméstico como sombra do filho para impedir decolagens inesperadas de janelas que aparecessem de maneira oportuna no caminho do menino e repetir várias vezes para uma Astoria resignada com as reclamações do marido que este comportamento anormal era culpa dos genes lufa dela.

 


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!