Era apenas mais uma das solitárias noites de folga que Sakura era obrigada a tirar. Sentada no sofá, de moletons velhos, a kunoichi de cabelos róseos fitava atentamente a foto de seu antigo time 7 enquanto esperava o chá ferver. Era sempre assim. Fitava a foto com máxima concentração, como se assim a força de seus pensamentos conseguisse chegar ao herdeiro Sharingan, seja lá onde ele estivesse. Pensava que, talvez, suas mentes pudessem se tocar e então ele saberia que não estava sozinho.

Sabia que não era fácil para ele. Ao contrário de todos, até mesmo Naruto, Sakura o compreendia. Ele precisava sair dali. Mesmo que isso custasse trair sua vila, trair seus amigos, as únicas pessoas em muito tempo que realmente se importaram com ele.

Achava ironicamente divertido pensar em como um dia já fora. Tão imatura, tão boba, achando que aquele amor infantil poderia salvá-lo. Ela nunca poderia ter compreendido sua dor. Aquele amor tolo e cego nunca poderia curá-lo.

Mas ela cresceu e seu amor cresceu com ela. Amadureceu. Queria que Sasuke pudesse de alguma forma, se curar. Ela não precisava ser esse remédio. Queria que fosse feliz. Que nunca mais tivesse que ser sozinho. Se ele precisasse completar sua vingança para entender que era só uma perda de tempo, que assim fosse.

Ainda perdida em pensamentos sobre o que poderia ter sido, levantou-se ao ouvir o som da chaleira fervente e, quando se servia da bebida fumegante, a campainha tocou. Involuntariamente uma ponta de esperança surgiu em seu peito e correndo, abriu a porta, com um grande sorriso no rosto.

- Naruto? O que faz aqui? - e então percebeu as roupas encharcadas do melhor amigo, as gotas de chuva que escorriam de seus cabelos loiros misturando-se com as lágrimas. –Oh, meu deus, o que aconteceu? Entre, entre, vai pegar um resfriado.

Minutos depois o ninja estava sentado em sua cozinha, envolto em cobertores, tomando da xícara de chá que Sakura havia feito. Ainda tremendo, a amiga não sabia se de frio ou de emoção, tinha um olhar perdido e tentava em vão segurar as lágrimas.

-Ela me deixou, Sakura. Hinata me deixou.

A voz tão trêmula quanto os dedos, Naruto apertou com ainda mais força a xícara, que estava a ponto de quebrar. Os sentimentos de Naruto pela menina de olhos perolados se revelaram brusca e repentinamente, após um beijo que a menina lhe roubara, quase um ano atrás. Desde então, mantinham um relacionamento escondido, à pedido de Hinata, que tinha medo da reação do pai. Naruto planejava pedi-la em casamento assim que achasse uma brecha na agenda de Sakura, que o ajudaria a escolher a aliança.

-Como assim, Naruto? Hinata sempre foi louca por você!

As lágrimas que a tanto custo foram presas agora escorriam livremente pelo belo rosto do jinchuuriki, e Sakura pensava nunca ter visto tanta dor em nos doces olhos azuis.

-Neji. Ela vai se casar com Neji. Hizashi quer manter puros os genes do Byakugan e vai voltar com a prática dos membros do clã gerarem filhos entre si. Ele ordenou que Hinata se casasse com Neji para dar o exemplo. Ela não ousou dizer uma palavra. Vai acatar a ordem de bom grado.

Contara a Sakura de como a esperou ansioso depois da ligação que recebera. Era ela, perguntando se poderia passar em seu apartamento. Ora, claro que sim. Hinata não era bem uma visita, certo? Ele arrumou a casa e comprou ramen. Pegou flores de um dos canteiros vizinhos e fez um buque para presenteá-la. A chuva lá fora caia fina e lhe lembrava dos olhos perolados da Hyuuga. Ele ficou esperando ela no hall do pequeno prédio de apartamentos. Quando a viu debaixo de um guarda chuva, foi apressadamente abrir o portão, com uma expressão feliz.

Seu sorriso se desmanchou assim que viu o rosto lavado pelas lágrimas da morena.

-Hina, porque ta chorando? Eu fiz algo errado?

A menina não pode deixar de abrir um sorriso triste para o tom preocupado e infantil do loiro.

-Você não fez nada de errado, Naruto-kun. Você nunca faz, você é perfeito. – O fluxo de lágrimas aumentou, contrastando com o sorriso sincero que ela abriu. – Meu pai ordenou que me case com Neji-san. Ele quer manter a linhagem do clã pura e o exemplo deve partir de nós. –As lágrimas aumentavam cada vez mais. –Eu não posso mais ficar com você, Naruto-kun, mesmo que eu queira assim.

A expressão de Naruto passou de confusão ao mais profundo choque.

- Mais ainda podemos falar com ele, não é? Eu posso casar com você, eu vou ser o Hokage, 'tebbayo. E tem a Hanabi, e tantas outras meninas, porque tem que ser justo você? – Ela balançava negativamente a cabeça, enquanto ele lentamente absorvia a realidade.

- Não dá, Naruto-kun. Eu sou a mais velha. Tem que ser eu.

- Então a gente pode fugir! Eu falo com ele, Hina-chan, é só você dizer que eu posso. –Os olhos azuis já começavam a se encher de lágrimas e Hinata continuava a dizer que não com a cabeça. – Diz que quer, Hina-chan! Diz!

Ele segurou fortemente nos pulsos finos da amada. Ela continuava sem falar nada, chorando cada vez mais, repetindo o mesmo gesto.

- Eu não posso, Naruto. Não tem outro jeito. Não tem, não tem...

- Mas você me ama, Hina-chan. E eu te amo. A gente vai conseguir ficar junto.

-Não, Naruto, não. Não dificulte as coisas. Eu... eu não te amo mais.

O choque fez Naruto parar. Soltou os pulsos da Hyuuga.

-Não é verdade.

Lentamente, a morena pôs a mão no rosto de Naruto, a dor estampada nos olhos que tanto amava.

-Esse é meu destino, Naruto. É meu dever.

Ela se virou e desapareceu. Naruto continuou lá, com o barulho da chuva a ferir-lhe os ouvidos, as últimas palavras de Hinata ecoando em seus ouvidos.

Não podia voltar para o seu apartamento... Ali havia lembranças demais. Com um grito atravessando-lhe a garganta, deixou seus pés o levarem e acabou ali, na frente da porta do apartamento de Sakura.

E a voz do loiro perdeu-se entre soluços, enquanto abaixou a cabeça entre os braços, num gesto de entrega. Sakura pousou a mão no braço do amigo e começou a fazer carinhos cabeleira loira, chegando mais perto até embalá-lo como uma criança. Naruto aninhou-se ao peito da kunoichi e até acalmar-se. Sentia se bem perto de Sakura. Desde sua volta a Konoha após o treinamento com Jiraya, eles se aproximaram muito, um dependia do outro.

-Eu vou estar do seu lado pra sempre. Não se preocupe. As coisas vão ficar bem. Vou fazer tudo ficar bem. – sussurrou a rosada entre os cabelos do melhor amigo.