Araignée au Plafond escrita por obnxslyth


Capítulo 4
Cicatrizes


Notas iniciais do capítulo

Esse capítulo, pra mim, foi um dos que menos teve acontecimentos. Ele está bem paradinho, mas ok.
Boa leitura. ♥



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Fazer a barba foi apenas o começo. Depois de alguns dias de insistência de Katya, eu a deixei fazer minha sobrancelha. Eu tinha me esquecido de como doía, mas só de estar sem duas taturanas - igual o Scott -, eu já me sentia mais confortável e menos feio. Depois de alguns dias, minha barba começou a crescer de novo, mas eu decidi raspá-la de outro jeito - ao invés de tirar tudo, deixei apenas abaixo do queixo. Assim eu não ficava parecendo tão novo, mas nem tão velho.

Pra falar a verdade, eu sentia como se as coisas estivessem melhorando. Não é como se eu tivesse parado de me culpar ou de me odiar, mas eu já não sinto mais nada - é como se meus sentimentos estivessem deixado de existir. Eles só voltam à noite, quando estou deitado na minha cama, olhando para o teto. Não tinha certeza como me sentia sobre isso. Contei para Scott, mas ele me falou que era efeito dos remédios, que eu logo me acostumaria a essa sensação... Ou falta dela, chame como quiser.

Eu pensei mesmo que estava melhorando. Durante algum tempo, eu até pude dizer que estava me sentindo bem. Não era mais tão doloroso como antes. As horas passavam mais rápido. E essas horas viraram dias. Os dias, semanas. E de semana em semana, eu completei o meu primeiro mês na Étoile. Minha família me visitou apenas uma vez, mas foi diferente. Foi bom. Era a primeira vez que eu conseguia ver minha mãe sem ter vontade de deitar no colo dela e chorar, pedindo perdão. Eu cheguei a pensar que tudo ficaria bem, que logo eu conseguiria seguir em frente, voltar a ser uma pessoa normal... Talvez, eu até voltasse a ter meus amigos e Michelle de volta.

Mas um dia, eu senti aquilo. O pavor, o medo. Mau pressentimento. E foi no mesmo dia da visita, eu veria minha família de novo. Eu estava bem receoso quando eles entraram, e só fiquei pior quando percebi que, por algum motivo, eles estavam estranhos, como se agissem com um pé atrás comigo. Eu tentei agir normal com eles, mas estava com medo. Principalmente quando eu conversei com a maman. Por algum motivo, todos parecem saber de alguma coisa que eu não sabia. Pensei que fosse sobre meus amigos, mas entendi tudo quando fiz Françoise abrir a boca. E eu não tenho certeza agora se preferia que ela ficasse calada ou que tivesse me contado mesmo. A verdade é que, até o momento, isso não entra na minha cabeça.

Como eu disse, todos estão seguindo em frente e eu sou o único que continua regredindo. Michelle seguiu em frente... Sem mim. Ela está namorando, e antes que minha irmã me contasse com quem, pedi pra ela não falar, eu preferia não saber. Provavelmente descobriria quando saísse desse lugar, mas no momento, eu não quero. E isso não devia doer tanto. Pra falar a verdade, eu já suspeitava que a Michelle conseguiria seguir em frente, mas foi tão rápido. Eu provavelmente sobrecarreguei-a até o ponto onde ela deixou de gostar de mim, de me amar. Perceber isso fez com que toda aquela carga caísse novamente sobre minhas costas. E pra ser sincero, eu não quero lidar com isso.

Durante algum tempo, eu realmente pensei que pudesse tê-la devolta depois que tudo isso acabasse. Mas agora que eu parei para pensar melhor, tenho certeza que está tudo terminado. No final das contas, eu não perdi apenas minha irmã gêmea - perdi tudo. Perdi todos os anos com meus amigos. Perdi os quatro anos que passei com Michelle. Toda a amizade que eu tinha com minha família. Tudo. Perdi um ano na faculdade. Quase dois anos da minha vida. Não sei mais quem eu sou.

Assim que eles foram embora, voltei para meu quarto e fiquei deitado na cama o dia todo. Apenas olhando para o teto... Algumas manchas amareladas, umas teias nos cantos... Então percebi uma pequena aranha. Ela estava presa em sua própria teia. Eu me sentia como aquela aranha. Estou preso nos meus problemas, em coisas que eu mesmo criei. Matei minha irmã, prejudiquei a saúde do Antonio, fiz meus pais ficarem tristes, fiz minha namorada terminar comigo... No final, eu acabei criando meus próprios problemas, minhas próprias teias.


— Xeque-mate. — Falei, cercando o rei de Matthew com minha rainha.

— Eu não esperava por essa. — Ele falou, analisando o tabuleiro.

— Tenho andado sem nada pra fazer, então treino meu xadrez. Parece que eu finalmente consegui te vencer — Sorri, indiferente.

Se eu estivesse com meu raro bom humor, provavelmente teria reagido bem. Mas sinceramente, não estou ligando a mínima. E Matt percebeu isso, porque quando eu voltei a fechar a cara, ele levantou uma sobrancelha, intrigado. Não era como se ele não soubesse meus motivos ou achasse que eu estava exagerando, mas ele estava preocupado - assim como os outros.

— Sabe, Francis... Você precisa se distrair. — Ele falou, cruzando os braços e colocando-os em cima da mesa — Eu sei que é ruim, mas você não pode se fechar para sempre.

— Sinceramente, como você pode saber disso? — Perguntei, passando a mão pelo rosto. Minha barba estava voltando a crescer, e eu não tinha vontade nenhuma de mudar isso. Que eu ficasse igual um Moisés loiro, não era como se eu ligasse.

— Olha, eu sei que eu sou novo e que, pra você, eu provavelmente não vivi nada... Mas não aja como se me conhecesse, ok? — Ele falou, olhando pra baixo. Levantei uma sobrancelha, intrigado... O que ele queria dizer com isso? — Eu sei pelo que você está passando.

Ele voltou a me olhar e, apesar do sorriso em seu rosto, ele estava triste. Então, com cuidado, ele levantou um pouco uma das mangas de sua blusa, mostrando uma cicatriz avermelhada descendo do seu pulso até a metade do antebraço. Engoli em seco, sentindo remorso de ter falado com ele daquele jeito.

— Isso está aqui por algum motivo, Francis. Diferente do que você pensa, eu sei muito bem como é sofrer.

— Desculpa, Matt, eu não-

— Você não sabia. Não me peça desculpas, Francis, porque eu não quero que sinta pena de mim. Quero que você entenda que cada um tem seus problemas, e se você não aprender a seguir em frente, não vai conseguir sair daqui.

Palavras duras, mas ele estava certo. Se eu queria sair da Étoile, tinha que aprender a lidar com tudo isso. Com a dor da perda, do término... Eu tinha que perder essa auto-piedade. E ao ouvir Matt falando isso comigo, era como se Amèlie estivesse na minha frente, me mandando dar um jeito na minha vida. Eu teria que aprender a viver sem a pessoa que ficou ao meu lado durante uma vida inteira, dezenove anos que eu teria que deixar no passado.

— Você me lembra ela. — Assim que eu falei aquelas palavras, percebi as bochechas de Matthew ganharem mais cor — O jeito de me puxar a orelha, os conselhos... Até o seu modo de jogar xadrez. — Eu ri, olhando pra baixo — E agora, parece que ela está aqui, me mandando deixar de ser um chorão e viver minha vida.

— Francis, todos queremos o seu bem. Seus pais querem o seu bem, por isso você está aqui. Nós, que convivemos com você, também queremos o seu bem. E eu tenho certeza que a sua irmã desejaria o mesmo.

E novamente, era Amèlie que estava ali. Eu sorri, assentindo. Era incrível como eu, um adulto, estava recebendo conselhos de um adolescente. Ele estava sendo mais maduro que eu.

—x—

Aquela cena era familiar. A música tocando, as risadas... Eles estavam lá. Antonio ainda andava, Gilbert ria e Amèlie ainda estava comigo. Olho para ela - tão bonita, tão feliz. Ela e Gilbert estão de mãos dadas, e dessa vez, percebo a pequena aliança prateada em seu dedo anelar. Eu volto a olhar para a frente, prestando atenção na direção.

Quando estamos chegando no cruzamento, eu piso no freio, tentando parar o carro. Ele não funciona, parece fazer a velocidade dele aumentar. E antes que eu pudesse tentar reverter a situação, aquilo tudo acontece novamente. Um Vectra azul atinge meu carro, que é arrastado pelo cruzamento. O meu lado bate em um poste, e eu acabo batendo minha cabeça na porta com força, o que me deixa tonto. Quando fecho os olhos, a única coisa que vejo é a minha irmã.

Agora estou no escuro - se há alguma coisa aqui, nada vejo... Mas escuto. De início, pensei que fosse uma criança chorando, mas agora que já me acostumei ao som e ele ficou mais alto, percebo que é a minha irmã. Eu tento me mexer, mas não consigo. Olho para os lados, procurando Amèlie, tentando encontrá-la. Apenas o escuro. Eu grito, chamo seu nome, mas ela não parece me escutar. E então, como se estivesse se afastando, o barulho volta a ficar baixo, cada vez mais. Depois de algum tempo, já não o escuto.

Então eu acordo. Scott e uma enfermeira estão do meu lado. Estou ofegante, suado, sinto como se tivesse corrido uma maratona. Mais um sonho com minha irmã. Isso não acontecia desde que sai do hospital. Abaixo o rosto, irritado, e não consigo conter as lágrimas.

— Vou pegar um calmante para ele — A enfermeira sai, então Scott se senta na beirada da minha cama.

O meu choro se intensifica. Antes que eu possa me controlar, já estou soluçando, as lágrimas grossas descendo pelo meu rosto e caindo no tecido fino da roupa. Meu peito dói, e como se eu conseguisse controlar a dor com isso, curvo-me, encostando a testa nos meus joelhos e abraçando minhas pernas. Por mais que eu tentasse negar, por mais que eu tentasse fugir, não conseguia - a morte de Amèlie sempre iria me assombrar.


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Notas finais do capítulo

Como eu disse, bem paradinho. E estamos quase chegando na metade. Pena. >:
Enfim, eu aceito reviews.



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