“Depois de algum tempo você aprende que amar não significa apoiar-se, que companhia nem sempre significa segurança. Que beijos não são contratos e presentes não são promessas. Que realmente pode suportar as dores. Que é realmente forte. Portanto, plante em seu jardim e decore sua alma, em vez de esperar que alguém lhe traga flores”



__Luna, preciso me ausentar. Não se preocupe, eu vou deixar algum dinheiro para necessidades imediatas.- Neville não queria preocupá-la, mas sabia que ela não o deixaria sair sem uma boa explicação. Os olhos interrogativos da loura e suas sobrancelhas levemente arqueadas confirmaram o que ele pensava.

__Posso saber aonde vai?
__A carta diz que minha tia está doente e precisa de dinheiro para ser transferida. Verdade ou não, eu preciso confirmar. -sua voz continha um leve desespero.
__Não posso ir com você?
__Prefiro que fique. Mandarei notícias.

Ele a beijou rapidamente e saiu antes que Luna o convencesse de ir junto. A chuva fina se intensificava e o céu estava coberto de nuvens negras que pareciam anunciar uma futura tempestade. "Tomara que as corujas consigam enfrentar esse mau tempo e tragam boas notícias..." pensou Luna andando de um lado para o outro, arrastando suas pantufas amarelas.

* * *

Patrick e Daphne não eram muito bons em aparatação, principalmente por que agora que esperavam um bebê, poderia ser perigoso se ela "deixasse alguma parte do corpo" no local de partida, então preferiram usar uma chave de portal em um campo vazio e afastado.

"Papai vai ficar furioso quando descobrir que fugimos..." era o que Patrick ouvia a cada passo que davam. Ele tirou uma bússola e um jornal de um dos bolsos de sua mochila de camping.
__O jornal de hoje diz que o tempo ficará instável entre parcialmente nublado, nublado entre nuvens e chuvoso. Isso não é bom... - sua expressão facial era típica de quando estava raciocinando e planejando algo esquematicamente.

__Esse lugar é muito frio e essa chaleira é muito óbvia! - dizia Daphne aos berros, dentro de um casaco colorido.
__Isso, fale mais alto... para todos saberem que vamos viajar de uma forma, digamos, nada convencional...- Patrick abaixou o tom de voz - a chave de portal não é aquela chaleira e sim o escorredor de macarrão logo ali adiante.

* * *

A primeira conversa que Neville tivera com Butler não havia sido nada agradável, principalmente quando as desconfianças que Neville tinha quanto ao caráter e honestidade de sua tia ultrapassavam até mesmo o seu bom senso.

__Deixarei um cheque para todas as despezas hospitalares de minha tia e prometo que irei visitá-la. Mas eu não irei pagar mais contas absurdas de um hotel luxuoso e muito menos as compras desmedidas de uma...de uma...consumista! - Sua voz se alterava a cada palavra.
__E quanto aos meus serviços? - perguntou um Butler mal-humorado.
__Serviços? Não disse que era um amigo pessoal dela? Do que está falando?

__Sim, somos amigos...- Butler tentou consertar a mancada e achou melhor não cobrar nenhum sicle a mais ou Neville poderia desistir de pagar até mesmo o hospital.
"Por que estou ajudando-a?" pensou o espião tentando se lembrar de alguma situação em que se dera bem ao lado de Thereza, mas não achou nenhuma. "Acho que a minha humanidade é maior do que eu imaginava...”, concluiu.

* * *

Nas horas em que estava sozinha naquele apartamento, Luna pensava que a única pessoa que ela podia chamar de "família" era seu irmão e que nem ao menos estavam se comunicando, a única informação que tinha era a de um casamento em breve, pelo qual ela esperava ansiosamente. Queria muito conhecer o Egito.

Foi até a cozinha preparar algo para comer, já que Neville não estava e poderia demorar, pois já fazia algumas horas que havia partido. Quando ele estava em casa, eles sempre iam á um restaurante simpático não muito longe dali. Ligou o fogão de uma distância absurda e com a varinha, para não se queimar. A campainha tocou e ela correu para atender, certa de que Neville havia chegado.

Girou a maçaneta nervosamente, louca para ouvir a história que Neville havia trazido sobre sua tia.
__Que bom que voltou tão rápido! -disse Luna, antes de prestar atenção em quem havia tocado a campainha.

__Surpresa! - gritaram Patrick e Daphne juntos.
__O...o que fazem aqui?- perguntou abraçando o irmão e envergonhada pelo engano.
__Luna, essa é Daphne.

Luna sorriu e percebeu que Daphne tinha um volume embaixo do casaco.

__Vamos, entrem...eu estava morrendo de saudades, você nunca responde minhas cartas...
__Sempre que posso...
__É que andamos ocupados cancelando o casamento.- explicou Daphne, se sentando, mesmo sem ser convidada.

__Cancelando?! Mas por que?
__Bom, é que já havíamos nos encarregado de tudo lá no Cairo, mas como viemos para cá resolvemos cancelar os pedidos, o buffet, a decoração, o vestido...enfim. Resolvemos casar perto de você e gostaríamos que o nosso bebê nascesse em Londres. Foi tudo idéia do Patrick.
__Mas que bebê? - Luna fixou os olhos na barriga de Daphne.

__Ué, você não acabou de ouvir? Vamos ter um bebê!
__Sim, Patrick, eu ouvi, mas são muitas informações ao mesmo tempo, eu estou confusa e...e muito feliz por vocês, muito mesmo! - uma lágrima escorreu pelo rosto de Luna.- Já sabem se é menino ou menina?

__Ainda não, mas só saberemos quando nascer...não queremos estragar a surpresa. Neville não está em casa?
__Não...ele foi resolver umas coisas. A tia dele está doente.

__Ah, antes que você esteja pensando em receber alguma carta dele, eu peço, ou melhor, imploro que não abra nenhuma carta que chegar até aqui...se não o pai dela poderá nos localizar, viemos sem o consentimento dele, se não ele nunca deixaria que Daphne saísse de perto dele, ainda mais esperando um bebê. Viemos quase que fugidos.

__Bom, na verdade eu estava aguardando notícias sim, mas já que é assim...
Luna reparou a expressão de desagrado no rosto de Daphne, quando Patrick mencionou a "fuga”, mas ela fingiu que não havia percebido.
__Então, vamos comer alguma coisa? Eu estou faminta, vocês não?
__Sim, vamos..

* * *
Thereza Blington foi transferida assim que o dinheiro foi repassado para o hospital. Estava sendo operada enquanto Neville aguardava notícias na sala de espera verde, que ele particularmente, achou brega.

Butler também aguardava na mesma sala, mas evitando contato com Neville, temendo que ele percebesse que ele era na verdade, um espião e um péssimo mentiroso, pois não conseguia agir disfarçadamente nem quando estava em serviço.

* * *

Patrick, Daphne e Luna se acomodaram no tapete da sala com três bandejas, chaleiras cheias de chá, biscoitos, pães, doces e ficaram assistindo um filme que passava na televisão, ao mesmo tempo em que iam contando as novidades menos importantes.

Daphne abriu sua caixinha onde guardava recordações e mostrou á Luna todas as fotos que Patrick estava cansado de ver e rever. A loura ficou encantada com os lugares que ele visitaram e com as histórias que pareciam o roteiro de um filme parecido com o que ele estavam assitindo, de aventura.

Sem que eles esperassem, alguém totalmente molhado irrompeu e caiu no chão da sala, quase os atingindo, tamanha violência com que colidiu. Lampejos de luz prateada pairavam sob o corpo inerte, como se fossem vestígios de alguma maldição que ele acabara de sofrer, segundos antes de aparatar.

"Neville!" gritou Luna, percebendo que o noivo estava com marcas no rosto e havia um corte em cima de sua sobrancelha direita. Estava totalmente sujo de terra e parecia desacordado, pois mantinha os olhos semicerrados.

Patrick retirou Daphne da sala, para que não se apavorasse e entrou pelo corredor do apartamento, sem saber ao certo por onde estava passando, até que achou um quarto com a porta entreaberta e deixou ali.

__Deite um pouco, tenho certeza que Luna não irá se importar.- disse tentando disfarçar o nervosismo.
__Por Merlim! Eu não vou ficar aqui deitada vendo que sua irmã está em estado de choque e há uma pessoa morta no chão da sala! - Daphne falava estranhamente baixo, até que seus grandes olhos foram perdendo a órbita e ela caiu na cama, desmaiada.

__Era só o que me faltava! Daphne, não faça isso, acorde. Não brinque desse jeito! - Patrick tentou ajeitá-la na cama, mas suas pernas teimavam em tombar para baixo, como se fossem puxadas.

Na sala, Luna tentava fazer com que Neville pronunciasse a única palavra que ela entendeu. Era algo como "Bule".
__Luna, não se preocupe, eu estou bem...Minha tia está fora de perigo e passa bem, mas terá que responder alguns processos, mas eu não...eu não...
__Eu não o quê? Eu preciso que você diga!
__Eu não vou ajudá-la mais. Eu fiz a minha parte.

__Nev, o que você quis dizer com "Bule"?
__Eu...eu quis dizer "Butler", eles são comparsas. Butler é um espião. Ele e uma equipe estavam trabalhando para minha tia. Eles tentaram arrombar sua casa, mas conseguimos fugir á tempo. Minha tia ultrapassou todos os limites que poderia! Ela é asquerosa...
__Tudo bem, não precisa falar mais nada, depois você me fala como descobriu tudo isso. Venha, levante, sente aqui no sofá.- Luna tentou ajudá-lo, mas seu peso era maior que as forças que ela tinha.

__Eu estava na sala de espera do hospital, conversando com o médico que me avisou que minha tia estava fora de perigo quando um homem de terno azul-marinho sentou atrás de mim e pediu para eu segui-lo. Ele tinha o porte e a aparência de um segurança, falava baixo, com a mão na boca. Eu o segui até o jardim, nos arredores do prédio e ele me contou tudo isso e disse que fazia parte da organização de Butler, o comparsa-chefe, mas Butler não havia pagado seus honorários como deveria e ele havia avisado que caso isso acontecesse ele tentaria me encontrar e denunciá-lo. Eu fique olhando para ele sem entender e vi uma sombra atrás dele. Butler o golpeou com um cano de ferro e ele desmaiou na hora, então eu tentei aparatar, mas ele interrompeu a aparatação com um soco, então ele tentou me bater com o mesmo cano, mas eu segurei-o, então nós trocamos alguns socos e chutes e eu consegui aparatar. Estou assim sujo de terra por que rolamos no jardim e caímos entre as árvores.

Luna ouviu o relato meio que sem acreditar que Thereza pudesse chegar á esse extremo.

__Tudo bem, a sua tia terá a punição que merece...a justiça se encarregará dela e como você sempre me aconselha, não se preocupe!
__Agora preciso tomar um banho, estou exausto!

__Neville, espera...temos visitas.

Tarde demais. Neville já havia tirado parte da roupa e aberto abruptamente a porta onde Daphne ainda se recuperava de um desmaio.
__Ahhhhh!!!! Não é possível, eu acho que estou vendo fantasmas!
__Quem é essa louca?! - gritou Neville

Luna explicou toda a situação para Neville que se limitou a rir cansadamente.
__Preciso dormir...- foi o que conseguiu dizer depois de uma péssima viagem.

Após a recuperação de Daphne e Neville, Luna apresentou o quarto de hóspedes onde as visitas dormiriam e também se deixou levar pelo sono. Não queriam saber de nem uma novidade bombástica pelo menos por um tempo.


* * *

Algum tempo depois...




__Uau! Você está linda! - disse Daphne observando Luna dentro de um vestido branco, com uma calda pontuda. O decote quadrado e as mangas compridas davam um ar clássico á noiva. Os cabelos estavam soltos e encaracolados e havia um arco de brilhantes no topo de sua cabeça. Nas mãos, um buquet de girassóis um pouco extravagante, escolhido pela própria. A maquiagem leve sobressaltava os traços marcantes de seu rosto fino.

__Não seja modesta, você está mais bonita que eu! - respondeu Luna para uma Daphne com formas bastante arredondadas em um vestido sem calda, ballonet, com detalhes em pérolas de marfim. O vestido teve que ser reajustado, pois sua barriga já demonstrava sinais mais aparentes. Uma fita perpassava a cintura, formando um laço nas costas. Seu buquet era feito de violetas e orquídeas pequenas e seus cabelos, lisos, emolduravam seu rosto sem nenhum arranjo ou adorno.

As duas se casaram na mesma cerimônia em uma chácara no topo de uma montanha. Fazia um dia lindo de sol. Na opinião de Luna, era o dia mais lindo que já presenciara em toda a sua existência.

Patrick e Neville vestiam ternos escuros, o que não combinou com a cerimônia diurna, mas não se pode exigir que aqueles dois que só entendiam de negócios, entendessem também de moda.

* * *

Três anos depois...


__Liz, você está muito bagunceira! - brigou Patrick com a sobrinha que tentava escalar a estante de sua casa em Little Winning.
__Não brigue com ela, Patrick! Liz só está tentando fazer contato com os nargolés que aparecem muito nessa época do ano. Além do mais, Julie está pintando as paredes do seu quarto e você nem percebeu.

__Minha filha não faria uma coisa dessas...
__Sendo filha de alguém que escolhe morar no local onde os Dursley moravam, ela só pode estar revoltada. Está manifestando sua arte...

__O jantar está pronto! - gritou Daphne da cozinha. Kate puxava a barra de sua saia.- Julie! Não faça isso!
__Eu sou a Kate! - gritou a menina.
__Desculpe, querida, mas vocês são iguaizinhas...confundem a mamãe!


Neville discutia com Patrick o resultado do último jogo de hóquei, no qual o time de ambos havia levado a pior. Luna sempre se divertia com essa cena. A mesa estava decorada como a tradição natalina manda. Muita comida e família reunida, sem contar os presentes na árvore.

Luna se sentou ao lado do marido, muito faminta.
__Eu te amo... - disse a loura fitando-o

__Engraçado...quando nos reencontramos, eu ouvi algo diferente. Fico feliz que tenha aprendido a me amar...
__Eu não aprendi, eu só percebi.
__Eu também te amo.

Luna jogou os braços nos ombros de Neville e o beijou indiscretamente na frente de todos. Embaixo da mesa, havia um envelope com um cartão de Natal, que depois do beijo, Luna abriu e leu:

“O milagre do Natal está no perdão e no amor.
No perdão que vence a culpa e no amor que vence o orgulho.
Sem culpa de ser orgulhosamente,
Mais forte que o ódio! "