Spirited Away 2 escrita por otempora


Capítulo 45
Perdas




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Nadesico acompanhava-os, andavam lentamente. Procurando prolongar os momentos que restavam naquele mundo. Estavam indo embora sem saber o que poderiam encontrar no mundo dos espíritos, mesmo que, supostamente, o tempo em que sumiram foi pouco, tinham medo do estrago que Haku teria feito. Haviam ficado ali por volta de um mês, Chihiro se fortalecendo pouco a pouco, com a ajuda de Nadesico. A mulher que inicialmente lhes parecera assustadora, distribuía sorrisos felizes, os quais aos poucos foram se transformando em pesar. Ela não podia ter contato com os mortos, sejam eles condenados ou aqueles que gozavam do descanso. Só existiam homens em seu castelo, que por longos anos, lhe trataram com uma cortesia excessiva. Nunca abrindo espaço para que pudesse se aproximar, ela era e estava sozinha. Quando chegaram, houve uma nesga de felicidade, inundando seu rosto perfeito. Um olhar que misturava surpresa e prazer, quando encontrava Boh e Chihiro com os dedos enlaçados, saia silenciosamente da sala, levando quem mais estivesse ali com os dois. E então, ela vagava um tanto trôpega para seu quarto, onde desabava na cama com o coração apertado. Desejando não ter que cobrar o preço necessário. Farta de conhecer o futuro, tentava, em vão, bloquear as imagens, cobrindo o rosto com o travesseiro.  

Agora, abraçava Chihiro, esperando que a garota não a odiasse. Era sua primeira amiga.

- Não se esqueça de sua promessa. – disse com as lágrimas inundando-lhe os olhos.

- Irei sentir sua falta.

- Sabe que talvez voltemos a nos encontrar.

Viu o assentimento mudo de Chihiro. E depois, o sorriso que se formou em seus lábios.

- É mesmo verdade?

- Sim. Suas escolhas os levarão por esse caminho, a não ser que falhem.

- Obrigada, por tudo que fez por nós. – olhou para Boh. – Por ter salvado meu bem mais precioso.  

As duas permaneceram frente a frente durante um segundo, sem saber o que dizer. Nadesico estendeu os braços, apertando Chihiro num abraço apertado.

- Eu sinto muito.

- Não se preocupe com isso, é o correto a fazer. É a escolha com que pude conviver. Depois eu poderei chorar por ela, mas não creio que irá ser tão mal assim. Eu confio em você.

- Eu sei. E é por isso que tenho medo.

- Tudo vai acabar bem, tenho certeza disso.

- Adeus, Chihiro.

Nadesico afastou-se dos dois com a cabeça baixa, retirou algo da manga do kimono.

- Estão prontos? – perguntou.

- Sim.

Uma luz ofuscante saiu dos dedos fechados e ela liberou-a com cautela. A face sumindo, sobrepujada pela luminosidade. Os olhos tristes impossíveis de se enxergar.

- Adeus, Nadesico. – Chihiro sussurrou. Sentindo a mão de Boh segura na sua.

- Está tudo bem? – ele perguntou.

- Sim... estou feliz por estar com você.

- O preço será alto. – Boh afirmou sombriamente, algumas rugas se formando em sua testa.

- Não posso lhe dizer o que é. Mesmo assim, você confia em mim, Bou?

- Sim, Chihiro.

- Então não precisa temer. Nadesico foi justa. - Chihiro virou-se de frente para ele, pousando a orelha na frente do lugar onde deveria estar o coração de Boh, ficou muito quieta enquanto aquela luz formava uma capa protetora entre seus corpos abraçados. Suspirou. – Eu não poderia ficar sem você. – falou baixinho.

Ela sorriu, olhando para a face de Boh, encontrando nos olhos escuros dele uma suavidade imensa e amor. Um sentimento tão forte que a fez ofegar. Perguntou a si mesma, se em seus sonhos de infância, em que encontraria um príncipe encantado, sequer imaginaria que algo como aquilo existiria. Ao mesmo tempo que havia a leveza, existia a sensação de estar sufocando, suprimida por algo que era tão mais forte que ela. Fazendo-a abandonar o racionalismo, a não se importar com os riscos envolvidos. Era algo terrivelmente assustador, mas lindo. Como se voltasse a ser uma garotinha com o rosto colado ao vidro frio da janela, ignorando os avisos para que fosse dormir, permanecendo fascinada demais para se mover enquanto os violentos raios açoitavam o céu. Ela, fraca demais para lutar com tudo aquilo, olhava, silenciosamente.

- Já esta acabando. – Boh anunciou, pousando a mão quente em sua face. – É melhor fechar os olhos.

Mas ela não o fez imediatamente, encarou Boh uma vez mais, memorizando seu rosto iluminado pela luz. Agarrou com força seu braço, certificando-se que ele não fosse capaz de ir embora.

- Eu estou aqui. – ele disse como pressentindo seu medo. Roçou os lábios em suas pálpebras.

- Espero que tudo isso acabe logo. – replicou.

Boh não respondeu, seu rosto voltou a ficar grave, perscrutando o lugar onde estavam parados ainda seguros na proteção de Nadesico. Não conseguiu conter uma exclamação.

- Mas... o que?

Ele conseguia sentir diversas energias desconhecidas, engolindo umas as outras, sobrepondo-se. E aumentando drasticamente.

- Não se mova, Chihiro. – disse tenso.

Não imaginava que tudo estaria dessa maneira, tentava dizer a si mesmo que os poderes das cópias não teriam aumentado. Mas estava enganado, tudo crescia cada vez mais, não havia ninguém que os controlasse.

- É muito forte... – ouviu Chihiro dizer, uma pontada de pânico mal disfarçada em sua voz.

- Consegue senti-los? – Boh perguntou.

- Sim...

- Vou lhe pedir um favor... – não esperou resposta, prosseguiu com uma urgência crescente na voz. – Mantenha a barreira. Consegue fazer isso?

Chihiro assentiu lentamente, fechando os olhos. Havia treinado isso mais vezes do que conseguia se lembrar, mesmo assim seus dedos tremiam quando juntou suas pontas. Era muito mais fácil quando não estavam realmente em perigo.

- Acho que Haku não está por aqui. Precisamos de tempo para decidir o que fazer, tentar rastrear. – ele não parava de falar.

- Bou! – Chihiro gritou aflita. – Eu não vou conseguir!

Boh segurou sua cintura.

- Olhe para mim. – pediu em voz baixa. – Acalme-se.

Ele se moveu, indo para trás dela, estendendo as mãos para que apoiassem as de Chihiro, pousando a testa no ombro dela.

- Cuidado para não expandi-la demais. – alertou, sua voz fraca.

- Bou?

- Estou bem. - ele disse. – Vai passar. Se concentre somente nisso.

Boh já estava fraco demais, a garota usara sua energia muito rapidamente. Não conseguia mais se manter em pé, a visão se turvando aos poucos. Tentava dizer palavras de incentivo, mas tinha certeza que ela não podia ouvi-las, apesar da proximidade.

Mergulhou no sonho.

Chihiro estava de pé, na porta do templo. Os cabelos presos deixando a mostra seu rosto. Estava linda e longínqua, o sorriso se formando em seus lábios enquanto observava as árvores bem cuidadas.

- Já disse que você não deve subir nessas árvores. – falou séria, mas não conseguiu imprimir a zanga adequada em seu tom de voz.

- Papai disse que estava olhando. – uma garotinha respondeu, enquanto descia descuidadamente.

- Não estou vendo-o em lugar algum.

- Ele saiu por uns minutos.

- Kagome... – Boh reconheceu a si dizendo, postou-se ao lado de Chihiro, abraçando-a pela cintura. A menina veio correndo até eles, os longos cabelos escuros esvoaçando.

- Olá, papai. – estava envergonhada, olhando-o com seus olhos escuros, iguais aos de Chihiro, por cima da franja.  

- Eu acho que alguma menina merece ser castigada.

- Oh, não. – correu para dentro de casa rindo. – O dragão quer me engolir...

A mulher recostou o corpo no batente, olhando com tristeza para onde Kagome havia acabado de passar.

- Ela sequer imagina... – comentou baixinho.

- Não gosto disso, Chihiro. Não deveria ter feito aquela troca com Nadesico.

- Agora não há mais escolha. Espero que ela seja feliz...

- Deveria ter me contado antes...

- Bou... O que você teria feito em meu lugar?

Ele não respondeu.

- Não se preocupe. Kagome deve viver, você não pode tentar fazer com que ela seja para sempre a nossa garotinha.

- Estou com medo. – confessou.- Lembra-se do que nós passamos lá?

- Sim... e estamos aqui nesse momento. Estou feliz ao seu lado.

 

 


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