Warrior Girl escrita por Karu


Capítulo 2
So Boring


Notas iniciais do capítulo

bubu



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Festa. Cerimônia, comemoração, reunião de amigos e familiares com regojizo por qualquer fato ou data. Acho que existem dois tipos de festas. As legais e as chatas, entediantes. E dentre elas existem vários sub-gêneros. No momento eu estava no tipo de festa chata, entediante. Sentada em uma cadeira, desconfortável, reparando o quão interessante era o tom de verde da grama. Bem, com certeza era mais interessante do que conversar sobre política e cores de ternos, como meu pai fazia. E também mais interessante do que repetir incessavelmente como o bebê de tia Doris era lindo, coisa que minha mãe fazia. Ah, se ao menos meu irmão estivesse aqui. Sim, eu tenho um irmão. E acho prudente dizer que ele não é apenas meu irmão, mas sim meu irmão gêmeo. Klaus Bell. Provavelmente o único com quem eu tinha conversas plausíveis. Mas no momento ele estava no colégio fazendo uma prova de matemática, pois era burro e não conseguira passar de ano direto.

__Ei, Clair. Quero que conheça uma pessoa.- e novamente eu estava sonhando acordada. E novamente minha mãe me despertou. Logo franzi meu cenho para sua fala. Não gostava de conhecer pessoas. Secretamente nem gostava de pessoas. Aliás, não gostava da maioria delas.

__ Quem?- lhe perguntei.

__ Bem... É seu futuro marido!- ela disse com entusiasmo. Mas também podia notar uma pontada de receio, ela estava preocupada com minha reação.

Ah não. Meu marido. Futuro marido. Indesejado marido. Desgraçado marido. É tão estranho pensar assim. Logo iria me casar com um homem praticamente desconhecido. Sobre ele eu apenas sabia duas coisas: seu nome era Paul Smith. E ele era rico.Isso era o suficiente para os meus pais. Acho esse pensamento primitivo e repugnante.

Assenti, contra minha vontade. Já tinha me acostumado com isso. Fazer as coisas contra a minha vontade. Me sentia domada. Me sentia um leão enjaulado. Um leão que nunca havia saído ao mundo. Apenas admirava o quanto podia dele por trás das grades de sua jaula estreita. Um leão que tinha sempre de respeitar os limites de seu cuidador. Não deveria em nenhuma circunstância rebelar-se contra ele. Deveria manter sua boca fechada, sem soltar os rugidos suplicantes presos à sua garganta. Mas o lugar de um leão não é em uma jaula. Leões nasceram para serem livres. Ai, como tô filósofa.

Me levantei com cuidado e segui minha mãe do mesmo modo. Caminhei olhando para meus pés e quase trombei com minha mãe quando ela parou de súbito.

__ Clair, este é Paul.- ela disse, me mandando uma olhar que significava "Seja-educada-sua-bastarda-ou-eu-te-mato" e gesticulando as mãos na direção de meu pretendente.

Paul era baixo. Bastante baixo. Menor que eu. E eu sou muito baixa. Tinha cabelos ruivos ridiculamente penteados para trás. Acima da boca estreita havia um bigode da mesma coloração do cabelo. Vestia um terno verde escuro acompanhado de uma gravata cor de café. Sua expressão era monótona, e aparentava ter feito isso (casar-se por dinheiro) mais de uma vez. Devia ter seus quarenta anos. Bem mais do que eu esperava. Inferno...

__Hum, Clair querida, diga alguma coisa.- minha mãe disse com um sorriso forçado e de certo modo assustador.

Eu ia dizer qualquer banalidade como "Prazer em conhecê-lo" ou "É muito bom ver o senhor". Mas eu fui interrompida. Fui interrompida por um som estridente e quase ensurdecedor. Todos no local pararam de fazer o que faziam e ficaram aflitos. Outros estavam confusos. A maioria correu o máximo que pode. E eles fizeram o certo. Fizeram o mais adequado.

Era o mais adequado a fazer quando se ouve um alarme de guerra.

E, obviamente foi isso que fizemos também. Eu e minha mãe, após acharmos meu pai, corremos para o carro, ainda aturdidas. Meu pai mesmo dirigiu, pois não tinhamos tempo pra procurar o motorista.

__ Querido, você sabe o que aconteceu?- minha mãe perguntou. Deus, até eu sabia.

__ Você é tonta por acaso? Todos sabemos o que aconteceu! Uma hora isso iria acontecer, o mundo está um caos, principalmente aqui na Europa. Li nos jornais que a carnificina iria começar aqui. E os próximos seriam a África e Ásia. Se ferraram pretos. Vamos pegar o Klaus e depois vamos pra casa. Nada de ir ao cabeleireiro ou fazer compras.- meu pai disse, rude como sempre.

Minha mãe se encolheu, como sempre fazia diante dessas atitudes de meu pai.

Desde 1930 o mundo estava com a respiração presa. Os governos totalitários, o nazismo, o Partido Fascista, Hitler, Mussolini. Tudo indicava guerra. Naquele dia, depois de pegarmos Klaus na escola fomos pra casa. Klaus nem teve tempo de terminar a prova, e acredito que ele gostou disso. Meu pai dirigia que nem um louco, e a cada curva perigosa que ele fazia bruscamente, minha mãe soltava um grito. E ele a mandava calar a boca.

Quando chegamos em casa minha mãe trancou as portas e todas as janelas. Ela estava desesperada. Mas eu sabia que não estávamos em perigo, não por enquanto. Não éramos judeus afinal. Provavelmente essa confusão era obra dos alemães. Infelizes! Secretamente vejo Hitler como um homem carente. Isso é falta de sexo! Ele não transa, daí desconta isso nos judeus. E também nos ciganos, homossexuais, testemunhas de Jeová, etc. Provavelmente todos eles praticam mais coito do que Hitler. Eu deveria levar um tiro só por pensar assim. Mas como prezo minha vida, mantenho minha boca fechada. Talvez Hitler seja um cara legal.

Minha mãe obrigou a mim e Klaus a ficarmos em nossos quartos, mas eu pude ouvir meu pai fazendo ligações. Ele tem contatos com políticos importantes, gente de alta sociedade. Blá, blá, blá, uma vida de aparências. Há, confirmado! O exército alemão havia invadido nosso país (Polônia). Mas pelo visto não corríamos perigo. Eu sabia.

Saí de meu quarto e fui atrás de Klaus. Entrei em seu quarto sem bater na porta. Ele estava sentado em sua cama com os braços apoiados nos joelhos. Olhar distante. Ele estava preocupado com algo, acho.

__ Tudo bem?- perguntei.

__ Tudo.- ele respondeu sem nem me olhar.

Me pus a sua frente e encarei seus olhos, pretos como os meus. Eles se destacavam na pele clara demais, assim como acontece comigo. Minha mãe dizia que nós parecíamos duas caveiras assim.

__ O que foi mano?- insisti.

Ele suspirou.

__ Harry e Gordon vão montar uma banda.- ele disse. Harry e Gordon eram amigos dele. Os três viviam falando de música. Meus pais não gostavam que ele se interessasse por esse assunto. Queriam que ele focasse nos estudos, pra eles música era coisa de gente desocupada. Logo entendi que ele queria participar da banda. Uau, montar uma banda no começo de uma guerra. Nada contra.

__ E você também queria entrar, não é?- perguntei.

__ Eles me convidaram! Nós iriamos inovar! Seríamos diferentes de todos esses músicos chatos e gordos que existem hoje em dia. Mas o pai e a mãe...- ele não terminou a frase, mas eu sabia o que ele queria dizer.

Eu o abracei.

__ Eu te entendo Klaus. Também tenho sonhos e quero fazer coisas, mas não posso por causa deles. Um dia quem sabe.- eu o confortei. Ele sorriu durante o abraço.

__ Uma garota que quer ir pra guerra.- ele disse, e riu logo em seguida. Sim, você leu direito. Eu quero ir pra guerra. Eu, uma garota. Pensava nisso desde 1937. Desde os meus 15 anos. Agora tenho 17, logo 18. E como presente de aniversário vou ganhar uma ida para a academia de moças na França. Toda garota sonha em ir pra França. Já eu, vejo isso como um pesadelo.

__ Dá um tempo!- disse, sorrindo também.

__ Um dia quem sabe.- ele disse.


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Notas finais do capítulo

Holla. Rola.



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