If I Die Tomorrow escrita por Tcrah


Capítulo 1
De todos os loucos eu escolhi você.




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Estava dirigindo quando um número não registrado me ligou. Fiquei encarando o celular, seguido de um suspiro longo. Me perguntei mais uma vez o porquê de eu não anotar o número se eu já sabia de cabeça que era do hospital. Consequentemente, algo havia acontecido com Renata. Senti dentro de mim um pouco de decepção. Mês passado Renata me prometeu que seria a última vez que tentaria se matar. Envolveu-se novamente com drogas, presumo.

Cheguei ao hospital e algumas enfermeiras me cumprimentaram. Óbvio, passo mais tempo aqui do que em minha própria casa, já faço amizades.

_ O que houve dessa vez? – Pergunto a uma enfermeira que saía do quarto.

_ Overdose. Teve duas paradas cardíacas desde que chegou, mas agora está instável. – Ela dá uma pausa e segura minha mão. – Não brigue com ela. Pelo menos não agora. Ela deve estar sensível. Você é a quarta pessoa pra quem ligamos, os outros três se recusaram a aparecer.

Suspirei. Meu olhar devia ser de derrotada, porque a enfermeira passou a mão em minha bochecha e pediu para que eu sorrisse. Abri o máximo de sorriso falso que eu consegui e um pouco de empolgação. Entrei no quarto que ela estava e sentei ao lado da cama.

_ Como está indo minha guerreira? – Pergunto segurando sua mão.

_ Bete estava sentada ai. Ela foi dar uma volta, disse que pegaria comida pra mim. – Bete é uma das amigas imaginárias que Rê tem desde pequena. Senti uma faca cortando meu peito quando ela mencionou o nome de Bete, isso me desanimou um pouco, mas não deixei que ela percebesse.

_ Rê, você não havia me prometido que não tentaria se matar? Mais cedo ou mais tarde seus pais vão ficar sabendo disso...

_ Eles já sabem. – Ela me interrompeu. – Ligamos pra eles e para o meu irmão, os três disseram que não viriam. Disseram que já cansaram dessa história. Minha mãe ficou histérica, disse que não queria mais se envolver com isso porque quem se mete com drogas não é confiável. Meu pai disse que eu estava torturando a minha mãe e que ela tem pesadelos e chora constantemente por causa dos meus gritos e dos meus “amigos”. E o meu irmão... Ele se mostrava tão forte, disse que estaria do meu lado. Atendeu ao telefone chorando e disse que se mudou pra Suécia, pediu para que não retornássemos e... - Não deixei que ela terminasse de falar e abracei-a. – Por favor, me deixa acabar logo com isso. Deixe-me ir. – Sussurrou.

Um médico entrou no quarto e me chamou de canto para conversar.

_ Senhora Flerch, lamento em informar que nós não podemos mais fazer algo que a Renata não queira.

_ Pera, você está dizendo que o melhor devia deixa-la morrer? Que tipo de médicos vocês são? – Levantei a voz.

_ Não é isso que... Olha, eu não devia te dar essa chance, mas todos aqui do hospital sabem que sempre que a Renata aparece aqui, devemos chama-la. E que os pais dela normalmente são os últimos a chegar. Também sabemos que agora os pais dela desistiram de vir. Ela é uma mulher seriamente transtornada e nós não podemos deixar essa escolha na mão dela. Ela pode escolher se suicidar e no final das contas, essa não ser a melhor solução.

_ Você está querendo dizer que...

_ Que nós vamos te dar o direito de escolher. Se quiser, nós internamos a Renata e ela fica aqui até que seja 100% confiável, e nós dois sabemos que isso pode não acontecer. Ou podemos liberá-la pra ir pra casa. Você é formada em medicina, saberá lidar com ela. Se for muito peso para você, pode trazê-la de volta que nós internamos. Agora, isso é uma escolha sua. Se preferir conversar com ela, fique a vontade.

Resolvi dar uma volta na cafeteria até absorver todas as informações. Comprei um sanduiche e suco para Renata, pois sabia que ela ficaria com fome após de esperar um lanche de uma garota que nem sequer existe.

Voltei para seu quarto e olhei extremidades da persiana. Renata parecia estar conversando animadamente com alguém, porém o quarto estava vazio. Sentei no chão, fazendo força contra a parede com as costas. Quem passava por ali, me encarava e via o meu estado totalmente lamentável. Estava a caminho de um plantão, quando tive que parar para ajudar uma amiga. A amiga. A melhor amiga. Cheguei a conclusão de que não podia deixa-la voltar pra casa. Se ela se matar, a culpa vai ser minha. Apenas minha. E nada nem ninguém poderão fazer algo pra impedir. Logo, deixa-la no hospital é a coisa mais certa a se fazer.

Eu sentiria falta dela, claro que sim. Ela é minha cara metade, minha alma-gêmea, mas eu não conseguiria lidar com a dor de ter “matado” a pessoa que esteve comigo a minha vida inteira.

Percebi que estava chorando quando algumas enfermeiras e médicos conhecidos vieram falar comigo. Perguntavam se eu precisava de ajuda, se o estado dela era grave, todos me abraçando tentando me consolar. Quanto mais abraços, mais forte eram os meus soluços. A porta estava fechada, portanto Renata não podia me ouvir, mas o movimento era tanto que provavelmente ela viu pela persiana o que estava acontecendo.

Limpei as lágrimas, me recompus, tirei forças não sei da onde e abri a porta.

Ela estava sentada na beira da cama, mexendo com um barbante, entretida. Me olhou por cima dos óculos e pediu para que eu sentasse. Deu um gole no suco, mas recusou o sanduiche.

_ A Bete estava lá fora, disse que te viu chorando. – Ela parecia estar distraída e não me olhava nos olhos. – Quando você vai me contar o que está acontecendo?

_ Rê, eu... – Olhei pela janela e vi que alguns médicos observavam do lado de fora. Achei aquilo um pouco desconfortante, mas resolvi ignorar. – Você sabe que eu te amo muito, e eu não deixaria nada de mal acontecer com você.

_ Fala logo Thamires.

_ Eles querem que eu decida. – Minha voz falhou e eu suspirei, tentando conter a vontade de chorar. Dei um longo gole no suco com a esperança de que o nó descesse. – Me deram a opção de te levar pra casa ou te deixar internada até que seja confiável o suficiente para não fazer nenhuma besteira.

_ Ah, graças a Deus! – Ela suspirou aliviada, largou o lençol e foi levantando da cama. – Quando nós vamos embora? Olha, estou super aliviada, pois se a escolha fosse da minha mãe, ela me internaria sem pensar duas vezes. Pega a minha roupa naquela mochila, por favor.

_ Eu escolhi te deixar aqui.

_ O QUE? – Ela me olhou procurando algum sinal de que estivesse brincando, mas exatamente por estar falando sério, não consegui olhá-la nos olhos. – Thamires olha nos meus olhos e diz que é brincadeira. – Sem resposta, ela levantou a voz. – FALA THAMIRES.

_ Me desculpa, eu não podia fazer mais nada.

_ Thamires, você é médica. Você pode sim fazer alguma coisa. Por favor, você não pode me deixar aqui. – Ela sentou do meu lado e começou a chorar. – Eu não quero ser deixada aqui. Por você, pelos meus pais, pelo meu irmão. Eu não tenho mais família, você é a minha família. Se você me deixar aqui... Eu não vou ter mais ninguém. – Continuei sem olhar pra ela, o que a fez perder a paciência. – Eu juro. Eu juro que não vou tentar me matar. Sabe o que a gente devia fazer? Pegar parte do dinheiro que guardamos e viajar pelo mundo. Por todos os lugares. Vamos viajar, Thami. Não é o que você sempre quis? Que a gente saísse dessa joça? Mas a gente nunca saiu porque eu precisava de medicamentos pra depressão. Já estou curada, podemos ir. – Ela segurou minha cabeça para que eu a olhasse nos olhos. Em seguida, beijou meus lábios com toda calma do mundo e nos afastou. – Por favor.

Entrei em choque. Eu e Renata nunca fomos mais do que amigas e nem parecíamos. Eu estava mais pra mãe dela do que pra namorada. Fiquei pensando sobre o beijo nos 45 segundos que ela me deu antes de me implorar por uma resposta. Talvez ela só tenha me beijado porque eu sou a única pessoa que resta pra ela, o que a deixou em desespero. Ou então ela realmente guardava uma paixãozinha por mim. Só sei que algo tomou conta de mim e, involuntariamente, falei algo que não esperava.

_ Vamos viajar. – Renata sorriu e me abraçou. Levantei-me para dar a notícia aos médicos.

Assim que saí do quarto, o grupo de médicos que estava nos olhando virou de costas e fingiu que não estavam vendo. Hipócritas, pensei. O doutor Maglik, que está com a gente desde a primeira vez que a Renata foi internada, veio falar comigo.

_ Então, decidiram?

_ Vamos voltar pra casa. – Ele me olha meio confuso.

_ Vocês têm certeza? Absoluta?

_ Sim. E vamos viajar semana que vem. Vamos viajar muitas vezes na verdade. Acho que vai ser bom pra ela. Peço que você transfira o caso dela pra mim, ela será oficialmente minha paciente.

_ Eu acho incrível você dar esse passo tão grande, de resolver sair do país com alguém que nem sequer é confiável, mas...

_ Ela é confiável. Estamos juntas desde os cinco anos, eu confio mais nela do que em mim mesma.

_ Não posso transferir o caso pra você.

_ O que? Por quê?

_ Ah, por favor, com todo respeito doutora Flerch, mas você não fez mais de cinco anos de medicina pra pedir pra cuidar de uma paciente assim. Ela é sua família. A coisa mais básica que devia saber é que não podemos atender família. Você pode ficar nervosa e passar um remédio que não devia, ou então ignorar algum contrato que ela assinar, ou se desesperar com alguma coisa. Não, definitivamente não.

_ Mas nós vamos precisar de um médico vinte e quatro horas por dia. Caso ela queira se matar.

_ Você disse que podia lidar com isso, certo? Me dê uma lista de países que vocês vão visitar que eu enviarei o prontuário para os hospitais de lá.

Peguei um caderno e rabisquei uma rota. Sairíamos de Vancouver e iríamos até Seattle, depois iríamos para Londres e fecharíamos com Amsterdã. Isso se a Renata concordasse.

 _ Amsterdã? – Disse Maglik, analisando o papel.

_ É o sonho de Renata visitar Amsterdã. Quis deixar por último porque se fossemos pra lá primeiro, ela não sairia mais e nós perderíamos a viagem.

_ Bom, são lugares lindos. E parcialmente românticos. – Ele me olha maliciando. – Vocês vão se divertir. – Corei em pensar que todo o hospital já sabia que nos beijamos. É isso que acontece quando se faz amizades no hospital. Sua vida vira polêmica.

Voltei para o quarto da Rê e ela já estava pronta pra ir embora. Entreguei o papel, ela não curtiu muito a ideia de deixar Amsterdã por último e fez um pouco de birra, nada que durasse mais do que o tempo que levamos pra chegar até o carro. Assim que entramos, ela me veio com a ideia de deixar Bete dirigir. Eu sei, ela sabe, todo mundo sabe que Bete não existe, mas as vezes, sabe lá onde se passa a mente da Rê que começa a trata-la como se fosse uma pessoa de verdade. Isso me desanima um pouco, mas convenço-a de que eu vou dirigir e ela passa o resto do caminho conversando com a Bete e mais uns três amigos imaginários. Algo me diz que essa viagem prometeria muito mais do que cumpriria, isso me assusta.

_ AAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAH! – Rê gritou um grito agudo e desesperado. O que me fez frear o carro bruscamente.


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Notas finais do capítulo

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