Sabe aquela sensação de que tudo está no lugar certo e um sentimento de felicidade e conforto toma conta de sua mente, de seu corpo? Como se independentemente do que poderia acontecer no futuro, nada poderia tirar de você esse sentimento nem destruir seu bom humor? Foi exatamente assim que Rachel se sentiu quando acordou e percebeu que não havia sonhado. Quando percebeu que realmente havia dormido a noite inteira envolta pelos braços de Quinn.

Ela se sentiu um pouco assustada por ter gostado tanto. E de estar tão feliz por não ter sido um sonho. Mas tivera uma noite confortável. Geralmente se mexia muito durante a noite, mudava de posição na cama a cada dez minutos. Mas ela não se moveu naquela noite. Sabia disso porque acordou do mesmo jeito que dormiu. E a melhor parte não era ela não ter se mexido: era Quinn não ter se incomodado o suficiente para desgrudar dela.

Com um suspiro, Rachel sorriu e pôs uma de suas mãos sobre as de Quinn, que se conectavam em volta de sua cintura. Já devia ser tarde e era melhor que acordassem logo. Fazendo leves movimentos circulares nas mãos da garota que a abraçava, começou a cantarolar em voz baixa, esperando que isso fizesse com que Quinn saísse de seu sono profundo.

Depois de três minutos, Quinn ainda não havia acordado. Rachel fez uma careta. Não queria que aquele momeno acabasse pois se sentia bem, mas ainda havia muito a se fazer em relação à festa. Virou-se com calma para encará-la e começou a chamar seu nome, aumentando o volume de sua voz a cada vez que o fazia. Começou a cutucá-la e assoprar em seu rosto, até que Quinn finalmente acordou.

Ainda sonolenta, a garota abriu um olho e ao ver que Rachel a encarava a uma distância mínima, sorriu. Começou a pensar em como aquela noite havia sido boa e como tinha sorte de ter Rachel em sua vida e... de repente pensou em quão estranho era estar em uma posição tão íntima com ela. E acordou por completo, sentando-se na cama e automaticamente afastando a pequena garota deitada a seu lado.

Com uma expressão confusa, Rachel sentou-se e esfregou os olhos. "Bom dia, Quinn. Já deve ser tarde. Foi por isso que eu te chamei."

"Hãn... tá, tudo bem. Bom dia, Rachel", ela respondeu rapidamente antes de se levantar e correr para o banheiro, deixando-a sozinha na cama. Quinn jogou litros e litros de água em seu rosto antes de se olhar no espelho. Meu Deus, o que estava acontecendo? Ela havia deixado Rachel infiltrar-se em sua vida de forma tão profunda que estava prestes a fingir que era sua namorada. E ela dormiu com ela. De conchinha.

Balançando a cabeça, ela secou o rosto e trocou de roupa. Quando voltou ao quarto, Rachel já usava um vestido rosa claro e uma sandália rasteira e estava penteando seus longos cabelos em frente à penteadeira. Sem dizer nada, as duas desceram as escadas lado a lado e encontraram Kurt sentado à mesa, tomando um café da manhã farto.

"Oh, bom dia meninas!", disse ele limpando a boca com um guardanapo. "Não chamei vocês pois quando entrei no quarto mais cedo pareciam duas anjinhas, dormindo coladas. Fiquei com dó de acordá-las."

As duas coraram com o comentário e se sentaram na mesa sem jeito. "E então, preparadas para o grande dia?"

Rachel e Quinn se entreolharam, um tanto inseguras. Haviam planejado tudo muito bem mas sabiam que algum imprevisto poderia acontecer. Rachel suspirou e se serviu de café. "Bem, eu acho que estamos preparadas. E você Quinn, o que acha?"

Quinn deu de ombros, enquanto passava manteiga em uma torrada. "Concordo. Nós estamos bem." Kurt deu um sorriso malicioso. "Sabem... casais às vezes se beijam em público."

Ambas pararam completamente com o que faziam e olharam fixamente para o chão, tentando esconder a cor de pimentão de suas caras e também pensando no que responder. Kurt estava certo. Ninguém acreditaria se elas não dessem uma demonstração de amor em meio ao grupo. Ou... iriam?

"É só... é só a gente dizer q-que não estamos preparadas para fazer isso na frente deles."

"É, é, é... Rachel tá certa, a gente fala isso e pronto."

Tudo bem. Tinham uma desculpa. Essa foi por pouco. Não é que se sentiam mal por beijarem meninas. Rachel tinha tido algumas experiências na faculdade, afinal ela estudou em Nova York. Quinn também já tinha beijado garotas, apesar de negar se alguém falasse sobre isso. O estranho era beijar uma a outra. Quinn Fabray beijando Rachel Berry. Não, não, isso era muito... não.

Kurt se levantou. "Se vocês dizem... agora, com licença. Preciso terminar algumas coisas da festa e quando terminarem aí podem ir me ajudar." Ele saiu do cômodo e elas ficaram sozinhas, em silêncio. Ambas queriam dizer algo pois as duas sabiam que pensavam na mesma coisa. Mas decidiram esquecer e terminar o café da manhã em paz.

~

Eram seis e meia da tarde quando os três terminaram de arrumar tudo. Ou melhor, os quatro, pois Santana havia chegado e 'ajudado' nos preparativos. O 'ajudar' dela era ficar sentada, olhando eles fazerem tudo e gritando coisas como 'movam suas bundas gordas' e 'façam isso rápido seus molengas'. Sua presença não mudava muita coisa.

"Bem, agora acho que podemos começar a nos arrumar. Eles chegarão aqui por volta das oito."

Todos concordaram e foram se preparar. Algum tempo depois, Santana usava um vestido vermelho tomara que caia, e seu cabelo estava preso em um rabo de cavalo caído para o lado. Kurt usava uma blusa preta de gola alta com um casaco branco e uma calça skinny escura. Quinn usava um simples vestido azul com um cinto preto na cintura. Sua franja estava presa para trás e o resto de seu cabelo estava solto, com algumas ondulações na ponta. Rachel ainda não estava pronta.

"Vamos logo, Rachel!" Quinn gritou do quarto para o banheiro.

"Espera, eu já tô quase pronta!"

Quinn bufou e sentou na cama. Kurt entrou no quarto. "Estão prontas?"

"Bem, eu estou mas Rachel ainda não está." Quinn respondeu irritada.

"Então faça ela descer logo. Mercedes, Tina e Mike acabaram de chegar."

O estômago de Quinn revirou. Ela sentiu uma onda de calor passar por seu corpo e mordeu o lábio. "Tudo bem. Daqui a alguns minutos descemos, Kurt." O garoto deu de ombros e saiu.

Quinn estava começando a repensar se executar aquele plano seria uma boa ideia. Não sabia mais se estava realmente preparada para algo assim. Talvez fosse melhor desistir... não. Ela não podia. Tinha prometido a Rachel. Lembrou-se de como os olhos da menina a encararam alguns dias atrás e como ela pediu que não desistisse. Com um suspiro, Quinn foi até o banheiro para chamá-la e quando estava prestes a bater na porta, ela se abriu.

Rachel estava deslumbrante. Vestia um lindo vestido branco rodado de uma só alça e um salto preto. Seu cabelo estava preso em uma linda trança e seu cheiro... que perfume era aquele? Era magnífico! Quinn a mirou encantada. Mal podia se mover e apesar de tentar, não conseguia gesticular uma só palavra.

"E então? Gostou?" Rachel perguntou genuinamente, mas Quinn achou que ela estava brincando. Não tinha como não gostar!

"U-uau, Rachel... Uau!" foi tudo o que ela conseguiu dizer.

Rachel sorriu tímida e suas bochechas rosaram instantaneamente. "Obrigada, Quinn. Você também está linda." E era verdade. Para Rachel, não havia como Quinn ficar feia. Como ela já havia dito várias vezes, ela era a garota mais bonita que ela já conhecera. E anos depois, isso ainda não tinha mudado.

"Bem... Nós... nós deviamos descer. Kurt disse que Tina, Mercedes e Mike já chegaram, então..."

"Ah sim, claro. Vamos." Rachel disse rapidamente e pegou sua pequena bolsa preta sobre a penteadeira. Ela se olhou uma última vez no espelho, respirou fundo e acompanhou Quinn até o andar de baixo. Quando chegaram na porta que dava para a piscina - que era aonde a festa iria acontecer na maior parte do tempo -, se entreolharam.

"Está pronta?" Rachel perguntou nervosamente.

Quinn suspirou. "Acho que sim. Quer dizer, eu confio em você então... acho que podemos fazer isso."

Rachel sorriu e Quinn sorriu de volta. Ambas olharam para a porta e quando foram entrar, deram as mãos.

~

Algumas cervejas depois, Rachel estava completamente animada. Sua trança havia se desfeito e agora seu cabelo caía por sobre os ombros. Seu vestido estava meio amassado e a única alça que o mantinha preso a seu corpo estava caindo lentamente. Quinn não estava muito diferente. O cinto de seu vestido havia sumido e seus pés estavam descalços. Sua franja tinha cedido e caido livremente com o resto do cabelo.

Kurt ainda estava sóbrio, pois apesar de ser o dono da casa e poder beber livremente, ficar bêbado não era muito sua praia. Santana por outro lado estava sentada na beira da piscina, chorando e lamentando-se de como odiava seu emprego. Tina, Blaine, Artie e Mercedes cantavam junto com a música que tocava. Mike, Lauren e Brittany dançavam em cima das cadeiras e mesas, apesar das constantes advertências de Kurt sobre como a mobília era cara. Puck havia caído umas três vezes dentro da piscina. Sam e Finn discutiam alguma coisa sobre futebol.

Kurt era o único que se lembrava da intenção de dar aquela festa. Por isso chamou Quinn e Rachel para a cozinha e lhes deu um copo de água. "Esqueceram do porquê de eu estar dando essa festa?"

"Claro que não, Kurtizinho!" Rachel disse animada. "A gente tem que ser um casal e dar uns amassos."

"Cala a boca!" Quinn gritou irritada. "A gente não vai se pegar, lembra? A gente combinou isso, a gente só vai fingir que tá se pegando."

"Eu esqueci! Não grita comigo! Só me abraça!" Rachel jogou-se sobre Quinn, que só fez uma cara confusa e deu tapas fortes nas costas da garota.

"Suas bêbadas! Como vão fazer esse plano dar certo desse jeito?"

"Eu sei! Eu sei! Eu tenho um plano! Não, pera... não tenho não!" Rachel disse e começou a rir descontroladamente. Quinn acabou imitando-a e rindo junto. Kurt revirou os olhos e olhou no relógio. Ainda não era nem meia-noite. Talvez se ele escondesse as bebidas, logo todos poderiam ficar sóbrios o suficiente para entender o que estava acontecendo.

Foi o que ele fez. Felizmente, ninguém tinha bebido tanto quanto as duas, portanto todos já tinham voltado a um estado mais sóbrio por volta da uma e meia. Apesar dos protestos de todos quando Kurt retirou as bebidas de perto deles, resolveram seguir seus comandos e logo estavam em uma roda, lembrando de coisas que aconteceram na época no colégio.

"Lembra de quando Quinn fingiu estar grávida de Finn?"

"Lembra quando Rachel e Blaine se beijaram?"

"Lembra quando Puck e Lauren namoravam?"

"Lembra de quando Finn quebrou o nariz de Rachel?"

"Lembra de quando eu e a Quinn éramos héteros?"

Todos pararam nesta parte. Rachel ria do próprio comentário enquanto todos, em silêncio e com uma cara séria, a encaravam. Quando se tocou do que disse, engoliu um seco e olhou para Quinn. "Acho que a hora de contar é agora."

"Você acha?" Quinn disse enquanto se levantava e ajudava Rachel a fazer o mesmo.

"Você pode explicar isso por favor, Rachel?" disse Sam enquanto as olhava confuso.

"Bem..." ela começou, mas Quinn fez um movimento com a mão sinalizando que ela faria o discurso.

"Pessoal... Tem uma coisa que nós queremos contar a vocês. Como devo começar... aliás, do que tava falando mesmo? Ah é... bem, há algum tempo atrás eu..." Apesar de ainda estar bêbada, Quinn sabia o que estava acontecendo. Ela estava suando e ficava entrelaçando seus próprios dedos e coçando a nuca de vez em quando. Era agora. "Eu percebi que... que tenho sentimentos... por ela, pela Rachel. Quer dizer, eu... percebi que sou apaixonada por ela."

Todos começaram a ficar agitados, mas Quinn respirou fundo e continuou. "Eu pensei que era muita muita burrice ficar apaixonada por ela já que... já que ela não gostava de mim, né. Por isso resolvi me casar com ele ali, o Finn." Ela olhou para o garoto, que esboçava um pequeno sorriso encorajador. "Mas percebi como isso era injusto com nós dois e... bem, vocês sabem o que aconteceu. O negócio é que... depois que expliquei isso pro Finn, ele acabou não se segurando e contando tudinho pra Rachel."

Com isso, o garoto abaixou a cabeça envergonhado. "E eu agradeço ele por isso." Ele levantou os olhos e mirou Quinn com um ar de confusão. "É, valeu Finn. Depois que você contou pra Rachel... ela veio falar comigo sobre isso e..."

"E acontece que eu também gosto dela." Rachel completou, entrelaçando com dificuldade seus dedos com os de Quinn. "Eu conversei com essa lindinha aqui e... ah, eu acho que sempre senti algo por ela mas nunca deixei florescer, sabe? Acho que no fundo tinha medo de que não desse certo, de que eu saísse machucada como SEMPRE... mas quando soube disso, simplesmente não pude evitar. Eu... meus sentimentos vieram à tona e me vi completamente apaixonada por Quinn."

Quinn a olhou atônita. Rachel falava como se estivesse bem mais sóbria do que aparentava e de um modo que fazia parecer com que tudo o que dizia era verdade. Ela podia até ver uma lágrima se formando nos olhos da morena! "Com tudo isso, a gente resolveu começar a namorar! Yay!", Rachel completou animada. "Não queríamos roubar o brilho da celebração amiguinhos, mas achamos que essa seria a hora ideal para anunciar o início de nosso relacionamento. Porque somos super gays e não conseguimos nos controlar."

Todos se entreolharam e as encararam antes de dizer algo. Quando finalmente se manifestaram, foi uma alegria só. Eles gritavam e batiam palmas e alguns deles abraçaram as meninas como forma de apoio. Foi uma reação um tanto peculiar na visão delas.

"Eu sempre soube! Eu sempre soube!" Mike dizia enquanto admirava as duas com um olhar orgulhoso. Tina revirou os olhos. "Não é grande coisa." Mike entendia. Tina sempre foi mais fã de Finchel.

"Quando eu pensei que esse pessoal não podia ficar mais gay!" Mercedes exclamou, ainda um pouco confusa com tudo.

"Ei garotas, eu sempre senti uma tensão sexual entre vocês duas, até pensava em chamar vocês para um treesome." Puck disse com um sorriso malicioso. "Devia rolar um beijo agora, hein? Pra gente saber que é de verdade!" Ele sugeriu, com segundas, terceiras e quartas intenções.

Quando Quinn estava prestes a dizer o que havia combinado com Rachel, a garota ao seu lado agarrou seu rosto com as duas mãos e selou seus lábios em um beijo inesperado.

Quinn se deseperou por um momento. Que porra era essa? Esse não era o plano! Esse não era...

Ela se rendeu. Acabou se deixando envolver pelo beijo e pôs as mãos nos quadris de Rachel. Foi um beijo suave e intenso ao mesmo tempo. Elas não usaram língua - apesar de saberem que se uma delas tentasse, a outra não recusaria - mas não era preciso. Nada mais era preciso.

O mundo a sua volta não parecia mais existir. Deus, como um beijo de mentira podia ser tão bom? E como podiam se sentir tão sóbrias e tão vivas quando estavam tão bêbadas? Rachel estava surpresa por ter feito o que fez, mas por incrível que pareça, não se arrependeu. E Quinn, apesar do pânico inicial, percebeu que não fora uma má ideia se deixar envolver. Tudo parecia certo, no lugar certo e no tempo certo, assim como quando acordaram juntas, abraçadas.

O beijo durou poucos segundos, mas para elas, parecia uma eternidade.

Uma eternidade que acabou rápido demais