– Merda! - Gritou Dean, atirando um copo cheio de uísque na parede.
Sentou-se no sofá e finalmente deixou aquele sofrimento cair livre pelos seus olhos, escorrendo pela face. Esfregou-os com as mãos, tentando se recompor. Mas ele simplesmente... Não conseguia. ''Pare de chorar, seu filho da puta'', sussurrou para si mesmo.

Every now and then, I get a little bit lonely
(De vez em quando, eu fico um pouco solitário)
And you're never coming round
(E você nunca está voltando)
Every now and then, I get a little bit tired of
listening to the sound of my tears.
(De vez em quando, eu fico um pouco cansado de
ouvir o som das minhas lágrimas.)

Havia mais de 48 horas que ele não dormia, sequer chegava a pregar os olhos. Dois dias antes, precisara assistir aquela maldita cena digna de um pesadelo: Castiel sendo vencido pelos leviatãs dentro de seu corpo. Um deles apossou-se do receptáculo e afirmou que o anjo já não estava mais lá entre eles. O monstro dirigiu-se para o local de abastecimento de água da cidade, sendo seguido por Dean, Sam e Bobby. O lago engoliu o corpo quase destroçado, e aquelas aberrações estavam livres, por fim. Deus sabia o que estava por vir, com toda aquela perversidade a solta. Congelado, sem saber o que diabos fazer, o Winchester mais velho assistiu os habitantes do Purgatório se dispersarem pela região.
– CAS! CASSSSS! - Berrava, em vão, enquanto o moreno desaparecia na negritude daquelas águas.

Every now and then,
(De vez em quando,)
I get a little bit nervous that the best of all the years have gone by.
(Eu fico um pouco nervoso quando penso
no melhor dos anos que se passaram.)

E agora só lhe restava aquele quarto sujo e parcialmente iluminado na casa do Bobby, aquelas dezenas de livros e o litro de bebida, o qual agora estava quase seco. Dean imaginou que o álcool talvez amenizasse aquele pesar, aquela solidão. Mas puta merda, não importava quantas doses ingerisse! Vinha sempre em sua mente aquele antes doce e puritano rosto, aquelas feições marcadas por aquele par de safiras nos olhos e pelo sorriso cativante. O rosto do anjo, seu anjo, não saía de sua cabeça.

Every now and then,
(De vez em quando, )
I get a little bit terrified and then I see the look in your eyes.
(Eu fico um pouco aterrorizado e então eu vejo o seu olhar)
Every now and then, I fall apart
(De vez em quando, eu desmorono)
[...]

Sim, amava-o. Não um amor fraternal, como sentia por Sammy. Era um amor verdadeiro, imaculado. Há algum tempo atrás, provavelmente acharia impossível que ele, Dean Winchester, se apaixonasse por um cara. Ou um anjo, para dizer com maior exatidão. Mas aos poucos sentia necessidade de Cas. No início, não era um desejo carnal, e sim o desejo de sua presença por perto sempre. Imaginou o rebelado como um novo membro da família, mas esse sentimento fortaleceu-se e transformou-se. Negou o que sentia incontáveis vezes. Ignorava as borboletas no estômago e a respiração acelerada quando o mesmo estava por perto. Vale ressaltar que essas sensações só sentira com poucas mulheres. E por mais difícil que fosse, depois de um tempo parou de mentir para si mesmo e aceitou que estava apaixonado: Cas era o primeiro e único homem que amou, que amava e que sempre amaria. Ele nem sonhava com isso, claro. O loiro pretendia esconder o que sentia, desde que o seu amor continuasse ali com ele. Isso bastava.

E agora ele se fora, quiçá para sempre.

And I need you now tonight
(E eu preciso de você agora esta noite)
And I need you more than ever
(E eu preciso de você mais do que nunca)
And if you only hold me tight
(E se você apenas me abraçar forte)
We'll be holding on forever [...]
(Nós ficaremos abraçados pra sempre [...])

Dean sabia que era forte, física e mentalmente. E tudo que passara nos últimos anos só o fortalecera ainda mais. Mas naquele preciso momento se sentia desmoronando internamente, caindo em um buraco negro infinito, puxado por correntes de aço invisíveis e incapaz de se ver livre. Não havia para onde fugir, e isso o amedrontava. Sentia-se desprotegido.

Once upon a time, I was falling in love
(Era uma vez, eu estava apaixonado)
But now, I'm only falling apart
(Mas agora, estou apenas despedaçado)

– Castiel, seu imbecil. P-or que você fez isso comigo? - Murmurou. Sua voz estava mais grave devido à embriaguez e embargada pelo choro. - Foi teimoso e cego. POR QUÊ?! - Gritou outra vez, ignorando se havia ou não pessoas na casa. E para sua sorte, Bobby e Sam saíram para comprar um ingrediente qualquer de rituais de um comerciante turco que estava no estado.

There's nothing I can do
(Não há nada que eu possa fazer)
A total eclipse of the heart.
(Um eclipse total do coração)

Por um breve tempo cogitou até mesmo um pacto com Crowley. Quem sabe assim pudesse dar um último abraço no amado? Abandonou a ideia antes que ela se formasse por completo, sabia que era impossível. E mesmo bêbado não se atreveria a fazer um pacto com o diabo.

Simplesmente não conseguia aceitar tudo o que tinha acontecido. Chorava pelo que o celestial havia se tornado em tão pouco tempo. E ao mesmo tempo se odiava, praguejando contra si mesmo e culpando-se por não ter conseguido fê-lo escutar. Não obstante, sabia que Castiel fora corrompido pelo poder, tornando-se presunçoso, prepotente e megalomaníaco.

Once upon a time, there was light in my life...
(Era uma vez, havia luz na minha vida...)

– Sam está doente, e você... - Calou, impossibilitado de terminar a frase. - Anjo idiota, idiota, mil vezes idiota. Agiu como um maldito ditador, e olha no que deu. Cas... - Soluçou - Se ainda há algum resquício de você por aí... - Virou os olhos de verdes como esmeraldas para o teto, entretanto as lágrimas dançavam descontroladamente pelas pupilas, interceptando sua visão. Suspirou e tentou manter a voz firme para o que estava dizendo - Se há ainda uma mísera parte sua intacta, saiba que te amo, te amo demais. Não como um novo Deus, mas como o meu protetor, o que você é. Ou que foi, já não tenho certeza. Só sei que nunca vou te esquecer, seu imbecil teimoso de sobretudo. É uma promessa.

But now, there's only love in the dark..
(Mas agora, só há amor na escuridão...)

Fungou mais uma, duas, três vezes. Desviou sua atenção para a lua minguante pintada no céu, atrás da janela escancarada. Fechou os olhos lentamente; A batalha contra seu próprio corpo estava perdida, pois. Tudo ficara em terno sossego - menos o coração do caçador. Este gritava ao ser flagelado aos poucos. Dean adormecera estirado no sofá desconfortável, com o litro de uísque na mão direita.

Nothing I can say.
(Nada que eu possa dizer.)

...
Não muito longe dali, um fio de luz resplandecente e gélido despertou. Silenciosamente, acalentava as almas dos amargurados. E na calada da noite lamuriosa, isso bastou para que a esperança não cedesse e perdurasse ali. Estava esfolada, gasta, mas presente e viva o suficiente para impedir o eclipse total nos sonhos dos guerreiros desamparados.

A total eclipse of the heart.

(Um eclipse total do coração.)