Estava frio. Não que Gray Fullbuster fosse se importar, é claro. Para dizer a verdade, o mago do gelo acolhia o frio como um velho amigo em noites de inverno como essa.

Também não era como se ele estivesse prestando atenção em qualquer outra coisa além da garota a alguns metros a sua frente.

Gray observava o longo e sedoso cabelo escuro dela se mover suavemente conforme ela caminhava. Às vezes o mago se pegava pensando em como seria passar sua mão pelos lustrosos fios. Ele tinha certeza que seriam tão macios quanto sua imaginação dizia que eram.

Só para esclarecer algo: Gray Fullbuster não costumava seguir garotas até suas casas. Não, isso definitivamente não era algo que ele fazia. Pelo contrário, normalmente as garotas o seguiam. Entretanto, desde que o Conselho decretou liberdade aos membros da Crime Sorciere, e uma certa Ultear Milkovich se mudou para uma casa a três quarteirões da guilda Fairy Tail, Gray não conseguia tira-la da cabeça.

Ele pensava em como seria bom senti-la contra seu peito nu. Como seria acordar ao seu lado e dá-la um beijo de bom dia. Em outras palavras, Gray estava obcecado pela garota.

Um poste foi o lugar que o mago do gelo escolheu para se esconder quando sentiu Ultear olhando por trás do ombro. Felizmente, ela pareceu não nota-lo e continuou seu rumo.

Era quase inacreditável como Gray podia se mover tão silenciosamente e agilmente ao mesmo tempo em que admirava a silhueta deslumbrante da mulher. Ele sabia que ela tinha todas as curvas nos lugares certos, porém, diferente de muitas garotas de sua guilda, Ultear não via a necessidade de vestir roupas vulgares para mostrar o corpo que tinha. Não que ela precisasse, é claro.

Gray também sabia que Ultear carregava a tatuagem de sua guilda nas costas. Por pura sorte, ele a vira algumas vezes de relance, mas não fora suficiente. Ele queria passar seus dedos pela marca, saboreá-la com sua língua.

Pode-se dizer que o mago do gelo fantasiava sobre Ultear Milkovich mais do que muitos especialistas julgariam ser saudável.

Mais rápido do que ele gostaria, Ultear chegou às escadarias que levavam ao seu pequeno apartamento a beira do rio. Coincidentemente, ela estava morando perto de Lucy, talvez porque o aluguel fosse razoável.

Gray suspirou, pronto para começar a caminhar em direção a sua própria casa. Sua missão estava cumprida. Ultear chegara sã e salva em casa.

-Você pode entrar, sabe – Ele ouviu a maga do tempo dizer de onde estava.

O corpo de Gray foi tomado pela tensão. Havia mais alguém ou será que ela –

-Eu estou falando com você, Gray – a morena disse, parada na frente de sua porta.

Como? Quando?

-Como você sabia que eu estava aqui? – Gray não pôde deixar de perguntar.

Ele deu um passo para frente, saindo da escuridão que as árvores proporcionaram e sendo fracamente iluminado pela luz amena que vinha da sacada de Ultear.

-Por favor, - ela riu – eu fugi do Conselho Mágico por sete anos. Você não acha que perceberia se um garoto me seguisse?

Talvez Gray a subestimara. No entanto, ele tinha tanta certeza de que estava sendo tão silencioso e discreto, praticamente como um fantasma da noite, que seria quase impossível Ultear o perceber.

-Então você sabia que eu estava aqui ontem também? – Ele perguntou, aproximando-se da maga.

Ela sorriu um sorriso que iluminou todas as suas feições.

-Ontem, antes de ontem – Ultear afastou uma mecha de seu longo cabelo do rosto – e todos os dias desde o mês passado.

Ela realmente soubera o tempo todo que ele a estava seguindo.

-Então, por que você nunca disse nada? – Gray perguntou, tentando tirar o rancor de seu tom de voz.

Ultear deu de ombros.

-Eu queria saber o quão longe você iria – ela disse, sem se importar se sua resposta soasse egocêntrica.

Gray passou a língua por seus lábios enquanto a assistia tirar seu sobretudo preto. Por acaso ele mencionou antes o quanto adorava o fato de Ultear usar roupas que não fossem vulgares? Bem, às vezes ele queria que ela quebrasse essa regra.

Agora mesmo, a maga estava revelando o vestido comportado, porém elegante, que estava usando por baixo do longo casaco. Como Gray desejava que aquele vestido fosse dois palmos mais curto e que o decote fosse mais aberto.

-Gray – Ultear sorriu.

Ultear Milkovich não era nenhuma garotinha inexperiente. Ela sabia o efeito que tinha sobre os homens e principalmente sobre Gray Fullbuster.

-Você é linda – ele disse como se estivesse esclarecendo algo óbvio.

Ela sorriu mais uma vez. Não era um sorriso inocente e virtuoso. Estava longe disso. Era um sorriso diabólico, quase convidativo.

-Sou um pouquinho velha para você, não acha? – A maga do tempo disse, sua sobrancelha arqueando levemente.

-Eu... O quê? – Gray perguntou, atordoado demais para formular frases com sentido.

Não era segredo para Gray que Ultear sabia dos sentimentos que ele tinha em relação a ela. Bem, não era segredo para ninguém. Até mesmo o ser mais estúpido do planeta, Natsu Dragneel, estava ciente da maneira como ele se sentia.

Contudo, Ultear nunca demonstrou que sabia. Na maior parte das vezes, Gray ficava furioso com isso, mas ele também sabia que a ignorância por parte dela era para seu próprio bem. Para não forçarem uma situação tão desagradável como a que estavam nesse exato segundo.

-Nós temos a mesma idade – ele a lembrou. – Eu só fiquei preso em uma ilha por sete anos.

Ultear riu. Uma risada leve que fez o corpo inteiro do mago se arrepiar.

-Isso significa que sou sete anos mais velha do que você agora – ela o lembrou.

-Não é verdade – ele teimou.

Gray Fullbuster sabia ser teimoso quando seus interesses estavam em jogo. Ultear não queria quebrar o coração dele, afinal, já fizera estragos demais na vida do antigo discípulo de sua mãe. Porém, o mago parecia implorar por isso.

-Eu gosto de outra pessoa, Gray – ela disse, sua voz tão fria quanto a noite.

Ele não gostou do que ouviu. Quem gostaria de ouvir que a garota de seus sonhos gostava de outra pessoa? No entanto, a informação não veio como um choque a ele. Gray não era nenhum idiota ingênuo; pelo contrário, o mago do gelo se tornava extremamente atento quando o assunto era Ultear Milkovich.

-É o Laxus, não é? – Gray ouviu sua própria voz dizer. – Eu vejo a maneira como você olha para ele; como sorri quando está perto dele.

Ultear não respondeu, mas Gray sabia que um sorriso lutou para aparecer no rosto dela quando o nome do Dragon Slayer do Trovão foi mencionado.

-Eu seria bom para você, sabe? – Gray continuou. – Melhor que ele.

Dessa vez Ultear realmente sorriu. Um pequeno sorriso que ressaltava o batom rosa claro em seus lábios.

-Boa noite, Gray – a maga do tempo se despediu, antes de entrar em sua casa e fechar a porta atrás dela.

Era frustrante. Ultear Milkovich podia não ser mais considerada uma criminosa aos olhos do Conselho Mágico, mas ela ainda assim cometia crimes. Como o crime de roubar o coração de Gray e tortura-lo lenta e dolorosamente.

Porém, o que mais doía era o fato de ela não fazer absolutamente nada. Tudo seria mais fácil se ela dissesse um “não” definitivo a ele, mas nem mesmo isso ela fazia. Ultear gostava de tê-lo bem na palma da mão e poder usá-lo como um plano B.

Gray fechou suas mãos em punhos, pronto para fazer o longo caminho até sua casa. Ele tinha que descansar, pois sabia que amanhã estaria de volta.