The Ascent escrita por Thaina Fernandes


Capítulo 16
Capítulo 15.




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Eu sonhei com o hospício.

Logo o reconheci pela sua branqueza imaculada e as gotas da minha IV sempre a pingar. Meu sonho era, eu percebi, uma memória. Reconheci as formas das enfermeiras rapidamente. Eu devia ter sido admitida fazia pouco tempo, pois ainda mantinham vigilância constante sobre mim. Não que eles precisassem, eu passava o tempo inteira dopada com os calmantes que me forçavam goela a baixo.
A enfermeira incumbida de me vigiar hoje era uma boazinha, que conversava comigo ao invés de só me observar friamente. Ela era ruiva também e estávamos conversando (ou ela estava conversando) sobre como era difícil passar despercebida. Mas nossa conversa unilateral foi interrompida quando outra enfermeira entrou, com um homem a seguindo. De imediato achei que fosse outro médico.

Mas o olhei melhor. Ele estava usando cores escuras, um casaco de tweed escuro cobria uma camisa branca, Sim ele era muito formal, mas não um médico.

—Podem nos deixar agora. — Ele disse, sem menos as olhar. Sua atenção estava completamente focada em mim.

E surpreendentemente elas foram.

Ele se sentou ao meu lado, no banco da janela em que eu estava sentada tomando sol. Seus olhos verdes me encararam por alguns segundos, e eu notei como os cabelos que eu julguei serem castanhos cintilaram em um cobre escuro.

—Quem é você? — consegui perguntar, minha voz soando fraca.

Seu cenho se franziu levemente. Ele puxou meu cabelo para trás, expondo a marca da mordida.
Uma marca que todos julgaram ser de algum animal.
Ele tracejou o ferimento suavemente com as pontas de seu dedo. Ele era gelado, e me enviou calafrios.
—Meu nome é Noah, Noah Dragomir. Eu sou família, não se preocupe.

Eu sacudi a cabeça, sentindo seu toque gentil em minha bochecha.

—Eu não tenho família. Deve estar enganado, se veio aqui apenas pelos nossos sobrenomes iguais perdeu seu tempo, minha família inteira está morta. Meus pais morreram em um acidente de carro.

Ele sorriu para mim, mostrando os caninos pontudos. Eu pulei para trás, pronta para berrar. Mas ele logo estava atrás de mim, tapando minha boca.

—É tudo verdade, sim. Você não imaginou. Não era para acontecer isso, sabe. As ordens dele eram apenas para te trazer até mim, não para te morder, muito menos atrair a atenção do idiota do James. Mas não tema, Sophia, eu sou do seu sangue. Não lhe faria mal algum.

Ele tentativamente tirou a mão de cima da minha boca, me dando espaço para susurrar:

—Não estava imaginando?

—Não, Tessa, não estava.

Eu me assustei com a menção do meu apelido de infância. Uma lembrança passou rápida em minha mente, de mim com menos de quatro anos de idade, correndo atrás de um adolescente que gritava “Vamos Tessa, mais rápido!” enquanto eu gritava com minha voz infantil ofegantemente por Noh, Noh...

Eu puxei minha respiração com força.

—Como você conhece meu apelido?

Ele me virou de frente para ele. Acariciou suavemente meu cabelo, com um afeto surpreendentemente familiar.

—Fui eu quem lhe dei. — Com um suspiro, olhou para o relógio em seu pulso. Me puxou para minha cama, me deitando nela, me cobrindo com a coberta. — é realmente uma pena ter que fazer você esquecer disso, querida. Mas irá lembrar quando for preciso.

—O que? Noah, o que você está falando? Precisa dizer a eles que eu não estava mentindo! Precisa...

Ele me encarou com aqueles olhos profundamente verdes, e a memória acabou.

Mas não o sonho.

Estávamos em uma sala de reunião. Muito parecida com a do Conselho, para falar a verdade. Só que essa era completamente de mármore branco, ressaltando a mesa redonda de mogno. Nas longas janelas foi onde o vi. Noah estava de costas para mim, o sol batendo em seus cabelos revelando o cobre escuro.

–Pare de tentar me confundir, colocando memórias falsas na minha mente.

Ele não se virou para mim quando me respondeu.

–Você sabe que não são falsas, Tessa. Há muita coisa que escolheu esquecer do seu passado. Eu ia te visitar sempre, naquele lugar. Você estava um caco. Nunca a teriam deixado sair de lá se eu não os tivesse convencido.— ele se virou para mim finalmente. — Você se tornou uma força da natureza, não é? Fico feliz em ver como conseguiu se tornar uma verdadeira Dragomir, mesmo longe de mim.

Sacudi a cabeça para ele, e bati as duas mãos na mesa. Eu estava cansada desse joguinho estúpido. Eu me sentia extremamente vulnerável e estava cansada disso.

— O que você quer de mim? Por que está me perseguindo desse jeito? Quem é você, de verdade? Pois não acredito que seja família. Se fosse teria ido me ajudar antes, manteria as memórias na minha cabeça.

Com uma velocidade que eu nunca havia visto antes ele estava ao meu lado, com sua boca colada em meu ouvido.

—Tessa, você sabe quem eu sou. Sou o Noah. Você me ama. Você estará segura comigo. Só precisa se lembrar.

—CARA, EU ESTOU ÓTIMA.

O grito de Linne me puxou para fora do sonho. Sentei um pouco atordoada. Demorei alguns segundos para conseguir enxergar qualquer coisa, tamanha a onda de tontura que eu tive. Havia tanto tempo que eu não ficava de ressaca que eu havia completamente esquecido a sensação.

—Linne, não. Quieta. Dor. Argh.

Ela se jogou na cama, e me estendeu dois comprimidos e um copo d'agua. Eu os engoli no momento.

—Esqueci que você está fora de forma. Enfim, eu estou ótima. Sabe o motivo?— ela nem me esperou responder. —Klaus é ótimo na arte de me dar tratamento completo.

Fechei os olhos com força. Eu não precisava e nem queria saber os detalhes.

—Linne, acho que não tenho estômago para falar disso agora.

Ela deu uma bufada colossal e jogou seu longo cabelo por cima de seu ombro.

—Qual é! Você e Caspian estavam praticamente se comendo na pista de dança ontem, sem falar dos beijos de desentupidor. Você teve quase tanta diversão quanto eu.

Eu gemi com a dor de cabeça. Eu havia me agarrado com Caspian. Eu gostava de James e havia beijado Caspian. E eu havia gostado.

Mas bem, eu ia me casar com Caspian o que tornava tudo menos terrível, não é?

Quase isso.

—James quer me encontrar.— eu disse com a cara enfiada sob o travesseiro.

—O que você vai fazer sobre ele? Afinal, você decidiu se casar com Caspian mesmo, não é?

Eu grunhi. —Eu não sei. A coisa certa a fazer seria terminar com ele, não é?

Eu a espiei. Ela estava me encarando com uma sobrancelha levantada.

—Sua vida é mesmo um especial adolescente não é?— eu taquei o travesseiro na cara dela. —Você irá fazer a coisa certa. Sempre faz.

Depois disso ela me deixou. Me forcei a levantar. Eu não tinha nada planejado para hoje, então tomei um banho e coloquei minhas roupas mais confortáveis, meu jeans preferido e uma blusa de lã verde, junto com tênis. Peguei meu celular no meio das minhas cobertas, pronta para mandar uma mensagem avisando que eu estava pronta para encontra-lo, mas assim que a tela acendeu, uma mensagem piscou na tela.

“Tenho uma reunião com os guardiões. Vamos ter que adiar nossa conversa.”

Só isso. Suspirei com alivio. Quanto mais demorássemos mais eu poderia me preparar para essa conversa. Eu não sabia o que James queria falar comigo, mas de uma coisa eu sabia. Eu tinha que o afastar de mim.

Como eu não tinha mais nada a fazer, fui para o único lugar que eu conseguia pensar claramente. Sem prestar muita atenção nas pessoas fazendo os preparativos para o baile, eu fiz meu caminho até onde meu dragão estava. O vento gelado vindo da janela que na parede q fazia parte do penhasco me fez desejar ter trazido uma blusa. Suspirei, passando a mão nas finas escamas dele, sentindo o choque familiar de sua aura adormecida.

—Se eu apenas tivesse poder o suficiente para te trazer de volta, tudo isso se resolveria não é? — murmurei.

Me sentei no chão e comecei a cavoucar a terra. Não sei quanto tempo fiquei assim, perdida em pensamentos. Eu não queria pensar na invasão que ocorreu em meu sono. Não podia pensar. Não podia suportar a ideia de algum Giovanni sendo parte de minha família. Lembrar do sonho fez meu estomago revirar, me lembrando que eu estava de ressaca e ainda não tinha comido nada. Eu acariciei o cranio escamoso novamente, e fiz o caminho até a cozinha do castelo.

Estranhamente, não havia quase ninguém aqui. Todos deviam estar na cozinha maior, a que costumavam usar quando precisavam preparar grandes quantidades de comida. Eu quase nunca vinha aqui, já que sempre conseguia pegar as refeições sendo servidas na sala de jantar. Peguei uma cadeira e comecei a revirar o armário, quase soltando um grito de felicidade quando vi meu cereal favorito. Eu estava mesmo com fome e nem havia percebido. Fui a geladeira e peguei uma jarra com achei que fosse leite, e depois de dar uma cheirada cuidadosa descobri que era mesmo.

Bem que eu podia achar as coisas importantes tão facilmente.

Sentei na bancada do meio da cozinha, depois de ter caçado uma tigela e colher, e me servi. Fechei os olhos apreciando o doce momento em que o cereal altamente açucarado entrou em contato com minha boca. Paraíso.

—Vejo que viemos aqui com o mesmo propósito.

Me virei e vi Caspian apoiado na porta. Senti meu rosto se avermelhar com as lembranças dos nossos beijos. Olhei para baixo, diretamente para meu cereal.

—Nada como um cereal para começar o dia, não é? — eu disse, usando minha voz mais normal.

—Ou começar a tarde.

Sorri. Ele se sentou ao meu lado depois de pegar uma tigela para ele e colocou uma quantidade muito grande de cereal e pouco leite. Exatamente como eu.

—E então, princesa, dormiu bem?

Abaixei a colher e o olhei antes de decidir dizer a verdade. Caspian, pelo que eu podia dizer, era uma das únicas pessoas que podiam realmente me ajudar.

— Para falar a verdade, não...

E contei sobre o sonho invadido, Noah, e sobre como eu achava que isso era tudo mentira. Ele me escutou atentamente.

— Não me lembro de ter conhecido alguém com esse nome nas vezes em que visitei Hugin. Mas posso estar enganado. Não se preocupe muito com isso, Sophie.

Sacudi a cabeça para ele. — Eu tenho que me preocupar. Preciso descobrir o que é que Nicholas está me escondendo. Mas não sei por onde começar a procurar.

Ele mastigou um pouco seu cereal, franzindo o cenho levemente. Ele estava com uma camiseta verde, e jeans. Nada de seu casaco hoje.

— Pelo escritório dele, é claro. Lá era o escritório de seu pai, e provavelmente o lugar mais bem trancado desse castelo. Mas nós podemos entrar lá de algum jeito, tenho certeza. Apenas temos que esperar Nicholas sumir um pouco. Não irá ser muito difícil.

Eu sorri para ele. Sabia que ele me ajudaria. Coloquei minha mão sobre a sua que descansava na mesa, dando um leve aperto nela.

—Obrigada, Cas, eu sabia que podia-

Fui interrompida por um pigarreio vindo da porta. James estava parado lá, olhando minha mão em cima da de Caspian com a cara fechada. Eu a retirei rapidamente, me levantando. Caspian se levantou também. Ele nem olhou na direção de James.

—É um prazer te ajudar, Sophie. Te vejo mais tarde, então. — ele disse e voltou a comer depois de me fazer uma reverência.

James se moveu para eu poder passar pela porta até o corredor. Estremeci com a energia que ele estava transmitindo. Parecia raiva, mas era diferente. Ele começou a andar do meu lado. Eu sabia que estávamos indo para o lugar de sempre, perto do rio, longe de todos.

Nenhum de nós disse nada por uma boa parte do caminho, até que eu decidi quebrar o silêncio.

—Ocorreu tudo bem na reunião?

Ele não me olhou para responder um curto sim. Comecei a ficar apreensiva. Ele estava bravo comigo. Eu sabia disso. Mas também estava chateado com alguma outra coisa. Lhe dei olhadas de esguelha pelo resto do caminho. Assim que chegamos árvore, eu o puxei pela manga, o forçando a me encarar.

Ele estava contra a luz do sol da tarde, todo vestido de preto. Finalmente me olhou nos olhos. Ele parecia exausto. De repente eu fui tomada por um sentimento estranho, quase como medo mas misturado com ansiedade.

—Qual o problema James? — eu perguntei, esperando ele dizer que sabia que eu havia beijado Caspian, que eu havia traído a confiança dele e que ele nunca mais queria ver minha cara.

—Robert quer que eu lidere os ataques no campo de batalha.

Eu demorei alguns segundos para absorver essa informação.Não era o que eu esperava. Se James fosse para a batalha algo terrível poderia acontecer com ele. Se algo acontecesse com ele...

Não quero nem imaginar isso. Olhei seu rosto, vendo seu olhar preocupado me encarando.

—Eles não podem fazer isso. Você é meu guardião, não podem te mandar para longe de mim.

Eu tive uma imagem bem nítida de James com a espada na mão, lutando. Sendo atacado. Minha cabeça começou a doer e eu me senti zonza. Fechei os olhos e me sentei, puxando o ar com força. Eu não estava acostumada a ficar de ressaca.

—Quando Nicholas dá uma ordem, até o Capitão da Guarda Real tem que acatar, Tessa. — ele se ajoelhou na minha frente, segurando meu rosto entre as mãos. — Eu vou ficar bem, não se preocupe. Agora me diga, o que você estava pensando quando saiu sem escolta ontem? Espera, é obvio que não estava pensando, já que isso foi uma coisa estúpida que só alguém idiota poderia fazer.

—Linne achou que me animaria. — eu menti, já que ele não ficaria nada contente em saber que a ideia foi dada por Caspian — Fazia tempo que eu não me divertia.Me desculpe, você não está bravo comigo por isso não é?

Depois de olhar a água corrente do rio por alguns segundo ele me deu um leve beijo. — É claro que não. Não mais. Eu sei que você precisava disso, tem estado horrível na ultima semana, não tem dormido bem. Só queria que tivesse tido um pouco mais de segurança além de Caspian e Klaus. Que tivesse ao menos me avisado, ao invés de me fazer te seguir.

Eu desviei meus olhos com a menção de Caspian. Eu sabia que eu tinha que acabar logo com isso. Eu sabia que era a coisa certa a fazer. Mas o que é certo nunca é o mais fácil, então mantive minha boca fechada.

— Me desculpe. — segurei sua mão, a entrelaçando com a minha. Ele suspirou e me puxou para o chão, nossas costas ficando apoiadas na árvore.

— Você e Caspian parecem estar bem amigos, não é? Pelo que estava agradecendo ele?

Eu não olhei em sua direção para responder. — Por me ajudar com meu Poder. Eu estou muito melhor em controlar ele agora, apesar de não entende-lo completamente. Caspian não é má pessoa James, mas não quero falar dele.

Ele suspirou novamente. Nunca pensei que veria James com ciúmes. Eu tracejei seu rosto com as pontas do meu dedo, apenas aproveitando o momento para gravar a imagem dele banhado pela luz do sol na minha mente.

— Sobre o que quer falar então?— ele mudou de assunto— Carolinne aprontou muito ontem?

Eu o contei sobre como ela me acordou berrando, e sobre como ela passou a noite inteira sendo paquerada por todos da boate. Logo isso levou a uma outra história sobre a primeira vez que ela ficou bêbada e vomitou em cima do pé do garoto que ela estava apaixonada. James riu e fez comentários semi-maldosos como sempre, e por um segundo, parecia que nunca tínhamos saído da cabana e que não estávamos soterrados em problemas e dúvidas.


Eu saboreei esse momento até o último segundo.


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