As Histórias De Thalia escrita por GiGihh


Capítulo 83
Codinome Beija-Flor


Notas iniciais do capítulo

Oie! =]



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THALIA

Não lembro de pagar o taxista, não lembro de abrir a porta e não me recordo de correr. Só sei que em miléssimos de segundos eu estava nos braços de Felipe, me agarrando a ele como se meu mundo dependesse daquilo, como se ele fosse o meu porto seguro, minha paz, meu único confidente... Ele era tudo o que Luke havia sido um dia... E isso me fez desabar em lágrimas involuntárias de culpa, amargura, raiva; de mim mesma.

–Nossa. Lia, tem certeza de que está tudo bem? – ele tentou disfarçar, mas eu sabia que ele também chorava, só que, bem mais controladamente do que eu.

–Não.

–Vem. Vou levar você em qualquer lugar em que possamos conversar – ele me abraçou de lado e sorriu maliciosamente – Você tá muito gata, sabia? Parece estar irradiando prata...

Eu ri.

[...]

Sei que podíamos ter pego um taxi ou um ônibus ou sei lá, mas preferimos ir a pé. Fê me contou como andavam suas aulas, suas notas haviam subido, principalmente em História. Ele contou como havia se interessado pelos deuses gregos, que queria entender meu mundo para me ajudar a me abrir de alguma forma. Não consegui conter a lágrima silenciosa que escapou. Ele era tão maravilhoso... Mas será que eu podia ser capaz de muda-lo também? Porque, eu tenho certeza, todos os deuses acham que a situação do Luke é responsabilidade minha...

Paramos em frente a uma construção linda. Annabeth com toda a certeza já deveria ter estado ali e comentado detalhe por detalhe cada fato histórico.

–Por que me trouxe a Biblioteca? – a Biblioteca Pública de NY era realmente grande, linda e, naquela hora, estava fechada, vazia, silenciosa.

–Um pai de um colega meu trabalha aqui. Meu amigo me mostrou a chave da porta dos funcionários e – ele sorria – eu tenho mãos leves, sabe? Eu achei... Eu sabia que você precisava de um lugar vazio.

É claro que ele tinha mãos leves. Como eu nunca suspeitei que essa semelhança existia antes? Como eu nunca percebi que estava me ferindo a cada dia mais?

Demos a volta no quarteirão, encontramos uma portinha discreta e a chave serviu perfeitamente. Segurando minha mão, fomos pelo escuro dando voltas por corredores longos, passando por salas trancadas, pequenos balcões e pequenas estátuas decorativas. Foi gostoso se perder pela biblioteca no escuro na parte onde não era permitida a entrada de estranhos. Mais que isso, era bom voltar a me perder com alguém que se importava comigo.

Como eu podia ter dito que ninguém se importava comigo? Felipe se importava mais do que devia, Pam também gostava de mim, Annabeth e Percy, Grover... Podiam nos ser os laços que eu queria (pai, mãe, e um amor), mas eles eram incríveis do jeito que eram, me amam do jeito que sou. Como posso me esconder dentro de mim quando eles só querem me ajudar?

Paramos em uma estante de livros ao canto, onde havia mesinhas de estudo. Felipe se sentou em uma cadeira a minha frente e eu sobre a mesa. Alisei a capa de um livro, me perdendo na textura e fechando os olhos. Ele me aguardava pacientemente, como se soubesse que era difícil para mim.

–Sabe, eu nunca consegui confiar em ninguém. Ninguém parecia ser capaz de me entender, proteger, me amar. Todos me decepcionavam de alguma forma... Até eu mesma. Nunca consegui me abrir com ninguém... Percebe o quanto isso está sendo difícil pra mim?

Eu abri os olhos; o contorno de seu corpo parecia murchar como se doesse nele essa minha desconfiança do mundo, esse meu medo de pessoas.

–Thalia, como eu posso te ajudar a confiar em mim? Como eu posso... – ele chorava.

–Me ouvindo. Se eu não confiasse em você não teria ligado, não estaria aqui. – tomei fôlego e segurei suas mãos prendendo-o a mim – Eu preciso que escute, que não fale nada. Eu vou te contar tudo, absolutamente tudo o que você pode saber sobre mim. Mas preciso começar do princípio... E saiba que ele é doloroso pra mim.

[...]

Felipe chorava.

Eu chorava.

O sol já brilhava do lado de fora. Estávamos a horas ali dentro; ele em silêncio e eu contando minha vida inteira, minhas dúvidas, medos, desconfianças. Foi cruel contar sobre Luke porque ele havia sido a melhor parte do meu passado. Contar a chegada da pequena Annabeth me apertou o nó na garganta. Havia uma promessa embutida naquele fragmente de lembrança. A cada lembrança eu parava para explicar como funcionava isso e aquilo em um semideus: os sonhos, o Néctar, a Ambrosia, nossos talentos individuais, problemas com os pais... Só parei de falar no instante em que meus pensamentos chegaram até a Colina Meio-Sangue. Contei como eu joguei Luke colina abaixo depois de um último beijo... E contei quando supostamente morri.

–Ah, Thalia! – ele me abraçou fortemente como se nunca fosse me soltar, como se fosse me proteger do mundo inteiro.

–Hey! Vocês! – não deu nem tempo de raciocinar; nós dois corríamos para longe da voz que nos seguia gritando sem parar. Começamos a rir sem parar. Os rostos ainda banhados em lágrimas, mas aquilo era legal demais para não rir.

–Ali, na janela! – a janela aberta era do primeiro andar. Pulamos e corremos para o meio da rua. Buzinas e gritos de motoristas só nos fizeram rir mais. Paramos de correr seis quadras depois. E o silêncio voltou.

–Então você está morta?

–Não. Eu não chegueia morrer; meu pai não deixou. Meu corpo se transformou em um pinheiro e ele, ah, me prendeu ali.

–Te prendeu!?

–O espirito. Era um jeito de eu não voltar para Hades... – fiz uma pausa olhando para a frente enquanto um vento me jogava os cabelos – Fui eu quem deu a vida pelos outros, mas foi Luke quem morreu. Annabeth perdeu o que restava da sua inocência e Grover perdeu toda a confiança.

Sentamos na grama verde de um parquinho qualquer. Ele me olhava como se quisesse me afastar de todas as lembranças ruins.

–... Ele despejou o veneno em mim – apertei a mão sobre o camafeu, onde Luke despejara o veneno – Eu gritava, chorava, pedia que parace... Ele não me ouvia, não me via... Quando me viu e tentou vir até mim, eu não deixei. Aquela expressão, sabe, “chorar rios” nunca tinha feito tanto sentido...

Continuei contando tudo. A chegada ao internato, a noite na boate, meu medo de perdê-lo para Lâmia. Contei como entrei na Caçada e como não pude falar com ele. Contei da culpa que eu sentia por toda aquela guerra, toda aquela confusão. E me senti distante enquanto falava sobre o incidente com o gelo...

–Você... Você tem certeza de que o Luke está morto? Digo, o menino que você conheceu? – ele perguntou lentamente; a expressão pensativa em seu rosto me era estranha.

–Sim... Não! – limpei o rosto nas costas da mão – Eu não sei. Quando tenho certeza de que sim, algo acontece e eu o vejo por poucos segundos ainda lutando para viver e... Depois some. – um pequeno pássarinho passou voando ao nosso lado – Sabe, foi como... – meus olhos fixos na avezinha sobre uma flor - Ele desperdiçou meu mel; devagarzinho, indo de flor em flor... – Felipe olhava de mim para o animal, compreendendo aos poucos minha comparação – Entre os meus inimigos, Luke é como um beija-flor.

Como o pássaro, Luke era lindo e arrancava um sorriso sincero fácil. Mas ele seguia de flor em flor, menina em menina, me deixando sangrar sozinha por alguém indomável. A cada pesadelo em que eu o via com uma nova garota, meu amor parecia acabar. Ele sugou-o devagarzinho até quase acabar...

Felipe acendeu um cigarro, tragou e me ofereceu. A fumaça saindo da minha boca me dava uma estranha satisfação.

–Você o ama?

Traguei outra vez.

–Thalia! – ele sorria de lado – Você o ama, sabia? Tenho certeza de que sim. – ele falava encantado como se tudo fosse maravilhoso – Não foi só uma desilusão amorosa, um primeiro amor. Eu sei o quanto eles doem, mas um coração partido por amor, um verdadeiro amor... Thalia, sei que nunca teve exemplos, acesso a uma inforção dessas, mas... Pense na dor da sua mãe.

Certo; ela chorava toda noite, fumava, bebia... E daí? O que ela tinha a ver comigo?

–Você anda fazendo o mesmo que ela... – abri a boca para reclamar, mas ele não permitiu – Claro que a sua dor é mais forte. Sabe... – ele parou como se refletisse; tragou outra vez e me entregou o cigarro – Acho que ele não te esqueceu.

E me contou o modo como ele havia sido torturado. Minhas mãos cobriram a boca. Como Luke havia sido capaz de tudo isso?

–Para! Por favor, Felipe, para!

–Você não percebe?

–Não. Eu não percebo nada! Nem quero perceber... – ele me empurrou contra a grama.

–Você parece que gosta de sofre... – o menino comentou com raiva.

–Eu não gosto. Só é a única sensação que eu conheço e que não me decepciona, que é exatamente o que eu penso dela...

Felipe suspirou exausto. Me ocorreu que eu tinha lhe tirado parte do sono e que lhe roubara uma manhã de aula.

–Sei que fará o certo, Thalia. Você sempre faz... Mas... Leve em conta o que sente, o que você quer... Talvez essa guerra não tenha a ver apenas com o futuro. Passado e presente são fundamentais...

–Mas a profecia não pode mais ser minha...

–Eu penso de um jeito diferente – já deitados eu fechei meus olhos, cansada e com a cabeça latejando – Penso que todos vocês tem um papel nessa profecia... Ninguém vai sair imune.

–Por quê?

–Você mesma me disse: as Parcas são cruéis.

LUKE

–Francamente, Luke – sua voz expressava irritação – Eu não acredito que você achou que roubar aquela moto era uma boa idéia.

–Bom, pelo menos, eu consegui um jeito de nos tirar daquela cidadezinha horrível...

–E conseguiu acabar com as nossas chances de ir mais longe! – a moto estava ali quebrada; havíamos batido em uma árvore no instante em que a gasolina acabou e eu perdi o controle. Estávamos um pouco ralados, mas nada anormal. Ela discutia comigo, porque ainda não estávamos longe o bastante da sua casa...

–Dá pra parar de reclamar? – gritei – Você não precisa ser tão chata...

–Preciso! Se ser chata significa ser responsável, eu preciso e vou ser chata.

–Pare de bancar a menina madura – disse com desprezo; nunca apreciei crianças que queriam crescer antes da hora.

–Pare de bancar o infantil. Você já não é mais uma criança. Tem 14 anos, devia ser mais prudente – ela disse com raiva, os olhos faíscando. Isso me intimidou, mas eu não podia demonstrar.

–Agora eu sei porque sua mãe te trancava longe de tudo; menininha grosseira!

Me arrependi do que disse assim falei. Thalia prendeu o fôlego, cerrou o maxilar, cravou as unhas na palma da mão. O olhos cintilaram em lágrimas. Ela virou e começou a se afastar de mim. Foi como ver tudo desmoronar. Por que estávamos brigando? Corri até ela... Eu não podia deixá-la ir. Não podia perdê-la.

–Thalia – eu gritava enquanto nós dois corríamos – Thalia, espera! – e ela corria mais – Por favor!

Consegui segurá-la. Ela olhava sempre para baixo, nunca encarava meus olhos. Levei minhas mãos para seu rosto e seu pescoço, quebrando a nossa distância assim. Seus olhos estavam avermelhados, mas o rosto seco. Thalia vivia me surpreendendo nas 12 horas em que havíamos estado juntos.

–Me perdoa. Por favor, me perdoa, Lia – eu quase chorava, mas segurava as lágrimas como ela – Eu não quiz dizer aquilo. Você não está bancando a menina madura, você é madura, responsável, misteriosa e linda... – senti meu rosto corar enquanto ainda prendia lágrimas, mas não me importei porque era verdade – Você não é grossa... Você tem medo de se machucar... Eu não quero te machucar!

Seus braços envolveram meu pescoço, sua cabeça descançava em meu ombro e ficamos assim, abraçados, por minutos.

–Eu nunca quiz te machucar... Nunca quiz dizer... – eu não parava de me culpar, até Thalia apertar mais o abraço...

–Eu sei – seus dedinhos percorriam meus cabelos me arrepiando – Eu.. Eu não quiz ser tão chata, também...

–Você nunca será chata, minha Lia.

–Sua? – ela tinha as bochechas rosadas... Tão linda e inocênte...

–É. Minha Thalia. E Eu serei o seu Luke.

–Promete?

–Prometo. E você?

–Eu também prometo!

[...]

–Mais força – rosnei para os dois meio-sangues que lutavam a minha frente – Mais força, imbecís!

Alan se jogou em uma cadeira ao meu lado. Que ótimo!

–Você perdeu a maior festança! Não te encontramos de manhã; você tava onde?

–Preciso de babá agora? – eu ri com escárnio – Você talvez esteja interessado em novidades, não? Pois não direi! – e ri da sua decepção – Treine esses otários antes que eu perca a paciência e mate ambos.

–Claro, chefe.

Precisava fazer alguma coisa. Precisava dar um jeito na bagunça que havia se tornado tudo isso. Toda essa responsabilidade, essa liderança, essa guerra... Eu não aguentava... Eu precisava... Precisava parar de sonhar e... Fugir.

THALIA

Cada caçadora seguiu por um lado, cada rosto pensativo, cada coração ansioso por uma nova batalha. Eu me sentia tão leve quanto pesada. Desabafar com Felipe havia sido magnífico, mas também medonho. Ele também havia me dado algo em que pensar. Luke podia ainda sentir algo verdadeiro por mim, não podia?

Eu realmente apreciava esses momentos em que nos separávamos apenas para andar. Era como se livrar de um peso e seguir livre. Parei encostada a uma árvore sem qualquer folha coberta apenas de pequenas e lindas flores brancas. O chão também estava marcado por flores derrubadas pelo vento. A madrugada avançava e o luar parecia refletir apenas naquela árvore. Era lindo e misterioso já que a mata era fechada por onde eu segui.

Podia ter ficado horas ali sentada no chão pensado em nada enquanto pequenas flores caiam... Mas a ponta de uma espada em minha garganta me fez abrir os olhos. Lá estava os cabelos cor de areia, os olhos pálidos e azuis, a cicatriz no rosto. Ali estava meu beija-flor, um dos meus piores inimigos.


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Notas finais do capítulo

* Alguns trechos do cap foram tirados da música do Cazuza [mesmo nome do cap]
Eu já tenho o próximo cap pronto, mas vou postá-lo ou sexta a noite ou no sábado, ok? Não adianta pedir para postar antes.
Até logo ;)