THALIA

Depois daquela noite na casa de May Castellan, Luke nunca mais foi o mesmo. Passamos por dias difíceis e por lutas dolorosas. A cada noite um beco escuro... Um monstro... Uma noite inquieta. Nossa proteção já não existia mais. Luke não tomava cuidado com suas atitudes e tão pouco demonstrava mais amor e carinho. Todos os sinais de compreensão haviam fugido do seu rosto. É... Foram dias difíceis.

Annie, Luke e eu estávamos muito mais magros e cheios de machucados. Já não tínhamos mais néctar nem ambrosia. E tão pouco, tínhamos o que comer. Os dias eram até agradáveis nas poucas vezes em que sentíamos o sol na pele... As noites, por outro lado, eram preocupantes, frias.

Eu temia pela saúde da pequena Annabeth.  A menina ficava exposta a ventos gélidos, há dias não comia e quase nunca via a luz do sol... Mas todos nós estávamos assim: pálidos e fracos. Continuamos a percorrer o país construindo esconderijos por onde passávamos... Quase não trocávamos palavras e principalmente sorrisos.

Nossa vida havia se tornado triste. Vivíamos apenas por viver, embora a vontade de continuar fosse já mínima.  Enquanto o mundo fisicamente era frio, emocionalmente era gelado.

Em uma noite particularmente fria, consegui, com o pouco de força que me restava, afastar os ventos da pequena loira que dormia profundamente. Luke e eu estávamos acordados. Ele faria a primeira vigia e eu estava simplesmente sem sono.

- Você devia dormir um pouco. – Luke fala de um modo até seco.

- Você precisa dormir muito mais do que eu. – retruquei de forma fria.

Fez-se um minuto de silencio enquanto nossos olhares se cruzavam e se perdiam em tonalidades diferentes de azuis.

- Você não costumava ser fria – ele disse em um sussurro tão baixo que meus ouvidos quase não detectaram ruído algum.

 Seus olhos estavam magoados, mas nem por isso deixei de soar firme.

- E você costumava ser responsável, dócil e sorridente.

-Chegamos então à conclusão de que nós dois mudamos muito.

Seus olhos ficaram frios e seu rosto inexpressivo após afirmar nossas mudanças.

- Você não faz idéia do que é sentir o que sinto Thalia – Luke se segurava ao maximo para não gritar. Ele rosnou as palavras como se precisasse há muito tempo colocá-las para fora – Ser forte em uma situação como a minha é difícil de superar!

A essa altura ambos estávamos de pé, longe da pequena Annabeth, para que ela tivesse um sono tranquilo.

-Tem razão. Eu não entendo... Cresci sozinha com uma “mãe” bêbada que estaria muito mais feliz se eu tivesse morrido após o parto. Cresci com um padrasto que sempre que se frustrava com algo me agredia física e emocionalmente. Fora as tentativas de estupro! – coloquei palavras para fora, assim como ele, que a muito precisavam sair. – Nem ao menos vi o meu pai. Nem uma única vez! – eu tinha plena consciência de que meus olhos estavam marejados, como toda vez em que minha família me vinha à mente.

- Thalia, eu... – Luke mudou seu tom de voz e sua expressão voltou a ser aquela preocupada comigo (aquela que eu tanto amava).

-Você deveria ser grato! Por mais que sua mãe seja estranha ou sei lá o que, ela te ama! Te ama, Luke! E seu pai pode, e com certeza, não é o melhor pai do mundo, mas você ao menos o viu e pode dizer a ele tudo o que sente e pensa. Eu nunca tive essa chance.

- Tha... – ele novamente começou a me interromper, mas eu tinha que colocar tudo para fora.

- Não Luke. É a minha fez de falar. E faz tempo que você não escuta.

- Você fala como se fosse fácil, mas isso DÓI! – Luke gritou colocando seus sentimentos pra fora.

-Eu sei que dói, mas você vai ter que ser forte por mim, pela Annie e por você mesmo! Vai doer, mas você vai resistir... Nenhuma vida existe sem problemas... Principalmente a nossa. – gritei assim como ele pondo a dor para fora.

Uma lágrima involuntária escorreu pelo meu rosto. Assim que ela caiu, em um reflexo rápido, enxuguei-a. Nunca deixei ninguém me ver chorar e não seria agora que eu mudaria as coisas.

- Posso não saber muito o que você sente,mas entendo um pouco com certeza.

Um silêncio se estabeleceu entre nós... Estava escuro demais para que eu pudesse interpretar qualquer feição em seu rosto.

- Thalia eu... Desculpe-me... Eu... – Luke sussurrava entre soluços

-Claro que eu desculpo. Durma. Eu faço a primeira vigia, você precisa dormir mais que eu.

Luke voltou para a escuridão onde Annie descansava. Assim que ele sumiu na escuridão, permiti que meu corpo caísse no chão e que as lágrimas caíssem... Estava começando a cansar de ser forte o tempo todo.