Já estava anoitecendo quando eu e Nicolas chegamos à casa de Paulo. Era uma residência que deveria ser bonita a uns cinco anos atrás, mas agora estava velha e gasta, com paredes de madeira manchadas de tinta azul. Tinha um jardim com rosas e jasmins, que estavam morrendo aos poucos devido à falta de umidade no ar. A porta de vidro era a única parte da casa que não parecia ter morrido com o tempo, pois ainda estava com o vidro polido e tinha detalhes dourados nas bordas. Nicolas e eu nos dirigimos até ela, mas paramos na sua frente.

Nicolas me olhou, como se dissesse "temos mesmo que entrar aí?". Eu o repreendi com um olhar severo e fitei a porta por alguns instantes. Eu não conseguia ver muita coisa no lado de dentro da casa, já que a porta estava coberta por uma cortina. Depois de algum tempo, tomei coragem e bati na porta. Um minuto se passou e ninguém atendeu, então eu bati de novo. Novamente, não obtive resposta. Tentei uma terceira vez, mas ninguém veio novamente.

"Talvez o endereço esteja errado." Disse Nicolas com um olhar esperançoso.

"É. Talvez devêssemos ir..." Fui interrompido pelo barulho da maçaneta girando, e pude ver a porta se abrindo lentamente, mas ninguém se encontrava atrás dela. A casa estava escura, então tudo o que pude distinguir foram alguns poucos móveis e uma escada no centro da sala. "Oi?" Gritei para o escuro, mas não obtive resposta. "Tem alguém ai?" Perguntei e, relutante, dei um passo para dentro da casa.

No momento em que entrei, senti uma forte pancada atrás da minha cabeça e caí no chão. Não sei por quanto tempo fiquei desmaiado, mas quando acordei já era noite. Nicolas estava ao meu lado e, ao me ver acordar, esboçou um grande sorriso.

"Até que enfim. Já estávamos preocupados com você."

"Como assim estávamos?" Só então percebi a figura magrela atrás de Nicolas com um sorriso nervoso. Olhei para os lados, eu estava no chão de um quarto. Reconheci o local imediatamente, pois era onde o vídeo tinha sido gravado. O quarto não era muito grande e nem muito amigável, tinha paredes azuis descascando e com estranhos símbolos pintados em tinta vermelha. Espere, não era tinta, era sangue. A única cama no recinto estava destruída e havia uma bancada com um computador e uma cadeira ao lado da porta.

Tentei me levantar, mas minha visão ficou turva e me deitei novamente. Toquei o local em que fui atingido, e tinha um galo enorme nele. Voltei-me para a figura loira com um olhar interrogativo, mas ela parecia muito nervosa no momento para dizer alguma coisa.

"O que me acertou na cabeça?" Perguntei após ter conseguido me sentar.

"Me desculpe." Disse o garoto loiro. "Achei que você fosse um deles." Olhou para os lados nervoso.

Olhei para Nicolas curioso, mas ele parecia não entende também que eram "eles", então resolvi perguntar. "Como assim deles?".

"Dos demônios claro." Disse Paulo como se fosse óbvio. "Eles estão quase me pegando e, quando conseguirem..." Ele começou a chorar.

Dei um suspiro. Sabia que ele estava passando por uma coisa difícil, mas também sabia que precisávamos dele, então ele teria que ser forte e nos dizer tudo. Sendo assim, segurei seus ombros e olhei no fundo de seus olhos. "Olha, sei que isso é triste, mas podemos ajudá-lo." Ele me fitou. "Nós sabemos de sua maldição e estamos tentando pará-la, mas precisamos de sua ajuda. Nos conte tudo o que sabe."

Finalmente ele tinha conseguido parar de chorar, e agora me olhava com um olhar esperançoso. "Como vocês sabem disso? Olha, tudo o que eu sei é que eu nunca devia ter ido naquele casarão." De repente, um pequeno barulho de unhas o fez parar. "Eles estão perto".

Nicolas tinha perdido a paciência. Se levantou e agarrou Paulo pela blusa. "Como assim perto? Como paramos a maldição? O que aconteceu exatamente no casarão? Contra o que estamos lutando?"

Paulo agora estava desesperado. Se levantou e começou a desenhar símbolos na parede. "Eles estão chegando, e sabem que vocês estão aqui. Para parar a maldição, vocês devem fazer um sacrifício."

"Como assim sacrifício?" Perguntei desesperado me levantando. "Não tem outro jeito?" Os barulhos de unhas começavam a ficar mais altos. Quando percebi, eles pareciam estar na porta do quarto. "Quem quer entrar aqui?" Vi Paulo se dirigir à janela e forçá-la.

"Ouçam, vocês tem que sair daqui, vão pela janela." Paulo fazia gestos frenéticos mostrando que devíamos ir logo. "Não me esperem. Vocês devem fazer um ritual, atraindo o demônio para um pentagrama e prendendo-o lá, mas tudo tem um preço."

"Mas, como assim um preço?" Perguntou Nicolas. "E como fazemos o ritual?"

"Tudo está em um diário nesse endereço." Disse Paulo entregando um papel amassado para mim. "Vocês devem ir até ele sozinhos e não podem mostrar o livro a ninguém. De repente a porta se abriu com um estrondo. "Chegaram." Disse Paulo, e, de repente, começou a gritar. Um corte se abriu em se ombro esquerdo, depois outro em seu peito. "Vão! Agora!" Outro corte apareceu em seu rosto. "E não confiem em ninguém, principalmente do cas..." A frase foi interrompida por outro grito. Agora a pele de Paulo estava sendo totalmente rasgada, e parte do ar se transformava em uma fumaça negra.

"Vamos João!" Disse Nicolas se encaminhando para a janela e me arrastando pelo braço. "Temos que sair daqui, ou seremos os próximos." Dizendo isso, ele pulou a janela e caiu dois metro abaixo.

Quando ia pular, dei uma última olhada para trás, e vi o corpo de Paulo começar a secar. Ele estava sendo sugado! Vi uma lágrima sair de seu rosto já desfigurado pelos arranhões, e também vi seus lábios se moverem dizendo uma única palavra: fuja!

Então, pulei a janela e corri atrás de Nicolas. Não arrisquei olhar novamente para trás, pois tenho certeza de que pararia e tentaria ajudar. Não pude ver o rosto de Nicolas, mas sabia que estava tão triste e perturbado quanto eu.