Estava um dia bonito; o sol brilhava alto no céu limpo com poucas nuvens e apenas uma leve brisa se podia fazer sentir.

         Yuuki caminhava distraidamente pelas ruas da cidade, sem saber muito bem onde estava nem para onde ia; a sua mente estava bem longe dali, demasiado ocupada com pensamentos confusos sobre sentimentos incertos.

         Passou por uma loja já sua conhecida e olhou para a televisão que se encontrava na montra com uma anormal falta de interesse. Estava a dar o programa do seu ídolo, Nyanmaru, mas não parou para ver, e isso, definitivamente, não era normal, e para quem o conhecesse seria preocupante.

         Não conseguia parar de pensar na última luta contra o Primeiro. Aquela luta onde mais uma vez todos os Code Breakers estavam reunidos para proteger Sakura do ex-code 1, Hitomi.

         Mas não era bem na luta que ele pensava, e sim na forma como fora protegido por ninguém mais ninguém menos que o Sexto, Ogami Rei!

//Flashback On//

         A luta já durava há algum tempo, e todos já estavam exaustos. Todos menos Hitomi, que continuava impassível sem qualquer sinal de cansaço. Olhava-os de cima de um telhado como se eles fossem insignificantes, apenas pedras no seu caminho que precisavam de ser eliminadas.

         Yuuki era o que estava mais perto do Primeiro, sabia que não poderia continuar a atacar, caso contrário era certo que entraria em modo Lost, mas não queria dar parte fraca. Agarrava-se ao seu ombro direito ferido e ofegava, tentando levantar-se, quando de repente se sentiu a ser observado. Arregalando os olhos olhou para cima encarando o seu atacante que o olhava com malicia enquanto uma bola de eletricidade começava a formar-se à sua frente, pronta a ser lançada.

         Porque o atacava apenas a ele, assim tão de repente? Talvez porque fosse quem estivesse mais perto?

         O ataque foi lançado, e Yuuki não se conseguia mexer. O seu corpo não respondia aos seus instintos.

         - Yuuki! – Ouviu algumas vozes gritarem o seu nome, e de repente alguém se colocou à sua frente protegendo-o do ataque. – Ogami! – As mesmas vozes gritavam o nome do Sexto.

         O ruivo sentiu um corpo cair sobre o seu e automaticamente, ignorando a dor do seu ombro, abraçou-o. Olhou para o rosto inconsciente do moreno sobre si e tremeu interiormente. Sentiu uma das suas mãos molhadas e foi quando a levantou e viu que era sangue que a sua mente pareceu estalar e o medo começou a corroê-lo por dentro. No entanto isso não o impediu de olhar para o ex-code 1 com raiva, apesar de o receio também lá estar.

         - Patético. – Hitomi cuspiu com escárnio. – Por hoje vou deixar-vos em paz, isto já não é divertido. – E, do nada, desapareceu.

         Rapidamente todos os outros rodearam Ogami e Yuuki visivelmente preocupados com o estado de ambos.

         - Sexto… - Yuuki sussurrou para si próprio, não conseguindo evitar o sentimento de culpa que começava a tomar conta de si.

//Flashback Off//

         Já tinham passado três dias desde então. Ogami acabou por ficar bem, o ferimento fora tratado rapidamente, por isso ele não perdera muito sangue, o que era bom.

         O problema era que Yuuki não sabia como iria encarar o Sexto na próxima vez que o visse. Não só porque se sentia culpado pelo que acontecera, como também porque não conseguia entender qual seria a possível razão para ele o ter protegido quando mais ninguém tinha movido um músculo para o fazer apesar de estarem todos preocupados.

         Não sabia se Ogami o considerava a si e aos outros amigos ou apenas “colegas de trabalho”, mas mesmo que os considera-se amigos era estranho arriscar-se daquela maneira por si, sobretudo quando nunca o fizera com mais ninguém, pelo menos não daquela maneira tão precipitada e imprudente. Ou então era Yuuki que não sabia como aquilo a que chamavam amizade funcionava, pois nunca tivera alguém a quem pudesse verdadeiramente chamar de amigo. Nunca tivera ninguém por quem estivesse disposto a dar a sua vida.

         De repente parou no meio da rua e arregalou os olhos. Dar a vida? Por alguém?

         Subitamente os seus ouvidos super sensíveis captaram o som de risadas e vozes conhecidas. Apressou-se então a esconder-se num beco ali perto e pouco tempo depois pôde ver Sakura, Ogami e Toki a passar por si sem o notar. Caminhavam juntos e Sakura parecia bastante animada enquanto tagarelava com o loiro, o qual lhe dáva toda a sua atenção de bom grado. Ao passo que Ogami mantinha-se em silêncio, parecendo estar com a mente noutro sítio.

         Inconscientemente Yuuki desejou poder saber o que ele estava a pensar.

         Esperou que eles se afastassem o suficiente e assim que teve a certeza de que não ia ser visto pelos outros três, saiu do seu esconderijo e dirigiu-se para um parque que sabia que havia ali perto. Precisava de um sítio sossegado para pensar.

*

         Acordou lentamente e olhou em volta procurando perceber onde estava. Quando finalmente a sua mente grogue pelo sono se elucidou e lembrou-se que se tinha sentado à sombra de uma árvore e no meio dos seus pensamentos acabara por adormecer ali mesmo.

         O dia já estava a chegar ao fim, o sol já se estava a esconder e a dar lugar à lua, e os candeeiros do parque já começavam a se acender.

         - Finalmente acordaste. – Uma voz pronunciou-se, e Yuuki tinha a certeza de que a conhecia.

         Olhou para a sua frente e viu uma sombra mover-se até ficar visível pela luz de um candeeiro que se encontrava ali perto.

         - S-sexto? – Gaguejou atordoado. – C-como… porque…

         - Eu vi-te. – Interrompeu-o. – Conseguiste passar despercebido pelo Toki e pela Sakurakouji, mas não por mim. – Aproximou-se lentamente e agachou-se à frente do ruivo, olhando-o. – Algum problema Yuuki? – Perguntou preocupadamente.

         Yuuki sentiu-se estremecer diante da preocupação que o moreno demonstrava para consigo. – P-porque haveria um problema?

         - A partir do momento em que tentas evitar os teus amigos, então é porque há um problema. Nem que seja só na tua cabeça. – E sorriu levemente.

         Sentiu-se corar diante daquilo. Não conseguia lembrar-se da última vez que o vira sorrir, por mais ínfimo que o sorriso fosse. – Não é nada, sou só eu e os meus pensamentos. – E levantou-se desconcertado, levando o outro a fazer o mesmo. E de repente viu-se preso entre a árvore e o corpo do maior que apoiava ambas as mãos de cada lado da sua cabeça.

         - Espero que saibas que podes contar comigo. – Disse suavemente, pegando-lhe no queixo com uma mão para evitar que ele desvia-se os olhos dos seus. – Para tudo. – Concluiu.

         - H-hai! – Respondeu, estremecendo internamente perante o olhar penetrante do moreno.

         Ogami olhou-o por mais alguns segundos, até suspirar e aproximar o seu rosto do dele lentamente. Hesitou um pouco, dando-lhe espaço para recusar o avanço, e assim que constatou que nada acontecia não hesitou mais em colar os seus lábios aos dele num beijo singelo e calmo.

         Yuuki arregalou os olhos ao sentir o contacto tão simples, mas ao mesmo tempo tão significativo. A sua mente ficou em branco, sem saber muito bem no que pensar ou a que se agarrar. E quando finalmente tomou consciência das suas ações deu por si a corresponder ao ato, fechando os olhos e agarrando-se ao casaco do outro ao sentir as suas pernas fraquejarem.

         No entanto, o beijo não demorou muito e longos segundos depois já Ogami se afastava encarando novamente os olhos vermelhos e brilhantes que se abriam lentamente e inocentemente de volta para si.

         - Vou-te deixar com os teus pensamentos. – Sorriu novamente, afagando-lhe os cabelos igualmente vermelhos antes de virar costas e distanciar-se na direção contrária. – Quando chegares a alguma conclusão, procura-me. – Acenou brevemente sem parar de andar.

         Yuuki observou-o absorto até ele desaparecer do seu campo de visão. Levou uma mão aos lábios e deixou-se escorregar pelo tronco da árvore até estar novamente sentado.

         A sua mente processava tudo muito lentamente e, na sua confusão, não sabia nem o que pensar sobre o que acabara de acontecer nem o que deveria fazer a seguir.

         No entanto, o seu coração que pulava freneticamente dentro do seu peito parecia saber, só faltava o seu dono dar-se conta disso.

Owari!