O guarda-chuva vermelho com sutis detalhes em dourado na ponta, os cabelos platinados e levemente curtos, os olhos de um belo tom âmbar, a personalidade despreocupada - e até um tanto irresponsável - e a sabedoria e o poder correspondentes ao seu cargo como Rei Prata, o primeiro dos sete reis. Essa seria uma praticamente perfeita descrição de meu segundo e atual mestre, Isana Yashiro.

Mesmo Adolf K. Weismann sendo seu nome original, quando este ainda estava em seu verdadeiro corpo, antes de ser enganado pelo Rei Incolor, ele aderiu ao seu novo nome e à sua nova vida de uma maneira tão despreocupada, sem sequer pensar na vida que abandonava com o ato, que chega a ser inacreditável. Ele sempre fora uma pessoa surpreendente.

Weismann dominou os céus por décadas, sendo visto até mesmo como um Deus por alguns civis, mas foi expulso de seu trono pelo malévolo Rei Incolor, que eu, Yatogami Kuroh, deveria ter matado, por ordem de meu antigo e já falecido mestre, o sétimo rei Ichigen Miwa, que me mandara, numa última ordem, julgar o Rei Incolor que o sucederia; ordem que, por causa de ações externas, não pude cumprir. Mas o Rei maligno está morto e penso que isso já é, de certa forma, satisfatório.

Bem. Voltando à minha linha de raciocínio inicial...

 Meu primeiro encontro com Shiro... Digo, com o meu atual mestre, Isana Yashiro, foi durante minha busca pelo malévolo Rei Incolor, o coringa dos sete reis e o culpado por tudo que se sucedeu ao Rei Prata. Meu mestre fora inclusive acusado de assassinato, sendo ele, na verdade, uma pessoa que poderia facilmente ser considerada bondosa.

Porém, seria hipocrisia minha se eu afirmasse que nunca suspeitei do jovem, e isso me fez recordar mais uma importante característica sua.

Outra verdade sobre Isana Yashiro é que ele sempre fora um grande mentiroso. Eu poderia inclusive citar que essa seria a parte de sua personalidade mais marcante, provavelmente pelo incontável número de mentiras que ele me contara em um espaço tão curto de tempo. Por isso, não fui capaz de aceitar a sua insistência, sempre dizendo ser inocente.

Hoje eu posso afirmar que certamente preferia ter acreditado nele. Talvez se eu não fosse tão teimoso, Neko, minha única companheira do clã Prata, e eu não estaríamos em nossa atual situação: sozinhos, esperando a volta de nosso mestre desaparecido. Afinal não é como se ele se sacrificara durante sua luta contra o Rei Incolor. Não é como se ele houvesse morrido! Ele é, além de tudo, o Rei Imortal, sendo assim ele não deve sequer ser capaz de morrer, mesmo que queira! Ele está fadado a uma vida eterna, e a assistir a morte das pessoas próximas a si; esse é o triste destino de meu mestre.

Por isso, em minha teimosia, digo que ele está vivo, mesmo que, no fundo, eu admita não ter realmente tantas esperanças quanto a jovem strain, que deposita em nosso mestre toda a sua esperança. Ela realmente o aguarda, pacientemente, como um bom vassalo devia fazer.

E assim já faz três anos que esperamos o seu retorno, numa incansável espera, e da qual não sei, ao certo, o que pensar, pois se em minha parte realista eu já aceitei a sua morte, a parte emotiva anseia pela sua volta. E talvez eu seja mais emotivo do que eu sempre supus ser, senão o que explicariam as finas lágrimas que se acumulam, vez ou outra, nos cantos de meus olhos acinzentados?

Provavelmente seja, mais uma vez, a minha teimosia, não querendo ter que aceitar o fato de que perdi mais uma pessoa importante para mim. Talvez se eu fosse mais sincero, eu admitiria de uma vez meus pensamentos, os aceitaria. Contudo, não importa realmente o que eu acho, e muito menos os meus desejos egoístas. Como vassalo do clã Prata, o esperarei, afinal ele é meu senhor e devo cumprimentá-lo quando ele se apresentar perante nós novamente.

E quando ele voltar, eu não o deixarei agir sozinho; não mais. Afinal ele é despreocupado demais com as consequências de seus próprios atos e alguém precisa ficar atento a toda essa irresponsabilidade, e acredito ser a pessoa ideal para esse tipo de serviço.

Por isso, Shiro, volte logo.

Volte para o nosso lado, que é o seu lugar. Não se esqueça, nunca, que estamos o esperando, nosso rei.

Ansiamos para que você ilumine mais uma vez as nossas vidas com seu brilho platinado, que apenas você tem. Chega a ser, inclusive, uma necessidade no momento.

Nossas vidas nunca se encontraram tão descoloridas.

Não demore em voltar, mestre. 

“A cortina desce no instante em que uma pessoa desiste.” (Ichigen Miwa)