Alice acordou apenas no dia seguinte, toda aquela confusão a deixara exausta (sem contar que ficou à beira da morte), depois de descobrir que tudo se resumia a ela mesma. Toda a sua imensa imaginação chegou ao ponto de criar uma outra Alice, intitulada Sarah, que virou o pesadelo do País das Maravilhas.

Abriu os olhos e olhou ao redor do quarto onde estava, deduzindo estar sozinha. Alice sentiu a cabeça latejar quando tentou levantar-se. Então pôs a mão na cabeça e saiu da cama lentamente, notando a fome tomar conta dela.

Não sabia como, mas Alice conseguiu chegar a sala de jantar sozinha. Ela apenas se tocou que haveria um interrogatório quando viu o olhar de todos ali presentes sobre ela.

O Chapeleiro levantou-se rapidamente da cadeira onde estava sentado e foi até Alice, passando um braço ao redor dela, ajudando-a a se sentar.

- Está se sentindo melhor? – ele perguntou. Não sabia se estava ficando louca ou a voz dele parecia normal demais.

Alice anuiu com a cabeça.

- Está com fome, querida? – perguntou a Rainha Branca, seguindo uma careta logo após. – É claro que está. Não come desde ontem!

Alice não sabia que horas eram, então achou que fosse jantar, porém ainda era de manhã e foi lhe servido o café com tudo o que tinha direito. Alice pensou que nunca comeria tanto assim na vida, mas logo após terminar a refeição, viu que não tinha saída e estava na hora de contar tudo.

- Ela ameaçou matar todos vocês – começou Alice, fitando seu prato vazio. – Ela, ou eu... eu não sei mais...

- Você? – perguntou, confusa, a Rainha Branca.

- Sim. Sarah é uma personagem, digamos assim, que eu criei. Ela tem todas as características que eu sempre quis ter, por isso a invejava na escola e nunca gostei dela. O problema é que eu nunca percebi que eu era a única a vê-la.

"Quando ela apareceu aqui e vi que todos vocês também a viam, não tinha como pensar nessa possibilidade. Eu não estava ficando maluca. Mas desde o começo era isso e eu acabei arriscando a vida de vocês por isso."

Os segundos se arrastaram no silêncio que se formou. Todos os estavam muito pensativos.

- Eu estive investigando coisas que começam com a letra A... – começou o Chapeleiro, fazendo Alice abafar uma risada. Os olhos dele brilharam ao vê-la rir.

- Você nos deu o maior susto – disse a Rainha Branca, mostrando um sorriso aliviado que Alice retribuiu.

Alice sentia-se nova, apesar de ainda estar sofrendo o trauma do dia passado. O pior de ter matado Sarah foi que ela quase morreria também. Pelo menos nenhum dos seus amigos morreu. Alice chegou a conclusão de que fez a coisa certa.

Estava debruçada no parapeito do terraço quando o Chapeleiro parou ao seu lado. Aquele era um bom lugar para pensar.

- Olá.

Alice abriu um sorriso leve.

- Chapeleiro, que coisas você estava investigando com a letra A?

O Chapeleiro hesitou antes de falar.

- Ah... – ele pigarreou e então continuou. – Alegria... Alice... ahn... amor...

Imediatamente Alice corou, e teve a impressão de que ele também.

- Você gosta mesmo de mim, Chapeleiro?

- Ahn... acho que sim – e então abriu mais um dos seus sorrisos loucos.

Alice sorriu e olhou adiante, admirando a paisagem.

- Dessa vez você vai ficar, não vai?

Aquela pergunta pegou Alice de surpresa: como não tinha parado para pensar nisso? E agora? Ela tinha uma vida fora do País das Maravilhas que não seria mais arruinada por Sarah, mas seria a melhor escolha a se fazer? Voltar para a sua vida normal era o caminho certo?

Não sonhei com este lugar à toa, Alice disse para si mesma.

- Este é o meu lugar – Alice respondeu, segurando a mão dele. – É onde eu devo estar.

O Chapeleiro sorriu e a beijou novamente. Alice nunca se sentira tão bem em toda a sua vida. Deveria escolher o que a fazia bem, mesmo que não parecesse o certo a se fazer. Aquele lugar estava sempre ali, esperando por ela, esperando por uma escolha dela. Sem sua presença, nada teria graça.

O País das Maravilhas era sua verdadeira casa, que nunca deveria ser deixada para trás.