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Novamente atrasada! E tudo graças às minhas pernas! Parece que cada passo que dou é uma nova opurtunidade para elas perderem as forças ou bambolearem tanto que parecem com medo de algo. Bem, na verdade quem aqui está com medo não são as minhas pernas mas sim eu...

Mais um dia naquela construção grande a que os humanos chamam de escola, a ter que aturar brincadeiras que nem o meu irmão mais novo fazia! E por falar nele? Como é que ele estará? Já a muito tempo que não nos vemos, e tudo graças a esta maldição maluca que me deu aspeto de humana. Estas pernas compridas a qual difícilmente controlo, estes pêlos exageradamente grandes que trago na cabeça e que não perdem a opurtunidade de se prenderem em algum lado, as mãos ainda são uma novidade para mim, aquelas coisinhas para usar nos pés que não são nada confortáveis e estas... ah... roupas que eles usam também! No princípio era assim. Não gostava de nada, imbirrava com tudo o que me pediam para fazer mas como a minha mãe me ensinou que devemos sempre respeitar os mais velhos, desde que ganhei esta forma e um casal muito simpático me trouxe para casa deles, que eu os ajudo e fasso sempre o que eles me pedem. Entretando já lá vão oito anos desde que sou humana e dois anos desde que o casal que eu mencionei me adotou. Eu estava num or... orfa... orfa-coiso, não me lembro agora, aquele sitio para onde vão os humanos miniatura que não têm pais (apesar de eu ter pais...), e esse lugar não era aqui, era perto do meu habitat natural, mas o ano passado o casal teve que mudar-se e aqui estou eu! Pronta, ou talvez não tão pronta, para um novo dia na escola. Não sei para é que serve vir aqui, ouvir pessoas a falar todo o santo dia e quando as pessoas não estão a falar podemos sair, o chamado intrevalo, e eu subo a uma árvore qualquer à espera que o sino volte a tocar.

TRIIIIIIIIIIIIMMMMMMMMMMM!!!

– Ai meu Deus! Tenho que correr! - grito pois ainda me falta alguma distânicia para chegar à escola.

E lá vou eu! Entre tropeções e pontapés em coisas no meio do caminho, consigo chegar a tempo, antes do professor.

Bem, devem estar a perguntar-se: "Quem é esta criatura que está a falar?! Mais parece um bicho!". Ah pois é! Eu não me importo com essas perguntas uma vez que não sou mesmo humana. É que eu era um Lince, segundo os humanos sou uma espécie em vias de extinção que já só existe em algumas partes da Península Ibérica, e bastou eu, certo dia, afastar-me mais do mato cerrado, para começar a ser perseguida por um caçador. Quando tentei atacar para me defender, um raio caiu em cima de mim e quando voltei a acordar eu era isto! No mundo dos humanos sou considerada uma rapariga de 15 anos (e bonita por sinal...) com dotes para educação física. Eu chamo a isso habilidades de gato, ou melhor, de Lince, mas tenho que me habituar a isto, né?

– Bom dia - digo calmamente quando entro na sala de aula.

Ninguém me responde, mas também eu nem esperava resposta. A coisa que mais me incomoda quando eu digo bom dia é que todos ficam a olhar para mim enquanto me sento. Até o professor para de se mexer só para me ver passar. Que irritante! "Não têm mais nada para fazer?! Olhem que também não me apetecia vir!". Sento-me no meu lugar e olho em redor com um ar indifrente. Ainda estão todos a olhar?!

– Professor... a aula? - digo fazendo gestos com a mão para ele continuar.

– Ah! P-p-pois sim! V-v-vamos lá começar! - gagueja enquanto arruma os óculos na cara desageitadamente.

E é sempre assim o começo dos meus dias. Até já os professores têm estes comportamentos medrosos pero de mim. Ah! E como não podia deixar de ser, os rapazes mais velhos já inventaram alcunha para mim! "Gata Assanhada" é o nome que eu os oiço murmurar quando passo...

Eu sou indifrente a todos esses comportamentos estranhos de humanos, mas por vezes quase que não me consigo segurar e, meio que, fico mesmo assanhada, daí a alcunha que me deram. Apesar de tudo sou considerada boa aluna por estar atenta nas aulas mais vezes do que os outros alunos porque, por vezes, também gosto de ficar a olhar pela janela e imaginar a liberdade que me foi retirada. "Relâmpago estupido!!!"

–Leslie Gween.

Olho na direção da porta e vejo uma auxiliar a chamar-me sem saber ao certo quem sou.

– Sou eu! - respondo levantando-me para a mulher me ver melhor.

Ela fica um pouco nervosa mas depois diz:

– Os seus pais... ah... eles... estão lá em baixo e pedem para falar com a menina.

"Mas que mal lhes fiz eu para terem tanto medo de mim...?!" penso olhando para o professor.

– P-podes s-sair - e volta a arrumar os óculos na cara nervosamente.

– Obrigada professor.

Saio da sala seguida pela auxiliar. Paramos perto da entrada do edificio.

– Os teus pais estão perto do portão da escola - diz apontando nessa direção.

– Está bem. Obrigada.

Assim que me afasto um pouco mais do edificio começo a ver os meus pais humanos a virem na minha direção. Corro até eles e abraço-os. Estava com saudades porque quando acordei eles já tinham saido para ir trabalhar.

– Bom dia mamã! Bom dia papá! - digo dando um beijinho a cada um.

– Bom dia querida! Como estão a correr as aulas?

– Hum... dentro dos possíveis. Que querem? Deve ser algo importante para virem à escola a esta hora.

– Bem... - começa o pai - nóstivemos uma reunião hoje cedo com os nossos chefes como sabes.

– Sim sei disso.

– Então... - continua a mãe - disseram-nos que vamos ter de fazer uma viagem de trabalho que vai durar cerca de um mês, um mês e meio talvez...

– E quando é que partem?

– O nosso voo é daqui a duas horas.

– Temos de nos mudar outra vez?! - pergunto um pouco ansiosa.

– Era isso que queriamos falar contigo querida... - diz a mãe com incerteza no olhar.

– Achamos que já és grandinha e que consegues cuidar de ti durante este tempinho. O que achas? estás de acordo ou preferes vir connosco?

Reflito um pouco.

– Se vocês confiam em mim, posso tentar! - respondo a sorrir. - Além disso a avó mora mesmo ao lado e se eu precisar de ajuda ou alguma dica de certo que ela me apoia!

Ah! Esqueci-me de dizer. Também tenho uma avó. É uma senhora tão simpática como os meus pais adotivos e gosta muito de mim! Ela não é mãe de nenhum deles mas ela adora a minha companhia porque não gosta de estar sozinha, por isso habituei-me a chamar-lhe avó.

– Então está decidido assim! Nós prometemos voltar o mais rápido possível, ok?

– Está bem... Agora é melhor voltar para a aula!

Volto a dar um beijo a cada um e corro para a sala de aula enquanto lhes aceno. Quando entro ninguém percebe e ouvem-se um murmurios no ar.

– Aqueles são mesmo os pais da Gween?! São tão diferentes! Como é que é possível?!

– Tens razão! É mesmo estranho!

Alguns murmuram ao fundo da sala. Eu olho para eles com um olhar de "pretes a atacar" e eles engolem em seco. Sento-me no meu lugar e olho pela janela ainda a tempo de ver o carro partir. "Dois dos únicos humanos que eu gosto partiram agora, e pelo que aprendi sobre o tempo ainda vão demorar a voltar... Vou ter saudades..." penso triste. Ainda se ouvem alguns comentários e eu não gosto nada disso! Mas também... "São normais estes comentários intrometidos. O meu pai e a minha mãe adotivos têm os cabelos negros como o céu da noite e o meu cabelo é castanho, meio alaranjado, e os meus olhos também castanhos enquanto que os da minha mãe são azuis marinho e os do meus pai são cinza. São grandes diferenças e as pessoas percebem isso..."

***

Mais um dia de aulas que termina. Não sei para que serve! Quando eu era um Lince aprendiamos a caçar e a camuflarmo-nos na natureza, aqui aprendem-se números, letras e coisas do passado, presente e futuro. A única disciplina que me faz lembrar a minha ecência animal é Educação Física. Subimos, trepamos, rebolamos, pulamos... é bom e acho que muitos truques que aprendemos foram inspirados nos animais. Pelo menos é o que me pareceu.

Caminho sozinha até casa, entretida com os meus próprios passos e a pensar em tudo o que se passou nestes anos. "À tanto tempo que estou assim... será que ainda me lembro de como é ser Lince? E os outros? Lembro-me de que enquanto estava desacordada, depois de ser atingida pelo relâmpago, ouvi umas vozes que diziam que existiam mais como eu, que tinhamos de unir forças e completar uma boa ação para com um humano para podermos voltar ao normal. Que tenho de fazer afinal?! Não percebo nada!" penso confusa. Dou meia volta e começo a correr na direção de um mato ali perto. Chegando lá, passo agilmente pelas árvores e plantas, saltando e tentando fugir (em vão) dos pensamentos que atromentam desde sempre, sem saber ao certo para onde quero ir. Acabo por parar quando o meu corpo não aguenta mais. Encosto-me a uma árvore e deixo-me deslisar até ao chão.

– Tenho de pensar em algo... - digo com a respiração acelerada - Deve de haver algo que possa fazer para voltar ao normal...

Então lembro-me mais uma vez daquelas vozes. "Uma boa ação para com um humano?! ELES QUE TIREM O CAVALINHO DA CHUVA!!! Nem em outra vida eu o faria! Ser simpática para os humanos mais do que o razoável?! Eles matam animais todos os dias só para fazer roupa ou acessórios que nem vão usar, e NÓS É QUE TEMOS DE SER SIMPÁTICOS!!!"

– ISTO É O CÚMULO! NUNCAAAAAA!!! - grito colcando-me de pé e gritando aos céus de punhos cerrados.

– Calma... que mal te fiz eu para gritares assim?! - oiço uma voz reclamar, invulgarmente calma, do topo de uma árvores um pouco ao lado.

Olho nessa direção e vejo um rapaz de cabelos castanhos claros, um pouco desarrumados e pele pálida. O que me chama mais a atenção são os seus olhos castanos (lindos) que contrastam bem com a pele dele.

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Parece ser um pouco mais velho e... "COMO É QUE ELE CHEGOU ALI A CIMA?!?!?!". Ele desce com um salto, quase parecendo voar, e cai quase perto de mim.

– O que é que estás aqui a fazer? - pergunta calmamente chegando mais perto.

– Eu... eu.... eu.... vim correr um pouco! - respondo como se fosse normal uma rapariga andar a correr no meio do mato, aquelas horas, e com o uniforme escolar ainda vestido. Tirando também o fato de eu estar a gritar para o nada, né? - Quem és tu?

– Eu até pedia para também me responderes a essa pergunta, mas já te reconheci... - diz com um leve sorriso no rosto.

– Ai sim? - pergunto desinteressada.

"Ele ainda não me respondeu..." penso levemente irritada. Ele finge pensar um pouco e volta a olhar para mim respondendo:

– Já sei! És a Gata Assanhada não é?

"Agora já chega!"

– Gata Assanhada uma ova! Para já odeio esse nome ok?! Segundo, que eu saiba o meu nome é Leslie! Leslie Gween!!! - *Li versão vulcão em erupção!* - E outra! Ainda não respondeste à minha pergunta!!!

Ele fica meio assustado com a minha reação explosiva mas depois acaba por me responder... calmamente...

– Desculpa Leslie... É que... todos te chamam assim... Mas... bem... O meu nome é Dallan Greensleve... mas podes chamar-me Dal...

"Incrivél! Ele parece tão ou ainda mais assustado do que os outros quando fasso isto, porém, não se mexe! Parece que tem uma espécie de tique porque não pára quieto com a cabeça, sempre a olhar para os lados assustado, além de estar bastante atrapalhado nas frases... Hum..."

– Não faz mal. Já me abituei a esses comentários parvos... - respondo com um suspiro.

Dallan olha para baixo e deixa um pequeno sorriso timido, escapar. Por fim suspira também:

– Sei como é...

– Hum?! Como assim?

– Acabaste de conhecer o "Canário Medroso"...