Wonderland escrita por Dorothy Eaton


Capítulo 2
II.




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Não perdera mais que dez minutos da aula de poções, mas mais uma vez, seu cabelo estava arruinado. O coque desmanchara, e suas mechas caíam impiedosamente sobre seu rosto. Apesar disso, ela sorrira para o professor ao entrar na sala. Sorriso que não durara muito, ao perceber que a única pessoa que não tinha uma dupla era Draco Malfoy.

Como ele chegara ali tão rápido? Foi o que se perguntou enquanto fazia seu caminho até sua carteira. Talvez soubesse algum tipo de atalho, ou simplesmente tivesse pernas mais compridas. Não era muito alto, portanto a última opção não era muito provável.

"Conseguiu se equilibrar direito nas escadas, Granger?" ele perguntou, fazendo graça. Hermione só levantou as sobrancelhas, como quem dizia que não lhe daria uma resposta. "Bem, estamos trabalhando com a poção polissuco. Slughorn disse-nos que já começou a prepará-la faz um mês." ele disse a guisa de explicação. "Você deve saber terminá-la melhor que eu." disse, apontando a mesa. "Fique à vontade."

"Não vou fazer tudo sozinha." disse firmemente, segurando-o pelo braço e impedindo-o de se afastar, como sabia que ele pretendia fazer. "Não achei que faria." ele resmungou "Mas não custava tentar." disse abaixando a voz para que ela não ouvisse.

*

Enquanto ouvia a sabe-tudo resmungar sobre a poção de tempos em tempos, Draco trocava bilhetes com um de seus colegas que estava sentado atrás dele. O professor de poções atual era bastante lerdo, e mesmo que o visse, não se importaria. Draco era sangue-puro e influente no mundo bruxo, o bastante para fazer parte do clube do Slug, e o bastante para ser deixado em paz.

Nunca faria isso numa aula de Snape, por outro lado. Seu antigo professor de poções e falecido padrinho era rígido e exigia disciplina de todos nas aulas, embora gostasse de favorecer a Sonserina e tirar pontos da Grifinória.

"Aposto que não tem coragem de se oferecer para tomar a poção do Longbottom." Blaise sussurrou em seu ouvido. Draco sorriu. "Aposta o quê?" Seu amigo pareceu pensar e disse por fim "Uma Firebolt." "Fechado, só não vale choramingar depois."

Todos conheciam a fama das poções do Longbottom. Geralmente explodiam na cara de quem se propunha a ajudá-lo, ou envenenava quem as tomava. Não que alguém tivesse morrido, o mais grave que acontecera fora que uma garota ficara com a pele roxa e cheia de feridas nojentas.

"Muito bem, tempo esgotado." Dissera Horace Slughorn aos alunos. "Hora de me entregar as poções."

Draco levantou o braço com um sorriso no rosto. Lançou um olhar para Blase e formou uma frase com os lábios. "Você me deve uma vassoura." disse alto "Professor, gostaria de tomar a poção do Longbottom." Quase todos os alunos arregalaram os olhos, mas o sonserino que apostara com Draco colocara os pés na mesa e se preparara para o espetáculo.

Neville pegou um vidrinho de poção e ofereceu a Draco, com as mãos tremendo. Ele tomou, fazendo uma careta ao provar todo o conteúdo. Não demorou muito para que as mudanças acontecessem, mas ao invés do cabelo negro e a boca dentuça de Neville, sua pele ganhou um tom esverdeado e uma textura gosmenta, seus pés e braços se transformam em patas e ele passou a coaxar.

Tinha se transformado em um sapo.

*

"Ta-talvez eu tenha deixado Trevo cair no caldeirão." disse o grifinório desajeitado arregalando os olhos diante da risada da turma e do olhar de reprovação de Hermione e do professor. "Mas não foi de propósito, eu juro!"

"Tudo bem, é só esperarmos o efeito da poção passar, e o Malfoy voltará ao normal." Slughorn comentou, esperando acalmar o ânimo da turma. "Mas professor, ele bebeu um vidro inteiro! Por isso, provavelmente, a transformação em animal foi total." Hermione parecia exasperada. Já tinha passado por uma situação semelhante no passado, sabia o quão constrangedor podia ser.

"Nesse caso, talvez a senhorita se proponha a levá-lo até a enfermaria. Papoula certamente saberá o que fazer para reverter o efeito da poção." A grifinória assentiu, pegando o Sapo/Draco com delicadeza.

Assim que deixou a sala, levantou-o a altura dos olhos e franziu a testa. "Sapos têm ouvidos?" perguntou-se em voz alta. "Talvez tenha um livro na biblioteca sobre o assunto. Se importa se passarmos lá antes?"

Draco coaxou algo que Hermione entendeu como "Claro que sim!" porque assim que passou pelas portas de mogno da biblioteca, seguiu direto. "Tem que ser muito corajoso ou muito estúpido para tomar um vidro inteiro de uma poção do Neville." o comentário foi seguido de um coaxar, e Hermione sorriu. "Você parece muito menos perigoso nesta forma, Malfoy. Será que vale a pena transformá-lo de volta?"

Interrompeu-se às portas da enfermaria, onde bateu antes de prosseguir. "Madame Pomfrey?" perguntou "Tenho um pequeno problema."

A enfermeira olhou-a de soslaio, e franziu os lábios. "Diga ao senhor Longbottom que não trato de sapos. Que ele peça a Hagrid para cuidar de Trevo." Mas Hermione limitou-se a sorrir, e, então permitiu-se dar uma gargalhada. "Apresento-lhe Draco Malfoy."

Diante do olhar incrédulo da enfermeira, Hermione contou-lhe o que aconteceu na aula de poções. "É preciso ter muita coragem ou ser muito idiota para fazer uma coisa dessas." Madame Pomfrey comentou. "Foi exatamente o que eu pensei. Mas agora acredito que é preciso ser muito Malfoy." E a enfermeira riu. "Qual poção você falou que era mesmo, querida?" perguntou enquanto levava o sapo para um dos leitos.

"Poção Polissuco." respondeu, franzindo a testa diante da reação de Pomfrey. "Não me diga que..." a enfermeira assentiu "Sinto muito Sr Malfoy, mas não existe um antídoto conhecido para a poção. Terá que esperar até o fim do efeito, que geralmente varia de meia a doze horas..."

“... Mas como foi o Neville quem fez a poção, nunca se sabe." completou Hermione. "Pode durar dez minutos ou dez dias." Se fosse possível, Draco certamente teria feito uma careta. Mas sua forma de sapo não era muito flexível, e tudo o que fez foi coaxar.

*

"Eu não acredito que você está cuidando dele, Hermione!" Um ruivo muito mal-humorado cruzou os braços e olhou-a de cara feia. "É o Malfoy!" ela bufou. "É uma pessoa, Ronald Weasley. Muito irritante, e certamente não merecia minha consideração, mas ainda assim, uma pessoa."

Hermione levantou o sapo que segurava com as duas mãos na altura dos olhos. "Não parece muito com um sonserino malvado no momento, não é mesmo?" Rony revirou os olhos, saindo de perto.

"Vê se dá para acreditar numa coisa dessas, Harry!" apontou para a castanha "Ela está tomando conta do Malfoy! Malfoy!" pisou forte no chão, como quem faz birra. "Não vai me dizer que está com ciúmes, Ron!"

"Ciúmes? Da doninha? Claro que não! É só que... Dá para acreditar nela? Nem parece que é o mesmo garoto que a chamou de sangue-ruim, que tentou matar Dumbledore e em quem ela deu um soco bem dado, diga-se de passagem, no terceiro ano!" resmungou essa última parte um tanto alto demais.

Harry sorriu. Não que estivesse satisfeito com a situação, longe de estar feliz com a presença de Draco Malfoy por perto, mas porque via alguma graça na situação. "Hey, Mione! Quem sabe se você der um beijo, ele não se transforma em príncipe?" Sabia que ela entenderia, por ser nascida trouxa.

"Vá se ferrar, Harry!" resmungou fazendo uma careta. "É o Malfoy, Hermione!" Harry imitou Rony. "Eu sei quem ele é, não precisam ficar repetindo. Sou a inteligente do grupo, sabe?" fez uma pausa "Além do mais, só estou retribuindo o favor."

"Posso saber, quando é que em sua miserável vida, o Malfoy fez um favor a alguém?" Rony levantou os braços, exasperado. "Hoje cedo, quando eu quase caí da escada." disse simplesmente, dando as costas aos amigos.

"Espera Hermione! Que história de cair da escada é essa?" Mas a sabe-tudo já tinha ido embora.

*

"Blaise me paga!" era um dos pensamentos que mais se passavam pela cabeça de Draco, que passou as primeiras horas de sua 'transformação' amaldiçoando o colega de casa. Mas depois de imaginar quantas maldições de tortura poderia usar contra ele algumas vezes, o passatempo tornou-se tedioso.

Não havia muito que pudesse fazer quanto à sua forma, então adentrou em um estado de resignação silenciosa - sua resignação geralmente era seguida por ameaças e gritos, mas estava impedido de falar. Quem diria que sapos não tinham cordas vocais? - e resolveu observar a grifinória que tomava conta dele momentaneamente.

Era estranho que, depois de tudo o que fizera contra ela, Granger fosse simpática. Não que não estivesse agradecido, o que era realmente difícil de acontecer. Por um tempo até achara que ela não estava fazendo mais que sua obrigação, para retornar o favor como ela mesma dissera. Mas observando-a mais atentamente, era óbvio que Hermione gostava de ajudar os outros.

Foram incontáveis vezes que ela parara para ajudar alguém nos corredores, fosse para catar alguma coisa que caíra no chão graças a um esbarrão, ou mesmo reverter um feitiço que dera errado. Naquele momento em particular, a sabe-tudo ajudava um garoto que pertencia à casa - pasmem! - Sonserina com a lição.

Um conceito estranho para o loiro que estava acostumado com narcisismo e egocentrismo: a simpatia. Em todos os seus anos de Hogwarts, nunca fizera o que podia ser considerado uma boa ação. Ajudara alguém? Sim, quando a ajuda lhe fornecera algo em troca. Mas fora isso? Nunca.

Antes de seu encontro com a Granger na escada, sequer tinha ajudado uma garota que precisava de ajuda. Fora mais por impulso que a ajudara, não era frio o suficiente para observar uma garota - mesmo que sangue-ruim e grifinória - sofrer um acidente tão grave sem se mover. Seu pai, Lucius, certamente o seria. Mas Draco nunca fora tudo o que o pai queria que ele fosse.

O caso era que ele não entendia porque a sabe-tudo levava-o para cima e para baixo, ao invés de simplesmente deixá-lo jogado em um dos leitos da enfermaria como madame Pomfrey sugerira. Talvez fosse nobre demais para isso...? Tudo o que podia a fazer era especular.

Já era bem tarde quando ela finalmente deixara-o na mesa de cabeceira do seu quarto na torre da Grifinória. Trancara-se no banheiro, e Draco aproveitara para olhar o ambiente em volta. Não era nem de longe tão luxuoso quanto seu quarto nas masmorras. A cama era feita de uma madeira escura que ele não saberia identificar, e o chão de um material um pouco mais claro apenas. Não havia espelhos ou lareiras, ou mesmo um luxo sequer.

A simplicidade combinava com ela, aliás.

Não percebera que a grifinória já se deitara na cama, até que ela o pegou nas mãos e colocou seus olhos profundamente castanhos nele. Fazia algum tipo de pergunta silenciosa, que ele não foi capaz de entender. "Boa noite, Malfoy." murmurou sonolenta, beijando automaticamente o que seria o topo de sua cabeça.

O gesto pareceria estranho se fosse qualquer outra garota, mas com a Granger parecia apenas adequado. Draco fechou os olhos ao sentir um formigamento estranho no corpo. Demorou para que sua mente registrasse o fato de estar voltando ao normal.

Era bom poder estar sobre os dois pés novamente, pensou. Abriu e fechou as mãos, tocou o rosto e balançou os cabelos. Tudo parecia estar normal. Draco sorriu, virando-se para observar a até então inimiga. Surpreendeu-se ao encontrá-la já dormindo, mas depois de mirar o relógio que pendia na parede, foi que percebeu o quão tarde realmente era.

Meia-Noite. Haviam passado-se mesmo tantas horas desde que tomara aquela poção? O tempo parecera correr naquele dia, apesar de tudo o que acontecera. Era estranho constatar o fato de que não se sentira entediado desde que sua atenção se voltara para a grifinória.

Tomando cuidado para não fazer barulho, andou até a porta. Lançou um último olhar para a menina que dormia tranquilamente. "Parece um anjo" murmurou para si mesmo, antes que percebesse o que estava falando. Então balançou a cabeça, para espantar o pensamento. Estava mesmo comparando a Granger com um anjo? Merlin! A garota lhe dera um soco certeiro no nariz uma vez. A palavra certa não era anjo.

Desceu as escadas da torre, que lhe fizeram levar um tombo ao transformarem-se em um chão liso. "Malditas escadas!" praguejou ao levantar-se. Uma menina do primeiro ano surpreendeu-se ao ver um sonserino por ali, ainda mais descendo do dormitório feminino. Draco fizera questão de sorrir e lançar uma piscadela.

Mas em momento algum tivera coragem de verbalizar o adjetivo que lhe parecera adequado para a grifinória naquele momento, tão serena, enquanto dormia. Negara-se a acreditar que podia pensar naquela palavra para a garota.

Princesa.



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Notas finais do capítulo

A poção polissuco - de acordo com as informações contidas no pottermore - não é capaz de transformar um humano em um animal. Não totalmente, pelo menos. O caso é que quem fez a poção foi o Neville e ele, vamos combinar, não tem talento algum para poções. A transformação em sapo foi um, digamos assim, efeito colateral.]



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