Family escrita por Petrova


Capítulo 1
Família


Notas iniciais do capítulo

Feliz Natal pra todos (um pouco atrasado mas, ok, né gente)



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/309687/chapter/1

Era dezembro. Trish terminara sua última missão naquela cidade e já se preparava para seguir em frente. Era inverno, e por isso vestia um trench coat preto, uma echarpe vermelha e bolsa de mesma cor, além de suas tradicionais roupas de couro preto. Uma fina camada de neve derretia nas calçadas. Ajeitou sua bolsa e começou sua caminhada. No entanto, parou logo em seguida, estranhando o que via. Notou luzes coloridas que decoravam quase tudo a sua volta, depois algumas botas de tecido nas portas das casas e renas de enfeite. O que estava acontecendo?

Do outro lado da rua avistou um jornal na porta de uma casa, e talvez ninguém se importasse se ela desse uma olhadinha. Olhou para os lados e atravessou, indo direto ao jornal. Sequer precisou olhar as manchetes, a data bastava para lembrar-se.

Não era somente dezembro, mas 24 de dezembro, véspera de uma data especial do calendário humano chamada Natal. Não sabia o que o Natal significava e comemorava, e tampouco porque os humanos o esperavam com tanta ansiedade. Havia percebido em seu tempo no mundo humano que era um dia cheio de costumes e partilha.

Ali deixou o jornal e seguiu andando, até que sentiu algo se chocando contra suas pernas. Ia virar-se para ver o que era, mas um garotinho saiu de trás dela correndo. Aparentava ter por volta de 7 anos e vestia uma calça de sarja cáqui, um casaco verde-exército e um gorro laranja, com um pompom na ponta. Tinha cabelos loiros, que quase cobriam seus olhos marrons como avelã. Ele virou-se para trás, ainda correndo, e acenou-lhe com a mão, em um pedido de desculpas. Endireitou-se e correu mais rápido. Deu um sorriso e, antes que pudesse pensar, outro garotinho passou ao seu lado, também correndo, mas parou poucos metros depois, dando os ombros, desistindo de perseguir o outro. Ele virou-se para ela.

–Peço desculpas pelo meu irmão, senhorita.

–Não se preocupe - disse, analisando-o.

Trajava as mesmas roupas que o outro, mas seu gorro era verde-claro; e foi quando percebeu que eram gêmeos. Tinha os mesmos cabelos loiros e olhos castanhos, mas de alguma forma este parecia mais responsável e sério que o outro. Não pode conter seus pensamentos e automaticamente lembrou-se de Dante e Vergil. Em todas as histórias que sabia a respeito da infância dos filhos de Sparda, e até mesmo quando teve contato com estes, as diferenças entre os dois ficavam mais do que claras. O garotinho, que estava na sua frente, em um piscar de olhos deu um fraco sorriso e voltou a correr.

Decidiu fazer uma visita ao mestiço, aproveitando que estava bem próxima da loja, a ponto de ver o letreiro vermelho e luminoso com seus olhos aguçados de demônio. Seguiu até o fim da avenida e parou em frente a Devil May Cry. Entrou e parou, ainda perto da porta. Dante estava sentado na sua cadeira, com os cotovelos apoiados sobre a mesa, brincando com um copo e uma garrafa de uísque pela metade. Parecia extremamente entediado.

– Não está animado para o Natal, Dante ? - perguntou. Algumas vezes ele não conseguia distinguir se ela estava sendo irônica ou não. Ele gargalhou.

– E por que eu estaria ?

– Ora, é uma boa oportunidade para ganhar algum dinheiro -respondeu como se fosse a coisa mais óbvia do mundo- Você tem cabelos brancos, está deixando a barba crescer e sempre usa vermelho. Poderia ser um Papai Noel de shopping.

O bom velhinho era apenas uma dentre as tantas crenças humanas que Trish não compreendia.

– Se você for uma das mamães noel de vestido curto e decotado, quem sabe eu aceite o emprego - sorriu, cheio de malícia.

Ela revirou os olhos e colocou sua bolsa sobre o sofá. Virou-se para a janela e a limpou com os dedos. O sol já estava se pondo, atrás das nuvens, mas ainda era possível observar lá fora com clareza. Começava a nevar novamente, e as luzes de Natal destacavam-se cada vez mais. A umas cinco casas de distância dali, avistou os gêmeos que encontrou antes. Os gorrinhos verde e laranja sobressaiam-se em meio a uma guerra de bolas de neve. Ela os observava atentamente. De repente pararam e olharam para a mesma direção. Uma mulher alta, de lisos e longos cabelos castanho escuros surgiu, com duas canecas nas mãos. Os garotos deixaram a neve rapidamente e foram em direção a ela, ansiosos. Pegaram as canecas e beberam do que estava ali. O menino de gorro laranja abaixou a caneca, com o rosto sujo de chocolate quente, rindo, enquanto o outro balançava a cabeça negativamente. A mulher fez um gesto com as mãos e os gêmeos entraram para casa. Mesmo que as crianças não estivessem mais ali, Trish continuava com o olhar fixo naquele jardim. Não conseguia parar de pensar no que vira. Inconscientemente, era por isso que não compreendia estas comemorações humanas. Não tinha família, sentia-se sozinha. Não sabia como era ter pais, irmãos, primos, avós, filhos. Sempre sentia um nó na garganta se formar quando lembrava-se disso.

– Trish!! - um chamado urgente a tirou de seus tristes devaneios. A julgar pelo tom usado por Dante, aquela já não era a primeira, nem a segunda vez que ele a chamava.

Ela se virou para ele, e o viu franzir levemente o cenho. Não estava muito contente. Dante odiava quando Trish mudava de humor sem motivos, subitamente ficava inconsolável. Odiava não por ela, mas porque mesmo sabendo que a culpa não era sua, ele sentia-se responsável pela mudança e por animá-la novamente.

Ele se aproximou dela e limpou uma única lágrima de seu rosto, que ela não havia percebido ter derramado.

– O que foi dessa vez, hm? - falou como se falasse com uma criança que não aprendia a lição.

Permaneceu em silêncio, fitando o chão, enquanto mais uma lágrima descia, e ele a limpava.

– Como é ter uma família, Dante?- ela voltou a encará-lo.

– Trish ... - para ele, este era um assunto encerrado. Ele levou as mãos sobre os ombros dela.

–Dante, por favor ...

–Você sabe como é ter uma família porque você tem uma - ela entendeu como uma repreensão, uma resposta evasiva, porém ele sorria.

Ela pensou por alguns segundos, enquanto ele tentava não rir de sua ingenuidade. Então ela entendeu.

Ela, sorrindo, deslizou a mão pelo seu rosto, sentindo sua barba, e deu-lhe um beijo na bochecha. Logo depois deu-lhe um abraço apertado. Surpreso com o gesto tão cheio de sentimento de Trish, ele, a princípio, ficou sem reação. Mas depois a abraçou de volta, também sorrindo.

– Feliz Natal, Dante - ela o encarou, mas sem soltá-lo.

– Feliz Natal, Trish.

A família dela podia ser indiferente, sarcástica, inconsequente, sem papas na língua e fazer cantadas baratas na maior parte do tempo, mas era, sim, uma família.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado (e nem vem, já sou a primeira da fila do Dante Noel, pfvr)