Premonição 6: Inferno escrita por Lerd


Capítulo 11
Dois Contra O Mundo


Notas iniciais do capítulo

Demora colossal, eu sei, mas o capítulo está aqui. Faculdade é isso aí, falta tempo pra tudo XD Tentarei postar o próximo capítulo mais rapidamente, prometo :D E ah! O título do capítulo foi retirado do filme "Planeta Terror", é a maneira como a protagonista define ela e o amor da vida dela XD Espero que gostem! ^^



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Quinn Rosetti apertou o botão com a maior força do mundo.

— Ok, eu já vi mais do que o necessário. Sierra, seu trabalho é falho. Christopher, a sua formatação é igualmente falha. Eu os trouxe aqui para avaliarem por si mesmos quais são especificamente as causas dessas alucinações, mas eu creio não ser mais necessário. Alguma coisa está claramente muito, muito errada com essas memórias.

E então a doutora passou a avaliar a expressão facial de todos naquela sala. Boo estava apreensivo, Dallas impassível; Yohann estava sério, Chelsea surpresa; Chris e Sierra, por sua vez, pareciam realmente apavorados. A doutora Ghosh foi a primeira a se manifestar:

— Não... Não é possível. Não. Natalie é a minha obra-prima. Ela é o resultado de toda a minha vida de estudos. E eu não sou a primeira. Esse projeto... Eu faço parte da quinta geração de cientistas que trabalham em cima disso. São anos, quase dois séculos de pesquisas... Eu não posso ter jogado tudo o que grandes nomes... Tudo o que os homens mais brilhantes estudaram e escreveram... Não, eu não joguei tudo isso no lixo. Não. Eu me recuso a aceitar.

Quinn engoliu em seco. Tentou:

— Doutora Ghosh, a senhora está sendo dura consigo mesma. Não existe nenhum dano causado por essa falha em Natalie. São apenas...

— Não! — Sierra gritou. — Não existe falha! Não existem erros!

Chris mantinha-se calado. Quinn cruzou os braços, percebendo que era inútil discutir com a outra doutora. Ela é velha e teimosa. Chelsea então levantou a mão timidamente.

— Diga senhorita...?

— Chelsea. — A oriental respondeu.

— Diga senhorita Chelsea.

A garota então tomou fôlego para o que iria dizer:

— Eu sei que eu sou uma novata, e que eu não tenho experiência alguma. Mas eu tenho algum conhecimento que pode ser de uso na situação em que vocês estão. Um conhecimento... Sensível. Espiritual, se me permitem dizer.

Quinn então desviou o olhar de Chelsea, com um sorriso irônico no rosto. Disse:

— Bom, era só isso. A partir de amanhã vocês dois, doutor Holt e doutora Ghosh...

— Isso é rude, doutora Rosetti. — Sierra falou. — Deixe a garota falar.

— Não, eu não deixo. Nós somos cientistas, doutora Ghosh. Nós trabalhamos com fatos. Nenhum argumento baseado em “conhecimentos sensíveis” ou “espirituais” será considerado válido em uma discussão a respeito de um problema científico. Não enquanto eu for uma das cientistas-chefe da Colmeia. Não enquanto vocês forem meus subordinados.

Chris então riu. A clássica risada debochada...

— Fale, doutor Holt. Qual é o seu brilhante posicionamento dessa vez?

— Não é nada demais. É só que... Algumas vezes você se acha Deus. Sabe? Como se tivesse todas as respostas.

— Eu jamais ousaria supor tal coisa, doutor. Até porque, de que me adiantaria achar que sou um ser inexistente e cujo único propósito é trazer conforto emocional a pessoas que claramente são emocionalmente vulneráveis? Não, eu não acho que sou Deus, menos ainda que tenha todas as respostas.

Chris já estava esperando por aquela deixa. Disse:

— Então ouça o que a garota tem a dizer.

— Não enquanto ela estiver falando sobre espiritualidade e sensitividade.

— E se isso for embasado cientificamente? — Chelsea arriscou. — E se houverem estudos e provas sobre tudo isso?

Por aquela nem Chris esperava. Na verdade o que ele estava tentando fazer era apenas deixar Quinn embaraçada e fazer sua irmã ser ouvida. Ele não esperava que os argumentos de Chelsea pudessem ser realmente válidos, já que, apesar de ele se recusar a admitir, concordava com o posicionamento da doutora Rosetti.

— Provas sobre premonições? Isso eu estou curiosa para ouvir. — Quinn disse.

Boo, Dallas e Yohann continuavam calados. Os dois primeiros pareciam curiosos com os rumos da conversa, enquanto o terceiro parecia apenas uma estátua de sal. Sierra também desistira de tentar fazer parte da discussão principal, e remoia a ideia de ter falhado com Natalie.

— Não são provas sobre premonições. São mais provas sobre as potencialidades das percepções extrassensoriais dos seres humanos. Tudo começou com estudos parapsicológicos, mas isso depois evoluiu. Nos três últimos séculos renomados cientistas publicaram artigos afirmando categoricamente que esses... Indivíduos... Que eles existem. Que o vislumbre, certo ou errado, de realidades possíveis é um fato.

Quinn não sabia direito o que pensar de tudo aquilo. Na sua cabeça, um turbilhão de pensamentos dançava, deixando-a completamente confusa. Chelsea podia ter razão. A cientista jamais acreditaria em coisas sobrenaturais e fantasiosas, mas a garota dizia ter provas, dizia que havia estudos. Claro, eles ainda necessitavam de uma grande boa vontade da comunidade científica para serem completamente validados, o que estava longe de acontecer, mas não eram tão absurdos. Havia a possibilidade de Natalie não estar com defeito algum.

— Muito bem. Eu creio que seja melhor para todos nós que essa reunião seja encerrada por hoje. Eu darei tempo para que possamos pensar sobre tudo o que foi dito. Doutora Ghosh, eu lhe peço que faça uma reavaliação de todo o projeto de Natalie, e procure qualquer mínimo detalhe que possa ter causado alguma falha. Doutor Holt, Doutor Murphy e Dallas, eu quero que trabalhem juntos, com o mesmo intuito da doutora Ghosh, mas levando em conta a formatação usada nas inteligências artificiais da Colmeia. Doutor Cutler e... Chelsea, vocês me ajudarão quanto a essas pesquisas sobre “percepções extrassensoriais”. — A oriental pareceu orgulhosa quando Quinn disse isso, feliz de ter tido suas ideias ouvidas. — Quero que vocês dois vão até a colônia China-7, perto da estrela Gaga, e conversem com o professor Reuben. Ele foi o meu mentor, saberá como conduzir esse problema.

Todos concordaram com acenos de cabeça, satisfeitos com suas funções. Quinn, por sua vez, sentia-se orgulhosa com a maneira com a qual lidara com toda a situação. Ela conseguira deixar todos confortáveis e não ignorar nenhum ponto de vista, mas ao mesmo tempo mantendo-se firme às suas convicções científicas e pessoais.

— Estão dispensados.

Chris foi o primeiro a sair, acompanhado de Chelsea. Yohann foi em seguida, em silêncio, junto de Sierra. Apenas Boo e Dallas ficaram na sala. Eles pareciam apreensivos, como se quisessem dizer alguma coisa. Quinn percebeu isso rapidamente.

— Pois não? — Ela disse.

Boo sentou-se na frente da doutora, bastante nervoso. Dallas rapidamente tocou o ombro do companheiro, como a lhe dar forças. O cientista então disse:

— Nós vamos fugir.

Quinn não soube como reagir. Pensou em rir de maneira debochada, mas então se lembrou de que isso seria exatamente o que Chris faria, e desistiu. Resolveu bufar e questionar, como era de praxe:

— Como?

Boo respondeu:

— Nós vamos pegar uma das naves de expedição até a o planeta Terra e não iremos mais voltar. Vamos viver junto de alguns humanos que não conseguiram se desapegar de sua terra natal. Viver dos alimentos das florestas, viver em contato com a natureza, com os animais. Nós vamos viver juntos.

A doutora Rosetti então tocou os lábios de Boo, pedindo que ele parasse de falar. Disse:

— Doutor Murphy, eu preciso mesmo lembrá-lo de que você não é uma adolescente? Que o senhor é um renomado cientista, de uma das maiores colônias espaciais da galáxia? Que o senhor é o meu braço direito e, se as coisas correrem como planejadas, meu sucessor? Essa é a ideia mais infantil e irresponsável que já ouvi em toda a minha vida. Além disso, é estúpido que me conte isso. O senhor sabe da minha postura ética e moral. Sabe que eu serei obrigada a alertar as autoridades se o senhor tentar escapar levando consigo um dos robôs da Colmeia. Qual é o objetivo, então?

O rapaz então abaixou a cabeça, sem saber o que responder. Quando a ergueu, ele tinha uma expressão de tristeza. Disse:

— Eu não sei qual é o meu objetivo. Eu só sei que... Não há como as coisas continuarem assim. Eu amo o Dallas, e ele me ama. As regras da Colmeia não permitem relações afetivas de qualquer espécie com os robôs, então que escolha eu tenho, doutora? Eu não consigo viver assim. Se for para que eu morra durante a minha fuga, que assim seja. Não existe outra possibilidade. Eu estou disposto a jogar minha carreira, minhas habilidades, minha vida... Tudo pela janela.

Quinn então sentiu um nó na garganta. Naquele momento Boo fazia a doutora lembrar-se de si mesma quando mais nova. De como fora romântica, e de como tivera tantos planos de fuga... Naquela época ela fantasiava sobre um futuro ao lado do Samurai. Fantasiava sobre um futuro onde os dois fugiriam para nunca mais voltar, e viveriam sozinhos para sempre. Por isso para ela era difícil aceitar duas coisas: a postura de Boo, e o que Chris se tornara.

— Como sua superior, eu te ordeno que abandone essa ideia, ou, do contrário, sofrerá as consequências. Mas como sua amiga, eu lhe aconselho: pense melhor. Essa não é a única solução. O amor não é tudo na vida.

Boo concordou com a doutora, com algumas lágrimas querendo cair de seu rosto. Dallas mantinha-se ao seu lado, com suas mãos de ferro prostradas no ombro do doutor, passando-lhe segurança e conforto. Dois contra o mundo. Era difícil para Quinn imaginar o que se passava na cabeça do gigante cibernético, mas ela tinha quase certeza que ele tinha desenvolvido uma característica inerentemente humana: a capacidade de amar.

Quando os dois saíram, Quinn sentiu-se leve pela primeira vez em muitas horas.

Reclinou-se na cadeira, ansiosa por começar a pesquisar a respeito do que Chelsea dissera. Mas, ao mesmo tempo, paradoxalmente, a doutora estava ansiosa por ter uma pausa de todo o seu estressante trabalho. Ansiosa por poder visitar sua família, os quais não via havia dois meses. Sentia saudade de casa, do cheiro da comida de sua mãe, dos petbots que o pai criava em seu quintal. Sentia saudades até mesmo de seu irmão caçula, ansioso por tornar-se um cientista como ela.

De repente, seus pensamentos foram interrompidos. Era Natalie.

A inteligência artificial acordou com um grito.

Quinn assustou-se e começou a olhar para o telão, onde os pensamentos de Natalie eram exibidos. Mas eu já a desconectei do corpo desse rapaz. Ela não deveria estar tendo nenhum pensamento. A não ser que...

Aqueles pensamentos eram da própria Natalie. Ela não pode pensar!

A imagem era a de um grupo de sete pessoas esperando para pegar uma das espaçonaves que os levaria até os dormitórios, localizados nos envelopes espaciais nos arredores da Colmeia. Quinn estava entre eles, bem como Boo, Dallas, Yohann, Sierra, Chelsea e o Samurai.

— Mas o que...?

O grupo entrou na aeronave, chamada de Bliss 10110100, com cautela. Lá dentro estava tudo calmo e pacífico, como sempre. Nenhum deles falava qualquer coisa. A Quinn do telão reparou que atrás deles havia um relógio que indicava as horas: 18:00. A doutora rapidamente olhou em seu relógio de pulso e percebeu que faltavam oito minutos para aquele tempo que estava sendo exibido no pensamento de Natalie. Isso é estranho. Eu estava realmente prestes a sair daqui para pegar essa espaçonave.

Mas então ocorreu um impacto. Uma pequena espaçonave pirata passou pela Bliss e os acertou em cheio. O impacto foi forte o suficiente para arremessar Chelsea para fora, fazendo-a cair no infinito escuro do espaço, sumindo para sempre. Chris aparentemente gritou, enquanto a doutora Rosetti da vida real tapava a boca, chocada.

Então houve uma pequena explosão no painel de controle, e uma barra de ferro atravessou a cabeça de Dallas, fazendo-a em pedaços. Alguns fios rapidamente começaram a soltar faíscas. O robô então acabou por cair em cima do Boo, esmagando o corpo de seu companheiro. A Quinn da visão abaixou-se, nervosa, tentando reanimar o doutor. Ela inclusive puxou os braços dele, mas conseguiu recuperar apenas a metade de cima, já que o corpo do rapaz havia sido cortado ao meio por Dallas.

A doutora Sierra esmurrava com força as paredes da Bliss, tentando pedir ajuda. Quinn foi mais racional, e gritou:

— Prendam-se aos cintos!

Yohann e Chris fizeram o que ela ordenou no exato segundo, mas Sierra não. Quinn não percebeu, e apertou o seu cinto rapidamente, em seguida apertando o botão de emergência da Bliss. A espaçonave parou bruscamente, e o impacto fez o corpo da doutora Ghosh bater contra o teto e depois contra o chão do veículo, desfigurando-a completamente. Muito sangue respingou por todos os lados.

Bliss estava estável. A Quinn que observava tudo pelo telão de Natalie estava em estado de choque. Ela acabara de assistir a morte de quatro de seus companheiros de trabalho.

Mas ainda não havia acabado.

Yohann gritou:

— Vai explodir!

E então não houve nada que os três pudessem fazer. A espaçonave explodiu no espaço, mandando pedaços de materiais sintéticos e resíduos humanos aos quatro cantos da galáxia.

Quinn havia assistido a sua própria morte. Exatamente como René.


x-x-x-x-x







Melissa passava a mão displicentemente pelos cabelos dourados de Brody, ao lado da maca dele no hospital. O rapaz estava bem, mas precisaria ficar sob observação. Ele ingerira uma quantidade muito grande de água salgada, e ela quase chegara até o seu pulmão. Os doutores disseram que o rapaz seria liberado no dia seguinte, mas que deveria passar a noite ali.


Isso até deixava Melissa um pouco aliviada. Ela conseguira autorização para passar a noite com ele, e deixar o hotel parecia ser a melhor coisa do mundo. Especialmente depois de tudo o que Pam vira ao tentar alertar Hank sobre o fato de que ele era o próximo.

Sangue por todos os lados, fora o que a mulher vira. Primeiro ela fora até o quarto do mágico, mas não encontrara nada. O segundo lugar que Pam teve a ideia de procurar foi óbvio: o quarto de Helena. E foi lá que ela encontrou o rapaz, com metade de sua cabeça arrancada pelo tiro de uma bala. Hank fora friamente assassinado. Pam chamara os policiais na mesma hora, e provavelmente ainda estava com eles, dando informações sobre qualquer coisa que pudesse saber. Melissa rezava para que a mulher não mencionasse a lista da morte, ou do contrário seria chamada de louca. Era claro que o rapaz morrera porque estava na lista, mas também era claro que a morte tivera ajuda.

Para Melissa, a ajuda poderia ter vindo de dois lugares: Helena ou Marsellus. Talvez ambos. A mulher claramente havia sobrevivido ao seu ataque, do contrário a vez de Brody e Hank não teria chego. Melissa suspeitava que o casal estivesse envolvido com o assassinato do rapaz. Ela lembrava-se de como Morgan reagira dois anos antes, de como ele tentara assassinar Heather. Se um adolescente bastante inteligente e são pudera cometer tamanha atrocidade, o que ela poderia esperar de dois completos desconhecidos?

Era coisa demais para se pensar. René estava em perigo no momento, e Melissa esperava que Pam fosse atrás do garoto. Ela mesma iria se fosse necessário, mas a mulher pedira explicita e veementemente que a garota ficasse cuidando de Brody. Pam temia que a vez do rapaz chegasse novamente, e sabia que as chances eram grandes de ela morrer antes. Ou seja, ela não poderia salvar o filho. Por isso pedira, de joelhos, que Melissa fizesse isso por ela. Que cuidasse de Brody, e que não permitisse que ele fosse levado. A loira não havia conseguido prometer nada, mas jurara que faria o possível para que Brody ficasse seguro.

Oh, Pam. Oh, René. Se Marsellus e Helena eram mesmos os responsáveis pela morte de Hank, Melissa achava que eles mereciam morrer, de certa forma. Em situações normais a garota era a favor da justiça da lei. Mas aquela não era uma situação normal. A morte dos possíveis assassinos de Hank, se fora da ordem, podia salvar a vida de Pam, de Brody e de René. Para Melissa, era uma decisão óbvia a se tomar.

É matar ou morrer. É questão de matar um assassino.


x-x-x-x-x







Marina abaixou-se ao lado do corpo de Hank e suspirou. Não conseguiu evitar pensar que ele poderia estar vivo se ela tivesse o levado até a sua casa junto de René e Jill. Mas como ela poderia prever aquilo? Hank era maior de idade, ela não tinha obrigação legal de ser a guardiã dele, como tinha com René e Jill. Mas mesmo assim... Eu poderia ter salvado esse garoto.


De repente um dos policiais que cuidava da segurança do quarto para que nenhuma pessoa entrasse na cena do crime, entrou e disse:

— Oficial Portilla? O garoto está chamando a senhora.

Ele não precisou explicar qual garoto, porque era óbvio. Marina tivera de trazer René consigo, já que havia grandes chances de ele fugir para ir atrás da namorada. A oficial já havia colocado dois de seus melhores homens em busca da garota, e logo iria encontrá-la. Ela não podia se dar ao luxo de perder René também.

Marina caminhou com cautela até a porta do quarto onde René estava. Quando chegou lá, viu que o rapaz estava sentado em cima da penteadeira, de costas para um espelho. Ao vê-la o rosto do ruivo pareceu tomar um tom de tristeza ainda maior.

— Você viu o que a lista é capaz de fazer, Marina? — René disse, segurando as lágrimas.

— A morte do seu amigo não foi causada pela lista. Aquilo foi assassinato.

René bufou e deu com os ombros. Disse:

— Tanto faz. Se ele não tivesse sido assassinado, algum acidente aconteceria. Era inevitável.

A oficial não sabia o que dizer. Felizmente ela não precisou, porque René continuou:

— Eu sou o próximo.

Oh, não. Marina temera a chegada daquele momento desde a primeira vez que o rapaz contara a ela sobre a lista. A oficial podia protegê-lo de outras pessoas, dos perigos humanos, mas não podia protegê-lo do sobrenatural. Do invisível. Da própria morte. Marina corria o risco de perder René sem poder fazer qualquer coisa para ajudá-lo. Eu não posso. Eu já vou ter de dar péssimas notícias a uma mãe. Por favor, Deus, não deixe que sejam duas.

Pensar naquilo deixou a oficial ainda mais triste. Ela estava acostumada a lidar com assassinatos de estrangeiros, mas as vítimas dificilmente eram adolescentes. Marina não sabia se estava preparada para dizer a uma mãe que o filho dela viajara para um lugar longe para nunca mais voltar. Ele nunca voltou pra casa, a oficial pensou, sentindo um nó se formar em sua garganta.

Foi então que Pam apareceu. A mulher entrou no quarto sem dizer uma palavra e correu na direção de René. Ela então abraçou o rapaz com a maior força do mundo, enquanto ele retribuía sem entender direito a causa de tanto afeto.

— Você está bem, querido? Eu fiquei tão preocupada...

— Eu estou sim. — René respondeu, desconcertado. — Mas a Jill fugiu.

Pam surpreendeu-se com aquela notícia.

— A sua namorada fugiu? Por quê?

— Nós brigamos. — Ele respondeu. E então seu pensamento se direcionou até Hank, e o rapaz novamente segurou o choro.

Pam olhou indignada para Marina, ao que a oficial respondeu prontamente:

— Eu já coloquei homens atrás da garota. Nós vamos encontrá-la, não se preocupe. Além disso... Ela não está na lista, não é?

A outra mulher então se surpreendeu com o fato da oficial saber sobre isso. Pam imaginava que Marina soubesse sobre a lista, já que havia ligado para ela para avisar de um sinal que René previra, mas não estava certa quanto a quantidade de informação que a oficial tinha. Aparentemente, ela estava bem informada.

Foi então que Pam sentiu uma tontura. Algo passou através dela, e a mulher sentiu-se fraca. Seus olhos foram se fechando, se fechando... E ela apagou.


x-x-x-x-x







Pam acordou em sua cama. A luz do sol entrava pela janela, e do lado de fora ela ouviu o barulho de pássaros. Ao seu redor havia as lembranças de sua adolescência: as paredes cor de rosa, as cobertas xadrez. Até mesmo seus ursos de pelúcia estavam ali, remendados e limpos. A garota se espreguiçou, tentando aproveitar ao máximo aquela bela cena. E então, de repente, alguma coisa tocou seu pé.


Adrian.

Pam deu um pulo e um gritinho.

Ele estava sentado na beirada da cama da garota, com o maior sorriso do mundo em seu rosto. Dessa vez ele usava um macacão jeans com uma regata branca por baixo, bem como um boné na cabeça. Foi só ao perceber o vestuário de seu príncipe, que Pam se deu conta de que estava em um sonho. Ele se foi, Pam. Há muito, muito tempo.

— Você fica tão linda dormindo. — O rapaz disse.

Pam rapidamente corou. Ela então empurrou as cobertas para o lado e sentou-se de pernas cruzadas em cima da cama. Adrian aproximou-se dela, e a garota então o puxou para perto de si, abraçando-o por trás. Aquilo podia ser um sonho, mas Pam iria aproveitar cada segundo que estava tendo com o amor da sua vida, por mais irreal que ele fosse.

— Por que você teve que ir embora? Por que eu não tive coragem de te dizer o que eu sentia?

Nós seríamos bons juntos. Nós seríamos perfeitos. Dois contra o mundo.

Adrian deu com os ombros. Disse:

— Eu não sei, Pam. Eu não sei. E eu jamais saberei o que poderia ter sido. O que eu posso fazer é te proteger. Eu posso, quero e vou te ajudar. É a minha missão.

A garota então se afastou alguns centímetros, como se tivesse sido pega de surpresa.

— O que você quer dizer? Vai acontecer alguma coisa comigo?

Adrian negou com um aceno de cabeça.

— Como você, não. Não por enquanto. Mas com outra garota. Uma que me lembra muito você.

— Jill. — Pam murmurou.

— Ela mesma. — Adrian confirmou. — Você precisa ir salvá-la, Pam.

— Mas por quê? — A garota indagou. — Ela não está na lista. Qual o perigo que ela pode estar correndo?

O rapaz balançou a cabeça negativamente.

— Eu não posso te dizer. Na verdade, eu não sei. Eu sei poucas coisas, Pam. Eu só sei te dizer que ela está em perigo. E que você pode salvar a todos se conseguir salvá-la. Ela é a chave. Você precisa ir atrás dessa garota para deter a lista da morte.

Pam estava confusa. Ela confiava em Adrian, mas nada daquilo fazia sentido:

— Mas onde ela está? Eu não sei...

Adrian então sorriu o sorriso que fazia Pam derreter. Disse:

— Ela está onde você esteve. Tudo o que está acontecendo com você faz parte de um ciclo. O começo é o fim, e o fim é o começo. Tudo está interligado. Você precisa começar de novo para chegar ao final dessa história. Voltar ao princípio.

— Princípio? — Pam repetiu. — Eu não entendo...

E então, antes que ela pudesse fazer mais perguntas a Adrian, ou mesmo se despedir dele, o rapaz desapareceu. E em um segundo nem mesmo seu quarto existia, e tudo estava preto e escuro...

Pam acordou.

Ao seu lado estava René, aparentemente nervoso. O rapaz mexia com os dedos da mão, inseguro, olhando com medo para tudo ao seu redor. Pam estava com o coração cortado por precisar abandoná-lo no momento em que ele mais precisava. Mas era necessário. A mulher estava prestes a deter a lista e salvar a vida de todos eles. Dela, de René, de seu filho... Depois que tudo tivesse tido um fim, a mulher poderia tentar esclarecer qualquer dúvida que tivesse a respeito de René. Será?, ela se indagava. Será que ele é o meu Adrian? O meu bebê?

E então um insight tomou conta da mulher, e ela soube onde Jill estava. Ainda não sabia o que deveria fazer, mas sabia o que deveria procurar. E sabia que precisava ir sozinha. Decidiu também que não iria se despedir de René. Aquilo só iria piorar a situação, deixá-lo ainda mais assustado.

— Eu vou ao banheiro, já volto. — Ela disse. René concordou com um aceno de cabeça, sem imaginar os planos da mulher.

Oh, fique bem, meu querido. Eu vou voltar logo, logo...


x-x-x-x-x







O noticiário que passava na TV não era estranho à Melissa. Nem mesmo a mulher que dava as notícias lhe era estranha. Oh, Heather. Continua linda como sempre.


O furacão que se aproxima aqui da cidade de Cancun já tem nome: Sabrina é como estão lhe chamando. Sabe-se também que o furacão Sabrina irá atingir com bastante intensidade a área das ruínas de Tulum, onde há poucos dias houve um desabamento que deixou centenas de vítimas. Existe a possibilidade de os ventos serem tão fortes que os destroços do que antes foi a grande construção Maia, sejam arrastados direto para o oceano, terminando de vez com esse patrimônio histórico da humanidade. Não se sabe a hora correta em que o furacão Sabrina irá passar pelas antigas ruínas, mas pode ser a qualquer momento a partir de agora. As áreas de risco já foram evacuadas, e recomenda-se fortemente que todos os moradores de Cancun permaneçam em suas casas. Nós voltaremos com mais notícias assim que elas nos forem dadas.

E então Heather foi substituída pela âncora do jornal. Melissa tremeu ao ouvir aquela notícia. Esse furacão vai ser mesmo barra pesada, pensou. Então seu celular tocou. Ela surpreendeu-se positivamente com o nome que viu na tela.

— Alice?!

Oh, graças a Deus você está bem, Mel! Eu acabei de ver a notícia sobre esse furacão que vai atingir Cancun. Me diz que você está em um lugar seguro, por favor.

— Eu estou sim. — A loira confirmou. — O furacão não passará próximo de onde eu estou. Pode tranquilizar a mamãe, eu sei que foi ela que te obrigou a me ligar.

Alice riu do outro lado da linha.

Ela não ligou pessoalmente porque não queria soar superprotetora. Mas pode deixar que eu a aviso. Todos aqui estão te mandando beijos. O Bimbo disse que está com saudades.

Bimbo.

— Eu também estou com saudades de todos vocês. Na semana que vem eu já estarei aí. Prometo que vou ficar uma semana na casa da mamãe, com os meus sobrinhos lindos.

E na minha casa também, por favor!

— Haha, claro, Alice.

Bom, é isso então. Até semana que vem, Mel. Beijinhos.

Melissa então desligou o aparelho. Falar com Alice fora de certa forma reconfortante, embora a garota não soubesse dizer o porquê. Talvez fosse pelo fato de que Alice era uma sobrevivente como ela. Ouvi-la lhe dava esperanças de que era possível deter a lista. De que Brody tinha salvação.


x-x-x-x-x







Jill sentou-se em um monte de pedras aleatório e abraçou as pernas nuas. Estava frio ali, e a garota usava apenas uma regata e um short jeans. Atrás dela havia o mar, com as ondas batendo suavemente nas pedras do que antes fora as ruínas de Tulum. Ao redor da garota havia apenas pedras e mais pedras, e, se ela parasse para escutar com atenção, ruídos. Os mais sensíveis talvez dissessem que eram ruídos das almas das pessoas que morreram no desabamento. Para Jill eram apenas malditos e irritantes ruídos.


A garota subitamente sentiu uma presença atrás de si. Virou-se rapidamente, na esperança de ser Hank.

E então foi atingida na cabeça com força, desmaiando em seguida.

Marsellus assoprou a mão, dolorida pelo golpe contra a cabeça de Jill. Agachou-se perto da garota e mediu o pulso dela. Jill ainda respirava. O homem então esfregou o rosto, indeciso quanto ao que fazer. Um pensamento estranho passou pela cabeça dele, algo como um mau sinal. E se Jill estivesse na lista? E se o rapaz não tivesse visto a morte da namorada, mas ela realmente ocorresse? Se aquilo fosse verdade, então a vida da garota não seria útil. Mas ele precisava tentar. Depois de matá-la, sempre havia a possibilidade de ir atrás da loirinha. Aquela Marsellus tinha certeza de que estava a salvo.

O homem então ergueu o corpo da garota e seguiu em direção a ponta do penhasco. Lá embaixo as ondas quebravam-se nas pedras.

Marsellus suspirou. E então quando estava prestes a soltar o corpo de Jill, ouviu o barulho de um tiro.


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Notas finais do capítulo

Bom, vamos às considerações finais:
Essa eu vou contar porque ninguém iria descobrir sozinho, eu acho. É referente ao nome da espaçonave onde acontece o acidente da trama do futuro. Ela se chama Bliss 10110100. Nada de estranho aí, certo? Só que "10110100" está escrito no sistema binário e, no sistema decimal, significa nada menos que... Adivinhem? Pois é, 180! XD
Agora outro ponto. A reação de René quanto à morte de Hank, pode soar fria, mas eu não vejo dessa forma. A jornada de René vem sendo, mais do que a de qualquer um dos meus visionários, uma jornada estritamente psicológica. Diferentemente de todos os meus outros visionários, ele está fora de todo foco da ação, e toda a sua jornada é mental. Eu sei que isso pode soar chato, mas foi o caminho que escolhi seguir com ele. No fim das contas, ação não falta: tem aos montes, mais do que as minhas outras fanfics, é só que René está fora dela. Mas voltando a reação do René, que era o tópico original: eu achei que do que jeito que ele reagiu, estava certo. Não quis escrever uma grande cena de choro ou de ele se descabelando porque senti que não seria certo. Sim, era o melhor amigo dele, eu sei. Mas René não foi capaz, naquele momento, de analisar a situação com clareza. De digerir a informação da MORTE. É tanta coisa passando pela cabeça do rapaz, que essa morte acabou sendo só "mais uma" desgraça. Tenho certeza que ele sofrerá e chorará mais tarde, mas não senti, como escritor, que esse seria o momento correto. Enfim.
E ah! Próximo capítulo provavelmente será o penúltimo ou o último da trama de 2013 (ainda não decidi). Depois disso, haverá mais dois capítulos (13 e 14) apenas com a trama do futuro (capítulos bons, prometo), e em seguida um último, o 15, que será uma finalização não só dessa fanfic, mas de toda a hexalogia, um finalzão geral :B
É isso. See you soon, guys!