Perigo na Floresta escrita por Crica


Capítulo 2
Capítulo 2




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Capítulo 2 – Perigo na Floresta

No início da manhã, a ambulância desceu a estrada em alta velocidade, ao som das sirenes, chamando a atenção dos habitantes. Com certeza, mais um turista apanhado pelos desabamentos na montanha.

O veículo atravessou a avenida principal e entrou no pátio do estacionamento do hospital municipal, parando diante da porta da emergência.

Os paramédicos saltaram e puxaram a maca para fora, apressados.

Um grupo veio de dentro do prédio em auxílio aos que chegavam.

Um dos enfermeiros tomou o lugar do socorrista que controlava o balão de oxigênio, enquanto o médico ouvia e conferia as informações prestadas pelo outro. Tudo isso, em movimento, deslizando a maca pelo largo corredor até a sala de exames do Pronto Socorro.

O movimento naquele lugar era frenético, às vezes. Principalmente quando surgiam vítimas da montanha. Deslizamentos e quedas eram acidentes comuns que, não raramente, terminavam em conseqüências graves para os mais desafortunados. Pelo menos, dessa vez, era apenas um.

Em menos de dois minutos, a equipe já tinha despido o acidentado de toda aquela roupa encharcada e enlameada.

A temperatura do corpo do paciente estava perigosamente baixa.

Um outro médico, mais velho, chegou para auxiliar o primeiro na triagem: sinais vitais, reflexos, temperatura,saturação periférica de oxigênio no sangue , dilatação pupilar , pressão arterial e outros detalhes não menos importantes.

Os cuidados iniciais foram tomados e toda a equipe desacelerou o ritmo, passando aos exames mais detalhados. Era necessário, depois de terem conseguido elevar a temperatura corporal e estabilizado a pressão arterial, verificar outros ferimentos menos aparentes, porque, pela experiência que tinham, nesse tipo de ocorrência, concussões e hemorragias internas eram sempre uma possibilidade.

Elliot Preston era o plantonista responsável pelo PS. Quando saiu da sala de emergência, deparou-se com dois jovens nativos-americanos. Os dois rapazes Yankton aguardavam por notícias. Eles tinham resgatado o sujeito na montanha, quase morto. Não havia muito o que dizer naquele momento. Então, passou pelos rapazes, sorriu e afirmou que o homem trazido por eles ainda estava vivo, graças a sua iniciativa e seguiu pelo corredor.

Alguns minutos mais tarde, já na sala de espera, um atendente trouxe um saco plástico que continha os pertences da vítima resgatada pelos adolescentes. Entregou-lhes a embalagem e sugeriu que aguardassem a chegada do xerife ou de um dos delegados para prestarem esclarecimentos.

Os dois rapazes sentaram-se no sofá de couro e depositaram o saco sobre a mesa baixa que havia no centro da sala. Foram retirando as peças, uma a uma: roupas sujas e molhadas, botas, um celular e uma carteira com uns poucos dólares, documentos e cartões de crédito.

Depois de observar todos aqueles objetos arrumados sobre a mesa por um longo tempo, os jovens decidiram verificar o estado do celular. Talvez houvesse algum número registrado para casos de emergência. Tentaram o primeiro registro de chamadas rápidas, mas a bateria se esgotou antes do segundo toque.

Uma hora mais tarde, o doutor Preston retornou, com seu semblante sereno e admirou-se do xerife não ter aparecido ainda. Informou que o paciente estava estabilizado, mas que ainda inspirava muitos cuidados. Fez também todas as perguntas de praxe e aconselhou que os garotos retornassem à reserva antes do anoitecer por conta do mau tempo. Ele mesmo se encarregaria de reproduzir aos policiais os detalhes do ocorrido e, se houvesse necessidade, seriam procurados na aldeia.

Antes de partirem, os jovens Yankton informaram ao médico o que tinham encontrado entre os pertences do sujeito resgatado, deixando de posse dele, a carteira e o telefone.

O médico passou o dia entre seus afazeres e as constantes rondas na Unidade de Tratamento Intensivo.

Somente no final da tarde, o xerife apareceu no hospital para tomar ciência das ocorrências do dia. Apesar da cirurgia ter corrido bem, o rapaz resgatado pelos meninos da reserva estava bastante debilitado.

Elliot Preston entregou ao homem da lei a embalagem que continha os objetos pessoais da vítima da montanha, alertando-o que tomara a liberdade de carregar a bateria do aparelho telefônico. Adiantou-lhe também os detalhes do resgate, passados pelos garotos Sioux.

Após conferir os documentos na carteira, o xerife Tompson concluiu que não se tratava de nenhum dos cidadãos da sua cidade. Com certeza, mais um turista se aventurando nas trilhas da montanha, apanhado de surpresa pelo tempo ruim.

Antes de voltar para a delegacia e encarar toda a papelada e os usuais formulários para desaparecidos, o policial decidiu arriscar o celular. Pressionou o primeiro número da lista e ouviu a mensagem que informava que o número estava fora de serviço. Decidiu pelo segundo, então.

_ O senhor Singer, por favor.

_ Sou eu mesmo – Respondeu a voz do outro lado da linha.

_ Senhor, sou o xerife Harry Tompson de Benton, Nebraska.

_ Nebraska? Como o senhor conseguiu esse número, xerife?

_ Temos em nosso hospital, um homem de nome Morissen e seu número constava na lista de emergência do telefone dele. O senhor o conhece?

_ Sim, é meu sobrinho – o coração de Bobby disparou _ O que aconteceu?

_ Segundo os médicos, seu sobrinho não corre risco de vida agora, mas ainda inspira cuidados.

_ Mas o que aconteceu, afinal? – O xerife falava no singular e isso estava deixando o velho caçador estressado _ E onde está o irmão dele?

_ Irmão? – o policial admirou-se _ Deve haver algum engano, porque não há registro de duas entradas – verificou novamente a ficha que tinha nas mãos.

_ Não é possível! Meus sobrinhos estavam juntos.

_ Estou com o registro aqui, senhor Singer, e só um homem deu entrada hoje: branco, cerca de 1,85cm, 80 quilos, 28 a 30 anos e encontramos documentos em nome de D. Morissem. Não há outro.

_ Esse é Dean – Bobby mal conseguia conter-se _ Mas Sam deveria estar com ele. Se não deu entrada é porque não se feriu. Poderia verificar, por favor?

_ Pelo que consta, seu sobrinho foi trazido esta manhã por dois rapazes da reserva Sioux dos Yankton e ninguém comentou nada sobre um irmão.

_ Tem algo errado... Muito errado. – apanhou um bloco e caneta dentro da gaveta do armário _ Pode passar o endereço daí? Estarei no primeiro vôo disponível. – Afirmou enquanto anotava os dados _Obrigado xerife. Chegarei o mais rápido que puder.

Bobby desligou o telefone e correu para o andar de cima. Abriu a porta do armário de seu quarto, atirando dentro de um saco de lona, algumas peças de roupa, documentos falsos e um rolo de dinheiro amarrado por um elástico. Não poderia levar armas. Elas não passariam pela segurança do aeroporto e não havia tempo para atravessar o país de carro. Seus meninos estavam em perigo.

Ainda no avião, o caçador divagava pelas hipóteses que se formulavam em sua mente.

Por que aqueles garotos decidiram caçar logo numa cidade perdida no meio do nada? Por que haviam se separado, afinal? Se Dean estava sozinho no hospital, o que fora feito de Sam? Aquele garoto jamais abandonaria o irmão ferido, mesmo num hospital. Ele sabe o quanto Dean odeia hospitais. Se Sam não está com ele, com certeza, está preso em algum lugar, ou muito ferido para pedir ajuda, ou pior, morto. A coisa deve ter sido séria porque, de jeito nenhum, se Dean pudesse andar sobre as pernas, se deixaria levar a uma sala de emergência. Mas que diabos! Em que porcaria de encrenca vocês foram se meter, seus idiotas? Vão acabar me matando do coração. Mas que merda!”

***

Depois de sete horas de viagem e três escalas, Bobby tomou um táxi no aeroporto de Port Scarllet em direção a Benton. A tal cidadezinha não tinha aeroporto, mas não ficava muito longe.

Faltava uma hora para o amanhecer quando o táxi estacionou diante da entrada principal do Hospital Municipal.

O lugar estava em completo silêncio. Nenhum movimento no corredor principal.

Singer seguiu a passos firmes e apressados até o balcão de atendimento, onde uma enfermeira assistia a um programa na TV.

_ Com licença, senhorita. – aguardou que a mulher desligasse o aparelho e se voltasse para ele _ Fui informado que meu sobrinho foi trazido para cá, ontem cedo, vítima de um acidente na montanha.

_ Sim, o senhor Morissem, correto?

_ Exatamente. O xerife ligou e vim o mais rápido que pude - O homem estava visivelmente ansioso _ Poderia informar em que quarto ele está? Gostaria de vê-lo, por favor.

_ Só um momento – a enfermeira acionou um botão na mesa telefônica e chamou por um médico _ O doutor Preston virá falar com o senhor em alguns minutos. Pode aguardar por ele ali – apontou a sala de espera _ Tenho certeza de que não vai demorar.

_ Obrigado – Bobby acenou com a cabeça e forçou-se a um sorriso amarelo.

Não foram mais do que dez minutos de espera, que pareceram uma eternidade. Todas as possibilidades para o que poderia ter acontecido com seus rapazes e para o que estava por vir, fervilhavam dentro de sua cabeça.

Quando o homem alto e grisalho entrou pela porta, o velho caçador ainda estava perdido em seus pensamentos, esfregando as mãos, uma na outra, num movimento mecânico e nervoso. O médico parou e observou, por breves momentos, aquela figura, antes de limpar a garganta emitindo um som que trouxe Bobby de volta à realidade.

_ Senhor Singer, eu suponho – estendeu a mão em resposta ao gesto afirmativo do outro _ Sou Elliot Preston, o plantonista responsável pelo atendimento ao seu sobrinho. O xerife informou-me que o senhor estava a caminho.

_ Como ele está, doutor? – Bobby não era homem de rodeios e meias palavras. Por mais que seu coração estivesse em pandarecos, preferia sempre ir direto ao ponto.

_ Agora, está estabilizado, mas seu quadro ainda inspira cuidados.

_ Posso vê-lo? Eu gostaria muito de vê-lo.

_ Claro – o médico percebeu a ansiedade na voz do seu interlocutor _ Mas antes de seguirmos para a UTI...

_ UTI?- Sabia que a palpitação dentro de seu peito estava lá por algum motivo _ Mas o senhor disse que Dean está estabilizado.

_ E que ainda inspira cuidados, não esqueça – Preston conduziu o caçador pelo braço, através do corredor _ Precisa tomar ciência de alguns aspectos bastante relevantes a respeito do estado de saúde de seu sobrinho.

Bobby estava tonto. Não entendia a metade dos termos que o médico despejava sobre seus ouvidos. Estava ficando enjoado, de tão tenso. O tom de voz daquele homem de jaleco branco o estava irritando profundamente. O sujeito falava como quem executa um mantra, num tom uníssono, cadenciado e repetitivo, como se medisse cada palavra e, por incrível que possa parecer, para o amigo de Dean, todo aquele floreio era muito pior do que qualquer notícia que pudesse receber.

O som da campainha do elevador fez com que Bobby focalizasse o pensamento novamente. Sua cabeça estava atolada de informações e nada, na verdade, fazia muito sentido. A porta abriu e ambos entraram no compartimento metálico.

Três andares acima, a porta abriu novamente, permitindo que adentrassem noutro corredor, ainda mais claro e gelado, ladeado por vários boxes envidraçados por onde se viam, em alguns deles, pessoas ligadas a uma quantidade enorme de tubos e fios.

O cheiro de anticéptico estava por toda parte.

Pararam diante de uma das aberturas envidraçadas e, com alguma dificuldade, Bobby tirou os olhos do chão e os ergueu, olhando através da janela que dava para o corredor.

Ele sabia o que encontraria, mas nunca se está realmente preparado. Suas pernas tremeram e teve que engolir umas duas ou três vezes antes de conseguir se pronunciar outra vez.

_ Posso? – Apontou a porta, um tanto hesitante.

_ Certamente – O médico empurrou a porta, dando-lhe passagem _ Mas lembre-se de que levará ainda algum tempo até que o rapaz recobre a consciência. Pretendemos mantê-lo sedado por enquanto.

Bobby não tinha dado dois passos dentro do quarto, quando parou e voltou-se para o médico. Seu olhar estava cheio de dor e dúvidas e Preston tinha experiência bastante para ler esses sinais.

_ O meu turno termina em 30 minutos, mas outro médico acompanhará o desenvolvimento do quadro de seu sobrinho – colocou a mão sobre o ombro de Bobby e sorriu _ A doutora Sarandon é muito competente e dedicada. Ficarão em boas mãos até amanhã e sempre poderá me ligar, se tiver alguma dúvida. A qualquer hora, está bem?

_ Obrigado, doutor – Estendeu a mão ao médico, em agradecimento.

Elliot Preston voltou as mãos aos bolsos de seu jaleco e deixou o quarto.

Foram necessários alguns segundos para que o caçador percebesse que estava sozinho naquele cômodo e que estava com frio. Fazia muito frio. Seu corpo inteiro estremeceu.

Ainda estava de frente para a porta e, atrás de si, o som cadenciado dos monitores o lembraram o motivo pelo qual estava ali, mas tinha dificuldade em virar o corpo e encarar a realidade. Por fim, fez o que tinha que fazer.

Dean estava lá, deitado, imóvel, com as bochechas vermelhas, os lábios rachados e esbranquiçados; a pele de seu rosto tinha um brilho plastificado, como se fosse rasgar a qualquer momento; sem falar em todos aqueles fios e tubos ligados ao seu corpo. Todas aquelas máquinas com luzinhas e bipes e sobes-e-desces, que o estavam tirando do sério.

Esfregou o rosto com as mãos e arrastou a cadeira acolchoada mais para perto da cama, sentando-se.

Dean estava ali outra vez. Novamente sobre um leito hospitalar. Mais uma vez, lutando pela vida. Tudo de novo, como num filme repetido.

Num movimento automático, Bobby elevou sua mão e pousou-a sobre a mão direita do amigo. Passou seus dedos delicadamente por cima da luva de gesso que envolvia dos dedos, ao meio do antebraço de Dean.

Seus olhos cansados fizeram o caminho do tubo plástico que saía da agulha e subia até um suporte metálico. Observou, por algum tempo, o líquido vermelho que pingava do frasco suspenso. Continuou sua varredura visual, passando por cada aparelho, ouvindo cada som, examinando cada movimento. Perdeu-se aí por bastante tempo. Sua cabeça ainda dava voltas. Seguiu com sua vistoria silenciosa. No rosto de Dean, olhando agora bem de perto, havia uma infinidade de pequenos cortes, como se uma janela tivesse sido estilhaçada sobre ele.

_ Senhor? – A mão pequena tocou o ombro de Bobby, fazendo-o saltar na cadeira _ Perdão, não queria assustá-lo, mas chamei duas vezes e, como não respondeu...

_ Oh, não... – apertou os olhos, voltando-se para encarar a mulher de cabelos curtos, encaracolados e grandes olhos azuis _ Está tudo bem. Eu só estava um pouco distraído.

_ Pude perceber – Ela sorriu e deu a volta na cadeira, aproximando-se de Dean e verificando as informações nos painéis dos aparelhos _ Mas não fique constrangido. Isso é muito comum por aqui – Deu a volta na cama e alterou a velocidade do conta-gotas do soro _ Toda essa espera, muita ansiedade e nada a fazer. É terrível.

_ Nem me diga...

_ Oh, que falta a minha! – Parou, de repente, as anotações que fazia e direcionou um olhar terno ao homem sentado que a observava, silencioso, com uma expressão curiosa _ Sou a doutora Sarandon.

_ Certo – Foi só o que ela recebeu em resposta. Bobby não estava disposto para amenidades sociais. Estava cansado, preocupado, faminto e meio enjoado.

_ O doutor Preston me passou o caso do seu sobrinho.

_ Eu sei. Ele me disse antes de sair.

_ Vocês conversaram a respeito das condições de Dean?- A médica colocou a prancheta com a ficha do paciente de volta ao pé da cama, pôs as mãos dentro dos bolsos do guarda-pó e encarou-o.

_ Ele disse muitas coisas e, para ser sincero, só algumas palavras entraram na minha cabeça: cirurgia, sangue, cuidados, ossos partidos... Eu... Eu estava muito abalado, sabe? Não estava pensando direito.

_ Certo. Então, acha que podemos conversar agora? Sente-se em condições de realmente ouvir?

_ Sim, senhora – Bobby se ajeitou no assento da cadeira _ Estou pronto.

_ Pois bem. Seu sobrinho, segundo consta, foi resgatado por dois rapazes nativo-americanos. Pelo estado em que chegou aqui, esteve sob a terra molhada e gelada e, não sabemos com certeza, mas isso pode ter ocorrido, pelo menos 10 horas antes do resgate, o que ocasionou uma hipotermia que conseguimos contornar. Está me acompanhando até aqui?

_ Sim, senhora - Aquela mulher gorduchinha, de bochechas coradas,estava fazendo questão que ele entendesse tudo, perfeitamente.

_ Ótimo. Dean sofreu uma cirurgia porque uma de suas costelas perfurou o pulmão direito – as sobrancelhas do homem se levantaram, em admiração _ Mas este não é o nosso maior problema, no momento. Nosso maior desafio será permitir que o rapaz se recupere dos muitos pequenos ferimentos sofridos que podem levá-lo a um quadro crítico.

_ Mas me foi dito que ele estava bem.

_ Bem não é o termo mais adequado. Nós o estabilizamos. Estamos monitorando os sinais vitais e refazendo exames em períodos curtos e tratando-o com anti-bióticos para controlar a pneumonia.

_ Pneumonia?

_ Sim, senhor. Como eu dizia, o que podemos fazer por enquanto, é mantê-lo confortável, aplicar-lhe a medicação necessária para combater a infecção e rezar para que ele continue lutando.

_ Certo – Um nó estava atravessado na garganta de Bobby _ Isso foi... muito...esclarecedor... eu acho.

_ Sinto muito se o assustei, mas como o único membro da família presente, precisamos que esteja consciente da situação.

_ Por falar em membros da família, o irmão de Dean, Sam, tem certeza de que ele não está internado aqui? Talvez como indigente?

_ Ninguém veio ver seu sobrinho além do senhor e, quanto a um possível João Ninguém, posso verificar se isso o tranquiliza.

_ Sim, doutora. Isso seria muito bom. Eu preciso achar esse garoto. Dean vai ficar louco se acordar e Sam não estiver aqui.

_ Então estamos combinados – ela sorriu daquele jeito doce do início da conversa e caminhou em direção à porta _ Vou ligar para o xerife e pedir que venha vê-lo. Faça um favor a si mesmo e vá até a lanchonete. Está com cara de quem precisa de um bom copo de café fresco.

Bobby sorriu para a médica e ficou observando enquanto ela passava pelo corredor, do outro lado da vidraça.

Um copo duplo de café preto e fresco era mesmo uma tentação e ajudaria a espantar o sono que o cansaço e o estresse estavam-lhe impondo.

***

O xerife Tompson aproximou-se da porta do quarto minutos depois da saída da doutora Sarandon. Parou antes de entrar e acenou para Bobby, que estava sentado ao lado do leito de Dean, pedidndo que saísse até o corredor.

_ Bobby Singer?

_ Sim – estendeu a mão em direção ao outro _ Xerife Tompson, eu presumo.

_ Exatamente – o homem da lei aceitou o cumprimento.

_ Eu gostaria de agradecer por ter-me chamado.

_ Não por isso – Voltou o rosto para a abertura envidraçada _ Como está o rapaz?

_ Aguentando. Os médicos dizem que vai melhorar, mas é preciso ter paciência.

_ Isso é bom – encarou o rosto do homem à sua frente, tentando lê-lo _ Temos uma excelente equipe médica aqui. Não se engane com a aparência provinciana. Eles realmente sabem o que estão fazendo.

_ Tenho certeza disso – Bobby cruzou os braços sobre o peito e inspirou o ar profundamente como que buscando forças para perguntar o que queria saber _ Alguma notícia de Sam?

_ Ainda não, infelizmente. Desde que falamos ao telefone, tenho perguntado por aí, mas creio que seus garotos não andaram muito pela cidade. Tem uma foto dele?

_ Sim – retirou a fotografia um pouco amassada de dentro do bolso do casaco _ Não é muito recente, mas ele não mudou nada.

_ Certo – observou o retrato onde estavam os dois irmãos e Singer, ao meio _ Vai ajudar muito. Vou até a reserva e alguns locais frequentados por turistas com essa foto. É certo que alguém os terá visto em algum lugar.

_ Xerife, seria um incômodo se eu o acompanhasse?

_ Na verdade, não, mas pensei que fosse preferir ficar aqui com Dean.

_ Ele está sedado e a doutora diz que permanecerá assim até, pelo menos amanhã de manhã. Então, não há nada que eu possa fazer por ele e esse cheiro, está me matando.

_ Sei do que está falando – o xerife sorriu, solidário _ Hospitais também me causam arrepios.

_ Então?

_ Se está disposto a passar horas gastando seu latim e sola de sapato comigo, por mim, tudo bem. É sempre bom ter companhia.

_ Ótimo. Vou apenas apanhar minhas coisas e seguiremos.

Bobby apanhou sua sacola e a carteira que tinha depositado sobre um criado mudo. Parou por um instante junto a Dean e, tocando sua mão, falou baixinho, como numa oração, um ‘Fique bem, garoto. Vou trazer seu irmão pra casa” e saiu.

***

A viatura policial estacionou junto à calçada que cercava o restaurante na saída da cidade e, dela desceram dois homens: um civil e um policial. Ambos caminharam os poucos metros que levavam até os três degraus que davam acesso à porta de entrada. Estava frio. Muito frio. Um vento gelado cortava a rua, queimando a pele exposta.

Bobby levantou a gola do casaco e enfiou as duas mãos nos bolsos, arrepiando-se até a alma. Imaginou seus garotos passando a noite ao relento e seu coração congelou com a imagem.

Ambos atravessaram a porta e perceberam, imediatamente, o ar aquecido do lado de dentro.

Não havia muita gente no estabelecimento àquela hora do dia. A placa dizia Restaurante do Harold, mas aquilo ali estava mais para um bar que, na falta de coisa melhor, servia refeições ao passantes.

Tompson tomou a frente e sentou-se, apoiando os cotovelos sobre o balcão, no que foi seguido por Bobby.

_ Olá, xerife - A figura que se aproximara, em nada combinava com o nome: alto, musculoso, careca e com um bigode enorme que caía por cima dos lábios, Harold exibia uma coleção respeitável de tatuagens e adornos _ Meio cedo para a cervejinha, não é?

_ Estou de serviço, Harold - o homem da lei tirou o boné e ajeitou os cabelos castanhos para trás _ Mas vou aceitar um café bem quente, se tiver. E para o meu amigo aqui, também.

_ É pra já – Antes de terminar a frase, já tinha a jarra e duas xícaras nas mãos, servindo os dois homens recém-chegados.

_ Você viu esses dois por aqui? – Depositou a fotografia dada por Bobby sobre o balcão e apontou as imagens de Dean e Sam, nela.

_ Não tenho certeza – o atendente puxou a foto para mais perto e sacou seus óculos de leitura de dentro do avental _ Acho que sim... Talvez, mas isso deve ter sido há uns quatro ou cinco dias.

_ Tem certeza? – Bobby interveio pela primeira vez _ Estavam os dois?

_ Sim, tenho certeza – retirou os óculos e virou a foto para o xerife _ Eles chegaram perto da hora do almoço, pediram comida e sentaram lá no fundo. Conversaram por um tempo, enquanto comiam e o rapaz de cabelos escuros parecia bastante aborrecido.

_ E você, certamente, não ouviu o teor da conversa, não é? – a fama de fofoqueiro de Harold o precedia.

_ Eu só cuido da minha vida, se quer saber – deu as costas e entrou na cozinha, ignorando a presença dos homens mais velhos.

_ Fantástico! – O rosto do caçador estava vermelho de irritação _ Grande abordagem, xerife.

_ O que eu fiz? O cara é o maior fofoqueiro da cidade e vem me dizer que não ouviu nada do que seus sobrinhos conversavam? Corta essa! É lógico que ouviu algo. Só está fazendo jogo duro para nos arrancar algum dinheiro, isso sim!

_ Espero que esteja certo, senhor – Singer tirou a carteira do bolso da calça_ Porque dinheiro é o menor dos meus problemas – Chamou pelo homem _ Hey, Harold! Harold, por favor, preciso que responda a umas perguntas. Qual é, cara!

_ Eu não vou falar com ele – apontou o xerife com o olhar.

_ Eu vou falar com você – Bobby acenou com algumas notas entre os dedos _ Essa vai ser uma conversa entre nós dois, prometo.

_ Então, está bem – Harold aproximou-se do balcão outra vez e apanhou a nota de 50 que Bobby depositara junto à bandeja de copos _ A Mandy comentou algo sobre os rapazes falarem em subir a montanha na terra dos Sioux.

_ A Mandy? – o policial interrompeu, mas calou-se diante do toque de Singer em seu braço.

_ Não é todo dia que gente feito aqueles rapazes aparecem por aqui. A maioria dos clientes é de caçadores, lenhadores e mineiros cascas-grossas. Tenho que admitir que os sujeitos chamaram a atenção. Como eu disse, eles comeram, conversaram; o mais alto ficou fuçando no computador e o outro deu uma surra no Justin e nos caras da mina na sinuca. Literalmente limpou os caipiras.

_ E mais alguma coisa?

_ Bem... Acho que não. Eles pagaram a conta e foram embora.

_ E não voltaram mais? – Bobby quis saber de detalhes.

_ Não que eu saiba. Mas, afinal, o que aconteceu?

_ Eles foram apanhados no deslizamento e o mais moço ainda está desaparecido – Tompson apressou-se em responder, apontando Sam no retrato.

_ Você foi muito útil, Harold – Bobby colocou outra nota sobre o balcão e anotou nela, o número de seu telefone celular _ Se lembrar de mais algum detalhe ou ouvir alguma coisa por aí que possa nos ajudar, chame, okay?

Aquela figura estranha, meio bizarra, puxou a nota com a ponta dos dedos, verificou o número e guardou-a no bolso do avental, concordando com um aceno.

***

FLASHBACK ON

Dean, acorda. Anda, acorda. Tem alguma coisa aqui, cara.”

Me deixa, Sam. Estou cansado... Não consigo mais... Não dá. “

Vamos lá, mano, você precisa reagir e se levantar daí. Tem alguma coisa aqui. Eu posso sentir.”

Eu estou congelado, Sammy... Minhas pernas estão dormentes...Não consigo respirar...”

Não dá mais pra ficar aqui, Dean. Temos que continuar andando. Vamos, me ajude. Tente apoiar-se em mim.”

Está muito frio...”

É, eu sei, mas se não sairmos daqui logo, o frio será o menor de nossos problemas.”

Estou... sem...ar...”

Qual é, cara. Preciso que me ajude. Você consegue. Respire. Você consegue. Nós vamos conseguir.”

Eu não...vejo... nada.”

Está escuro. Vou acender a lanterna. Pronto. Viu? Vou iluminar o caminho e sairemos dessa. Dean? Dean? Dean! Oh, meu Deus... O que... o que... onde... Afaste-se de mim. Afaste-se de nós! Não!!!”

***

CONTINUA...

***

NOTA: Não entendo nada de medicina, então quaisquer informações quanto aos problemas de saúde e cuidados com Dean, se basearam no que já ouvi por aí. Se houver algum leitor com conhecimento na área de saúde, por favor, desconsidere os erros que possam existir neste e nos próximos capítulos, me perdoe e/ou me corrija.

***

 


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