Não sei quanto tempo fiquei correndo, mas sei que não foi o bastante. Logo estava perto da saída e temia que Dylan e Mia vissem Daniel assim. Então parei e me arrisquei.

Quando ele me alcançou, seus olhos ainda estavam vermelhos, mas logo voltaram ao verde brilhoso de antes. Respirei aliviada e logo depois falei:

- Você é um 7, também?  - perguntei recuperando o fôlego. Ele hesitou em responder e apenas balançou a cabeça afirmando. - Porque não disse? Eu falei tudo para vocês, eu disse tudo o que eu era...

- Você não disse tudo – ele me interrompeu – Pelo menos não de primeira.

- Tem razão, mas eu disse pelo menos. – falei. Meus olhos ardiam e mostravam sinal de que iam rolar lágrimas daqui a pouco – Há quanto tempo sabe que é assim? – perguntei a ele.

Ele deu de ombros, mas me disse:

- Não sei, há 6 meses, mais ou menos. – ele falou, evitando me olhar.

Tentava segurar as lágrimas, mas elas queriam sair cada vez mais. Passei a Mao nos dois olhos, impedindo que elas caíssem. Respirei fundo e perguntei:

- Os seus irmãos sabem, Daniel? Dylan e Mia sabem?

- Não – ele foi curto e grosso – E os seus, Abby, eles sabem? – não gostei do jeito com que ele pronunciou o meu nome. Como se fosse uma coisa ruim.

- Sim, caso você não se lembre, o médico falou na frente deles e na frente dos meus pais. – respondi a ele.

Ah, pare com essa “baboseira” garota. – falou a voz. Eu já estava irritada e ela não tinha ajudado nem um pouco.

- Saia daqui! Cala a boca – gritei com ela. Mas só depois eu me lembrei: só eu a ouvia e ali só havia Daniel.

- Como? Eu nem estou falando com você garota. – ele falou ríspido. – E não vou sair daqui também, saia você.

- Não. Era. Com. VOCÊ! – gritei com ele.

- Então com quem era? – ele perguntou cruzando os braços.

- Com a voz! – respondi fazendo o mesmo gesto que ele.

É claro que era comigo. – ela disse.

- Será que dá para você ficar quieta? – pedi nervosa. – E você – olhei diretamente para ele – Você sabia que eu a ouvia porque eu te disse isso hoje de manhã!

- Você me disse que ouvia o que nós, os 2, ouvimos. Não me disse que era esse tipo de voz. – ele falou naquele mesmo tom.

- Por que fala nesse tom comigo? – perguntei, minhas palavras saindo tremidas.

- Porque esse é o tom que eu falo quando estou com raiva.

- É um péssimo tom – berrei, enquanto a voz cantarolava alguma coisa na minha cabeça. Aquilo havia me deixado mais irritada ainda.

- Quer saber, acho que não nos conhecemos o bastante para discutir esse tipo de coisa – ele disse.

- É, eu realmente acho que não nos conhecemos mesmo – afirmei.

- Então acho melhor terminarmos. – ele falou.

- Perfeito – eu concordei. – Então terminamos. E não fale mais comigo!

Depois ele sumiu floresta adentro e eu voltei devagar para casa. Só no caminho que fui perceber as minhas palavras. Eu acabara de terminar com ele, ou ele acabara de terminar comigo, não sei. E essa voz... Tudo culpa dela...

Não é culpa minha.

- É sim – respondi com o sangue subindo a cabeça. Enquanto isso ela continuava a cantarolar.

Pobre Abby

Inocente Abby

Parece uma santinha.

Quando será,

Que vão descobrir,

Que não é nem uma

Anjinha?

- Se depender de mim nunca.

Mas se depender de MIM, logo, logo.

Ignorei-a e entrei na casa. Olhei para o relógio. Ainda era uma da tarde. Sabia que Dylan e Mia só chegariam lá pelas 3. Então apoiei na porta e fui deslizando até cair no chão. Sentia falta da minha mãe, ela saberia o que fazer, dos meus irmãos, que iriam me alegrar e do meu pai que iria me ajudar também.

E finalmente deixei as lágrimas caírem.