POV Sophie

A senhora Callowey quase caiu de costas quando fitou a todos nós, quase não contive o riso ao ver sua expressão assustada, para sorte dela e também nossa eram apenas pequenos curativos, até mesmo nós poderíamos cuidar uns dos outros, mas eu sabia que ela era rígida demais para deixar. Nos sentamos nas macas da enorme enfermaria e eu observei Sharon de longe, ela colocou a mão em seu pescoço e fechou os olhos, em segundos as marcas e cortes sumiram. Algo em mim gelou e olhando em outra direção encontrei o olhar fixo de Marriete sobre ela, a ruiva a olhava com dúvidas, eu podia ver as incógnitas em seus olhos acinzentados e no segundo que Sharon se levantou deixando a enfermaria com cara de tédio ela a acompanhou com o olhar. Deixamos a enfermaria mais ou menos meia hora depois, tudo que passava na minha cabeça era um bom banho. Atravessei a porta da enfermaria e fui parada por Marriete que segurou o meu braço:

– Que susto! – Falei recuperando o fôlego.

– Preciso da sua ajuda. – Ela falou quase num sussurro.

– O que houve?

– Como você disse que Sharon se chamava?

– Blackmore.

– Te encontro em meia hora na biblioteca. Não comente, não seja seguida, não leve ninguém.

Dizendo isso ela saiu sem ao menos me dar a chance de discordar. Fiquei ali por um momento atônita, desde quando ela me dava ordens? Ou melhor, desde quando ela falava comigo? E desde quando ela falava? Me dirigi ao meu quarto e encontrei Lauren saindo do banho ela passou por mim que eu nem vi. Ela sorriu se aproximando da cama dela onde estava a roupa:

– Vou fazer o mesmo. – Eu disse sorrindo.

– Ta tudo bem? – Ela perguntou com uma expressão confusa.

– Claro... Ta sim...

– Onde está a Marriete?

– Ahn... Não sei. Eu não vi pra onde ela foi.

– Estranho...

– É... Eu ahn... Volto em um minuto.

POV Andrew

Calleb, Mathew e eu estávamos combinados, agora só precisávamos encontrar as meninas, teríamos uma semana de pausa nas aulas graças a aula de defesa pessoal que ficou perto de acabar em enterro. Saí do quarto apressado em busca de Lauren, ela se encarregaria de chamar as outras meninas quando eu a avisasse. Cheguei no salão principal e alcancei o lance de escadas tomado por um sorriso bobo, não podia deixar de conter a ansiedade, cheguei no corredor do quarto delas e bati a porta um tanto ansioso. Reconheci a voz dela dizendo “Só um minuto.” Em questão de alguns minutos ela apareceu na porta surpreendendo-se em me ver:

– Andrew?

– Oi... Eu queria te pedir que avisasse a Sharon e Jessica que vamos “passear” essa noite.

– Ah, você quer que eu avise? – Ela falou sarcasticamente. – Mais alguma ordem mestre?

– Qual é? – Eu ri. – Vai ser divertido!

– Tudo bem, eu vou ver se elas querem ir.

– E você quer? – Sorri.

– Vou pensando no caminho.

– Nos vemos as 22h no muro de sempre.

Deixei-a indo ao encontro de Matt e Calleb que estavam no quarto de Calleb. Quando desci o último lance de escadas alcançando o salão eu avistei Sophie que parecia um pouco assustada como se estivesse se escondendo de alguém, me aproximei dela devagar tocando-lhe o ombro:

– Tudo bem?

– Meu Deus! – Ela falou dando um pulo de encontro à parede. – Quer me matar de susto Andrew?

– Ta fugindo de quem?

– Fugindo? Eu? Que idéia. Eu estou indo... Para o meu quarto.

– Ta bom... – Falei desconfiado.

– Até mais.

Ela me disse virando as costas e caminhando em direção as escadas. Ainda a olhei por um momento e caminhei em direção ao quarto de Calleb que ficava naquele mesmo corredor, tudo estava silencioso demais e eu cheguei a achar estranho. Entrando no quarto sem bater presenciei os dois conversando enquanto desfrutavam de um jogo de cartas:

– Falou com elas? – Calleb perguntou atento no seu jogo.

– Sim, Lauren vai ver se as outras querem ir e nos encontramos no muro norte.

– Ao que parece as inimigas mortais deram uma trégua. – Calleb brincou.

– Acha mesmo? Eu duvido muito, e por via das dúvidas mantenha a Jessica bem longe da Sharon enquanto estivermos lá. – Matt disse colocando seu jogo na mesa.

– Droga! – Calleb exclamou atirando as cartas sobre o jogo de Matt. – Digo o mesmo pra você!

– Ok pessoal, sem brigas e sem pensamentos ruins, vamos ter uma noite perfeita à seis, por favor.

– Tudo bem Don Juan! Talvez assim você consiga criar coragem e pedir a Lauren em namoro. – Matt falou rindo.

– Olha quem fala! Esse tempo todo e você ainda não dobrou a Sharon!

– O lance com a Sharon é diferente... – Ele pareceu sério.

– Qual é Matt, ta escrito na sua testa que você arrasta um planeta por ela! – Calleb falou atirando um travesseiro em Matt.

–Você não pode falar muito porque a Jess ainda está solteira e você só ai... Dormindo.

– Pow Calleb, toma café irmão! – Andrew riu.

POV Jessica

Olhei para Sharon que penteava os cabelos loiros com uma expressão distante, me lembrei da aula de defesa pessoal onde lutamos juntas e percebi, na sua provocação, que havia algo mais nela em relação à mim.

“- Olha você pensa- Ela me fitou com um olhar debochado, mas havia algo por trás daquele olhar, eu não conseguia identificar o que era, mas me senti estranha por um segundo.

– Claro que penso, a fama de burra é das loiras- Rebati.”

– Algo errado?

A voz dela ecoou pelo quarto e só então eu percebi que ainda olhava pra ela fixamente enquanto recordava o ocorrido, meneei a cabeça falando calmamente:

– Nada.

– Difícil a aula hoje não? – A voz dela era igualmente calma, os olhos verdes me fitaram, sem maquiagem eles pareciam ternos, quase bons.

– Difícil é imaginar algo sendo difícil pra você... A “senhorita auto-suficiente”.

– Há muito mais por trás de mim do que você consegue enxergar...

– E sinceramente, não gosto nada do que vejo.

As batidas na porta interromperam a discussão que provavelmente iria se formar ali levantei e caminhei até lá abrindo e me deparando com Lauren, ela estava produzida para um encontro, calças jeans de um azul impecavelmente escuro, uma bata verde e por cima um suéter amarelo bebê. Um colar e um par de brincos combinando, nos pulsos pulseiras variadas e nos pés uma sapatilha preta.

– Onde é a festa? – Perguntei olhando-a de cima a baixo.

– Será em um lugar muito legal e nós fomos convidadas, topam?

– To fora. – Sharon falou levantando e caminhando até o armário.

– Qual é Sharon não estraga a festa! Mathew pediu pra chamar você!

– É loira, vamos lá! – Falei na tentativa de animá-la, mesmo sem saber por que.

– É sério? –Ela olhou pra mim perguntando sarcasticamente.

– Se você não for o Matt vai perder essa, ele não vai querer ir sozinho.

– Ah vá Sharon, não seja chata. – Lauren pediu com jeitinho.

– Ai ela ia deixar de ser ela. – Falei revirando os olhos.

– Tudo bem...

Lauren saiu e começamos a nos vestir, a loira colocou uma calça jeans preta e um blusão regata branco com uma imagem da Tarja Turunen. Vestiu por cima uma jaqueta de couro simples com zíper e um coturno de cano médio. Enquanto ela colocava toda a maquiagem pesada nos olhos eu terminava de calças as sapatilhas me analisando no espelho pra me certificar que tudo estava certinho. Optei por uma calça Capri azul, uma batinha branca e um suéter rosa bebê. Prendi os cabelos em um rabo de cavalo e coloquei umas pulseiras simples.

POV Marriete

Olhei no relógio por provavelmente a vigésima vez e soltei uma lufada de ar irritada, já estava desistindo de esperar pela pirralha da Sophie quando ela finalmente decidiu dar o ar da graça. Parecia um animal assustado, caminhava apressada como se estivesse fugindo do Fred Krueger. A recepcionista da biblioteca parou-a provavelmente para saber o que ela fazia ali uma hora daquelas, vi quando ela apontou o dedo pra mim e passou caminhando entre as mesas até chegar onde eu estava.

– Já estava desistindo de esperar você!

– Desculpa, mas enfim, do que você precisa de mim?

– Eu sei que você também tem todos os pés atrás com a Sharon... Não está sozinha nesse jogo, eu tenho certeza que tem algo errado com aquela garota! E quero descobrir o que é!

– Bom, ela tem magia no sangue dela isso por si só já não é boa coisa, precisamos descobrir de onde vem.

– A magia não é o problema Sophie, não totalmente, abra os olhos.

– O que quer dizer.

– Olha isso... – Falei colocando o livro que eu lia enquanto esperava ela chegar no centro da mesa. – Aqui está a linhagem da família Blackmore. Está vendo aqui? – Apontei para o meio do esquema no livro. – Ela vem de uma ligação bastarda com a família real inglesa.

– Então o sangue dela é real?

– Não exatamente, vê só o que eu achei. – Coloquei sobre o livro algumas folhas que havia imprimido. – A mãe da rainha Victória tinha um diário pessoal onde ela colocava os segredos mais valiosos da família, poucas página desse diário foram encontradas pelos historiadores, ao que se sabe a cabecinha real dela era muito meticulosa. O que acontece é que a família real era ligada à magia, e não era qualquer magia, eles tinham uma feiticeira particular.

– Certo e onde a família da Sharon entra nisso?

– Bem, a ancestral mais próxima de Sharon é Esther D’ávilla ela é filha de Alastair Hemswood e Theodora, mãe da rainha Victória.

– A rainha pulou a cerca...

– Você não viu nada. Essa mulher teve quatro filhos, três mulheres e um homem, a mãe de Sharon é Evangeline Blackmore o que eu acho que a loira mal humorada não sabe é que a mamãezinha dela é filha de uma das piores bruxas que já houve no século XVIII, e eu to falando de magia negra da feia!

Eu coloquei os papéis na ordem em que pesquisei e conforme ia explicando a Sophie eu apontava nos papéis sobre o que estava falando. Tentavamos falar o mais baixo possível a fim de que a bibliotecária não ouvisse nossa conversa.

– Então é por isso que ela tem uma aura tão pesada.

– O que se passa com ela é o que temos que descobrir, mas eu fiz uma descoberta bem interessante no momento...

– O que?

– A mãe de Sharon teve duas filhas. Será que ela sabe disso?

– Como você descobriu isso? – Ela me olhou chocada.

– Consegui hakear os arquivos do hospital onde ela deu a luz, foram gêmeos fraternos... E ao que parece um caso raro, só que o interessante é que ela deu uma das crianças para adoção. Aqui não diz o sexo nem o nome do bebê.

– Então a bruxinha tem um irmãozinho. Precisamos contar isso pra Lauren.

– Enlouqueceu?!

– Ela é a mais responsável do grupo e a pessoa mais indicada para se aproximar da Sharon e conseguir alguma informação que nos ajude a entender mais a história.

– Acha mesmo que ela vai topar fazer isso?

– Eu sei que vai, ela mais que ninguém quer saber o que tem de errado com a loira metida.

– Então tudo bem, mas tenta meter o menor número de pessoas possível, se ela descobrir sabe-se Deus o que pode acontecer.

– O que quer dizer?

– Nossa, você é cega mesmo não é? Não percebeu? Os poderes malignos dela aparecem quando ela está com raiva!

– Por isso ela atacou a Jess...

– Por isso ela sempre ataca a Jessica. A garota tem o dom de irritar a loira! Se a gente quer saber o que tem de errado mesmo com aquela garota precisamos ser cuidadosos.

POV Lauren

As meninas saíram do quarto cada uma linda ao seu estilo, sorri olhando-as em sinal de aprovação. Sharon estava levemente retraída aquela noite, como se algo a incomodasse. Olhei no relógio em meu pulso e vi que faltavam cinco minutos para as dez, os meninos provavelmente estavam nos esperando. Saimos através do corredor tomando cuidado para que nenhum dos guardas nos visse e ao chegarmos no muro norte lá estavam eles, não contive o sorriso ao ver Andrew, e pela primeira vez vi Sharon sorrir ao se aproximar de Matt, ela tinha um sorriso muito bonito, acho que mais por ser tão raro. Ela parecia confiar nele, achava inclusive que os dois se gostavam.

– Bom, já que estamos todos vamos antes que alguém nos pegue!

Rimos baixo. Calleb segurou na cintura de Jess e ambos atravessaram o muro sem dificuldade, Sharon abriu a mão para o muro e no mesmo instante a parede abriu-se como uma porta, atravessamos ganhando a liberdade. O carro de Andrew estava como da outra vez do outro lado, caminhamos em silencio pela entrada do castelo até chegar a ele, eu fui com ele na frente e os outros quatro acomodaram-se no banco de trás. Eu já conhecia o lugar, mas era a primeira vez que os outros iam e imaginei que depois de um dia duro como o que tivemos nós merecíamos aquele momento de calmaria a lua cheia pintava toda a paisagem com sua luz prateada e pálida, pela janela eu observava maravilhada a copa das árvores iluminadas como se as folhas do topo brilhassem, e imaginei que a cachoeira deveria estar maravilhosa tocada por aquela lua.

Chegamos a mais ou menos meia hora. Como eu imaginei a lua prateada refletia sobre a água fazendo com que a água da cachoeira parecesse igualmente prateada, o brilho das águas fazia o lugar parecer mágico, Calleb levou Jessica para uma rocha mais afastada de nós, eu entendi que o motivo era manter Sharon e ela afastadas uma da outra e achei melhor. Matt e Sharon sentaram-se à margem do rio juntos, mas separados, olhei para Andrew e sorri sentando-me com ele em um tronco caído com vista para todo o lago.

– Hoje a noite está linda. – Falei observando o lugar.

– Não mais linda que você. – Ele sorriu segurando minha mão.

***

[Sharon POV de entrelinha]

– Eu adoro lugares assim... – Falei calmamente. – Me fazem sentir bem.

– Eu também... Mas gosto principalmente da sua companhia. – Ele me olhou sorrindo.

– Tenta outra. – Sorri em resposta. Ele abaixou a cabeça rindo.

– Como você é difícil hein!

Suspirei calmamente olhando o brilho da água, era semelhante à noite naqueles animes que eu costumava ver quando criança, algo estupendo e tão real.

– Sabe... Gosto de ficar com você Matt... Quando você esta perto eu não tenho medo de ser eu mesma.

– Não quero que você tenha medo de nada... Nunca.

– Por que se importa tanto?

– Por que você é importante pra mim. Importante demais.

– Você nem me conhece.

– Eu já sei o bastante. O resto é só o tempo.

Não havia como argumentar com Matt, ele tinha certeza do que queria e não desistiria nunca, eu o conhecia o bastante para saber. Nesse momento levei minha mão a dele e a segurei, ele entrelaçou nossos dedos enquanto olhava dentro dos meus olhos, o encaixe perfeito.

***

Olhei para cima e vi Jess e Calleb abraçados observando a lua, todos nós estávamos desfrutando daquele momento de paz, que parecia tão inabalável e por um momento eu desejei que a noite se arrastasse, que aquele momento se eternizasse, encostei a cabeça no ombro de Andrew que envolveu o braço em volta do meu corpo naquele instante nada mais importava, estávamos bem e antes de tudo: Estávamos juntos.