Quando Escureceu escrita por Vibeke Osterhus


Capítulo 1
Capítulo Único


Notas iniciais do capítulo

Esta estória foi escrita quando eu tinha 14 anos, hoje estou com 24, e a considero meia crua, porém decidi mantê-la assim mesmo para não perder a sua essência . Espero que gostem. ^^



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QUANDO ESCURECEU


 1


 É meia-noite, sempre foi meia noite.

 Contemplo o céu estrelado da janela de meu quarto vazio, rodeado por corredores silenciosos.

 Ainda é meia-noite, sempre será meia-noite.

 Talvez haja uma chance, eu talvez, ou Luther quem sabe. Não, acho que não há chance alguma. A esperança foge de mim, passa entre meus dedos quando tento agarrá-la. Luther sempre tenta me convencer a continuar, eu não quero, eu não posso, eu não devo continuar.

 Não sei por que ainda estou pensando nisso, eu já tomei uma decisão e não quero voltar atrás, não é preciso voltar. Covarde? Acho que não. Mas essa palavra ressoa na minha mente. Vou me deitar, talvez eu esqueça tudo isso. Minha cama me abraça, mas eu não posso fechar os meus olhos, imagens em vermelho ainda me atormentam, crianças choram e suas mães chamam meu nome e todos os homens lutam, por que eles ainda lutam? Eu já disse para desistirem. Talvez eles tenham esperança, a mesma esperança que foge de mim. Meu povo ainda acredita em mim. Não dá para continuar, eu só posso esperar que eles parem de lutar e fujam, ou então... Nada mais poderá ser feito.

 Oh, Deus do sono me acalente! Eu não quero mais pensar nisso, meu olhar está preso no teto, mas minha mente viaja pelos campos de batalha. Acho que estou perdendo meus sentidos, o Deus do sono deve estar me abençoando. Será que já estou sonhando ou há realmente alguém subindo as escadas, correndo pelos corredores sombrios, se aproximando? Desejo, eu realmente desejo que essas batidas em minha porta sejam parte do meu maldito sonho.

 "Lady Furlyen! A Senhora...”.

 "Já ouvi nobre Johannes".

 “O Conde de Sjöholm a espera no salão principal, ele pediu que avisasse”...

Luther? Sempre que ele aparece...

 “... e também disse que se demorasse muito partiria sozinho!"

Partiria sozinho?

 Maldito Luther, ele sempre consegue me tirar de meus devaneios, mesmo eu pedindo para que me tirassem deles. Na verdade eu não queria. Para onde mesmo Johannes disse que ele iria?

 Desci as grandes escadas do salão principal, minha mão apertando meu seio tentando conter uma dor que sabia que não iria passar tão fácil.

 "Ah, olá Lady Furlyen! por que a demora? Bom, já que estou sem muito tempo não darei meus argumentos, só direi que me satisfazem, espero uma resposta sua que valha pelo meu precioso tempo perdido aqui, Milady!”

 "Minha resposta? Não creio que há uma resposta sem uma pergunta!"

 "Isso não é uma brincadeira Furlyen! Pedi para que Johannes a avisasse, pois... enfim irá ou ficará trancada dentro de suas muralhas?"

Irei... Para onde? Onde mesmo Johannes disse que ele iria?

 "Eu não sei...”.

 "Ótimo! Vim até aqui para receber a mesma resposta de sempre. Por que ainda me importo? Por que ainda tenho esperança?"

A mesma que foge de mim?

 “... a mesma esperança que você teme!"

 "Eu nunca disse que tinha perdido minhas esperanças! (Eu não a temo, é ela que...) Eu só gostaria de saber o quê fará? Já tentamos de tudo e as pessoas continuam morrendo!"

 "Então irei morrer junto delas!"

 "Luther..."

Aquela feição, aquela maneira brusca, aquele olhar, nem mesmo o rosto parecia pertencer ao Conde de Sjöholm.

 A enorme porta batendo fez um som horrendo, o som de uma despedida final, por ela acabou de passar meu último amigo e aliado ainda vivo, e fui eu mesma quem o expulsou de minha vida, não porque eu quisesse. De repente meu coração começou a doer novamente, eu já não sabia se Luther iria voltar desta vez.

 "Senhora se quiser...”.

 "Não precisa Johannes, voltarei para meu quarto desta vez não quero que me incomode por nada... o pior já passou!"

 "Sim, como quiser minha Senhora!"

 Às vezes ficava incomodada com a obediência de Johannes, me parecia que ele não se importava em me agradar com meus luxos por mais absurdos que eles poderiam parecer.



   2


 Já no meu quarto, ainda estava sendo atormentada por lembranças e ainda tinha que me preocupar com Luther. Onde eu estava com a cabeça para ter deixado meu amado amigo partir para sua desgraça. Ele já participou de várias batalhas, eu sei, mas como nunca se feriu gravemente, talvez ache que seja só uma brincadeira...

 Não, ele sabe que não é uma brincadeira.

 Ele é um nobre senhor, sempre teve seus cavaleiros para protegê-lo, mas quase todos já morreram. Ele é jovem e não tem muita destreza com a espada, pode ser muito arriscado, ele pode morrer.

Ele vai morrer.

 (Então irei morrer junto delas!).

 Eu irei conseguir viver com esse fardo? Saber que deixei ele morrer? Saber que eu o matei, pois não tive coragem de protegê-lo, eu não consigo enxergar o que ele quer que eu enxergue, não quero voltar a ver o sofrimento, mesmo que eu me importe meu inconsciente bloqueia qualquer sentimento de piedade, eu realmente não quero que ele morra, mas ao mesmo tempo não consigo me mover para impedir que o pior aconteça.

 Tudo parece rodar, minhas tormentas se foram para dar lugar a um mar de confusão. Não estou mais deitada, não consigo ficar deitada, começo a ficar realmente preocupada. O quê será que ele esta fazendo? Cavalgando em direção à morte? Ou... já terá morrido? Não consigo ficar parada, meu coração começa a bater forte num ataque de remorso.


   3


 "Tem certeza, Senhora? Conde de Sjöholm deve estar a quilômetros daqui”.

 "Eu não posso ficar aqui esperando que alguém, algum mensageiro, vir me dizer daqui a algum tempo que Luther está morto. Eu não aguentaria tamanha dor, eu morreria também!”

 "Mas, Senhora, sabe que aqui estará a salvo!"

A salvo? É por isso que eu não queria sair? Eu tenho medo? Medo do que? Não há do que ter medo.

 "Johannes, arrume minhas coisas e mande dois empregados selarem meu cavalo."

 "Senhora...!"

 "Por favor, nobre Johannes, antes que eu mude de ideia!".

De novo

 Na hora eu nem me dei conta, mas Johannes estava tentando me impedir, ele nunca havia feito isso, sempre que eu pedia ele fazia, sem nunca falar nada, até nobre Johannes sabia o que iria acontecer, então por que Luther também não podia enxergar isso? Não quero pensar que Luther conhecia a verdade, mas mesmo assim queria continuar

Eu não quero, nem devo continuar

 eu também estava continuando

Estava?

 mas, eu tinha um objetivo, teria Conde de Sjöholm um também? Destruir Lorde Hardcastle? Ele sabe que já tentamos de tudo e a meia-noite continua reinando! Eu não sei, mas acho que quero que seja assim, a escuridão tem seu lado positivo, enquanto a luz ofusca as trevas fortalece. Seria esse o segredo do poder de Lorde Hardcastle? O segredo do poder. Se ele precisa de um segredo é por que tem uma fraqueza.

 Estou com medo! Medo de voltar atrás, voltar a ter esperanças.



    4


 Meu cavalo parece estar muito cansado, desço e resolvo ir a pé, não quero me preocupar com outro ser que tanto gosto, já me basta as extravagâncias de Luther, sei que ele voltará a salvo, é um animal muito esperto.

E eu? Com todo o supremo raciocínio na qual minha raça se distingue das outras serei capaz de voltar a salvo?

 Meu Deus! A cada passo minha aflição aumenta, meu peito aperta dolorosamente, a fisgada é tão forte que às vezes me vejo obrigada a me apoiar em alguma das inúmeras árvores que me rodeia e me sufocam cada vez mais. Meus olhos se enchem de lágrimas quando minha mente sussurra: "Será agora, o meu fim?", mas não sinto nenhuma delas deslizando sobre meu rosto, talvez por que não seja apenas um pensamento perdido voltando em horas impróprias, talvez seja, neste momento, meu real desejo. A cada momento estou cultivando mais minha paixão pela morte.

 Continuo seguindo o rastro de Luther, não sei direito se esse caminho é o que realmente devo traçar: o caminho da morte, do reino, dos súditos, do povo, de Luther,...

A minha.

 Minha respiração acelera, o ar daquele lugar sombrio queima meus pulmões como fogo, as copas das árvores dançam ao luar eterno daquela maldita meia-noite, uma coruja pia e uma gota gelada percorre minha espinha, o tempo é curto e esse lugar um belo túmulo.

Percebo, nos troncos, marcas de lâminas afiadas, marcas incertas de uma provável mente insana, folhagem arruinada e... Sangue. Enfim, chego a uma clareira... Enfim, comtemplo o rosto da morte. Há sinais claros de uma batalha sangrenta, corpos mutilados, desmembrados, dilacerados. O sangue forma um rio grotesco de nascentes pútridas. Parece não haver inimigos ao certo, os mortos claramente são (foram.) do mesmo lado. Surpresa vejo que esse lado é o meu, são meus cavaleiros, meus súditos, meus aliados, todos mortos.

Caio aos seus pés e me entrego, tudo que é belo um dia morre. Não há mais nada que posso cultivar, tudo se foi e agora resta apenas a meia-noite que engole tudo ao seu redor.

Luther?

Ele me olha sem expressão suas faces manchadas de sangue seco, sua espada apontada para o chão goteja. Sua aproximação é lenta e para mim muito dolorosa, continuo ajoelhada no cascalho que me fere, ele segura meu cabelo puxando-o para trás me fazendo encara-lo, vejo um sorriso leve...

Oh, Luther... Lorde Hardcastle!

Sinto sua espada nas minhas entranhas, é tão gelada, tão cruel... Ele me beija e diz adeus e eu deixo minhas memórias fugirem, não quero levá-las comigo, não quero lembrar mais nada de quando escureceu.


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Notas finais do capítulo

Obrigado aos que leram.