Os Vampiros foram recebidos primeiramente na casa de Arilla, onde iriam ter a primeira conversa sobre a situação. Para tentar evitar qualquer tipo de desconfiança ou clima pesado, Arilla decidiu por ter na sala o mesmo número de Garous e Hemfils, levando consigo Thimoty e Jeremy. Nehemiah havia se retirado para seus aposentos dando como desculpa a idade e cansaço pelas últimas viagens. Tomas decidiu que não queria ficar perto deles, para evitar ser olhado como uma espécie de animal em extinção, então os dois amigos concordaram em sumarizar o conteúdo da reunião posteriormente.

    - Então foi isso. Realmente, não é de se surpreender que vocês nos chamaram, e fizeram bem. - Disse a vampira Anna com um ar pensativo.

    - Quer dizer que podem nos ajudar? Podem nos ajudar a descobrir o que foi este ataque? - Disse Arilla, desencostando da poltrona onde estava.

    - Na verdade, acredito que nós daríamos um jeito nesta situação mesmo sem o aviso de vocês. Este ataque tem a mesma natureza que alguns dos que tivemos sofrido desde o último mês por parte de alguns vampiros em nosso território.

    - Como assim? - Quem levantou a questão desta vez foi Thimoty - Você quer dizer que Tomas e o irmão dele foram mordidos e que vocês não pegaram estes caras antes?!

    - Sim, acredito que seja isto. Este grupo pequeno tinha feito alguns ataques em nossa área, e as descrições físicas dadas por Kristopher batem com as de nossas testemunhas. Provavelmente é o mesmo grupo que está mudando o local de operação, devido às investigações que estávamos empreendendo.

    - Ei ei! Não fuja do assunto! - Thimoty se levantou bruscamente, e quase instantâneamente os dois companheiros de Anna tomaram a frente, defendendo a líder com rosnados e silvos. Jeremy segurou o ombro do amigo, que por pouco não perdeu o controle e atacou. Arilla estava levantada em sua poltrona, com o semblante preocupado. - Como vocês conseguem viver bem sabendo que foram responsáveis pelas vidas de uma família inteira?! Tem um cara lá fora que teve seu mundo virado de cabeça pra baixo por culpa de vocês! 

- Thimoty, acalme-se! - Gritou Arilla com tanta superioridade quanto conseguiu. - Se você não consegue se controlar, pode sair! Você já fez sua parte aqui. 

    Lentamente, todos começaram a se sentar nos devidos lugares, porém o clima pesado de antes agora conseguia ficar ainda pior. Thimoty, especialmente, tremia de raiva.

- Não nos sentimos responsáveis... Thimoty, é isso? Não nos sentimos responsáveis por que não é nossa culpa. A culpa é completamente deles, seja lá quem forem, que destruíram a vida do seu amiguinho. Pra falar a verdade, nossas responsabilidades se resumem em nosso território, uma vez que eles saíram, não temos obrigação nenhuma de agir. Deixe eu lembrar que quem pediu ajuda foram vocês.

    A  Vampira tinha completa razão, e ninguém pareceu gostar muito disso.

- Agora... Tem outra coisa que quero discutir. O Tomas... Vocês tem alguma pista do por que ele é tão forte?
- Nenhuma. Não foi a primeira vez que Kris mordeu alguém e isso nunca aconteceu. Achamos que ele seja apenas uma exceção. Talvez tenha a ver com o fato de ter sido em uma Lua cheia, mas não temos nenhuma pista sobre isto também. - Disse Arilla tentando recuperar a compostura.
    Sem comentar mais nada sobre a última pergunta, os Hemfil decidiram que para uma primeira reunião eles já tem o suficiente para começar a pesquisar.
-Afinal, vocês ainda precisam dormir - Anna disse sorrindo maliciosamente enquanto saía pela porta.

- E é isso. Não vemos eles desde ontem de noite. Devem ter ido se esconder em algum lugar dentro das florestas.

    Era a metade da manhã e os três andavam a esmo pela pequena vila enquanto Jeremy e Thimoty contavam para Tomas o que acontecera na noite anterior.

- Então eles também não fazem idéia do por que que eu...

- Não dava pra esperar que a gente falasse só sobre você também. - Thimoty estava taciturno desde o dia anterior, distribuindo comentários ácidos a torto e direito.

- É, acho que você tem razão. Mas de qualquer forma, espero que tudo isso acabe rápido.

- Não é como se você tivesse pouco tempo né? Quer dizer... Você tem séculos pra pensar nisso tudo. - Jeremy disse, rindo sozinho.

- Não, não tenho.

- Tomas você...

- Eu já me decidi Jeremy, eu vou sair daqui pra procurar meu irmão assim que vocês me liberarem.

- Tomas, ele não é mais-

    Thimoty não conseguiu terminar a frase. Sentiu apenas a palma da mão de Tomas tapando sua boca. Lentamente Thimoty reagiu e pegou o pulso de Tomas, forçando-o a tirar a mão e revelando o sangue quente entre os lábios.

- Ele não é mais seu irmão.

- Thimoty! - Jeremy gritou mas sua voz não chegou ao ouvido dos dois.

    O soco de Tomas passou rente pela orelha de Thimoty, que conseguiu desviar e girou, levantando a perna e chutando o peito do primeiro, que deu um passo para trás. Sem nem mesmo esperar a primeira perna chegar ao chão, o segundo chute de Thimoty chegou de encontro ao rosto de Tomas, jogando-o alguns metros para trás. Tomas se levantou e cuspiu sangue no chão.

- Empatados. Babaca. - Thomas se virou e saiu andando. Jeremy deu um tapa na nuca de Thimoty, que limpava o sangue da boca com as costas da mão.

    Dessa vez ninguém o impediu de sair pelos portões em direção ao bosque que cincundava a vila. O ar ficava cada vez mais frio à sombra das grandes árvores e Tomas mais do que nunca queria poder se transformar e esmigalhar uma árvore. Não conseguia entender o por que de sua presença naquele lugar era tão importante assim. Nada daquilo era culpa dele, e ninguém parecia se importar com o fato de que Henrique estava tão ou muito mais perdido do que ele. Acima de tudo, ele odiava o fato de estarem fazendo-o engolir a situação toda goela abaixo. Não queria amigos, não queria uma guerra. Queria ele descobrir como lidar com aquilo tudo sem ninguém lhe ditando regras atrás de regras.

- É engraçado como vocês realmente conseguem fazer cara de cachorrinho abandonado, sabe? - A voz masculina se fez ouvir e meio ao silêncio do bosque, ao que Tomas prontamente se virou achando o dono dela sentado de costas em um pinheiro. Era o vampiro de cabelos compridos do dia anterior. - Ora se não é Tomas Ravenclaw.

- Você... 

- Richard Ytlayor, ao seu dispor. - Ele se levantou e mostrou um sorriso.

- Achei que vocês tinham que dormir durante o dia.

- Mesmo de dia é bom ter turnos de vigia, já que não contamos com os muros de vocês.

- Mas você está sozinho aqui. - Os risos do vampiro em relação ao comentário deixaram à mostra seus caninos salientes.

- O melhor jeito de vigiar é não mostrar que está vigiando, garoto.

- Que seja. Não quero incomodar. - Fez menção de sair.

- Não se preocupe, é sempre bom um pouco de companhia... Vai me impedir de dormir aqui.

- Eu não estou afim de conversar cara, foi mal--

- Nós temos a pista sobre seu irmão, Tomas.

- Vocês o que!? – Deu dois passos em direção ao outro.

- Temos uma pista. É algo que não queríamos falar para os outros cachorros, mas conseguimos a pista dele, apesar de ter perdido o rastro quente pouco tempo depois.

- Onde ele está? Que pista é essa?

- Não se preocupe, as pistas que temos dizem que quem o encontrou está do nosso lado.

- Eu preciso encontrar ele. Que porra de pista é essa?

- Woa woa, calma aí campeão. Não posso dizer muita coisa. Só achei que gostaria de saber, pra esfriar a cabeça. - O contraste entre os rostos se tornava cada vez mais evidente, como se Richard visse graça na expressão preocupada de Tomas. Talvez realmente visse.

- A chance de ele ser defeituosamente forte - risos - como você é, se me permite o comentário, é bem alta. Ele não vai se meter em uma encrenca que não possa resolver... Não se não procurar.

- Ele vai comer...

- Possivelmente. Mas quase todo vampiro passa por isso. Digamos pra pra nós é bem mais fácil de conseguir vítimas que para vocês, pelo menos nessa parte do mundo.

- Você não pode me pedir pra não me preocupar com ele. Ele é meu irmão. Uma coisa de sangue frio como você não pode entender algo assim.

- Você acha que somos assim tão diferentes, Garou? Eu não falei isso pra que você deixasse de se preocupar. Eu falei isso pra que você pare de culpar as únicas pessoas que podem e querem te ajudar puramente por causa do seu desespero.

    Silêncio. Os dois se encaravam.

- Você fala como se soub--

- Não seja ridículo. - Mais risos irônicos. - Oh, veja só. Brunnö chegou pra me substituir. - Olhou por cima do ombro de Tomas.

    O outro vampiro macho chegava andando decidido com o corpo completamente coberto por um sobretudo. Mal olhou para Tomas, chegou ao lado de Richard e tomou seu lugar, entregando-lhe o sobretudo. Só nesse momento Tomas notou que a árvore onde ele estava encostado ficava no centro de uma clareira por onde a luz fraca do sol era marcada pela árvore do centro, criando uma ilha de sombra. Usando o sobretudo para esconder a pele, Richard atravessou a área com luz deixando o companheiro isolado.

- Você não vai conseguir tirar muitas palavras de Brunnö, Tom. - Falou ele enquanto entrava na parte mais fechada do bosque.

    Era uma vez dois irmãos e uma menina. O irmão mais velho era o líder. Era o líder do grupo de amigos, a primeira pessoa a falar, aquele de quem todos riam das piadas mesmo que elas fossem sem graça. O irmão mais novo era a âncora em que todos podiam se sentir firmes. Era a pessoa confiável que nunca chorava e tomava as situações sobre seu controle, com preponderância e calculismo. A menina era a dama que servia de consoladora e inspiração, que arrebanhava a todos embaixo de suas asas brancas de penas macias.

    Evelyn não sabia como agir. Ela não havia nem mesmo notado a noite anterior passando, enquanto pensava. E não pensava apenas em tudo que ouvira, pois sua mente havia aproveitado para imaginar e sonhar, além de remoer e repassar tudo que acontecera. Pensou em Tomas, pensou em Henrique, pensou no Drácula. Pensou que talvez existissem fantasmas e bruxas também. Estava pensando na possibilidade de essas criaturas aproveitarem o Halloween para perambular por aí fantasiadas de crianças, quando o barulho do despertador a tirou do transe.

    Levantou-se e sentou-se na cama, passando as mãos pelos braços e notando que estava fria. A janela havia ficado aberta durante a noite, e ela imaginou diversas vezes que um lobo bípede musculoso aparecia e tomando-a nos braços, ambos desapareciam na escuridão da noite canadense. Encabulou-se de boa parte do que acontecia depois disso e foi ao banheiro, onde tomou um banho e voltou para o quarto. Enquanto Secava o cabelo, sua mente se perdeu novamente, até que sua mãe abriu levemente a porta do quarto.

- Evye? Ah, que bom que já acordou. O café está na mesa.

    Quando Evelyn terminou de secar o cabelo, a dúvida já estava instalada em sua mente. A singela pergunta que a levaria a um destino fabuloso e inimaginável. 

    "E o Henrique?"

    O céu estava se dividindo entre roxo escuro e laranja quando os dois olhos prateados se abriram. As vozes sibilaram rapidamente e logo as folhas farfalharam, denunciando que os dois vampiros já estavam longe dali. Os dois vultos iam na direção de Tremmonsie.

    Nesse mesmo momento Tomas entrava na vila dos Garou.

- Atrasado. - Encostada no muro, protegida pelas sombras projetadas pelo crepúsculo estava Anna.

- Vocês estão me seguindo hoje?

- Alguém tem que ficar de olho nas crianças. De qualquer forma. Eu não posso entrar na vila ainda, por causa do Sol, então você avisa quem tiver que avisar que rastreamos dois vampiros indo em alta velocidade em direção a Tremmonsie.

- Dois?

- Um deles é experiente, o outro não foi criado a mais de um mês.

- Você está dizendo que...

- É a nossa melhor pista até agora.

    Sem ouvir por mais um segundo Tomas tomou a direção oposta e desapareceu novamente no bosque adjacente, pulando de galho em galho. Quando chegou nos limites do bosque, seus olhos brilhavam dourados.