22 de Outubro... O dia do meu aniversário de dezessete anos.

Eu ainda estava na cama enrolada nos cobertores abraçada ao travesseiro. Eu não tava nem ai pro meu aniversário, não tava nem ai pra mais nada. Essas últimas duas semanas tem sido um inferno, um horror pra mim. Meus sonhos assustadores ficavam cada vez pior. Fredd sempre estava nele pra enfiar a rosa branca em meu peito, e quando eu acordava sempre sentia aquela dor infernal, insuportável, terrível... Aquela ardência no peito. Duas semanas com o mesmo sonho, as mesas feridas que sempre cicatrizam em minutos. Nessas duas semanas de pesadelos, eu já havia aprendido que a ardência em meus machucados significava que era um processo de que estava curando rápido... Eu sentia a dor, e rapidamente ela desaparece junto com o machucado deixando apenas o sangue pra trás. Durante as duas semanas as vezes aparecia novas feridas. Fredd, além de enfiar a rosa em meu peito, me arranhava com os espinhos grossos da rosa deixando cortes profundos em meu braço e na minha barriga.

O mesmo sonho. A mesma rosa da clareira cujo caule é bem grande. A mesma praia. As mesmas feridas... Nada mudou. Minhas pernas ainda ardiam quando eu acordava, mas não havia um arranhão nelas. Eu não entendia o que isso poderia significar.

Havia duas semanas que não ia à escola. Jeniffer e vovô já vieram no meu quarto umas trezentas vezes vê o que estava acontecendo comigo. E eu apenas dizia que me sentia mal. Eles tentaram me levar ao médico para ver o que eu tinha de errado, mas eu recusava. Eu realmente não me sentia bem, mas não estava passando mal, eram os sonhos que estavam me deixando louca, eram os cortes, era o Fredd, era Meygo... Tudo nessas últimas duas semanas tem me aterrorizado sem parar e me deixado mal, deprimida, depressiva, e com raiva. Eu cansei de sentir dor, cansei de ficar com medo todas as noites quando acordava.

Já tentei não dormi para não sonhar, mas não funcionava. Eu praticamente dormia acordada. Tentei me cortar varias vezes para que a dor me distraísse do sono, me machucava direto propositalmente para não dormir, mas também não funcionava porque todas as vezes que eu me machucava mesmo acordada os ferimentos ardiam e se curavam sozinhos logo depois deixando pra trás apenas hematomas. O que estava acontecendo comigo? O que era tudo isso?

Eu fiquei duas semanas dentro do quarto, e só saia para ir ao banheiro. Nem pra comer, nem pra beber, nem pra ver os cavalos. Eu me isolei no quarto sem querer falar com ninguém. Às vezes Jeniffer, ou Justin, ou Shofy, ou Lex, ou até mesmo Jackson trazia comida pra mim. Eles sempre deixavam no chão em frente à porta porque eu estava com ela sempre trancada. Mas eu não comia nada, na verdade nem pegava o prato. Eu não sentia fome há duas semanas, e toda vez que eu pensava em comida eu na verdade pensava em outro tipo de comida... Liquido viscoso e vermelho. Toda vez que eu pensava em sangue minha barriga doía, como se meu organismo estivesse implorando desesperadamente por sangue. Eu sentia meus olhos arder toda vez que imaginava o sangue em minha boca, apreciando o sabor. Eu sabia que não era por causa das lágrimas que meus olhos ardiam... Eles estavam mudando de cor. Isso não acontecia a toda hora, acho que só aconteceu duas vezes: quando sonhei pela segunda vez com o mesmo sonho eu acordei com os mesmos machucados e quando me olhei no espelho meus olhos estavam ardendo e depois ficaram violetas brilhantes; a outra vez foi quando, pela primeira vez, pensei desesperadamente em beber sangue, meus olhos ficaram violetas por dez segundos e depois voltaram ao normal.

Quando eles começavam a arder eu começava a chorar descontroladamente implorando pra que tudo aquilo parasse. Mas quando me direcionava ao espelho eu via meus olhos ainda normais, o mesmo azul celeste de sempre. Eles apenas ardiam, mas não estavam mudando de cor novamente. Cada vez que a palavra sangue aparecia em minha mente, meu estomago gritava mais alto e meus olhos ardiam mais ainda.

Varias batidas fortes na porta me fizeram pular na cama, tirando-me dos meus devaneios. Eu estava com uma blusa de manga longa por causa do frio e por causa dos machucados que mesmo curados deixaram marcas para trás. Sentei-me na cama e encarei a porta que estava sendo socada pelas mãos de alguém do outro lado.

Meu pulso estava dolorido pelos cortes da noite passada, minha barriga estava clamando por algo... Por sangue.

__ Abre! __ Gritou Jackson com a voz banhada de raiva. Eu não falava com ele desde o dia em que cheguei do hospital, que foi o dia em que me tranquei no quarto e não saí mais.

Eu deixei de sair do quarto, deixei de cuidar dos cavalos e do Espartano, deixei de ir à clareira para ver a rosa. Eu apenas ficava zanzando pelo meu quarto na maior parte do tempo pensando em me machucar e me manter acordada, às vezes ficava olhando pela minha janela por um bom tempo, ela ficava na lateral da casa e tinha a vista direcionada para as paredes laterais do estábulo lá em baixo e para o cercado. Eu via Derek cuidar dos cavalos, varrer os fenos espalhados colocando-os na lateral do estábulo, às vezes o vejo lavar sua moto perto do cercado, ou conversando com Justin, ou com Rikki que parece se atirar pra cima dele todos os dias fazendo suas poses sensuais de diferentes modos ou tentando chegar mais perto dele, e quando ele me vê na janela do meu quarto sempre pisca pra mim ou acena com um sorriso fraco no rosto.

Toda vez que o via, eu tinha aquela estranha sensação de vá ter visto ele antes. Sem contar da energia dele que tem me assustado muito quando sinto que ele está dentro de casa.

Eu não consigo me lembrar de nenhum momento ter visto ele antes de começar a trabalhar em Heartland. Então porque essa sensação de que já nos conhecemos? Quando olho pra ele sinto isso dentro de mim, e meu coração parece dar vários saltos ao mesmo tempo está morrendo de medo dele. Ele tem esse ar sério e perigoso, meio misterioso e reservado.

Eu sabia que seu estilo era como o de Jackson, Bad boy e rebelde. Na verdade acho que Derek tem uma personalidade mais forte que a de Jackson. Derek é mais atrevido, mais rebelde, mais ignorante, mais cheio de si, mais misterioso, mais malicioso também, mais bruto, e mais... Fora da lei. Derek havia sido preso por tentar fazer algo a alguém (ele não falou o que era exatamente e nem o vovô quis comentar nada, então ficou esse mistério do que ele fez realmente e a quem fez) quando era mais novo e acabou indo parar na prisão juvenil. Para obter sua liberdade condicional, ele acabou sendo enviado para trabalhar aqui no rancho e vovô aceitou contratá-lo. O homem que cuidava da condicional dele iria vir uma vez por mês para ver se estava tudo certo, se ele estava se comportando até completar dois anos, depois de dois anos sem nenhum problema Derek estaria livre da condicional. Se não estivesse tudo bem, então ele iria ser mandado para a prisão. Ele parecia ser uma cara legal, mas vai saber... Não o conheço bem então não vou julgá-lo só por ter a aparência bonitinha e ter jeito de um cara legal e não de um cara que já parou na prisão. Ele era mais velho que Jackson, tem vinte anos apesar de aparentar ter dezoito.

As batidas na porta ficaram mais brutais.

__ Abre logo Any! __ Jackson gritou. Fechei os olhos e tentei ignorá-lo. Não era a primeira vez que ele batia na porta pedindo pra abri-la, ele fazia isso todos os dias desde que me tranquei aqui e desde que ele parou de trabalhar durante à tarde na Oficina do Boo e voltou a trabalhar apenas de manhã. Aquele dia que ele chegou em casa durante a tarde (o dia em que Derek chegou a Heartland), foi o dia que ele pediu ao Boo para voltar a trabalhar apenas de manhã. __ Any! Eu já to de saco cheio! Abre logo! __ Gritou mais auto.

Eu não tinha forçar para levantar, meu corpo estava cheio de machucados, estava dolorido e cansado. Duas semanas sem dormi direito. E mesmo se eu conseguisse forças para me levantar, não iria abrir a porta.

Ouvi Jackson suspirar do outro lado da porta.

__ Any... __ Sussurrou. __ Por favor.

Fechei os olhos deixando algumas lágrimas escorrerem por meu rosto. Meu coração doía só de ouvir a voz dele, ainda mais quando ele falava desse jeito. Eu senti a sua voz: triste e cansada. Fechei os olhos com mais força controlando o impulso de abrir a porta.

Eu fiquei sozinha por um mês sem ele. Sonhando cada vez mais com coisas horríveis, e ele não estava comigo, não veio ficar comigo, não quis saber de mim. Eu não o culpava.

Nessas duas últimas semanas foram as que mais precisei dele ao meu lado, eu estava com medo, apavorada, sofrendo e perdida. Ninguém podia me ajudar, a única pessoa que sabia sobre meus sonhos era Jackson. Já contei uma vez para Nina e Emma, mas elas acharam que fossem só pesadelos comuns, não levaram muito a sério. Mas agora que sei que ele não me quer por perto, não vou deixá-lo carregar esse fardo, não vou deixá-lo ter de se preocupar com meus problemas. Ele estava livre de mim agora, e eu ficarei livre dele também.

Meus olhos começaram a arder.