Assassinato Na Royal Opera House escrita por Dreamer


Capítulo 2
“O Quebra Nozes”




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John digitava furiosamente em seu notebook. Sua mente divagava nos fatos que contaria sobre o caso que terminaram de desvendar no dia anterior. Era uma amistosa tarde de sábado e, com reservas de precaução, marcara um encontro com Sarah. Ele torcia para que Londres se tornasse um lugar pacífico por pelo menos aquela noite, para não ter que desmarcar mais uma vez...

Sherlock saíra do seu quarto. John nunca o vira dormir tanto. De qualquer forma, sentiu-se apreensivo: ele estava mais elegante que o seu normal.

—Lestrade ligou? —perguntou John. Devia ser um caso. Um maldito caso que arruinaria sua noite com Sarah.

—Não, porque? Ele te ligou?

—Não.

Os dois se entreolharam. Sherlock quebrou o contato visual indo para a cozinha e John o observou, investigativo. Pouco tempo depois ele voltou e apanhou o seu cachecol, já fazia frio em Londres.

—Então, Sherlock... —chamou John, quando Holmes já estava próximo à porta.

—O que foi, John?

—Você ainda se considera "casado com o seu trabalho"? —repetiu ele a expressão que já o ouvira dizer.

—Sim—respondeu lentamente, estranhando a pergunta. —O que...?

—Não, nada—respondeu ele rindo e segurando o riso em seguida.

—Ótimo—disse já começando a descer as escadas.

—Ei, Sherlock! Onde você está indo?

—... à ROH¹—respondeu, da escada.

—Arte, huh?

Sherlock estreitou os olhos tentando achar sentido naquela conversa. Não podia se atrasar, então voltou a descer as escadas e logo saiu do apartamento.

John percebeu um movimento lento e logo a Sra. Hudson apareceu:

—Querido, Sherlock saindo sem você?

John riu.

—Onde ele foi? —sentiu-se curiosa.

—Por incrível que pareça, Sra. Hudson. Eu acho... —respondeu ele, mal acreditando na própria conclusão. — Acho que ele tem um encontro.

.o.

Não tivera uma vez em sua vida que Sherlock não olhara a ROH com admiração. Das paredes douradas e decoração impecável ao requinte e imponência que era capaz de tirar o fôlego de todo cidadão britânico. Talvez tivesse se lembrado das vezes em que estivera ali durante a sua infância, se já não tivesse soado o segundo sinal.

Sentou-se na cadeira 22 da fileira A do Grand Tier². Não se surpreendeu pelos assentos 21 e 23 estarem ocupados não por Irene. Conhecia-a o suficiente para saber que, se ela estava procurando uma maneira de encontrá-lo, não aconteceria de forma convencional. Se é que essa era a intenção dela. A falta de mensagem tornava aquele convite ainda mais misterioso e sedutor. Apurou os seus sentidos, pronto para captar qualquer sinal que pudesse indicar qual era de fato a intenção dela.

O terceiro sinal soou.

A aproximação não seria direta, ele sabia. O ingresso ofertado para o Grand Tier o deixava bem no centro de diversos espectadores. Se ela quisesse encontrá-lo durante o espetáculo, teria escolhido um assento para ele em um dos Boxes³.

Ela poderia estar sentada em qualquer fileira atrás dele, mas ele sabia que não estava. Com o seu binóculo, começou a observar as pessoas sentadas nas laterais. A visualização do palco era excelente de onde estava, mas constatou que perdia muito da visão da plateia que poderia ter. Não demorou muito para saber que ela não estava nas laterais. Restava toda a plateia que seus olhos não podiam alcançar. A primeira certeza: aonde quer que estivesse, não queria ser vista.

A luz da plateia tornou-se tênue. Sherlock apanhou o seu celular e tirou o som. Deixou-o sobre o colo para que, caso tocasse, pudesse perceber pela iluminação de sua tela.

O espetáculo se iniciou e o som vindo do fosso[4] encheu todo ambiente. Não havia nada a ser visto, a não ser o espetáculo. Sherlock surpreendeu-se com a compreensão de que Irene queria, de fato, que ele assistisse ao Ballet.

A cena se iniciou e lá estava no palco um dançarino com roupas de boneco e outro atuando como um relojoeiro.

"Pode ser que seja o relojoeiro – IA".

As sobrancelhas de Sherlock se cerraram levemente. O que quer que ela queria que ele visse, estava no palco. Apurou a sua atenção.

O Natal chegou na apresentação e a bailarina no papel de garota dava piruetas de alegria pelo presente: o boneco Quebra Nozes. O relojoeiro saiu de cena. Dança, dança, dança. A garotinha adormeceu ao lado do brinquedo.

"Pode ser que seja o príncipe – IA".

Ele conhecia a história do "The Nutcracker", o Quebra Nozes logo se tornaria um príncipe para a garota. E o segundo Ato terminaria após aquela hora e meia.

O palco se encheu de gelo seco e com a magia da cena, aquele boneco reapareceria como o príncipe. A troca de dançarinos era tão perfeita pela equipe que nem mesmo Sherlock foi capaz de perceber. E, logo a bailarina adormecida se levantou graciosamente elevando os seus braços e uma das pernas. Pulou e rodopiou em meio ao gelo seco com seu vestido branco se confundindo com o cenário, como se fosse o sonho imaginado por Tchaikovsky[5], o mais belo sonho daquela garotinha...

A plateia, extasiada com a beleza da cena, levou um tempo para entender porque o príncipe se levantou de maneira tão estranha e rude. A bailarina correu para ele esperando que o movimento dos seus corpos se entrelaçassem, mas ele estava...

Ela gritou e interrompeu a sua dança. Sherlock se levantou de súbito, mas sabia que não chegaria facilmente ao palco, parou sem ação, em meio a plateia, era impossível de se mover em meio a tanta gente.

Morto, pendurado por uma corda envolta no pescoço, estava o bailarino. Flocos de neve falsas, previstas para aquela cena, começaram a cair. Sherlock teve a sensação de ser granizo.

As pessoas na plateia começaram a conversar, agitadas. O maestro elevou o seu olhar para entender o que acontecia, interrompeu sua regência e os músicos pararam de tocar, sem imaginar porque o espetáculo havia sido interrompido. A cortina foi fechada mais rapidamente o quanto possível. As luzes se acenderam.

"Então, era o príncipe, afinal de contas – IA".

...

"Feliz aniversário, Sherl – IA".

.

.

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[1] = Royal Opera House.

[2] = The Donald Gordon Grand Tier, uma das melhores áreas de assentos da ROH.

[3] = Trecho na lateral com quatro assentos, separados dos demais por paredes.

[4] = Orquestra Pit, no Brasil, "Fosso", local abaixo do palco onde a orquestra executa a obra em óperas, ballets ou peças de teatro.

[5] = Compositor da suíte "The Nutcracker" ("O Quebra Nozes").


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