Meia Alma escrita por Monique Góes


Capítulo 21
Capítulo 20 - Desespero


Notas iniciais do capítulo

Hey people, I'm back.
Tanta cara de pau que eu poderia fazer uma pose .-.
Enfim, eu tive um muito longo e muito chato período de que não conseguia escrever nada.
Eu fiz quinze anos tmb, e as preparações pra festa me atrapalharam um pouquinho XD
Espero que gostem!



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Então Meu pai era um grande cientista, e a Ordem ficou interessada nele, mas ele recusou o convite de entrar. Ygor continuou, terminando sua explicação. Então eles me pegaram quando eu tinha oito anos quando estava saindo da escola e disseram para o meu pai que se ele negasse eles iriam me transformar em híbrido.

E ele negou?! Alma exclamou.

Não. Ele suspirou e se jogou na poltrona atrás de si. Mas é a Ordem, sabe como é. Quando ele entrou, meio que me jogaram para ele. Logo depois de eu ter acordado da cirurgia. E então ele ficou como é hoje.

Cara, é meio difícil de acreditar, mas como Ygor disse, é a Ordem. Mas o que fizeram com o pai dele, tipo É muita crueldade.

Então Você é o híbrido criado dentro da Ordem citado por Raiden. Anita disse num tom incisivo, mas dava para ver que a história a deixara irritada. Quem não ficaria?

Sim. Não sou o único. ele deu uma olhada à Altri, que estava bem afastado. Não sei quantos tem ao certo, mas acho que são muitos. Altri ergueu o polegar num sinal de positivo. Vão por mim, vocês veriam coisas que os deixariam de cabelo em pé.

Tipo?

... Vocês sabem que a Ordem tenta fazer híbridos com carne de Despertado, não sabem?

Para mim não era surpresa, pois lembrava muito bem das memórias de Yudai, assim como Anita. Mas os outros não receberam esta notícia muito bem, como era de se esperar. Era algo repugnante só de se pensar, quanto mais de se saber que há pessoas com mente deturpada o suficiente para tentar fazê-lo, e com certeza, com crianças.

O qu...

E o que acontecia? cortei os outros antes que começassem um escândalo num tom que até eu me surpreendi com minha frieza.

Como é de se esperar, a maioria morria. comentou, encarando o chão. Os que sobreviviam eram mortos logo após, pois eram absolutamente selvagens. Mas em características físicas, eram como qualquer outro híbrido. Acho que matei uns quatro desses, mas não quero entrar nesse assunto...

Matou?! Alec exclamou.

Aqueles caras adoram ferrar com a vida dos outros, mas não com a deles. Ygor disse o óbvio. Quando eles entravam em qualquer lugar onde estivessem esses híbridos, eles levavam uns quatro normais para garantir a segurança de cada um, e nós que nos ferrássemos. fez uma careta.

Tudo bem, o que quer que digamos quanto a isso? Anita perguntou.

Bem, eu vim no veículo do meu pai. Como qualquer outro dos cientistas, curadores e sei lá o que da Ordem, ele tem muita coisa, mas ainda não tive tempo de mexer em tudo. Podemos conseguir coisas úteis, como Transfiguradores, dinheiro e, só talvez, informação.

Acho que o esperado para um veículo de um curador. Susana comentou.

Acha que eles já sentiram falta de Hugo?

Claro, desliguei o comunicador do veículo dele. Com certeza devem estar ao menos desconfiando que tem algo errado.

Se eu fosse eles, também desconfiaria. comentei e Ygor assentiu.

Todos ficaram em silêncio depois disso, creio que pensando ou no fato de Ygor ter sido criado dentro da Ordem, ou pelo fato de tentarem criar novos híbridos e matá-los a sangue frio logo após de serem criados ou coisa assim. Já eu nem sabia o que pensar.

O que acha de irmos ver o que tem dentro do veículo? Raquel sugeriu, mas foi uma sugestão visivelmente aberta e indecisa, talvez apenas para preencher o vazio do momento.

Ótima ideia. Anita disse e levantou. Quem quer vir?

Me levantei e Ygor também, assim como Raquel, mas o resto continuou na deles, então saímos do mesmo jeito, sem dizer nada. Ygor não parecia estar com muita vontade de dizer alguma coisa. Mas pensando bem, ser usado pra chantagens ou coisas parecidas não devem deixar ninguém à vontade, principalmente tendo de contar tudo. E mais, para onde ele tinha despachado Hugo?

Senti Raquel pegar minha mão e a olhei meio que perguntando o que foi, mas ela me indicou algo com um maneio de cabeça, então olhei para o lado.

Tinha um Aparição bem ali, atrás de um prédio.

Hein, como ninguém reparou nele ali além da Raquel?!

Ele não era aquele Oito, seu capacete era mais quadrado, enquanto o de Oito tinha um formato mais oval. Ele parecia ser mais baixo também. Olhei-o e ele me encarou, antes que talvez Ygor ou Anita repararem em sua presença, ele sumiu.

Franzi o cenho e olhei para Raquel, que também me encarou com uma expressão estranha, mas se aquele cara não causara nenhuma confusão, talvez tudo bem não dizer nada por hora. Anita e Ygor tinham seguido em frente sem perceber nada estranho, então apenas os seguimos sem dizer uma única palavra, mas de vez em quando olhava por cima de meu ombro para ver se não tinha ninguém atrás de nós.

Chegamos à pista de pouso onde o veículo ainda jazia com a porta aberta. Olhei envolta e vi apenas Djan e um soldado de cavanhaque que reconheci por tê-lo nocauteado quando forcei nossa entrada em Sacraelum e que pareceu me reconhecer, afinal, lançou-me um olhar mortal e começou a se aproximar. Falando em Djan, ele nos notara também, pois o seguia.

De vez em quando vejo esse garoto rodeando a casa com uma garota. Ygor comentou.

Já falei com ele algumas vezes. respondi.

O que vocês estão fazendo? o soldado questionou num tom incisivo.

Vendo o que tem no veículo. Ygor disse curto e grosso enquanto entrava. Djan simplesmente suspirou e revirou os olhos atrás dele.

Se quiser ter certeza, pode vir conosco. Anita disse com simplicidade, enquanto eu e Raquel entravamos logo atrás de Ygor.

O interior do veículo era como o de uma nave cargueira. Tinha uns dois bancos longos e acolchoados com várias caixas e sacolas espalhadas sobre eles, cuidadosamente etiquetados com nomes e números, além de ganchos presos ao teto que traziam sacolas claramente de armaduras e algumas mochilas de couro. Mais a frente havia o painel de controle e a cadeira que Hugo provavelmente usava para controlar tudo. Olhei para o teto e vi um mapa de Darneliyan holográfico num tom genérico de azul, com regiões e sessenta e oito nomes circulados em cada uma delas, mas alguns nomes que não eram de cidades nem regiões, e os números de um a sessenta oito espalhados pelo continente.

Quanto coisa. Djan assoviou logo atrás de mim.

O que é tudo isso? o outro soldado perguntou.

Com certeza para os híbridos, ao menos a maioria. Raquel disse, pegando uma sacola de armaduras pendurada, pegando uma ombreira e a amassando entre os dedos. Estão cada vez piores.

Eles querem que vocês se protejam com isso?!

Desde sempre. comentei e junto com Ygor entrei na câmara de piloto. Ele mexeu em alguma coisa no painel, então duas listas apareceram. Ambas traziam nomes, sendo que a da direita trazia alguns nomes riscados, e vi o meu próprio entre eles. Deveria significar os híbridos mortos.

Essas listas são dos híbridos que cada curador tem que cobrir. Ygor informou. O da direita é da antiga geração, os riscados são os mortos. Ele me olhou. Mortos. O da esquerda é os vivos.

Assenti e olhei envolta, e Ygor assoviou.

O que foi?

Tem coisa da Ordem aqui. Chame nossa hacker número um.

Demorei algum tempo até perceber que ele se referia à Anita, então fui atrás dela que foi dar um jeito de decodificar a senha. Peguei uma mochila de couro do teto e a abri, encontrando as sacolas de Transfiguradores.

Olha só... comentei, a soltando, e Djan deu uma espiada.

O que é isso?

Transfiguradores. respondi e peguei um para olhos de cor indistinta, suspendendo-o. Quando tínhamos de fazer uma missão longe da vista de humanos, mas em meio a eles, tomávamos um desses, que dava cor aos olhos e cabelos.

Ah... ele disso num tom de quem se preocupava de ter conhecido algum híbrido.

Esse faz os olhos voltarem a ser da cor que era quando era humano. tomei-o e após alguns segundos, aquela irritante sensação de ter uma película sobre meus olhos surgiu. Olhei para Djan, que piscou surpreso. Se você não me conhecesse e me visse assim, passaria na sua cabeça que sou um híbrido?

Não. disse imediatamente. Que clichê, você é ruivo de olhos azuis.

Dei de ombros e reparei que o cara de cavanhaque nos encarava de cenho franzido.

O que foi? Djan perguntou.

Vocês têm ou tinham, sei lá, olhos da mesma cor. Que bizarro.

Raquel apareceu do meu lado carregando também uma sacola.

O que é isso?

Ela me passou a bolsa que pesou em minhas mãos e tintilou.

... Moedas?

Provavelmente o dinheiro de uma caçada. disse, pondo uma mecha atrás da orelha. Talvez tenha mais, porque ele poderia pegar em várias cidades antes de voltar à Ordem.

É uma boa hipótese. concordei e percebi que Djan e o soldado olhavam abobalhados para Raquel. Reprimi um suspiro irritado e pus a sacola no chão, balançando a de dinheiro, tirando os dois do transe que eles mesmos se puseram. O bom de Raquel ser inocente é que ela não percebeu uma vírgula do que acontecera enquanto mexia distraidamente na bolsa de Transfiguradores.

Raquel, Hideo, olhem isso aqui. Anita voltou da câmara e nos chamou. Levantei e fui para lá.

Anita claramente conseguira invadir os computadores da nave, e estava flutuando numa tela a imagem de uma cidade em ruínas coberta por uma cúpula, com diversas informações correndo ao lado da imagem.

Essa não é a cidade onde ocorrem os testes para guerreiros? Raquel questionou.

Uma delas. Ygor corrigiu. E vai ter um daqui um mês e meio.

Nós quatro ficamos em silêncio. Um teste para guerreiros daqui a um mês e meio. Normalmente se são levados em torno de vinte a trinta aprendizes normalmente no máximo uns dez saem desse meio, sendo que muito raramente suas numerações são superiores à trinta. Considerando-se quantos morriam...

Poderíamos tentar fazer alguma coisa. sugeri.

Sim, mas o quê? Anita indagou. Poderíamos tirá-los de lá, mas para onde os levaríamos? Aqui as pessoas já ficam atormentadas com onze, e vocês já trouxeram mais dois...

... Temos um mês e meio. Até lá, poderíamos tentar arranjar um local. Temos a vantagem de não podermos ser detectados. Ygor comentou.

E normalmente, aprendizes ainda não aprenderam a usar Auras. Raquel arriscou. Então temos quase o mesmo resultado.

Onde vai ocorrer o teste? questionei.

À leste, na região de Ilnois. ele informou com o maxilar travado. Perto ao mar.

Podemos dizer que temos um veículo. Nela com certeza cabem trinta crianças e adolescentes. Agora falta um lugar seguro para deixá-los.

Pois é. Anita comentou. E se quisermos fazer isso, teremos de ser rápidos.

Anita e Ygor estavam discutindo algo quanto a terem encontrado phomas quando eu e Raquel decidimos ir embora. Djan e o cara do cavanhaque ainda estavam por perto, mas os deixamos quietos. Ainda estava de tarde, e talvez por isso, não havia muitas pessoas na rua, que afinal estavam trabalhando ou estudando talvez.

Achei vocês dois parecidos. Raquel disse de repente quando estávamos quase chegando na casa.

Hm, quem? questionei sem entender.

Você e Djan são parecidos. explicou. Principalmente depois que você tomou o Transfigurador. Poderia até dizer que são irmãos.

Você acha? balancei a cabeça. Só tenho, quer dizer, tinha, dois irmãos. O Yudai e a Yume.

Ah é. Ele me falou dela. Bem rápido.

O que ele disse?

Que ela tem minha idade.

Deve ter. Um pouco depois daquele dia em que eu te conheci, fui a uma missão em Deditio. Encontrei-a lá, mas nunca disse uma palavra a Yudai.

Raquel ficou um tempo em silêncio antes de dizer:

E como foi?

Por incrível que pareça, ela me reconheceu.

Ela me encarou com os grandes olhos assustados e suspirei.

Sempre achei melhor caçar à noite, então decidi esperar no parque até anoitecer. Tinha umas crianças por lá, que saíram correndo assim que me viram. Mas uma ficou. confidenciei, afinal, nunca contara o ocorrido a ninguém, então olhei para o céu. Ela usava duas tranças ruivas que chegavam à cintura e estava com um vestido branco de desenhos azuis e rosas, com um avental preto bordado por cima e aqueles sapatos de fivela que quando ela era pequena odiava. Ela perguntou se eu era o irmão dela.

Ah... E então?

Eu perguntei o porquê ela estava me fazendo essa pergunta, e ela disse que quando ela era menor, a cidade vendeu os irmãos dela, e ela me achava parecido com o nosso pai. Fiquei meio sem reação depois disso, e ela perguntou quem eu era, Yudai ou Hideo.

Nossa...

Surpreso fiquei eu, porque ela só tinha cinco anos quando fomos vendidos, então... suspirei. Acabei respondendo que eu era o Hideo mesmo e então ela me deu um grande abraço, sem o mínimo de medo, e então comentou se iria ou não falar que me viu para os nossos pais, porque todo o assunto referente a nós dois era evitado, porque nossa mãe se sentia mal.

Raquel ficou em silêncio, permitindo que eu prosseguisse.

Eu não sentia nenhuma Aura, então andei um pouco com ela no parque. Ela me falou de tudo, de como as coisas andavam em casa, escola, amigos e tudo mais. suspirei. E eu me senti bem, sabe? Senti-me como se eu fosse o irmão mais velho dela, sem ter toda aquela coisa de que eu sou o décimo híbrido mais forte da Ordem, irmão gêmeo do número nove, só alguém normal. Fazia tempo que eu não me sentia assim.

Você não se sentiu mal por não... Ser mais humano ou coisa parecida?

No começo sim, mas depois passou. Ela perguntou como era a vida de híbrido, e como estava Yudai, se ele vivia doente como antes. Eu respondi que não e que ele tinha salvado uma menina e ia deixar ela em uma cidade próxima, mas do jeito que o coração mole dele era, provavelmente ia ficar com ela.

Você falou como se eu fosse um bichinho de estimação. acusou num tom que identifiquei sendo falsamente magoado.

Vendo agora foi mesmo. Desculpe. rodeei seus ombros com meu braço, trazendo-a mais para perto de meu corpo. Raquel segurou meu pulso com ambas as mãos. Quando ela se despediu estava quase anoitecendo, então voltou correndo para casa, e resolvi segui-la apenas para ver como as coisas estavam. Da casa da árvore do jardim eu consegui vê-la contando só para o meu pai antes de dormir que me encontrara, e logo depois tive de sair, pois senti o rastro do monstro.

Raquel permaneceu em silêncio e entrei na casa, e nenhum sinal de vida. Franzi o cenho, olhando envolta, e havia um sofá revirado, a mesinha também.

O que aconteceu aqui? Raquel perguntou.

Oi pessoal. Susana saiu das sombras (debaixo da escada) Vocês viram o Larry ou o Alec por aí?

Não, por quê? questionei preocupado. Larry?

Sim, ele chegou para avisar que... Diego teve de usar sua Aura então por segurança ele não vai mais entrar na cidade e... Bem.

O que foi?

Não peguei a confusão, só quando escutei as coisas sendo reviradas mesmo, mas o que sei é que Nina se trancou em seu quarto sem dar sinal de vida e Alec quer matar nosso querido homem elástico, Laurence, conhecido como Larry. disse num tom fanhoso de atriz de comercial. Acho que você já sabe o que aconteceu mais ou menos, mas a Alma tava aqui e pegou o motivo inicial, só que ela foi atrás deles.

Fiquei em silêncio. Era meio óbvio que era... Bem, todo mundo sabe o que é.

Tudo bem, vamos botar as coisas no lugar e agir como se nada aconteceu. Falei.

Mas e a Nina lá em cima?

Sério que ela ficou surpresa? Raquel perguntou.

Acho que ela sempre pôs Alec na friendzone, então não via nada. Mas só acho mesmo.

Eu e Raquel nos entreolhamos em silêncio, então fui por os sofás no lugar, e Susana subiu as escadas. Escutei-a batendo na porta e chamando Nina, mas não houve resposta.

Ei Hideo. Raquel me chamou.

O que foi?

Você se lembra de que... Encontramos aquele híbrido moreno. Assenti. Ele disse primeiro híbrido..

Entendi onde ela queria chegar.

Eu não sei o que ele é. Mas eu olhava para ele e tinha a sensação de estar vendo algo muito velho.

A Ordem foi criada há mais ou menos quinhentos anos com a criação do primeiro híbrido. Você acha que alguém conseguiria viver tanto tempo?

Não faço a mínima ideia. Mas acho difícil encontrá-lo novamente, ele foi numa direção completamente diferente.

Ela assentiu e pôs-se sentada sobre o sofá recém-reposto e sentei ao seu lado, pondo-me a tentar rastrear a Aura dos dois. Encontrei a de Larry encima e a de Alec próxima. Provavelmente ele se refugiara sobre alguma árvore. A de Alma estava logo atrás. Suspirei e joguei minha cabeça para trás, vendo Raquel exclamar algo. Pisquei e quando baixei a cabeça Pietro estava a minha frente.

Pietro?

O monstro preto está por perto. disse e franzi o cenho.

Castaninha! Paola apareceu pela porta da frente e congelou quando nos viu. Ergui uma sobrancelha.

Castaninha?

Hã... É... Um apelido que dei para ele...

Que vai me perseguir até os quintos dos infernos. ele murmurou.

Todo mundo o olhou assustado. Esse garoto tem três anos mesmo?

Por que Castaninha? Raquel perguntou um tempo depois.

Por que eu pensei Como esse garoto pequeno como uma castanha é o número cinco? quando conheci Pietro.

Faz sentido. Murmurei meio distante, voltando minha atenção para as Auras, percebendo a Aura anormalmente quieta de Nina. Então senti a de Alec perseguindo a de Larry. Provavelmente Aura estava os seguindo para ver a bagunça.

Ei. Susana apareceu no alto da escada, mas a desceu num salto. Vocês acham que se Anita mandasse Alec e Nina para uma missão daria certo?

Olhei para Pietro e ele disse:

Não digo nada.

Suspirei e desviei o olhar.

Talvez.

Vocês dois deu certo, não é? disse num tom sacana e bufei, e quase senti o olhar de Raquel sobre Susana, que se calou. Claro que deu. Pelo menos vocês não são que nem esses dois que estão nesse chove e não molha há...

Quinze anos. No mínimo.

... Sério? Raquel questionou.

Sim, e eu sei, me dá nos nervos.

Anita entrou pela porta e assim como eu, pareceu estranhar algo no momento em que entrou.

Caso esteja dando falta de alguém, Alec está perseguindo Larry, Alma está atrás deles e Nina está trancada no quarto. Acho que você já se tocou o que aconteceu, então eu exijo que você os mande em missão juntos para que essa enrolação acabe de uma vez. Susana disse do nada e Anita pareceu parar para poder assimilar o que ocorrera.

Hã... E por que Larry está aqui? questionou.

Diego se machucou e precisou usar Aura. avisei e ela pareceu se preocupar. Provavelmente ele vai se manter afastado por isso. Não se preocupe, porque se ele está por aqui, então eles estão fora de perigo.

Tem certeza?

Vai por mim. Além do mais, Diego tem força o suficiente para lidar com dígitos únicos acima do número seis. Mesmo que ele seja atacado, vai se sair bem.

Mesmo não parecendo totalmente convencida quanto a segurança de Diego, ela assentiu. Pietro começou a saltar os degraus, e não sei de onde ele tirara, mas trazia um giz de cera em riste. Talvez prevendo pichações, Susana e Paola foram atrás dele.

Eu gostaria de eu mesma ir verificar essa cidade onde vai acontecer o teste. Anita murmurou. Mas...

É melhor você se manter aqui, para servir como uma espécie de base. Raquel disse. Assim, dá para ir e voltar sem problemas, em vez de deixar recados, por assim dizer.

Anita a olhou com uma expressão traída, algo como Até você!. Eu entendia a preocupação de Anita, mas também entendia o lado de Raquel. E concordava com ele, pois seria muito mais difícil se localizar com Anita em algum lugar do continente.

Mas não podemos alugar a cidade o tempo todo. Teremos de arrumar um lugar para ficar. comecei.

Sim, e... Não querendo dizer nada, mas já dizendo, toda vez que você e Raquel saem da cidade, vocês trazem alguém novo...

Pior que era verdade. Primeiro Raiden, agora Altri. Se acontecesse uma terceira vez, seria oficial.

Ah, Anita... Falando em alguém novo, quando estávamos vindo para cá... Raquel começou.

O quê?

Encontramos um híbrido. Também era um renegado.

Ah sim. continuei. Ele era bem estranho, sabe...

Estranho?

Eu olhava para ele, e tinha a sensação de estar olhando uma coisa muito antiga. A espada dele não era um símbolo, ele simplesmente a carregava nas costas. comentei. E ele comentou muito rápido antes de ir embora algo sobre ser... O primeiro híbrido. Mas o primeiro híbrido foi criado a quase há quinhentos anos.

Vocês me perguntam se há alguma chance de ele realmente ser o primeiro híbrido? questionou.

Bem, sim. Raquel admitiu.

Tudo bem... Se fomos pensar em termos atuais, acredito que é muito difícil híbridos chegarem a completar um século de vida devido as caçadas, quanto mais cinco. Mas... Temos pensar que Lyon...

Lyon? interrompi.

O nome do primeiro híbrido era Lyon Ezra. respondeu brevemente. Continuando, temos que pensar que Lyon foi criado em um tempo em que havia muitas cidades que eram ninhos de monstros. E depois que ele tinha alguma estabilidade para caçá-los, ele era o único híbrido disponível, afinal, o segundo híbrido, na verdade, híbrida, foi criada apenas trinta anos depois dele. Ou seja, ele com certeza lidou com muita coisa sozinho. Sem contar que essa híbrida foi a primeira Despertada, e ele também acabou com ela sozinho.

Ou seja, sendo o único, ele era obrigado a ser mais forte que muitos híbridos hoje considerados fortes são.

Com certeza. Então, acho que há a possibilidade dele estar vivo. A única coisa que se sabe é que ele não morreu, simplesmente foi embora depois da terceira geração de híbridos.

Por quê? Raquel questionou.

O que consegui ver foi apenas especulação, mas... A terceira geração foi apenas um híbrido também, mas foi o primeiro a ser criado ainda criança. O nome dele era Abel. Foi criado mais ou menos com cinco anos, e foi dado a Lyon treinar, e ele tinha o quê? Um sessenta anos no mínimo, e ele ficou apegado ao garoto, talvez como Yudai era quando achou Raquel, ou como um filho mesmo. Mas doze anos depois, Abel foi morto em uma caçada. E Lyon ficou muito abalado com isso, e logo depois disso, o irmão dele, que ainda era humano também morreu de causas naturais. E então ele simplesmente foi embora e ninguém ouviu mais falar nele.

Pelos deuses... Murmurei.

Deve ter tido uma histeria inicial, claro, pois o único híbrido vivo havia desaparecido, e logo depois a Ordem se tornou como hoje. Criando um híbrido atrás do outro.

Tinha algum retrato dele ou coisa parecida?

Bloqueado de modo que não ousei entrar. Anita deu um muxoxo. Apenas encontrei uma descrição, que o citava como um rapaz alto, de pele morena e cabelos ondulados. Apenas isso.

Olhei para Raquel.

Ele não era assim?

Era. ela olhou para Anita. Ele era ainda mais alto que Hideo.

Pelos deuses.

Acabei rindo com o comentário. Entendi que era mais pela altura mesmo. Mas então falei:

Anita, quanto... Bem, você não quer que eu vá ver essa cidade onde ocorrerá o teste?

Por que está me perguntando isso?

Porque você me deixou ir... Bem, onde eu queria ir. Sendo que não seria nada relevante à nossa causa por assim dizer.

Eu estava com a pretensão de mandar Alec e Nina para lá. ela comprimiu os lábios como se não quisesse rir, e eu percebi que fiz o mesmo. Mas se você quiser ir ela olhou para Raquel. e você também, eu arranjo algum lugar para os dois irem.

Pelos deuses Anita, até você. Raquel riu.

Claro, passei anos com aqueles dois me dando nos nervos.

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Passamos uns três dias até irmos finalmente para a missão, um descanso rápido. Nina estava meio que evitando Alec, acho que para o desespero do coitado. E o da vanguarda que esperava algum movimento dos dois, mas, enfim.

Eu estava arrumando algumas coisas antes de sair, quando Ygor bateu na porta e abriu sem esperar a resposta.

Claro, bata mas não espere resposta. resmunguei e ele riu antes de me jogar algo. Percebi que era um kit de phoma.

Tinham vários desses no veículo do meu pai, então troquei os códigos e cartões para a Ordem não rastrear e estou dando pra cada um para conseguirmos manter contato rápido.

Ergui a caixa e a balancei.

Obrigado.

Ele deu de ombros e saiu.

Pus o phoma na sacola, e a joguei nos ombros, descendo rapidamente. Na metade alguém puxou minha calça e vi que era Pietro.

Cuidado com o monstro preto. Não quero que Ciel não venha, porque se só ele voltar, só Luna vem.

E foi embora.

Tudo bem, tinham tantas coisas pretas que tive vontade de pedir para ele especificar, mas ele já tinha ido. E quem diabos eram Ciel e Luna?

Desci o resto da escada e vi Raquel, Alma e Susana conversando.

Ei, já vão?! Alma exclamou. Cuidado, não quero bebês a caminho quando voltarem!

Tá bom Alma, nós não podemos engravidar. Susana comentou enquanto Raquel virava algo próximo a um tomate.

Quase tive vontade de discordar, mas sabia que pesaria para meu lado, então me mantive quieto, e simplesmente saí pela porta.

Pietro falou algo para você? Raquel perguntou enquanto andávamos.

Ele disse alguma coisa sobre tomar cuidado com o monstro preto, senão Ciel não vem, coisa assim. olhei para ela. Não faz o mínimo sentido.

Será que é o terceiro híbrido que vamos encontrar para selar a fama de vez? perguntou e acabei rindo enquanto saíamos da cidade.

Caminhamos sem grandes problemas durante uns dois dias. Depois de uns dois dias andando a noroeste, estávamos próximos ao rio Irvine, e perto dele a cordilheira de Piste, que é a maneira mais rápida de se chegar a Ilnois. O bom do phoma que Ygor me dera era que ele tinha um mapa e ele marcara o local para onde deveríamos ir, assim, não iríamos ficar procurando a cidade. Ela ficava num local sem nada no mapa.

Eu sempre gostei do rio Irvine. comentei do nada.

Nós estávamos caminhando mais lentamente agora, depois de termos almoçado. Era quase preguiçosamente.

Hm, por quê? Ela perguntou sem entender.

Meu avô tinha uma fazenda à margem, era enorme, e tinha de tudo. sorri. Íamos no mínimo duas vezes ao mês, e a cada feriado toda a família corria para lá. Era muita bagunça, mas era legal.

Como era?

Bem... Realmente grande. Tinha bois, galinhas, ovelhas, cachorros, bungles, enfim. E tinha o rio. Uma vez alugaram para um festival de música, e foram umas mil pessoas para lá. Raquel pareceu ficar surpresa com o dito.

Nossa... Devia ser realmente grande.

Sim... O phoma apitou, então o peguei, indo um pouco à frente de Raquel para vê-lo. Avisava que tínhamos de ir para a direita.

E então eu escutei. Aquele som molhado e nauseante e um ofego, coisa, que, aliás, eu não escutava a muito tempo. Algo quente repingou em meu braço, e a adrenalina e nervosismo subiu por meu ser.

Girei para ver e Raquel parecia prestes a perder a consciência, havia... Uma mão atravessando seu peito, bem sobre o coração, e ela estava perdendo sangue. Muito sangue.

A visão sangrenta de Yudai me veio a mente e meu peito doeu com muito mais força que o normal.

Não...

Não!

A pessoa retirou a mão, com novamente o som molhado e Raquel começou a cair. Saltei à frente, a pegando antes que atingisse o chão meus braços praticamente se encharcando com seu sangue.

Eu já estava prestes a entrar em desespero quando vi quem estava à minha frente. Não era um Aparição, nem nada do tipo... Tinha cabelos e olhos cor de chocolate.

Aí entrei em desespero. O verdadeiro desespero que experimentara apenas uma única vez.

A pessoa que atacara Raquel era Lúcio.

Não sabia se era um reflexo do terror que eu sofrera quando criança, mas congelei quando o vi.

Ué... Eu lembro de ter matado ela... murmurou, se aproximando.

Lembrei dos passos metálicos reverberando pelo chão.

Vou ter que matar de novo?

Ele estava cada vez mais próximo.

Ei, rapaz. Lembro do seu cheiro.

Finalmente meu corpo respondeu, e levantei num salto, começando a correr. Mas não antes que ele acertasse meu ombro de forma dolorosa, de tal forma que quase soltei Raquel.

Era uma necessidade. Tínhamos que fugir dele.

Ele pensava que Raquel era Sophia, era isso?!

Comecei a correr, mas novamente para meu completo desespero, ele começou a me seguir. Mesmo sem sentir minha Aura, ele provavelmente poderia sentir o cheiro de sangue, tanto meu quanto o de Raquel. Trinquei os dentes e aumentei a velocidade. Não sabia se era o desespero, mas parecia que quanto mais eu corria, mas ele se aproximava.

Eu não estava com tanto medo por causa de mim. Estava com medo por causa de Raquel.

Não queria perder mais ninguém.

Elevei minha Aura em dez por cento, mas não parecia o suficiente. Ele continuava, vindo e vindo.

Elevei a vinte e cinco por cento, a toda velocidade. Havia algo escorrendo por meus olhos.

Lúcio continuava a vir, cada vez mais rápido. Trinquei os dentes, mas não era o suficiente, e eu sabia que estava ainda mais rápido do que no dia dos zumbis.

Mas não era o suficiente.

Arquejei e num ato desesperado e arriscado, elevei minha Aura de uma vez, aos setenta e seis por cento. O limite antes de virar um monstro. Algo muito perigoso, considerando o quão próximo estive do Despertar. Minha língua sangrava, e com meus braços protegia Raquel dos baques que eu dava nas árvores, arrancando-as.

Eu não respirava, eu não tocava o chão.

E Lúcio continuava vindo. Escutava seus passos logo atrás de mim.

O cabelo dela estava se tornando negro.

Ele ia matar Raquel, eu sabia disso. E era justamente isso o que eu não queria.

Eu já tinha dado adeus às minhas pálpebras que haviam descascado. Eu precisava de algo para salvá-la. E de preferência, algo para me salvar também.

Mais rápido...

Estava quente.

Estava queimando.

Meus pés.

Vi algo estranho. Parecia que o ar começava-se a se dividir a minha frente, ainda que fracamente. Abria-se e fechava-se. Apertei ainda mais os passos.

Eu podia sentir minhas botas se despedaçando.

O ar se abriu em uma espécie de caminho, e quando pisei nele, pareceu-me que fui impulsionado para frente. Não consegui parar de correr, apenas fui e fui. Não via mais nada, meu corpo estava cansado, à beira do limite.

Lúcio finalmente estava ficando para trás.

Cheguei à beira de um penhasco e não consegui parar. Quando saltei no nada, obriguei toda minha Aura a voltar. Não iria correr os riscos de sete anos atrás. Não, não iria.

Apertei meus braços em volta do corpo inerte, e girei em pleno ar. Quando minhas costas bateram no chão, foi o pior. Foi queda na pedra. O pior foi que não apenas caí, como estava muito rápido, quiquei e caí mais uma vez antes de finalmente parar. Foi terra e pedras para todos os lados, e, no fim, caí de peito para cima, segurando o corpo de Raquel possessivamente sobre o meu.

Meus pés pareciam pegar fogo, eu não conseguia respirar.

Havia gritos, e minha visão começava a escurecer, olhava vagamente para o céu acima de mim.

Lúcio ficara para trás.

Alguém apareceu no meu campo de visão enegrecido, mas tudo o que via era sua silhueta e cabelos ruivos e ondulados.

Eu não conseguia respirar, mas arranjei fôlego do fundo de minha alma para balbuciar algumas palavras.

... Ela... Salve... Ela... Por...

Não consegui terminar, logo apaguei.


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Notas finais do capítulo

Pois bem, foi isso... Eu tentei fazer um mega cap pra vocês.
Pra quem pensava que o Lúcio NUNCA ia dar as caras... Hehe.
O próximo cap eu vou, eu juro, de joelhos, pelo amor de Yudai, que posto no máximo amanhã, ok?



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