Garoto Punk escrita por Camila Marcelaa


Capítulo 1
Garoto Punk


Notas iniciais do capítulo

Eu escrevi esse texto pro Marcelo, um amigo meu. Lembro até hoje dele dizendo: "Gostei. Tu me descreveu como um drogado fodão. Mas poh, sua vagabunda, precisava me mata no final?"



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Marcelo era o típico garoto punk dos anos 70. Sid Vicious, mas sem heroína. E eu era Nancy.

"Não seja uma maldita cadela da sociedade", ele disse. E me passou o baseado. Era o que costumávamos fazer durante seu serviço comunitário. Eu, já bem chapadinha, ria como uma hiena. E depois íamos para um bar. Sempre o mesmo. Bom, barato e aceita menores. Eu dançava em cima das mesas ao som de Dancing Queen ou qualquer outra musiquinha escrota que tocasse lá. De madrugada, com uma garrafa de tequila na mão, encontrávamos Bill e sua gangue. E então andávamos pelo centro da cidade, metendo medo em quem quer que se arriscasse a sair na rua. Conseguíamos alguns trocados e, se déssemos sorte, alguma coisa pra nos manter acordados.

Eu sempre gostei de carros, mas Marcelo era tanto superprotetor comigo, só dirigir se estivesse sóbria. Talvez seja por que certa vez bati em um poste. Acordei com o som de cirenes. Marcelo me puxou pra fora do carro e corremos cerca de 1,5 km. Eu com a cabeça sangrando e ele com um dedo deslocado. Estávamos tão bêbados que deitamos na grama rindo da situação e dormimos observando as estrelas. No dia seguinte, um guarda nos acordou. Ele ia deixar passar mas, ao revistar Marcelo, achou maconha. A partir daí ganhei uma ficha na polícia. E o pior é que nós nem sabíamos que tínhamos aquilo. Que desperdício.

Sexta-feira era o dia das festas. Entrávamos de penetra, éramos muito bons nisso, e sempre uma diferente. Breu, doce, bala, cola, álcool e pó. Tudo na mesma noite, até não aguenta mais. Tínhamos um trato: o primeiro que recobrava a consciência tinha de ajudar o outro. Normalmente, essa parte sempre sobrava pro Marcelo. E então nós íamos para casa, tropeçando no vento. Subíamos no telhado, nos escorávamos na chaminé e ficávamos vendo o dia passar. O melhor presente que já ganhei dele foi um estilingue. Quando as crianças dos vizinhos passavam, mirávamos a cabeça delas. Normalmente errávamos, mas uma vez ele acertou, e a pobre garotinha teve de fazer 7 pontos atrás da orelha.

Nós fazíamos tudo junto. Bebíamos juntos, dançávamos juntos, corríamos da polícia juntos, cortávamos o cabelo um do outro. Defendíamos um ao outro. Ele me ensinou lutar e preparar coquetel Molotov.

Bons tempos. Até ele roubar algumas poucas gramas de um traficante. Uma semana depois vi sua foto no jornal.

Recuperamos o corpo, mas não teve funeral. Vendemos seus órgãos, roupas e objetos. A facção precisa se sustentar de algum modo.


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