Dormi mais ou menos à meia-noite. Acordei, como sempre, com um delicioso grito de ACOOOORDAAA!! da minha mãe. Isso quando ainda era uma hora da tarde.

Fala sério! Uma hora. Uma hora é muito cedo.

Fui pra cozinha tomar o café da... Almoçar.

Não acho legal ficar sem o café. Mas sempre foi a regra da minha mãe: Acordou tarde, fica sem café. Bem, a culpa não era totalmente minha.

Não era ela quem tinha o quarto colado com o quarto do meu irmão. O tal quarto em que eu ouvi barulhos e gemidos de uma voz familiar a noite toda.

Tentei não pensar nisso. Mas sempre que passava na frente do quarto do Léo eu tinha a certeza de que Joice estava lá. E os dois provavelmente dormindo de... Eca!

Achei melhor pensar em mim e Talita assim.

Seria mais legal. A cena, sabe? Mas nada a mais que isso. Pelo menos, não por enquanto, pensei.

Resolvi deixar o almoço para um pouquinho mais tarde. Ou seja: facebook.

Corri para o computador e o liguei.

Ou não.

Acho que não.

Não liguei.

Liguei de novo.

Não, de novo.

Depois que minha ficha caiu o único pensamento que tive foi: NÃÃÃÃÃO.

Qualquer coisa menos isso.

Computador demoníaco.

Tudo bem. Eu tinha que me concentrar em tudo o que estava acontecendo. Tinha que contar tudo ao Léo e à Talita. Tudo sobre a Julia, e o Léo tinha que me contar em detalhes tudo o que aconteceu no dia da morte do Hugo.

Cheguei na porta dele e quando ia bater, pensei: Talita primeiro, é melhor.

Mas não precisei. A porta abriu sozinha. Era Léo. Ele levou um susto quando me viu.

-Preciso falar contigo - falei, depois de reparar que ele estava semi nu.

Ele olhou para mim como se esperasse que eu desse um tapa nele.

Porquê?

Olhei para dentro do quarto. Ele não estava com a Joice. Quer dizer, estava também.

Ele saiu e fechou a porta.

-O quê?

Depois de vegetar em pensamentos maléficos falei:

-É... Ahn... É... Eu, é...

-Fala logo! - gritou.

-Acho melhor eu falar depois. Outra hora.

-Tudo bem. Mas é você que está falando.

-Léo.

-O quê?

-Por que sua cueca tem palhaços?

Ele riu, sem nem mesmo olhar. Entrou no quarto de novo, tentando esconder as meninas.

-Você não viu nada.

-Não, não vi.

Queria não ter visto, pensei.

Ele fechou a porta e eu saí dali rindo.

-Mas você realmente acha que ela está envolvida?

-Não tenho dúvidas.

-A gente tem que conversar com o Rafael sobre isso.

-Tudo bem. Mas não agora. Temos que ter certeza primeiro, senão ele vai acabar não acreditando.

-É. Tem razão.

-Mudando de assunto. Preciso te contar o que me aconteceu hoje.

Contei a ela todo o meu dia até a hora que saí de casa.

-Palhaços? - disse Talita, rindo.

-É.

-Essa tal de Joice. Ela é estranha.

-É. Ela é bem estranha mesmo mas acho que.. Acho que adultos costumam fazer isso. Não é? Com mais de duas pessoas?

Talita olhou para mim e começamos a rir novamente.

-Tá bom. Mudando de assunto de novo, sabe porquê seu computador quebrou?

-Não. E ninguém mais sabe. Só você. Vou falar pra minha mãe mandar aquela bosta pro concerto.-

-E... você tem alguma suspeita.

-De que?

-Do porquê dele ter quebrado.

-Não faço ideia. Ontem a última coisa que eu fiz foi conversar com a Mariana.

-Ah! A Mariana. Vocês estão muito íntimos ultimamente.

-Ah! Ela é só minha amiga, cê sabe né mô?

Talita abaixou a cabeça.

-Ah não, vem cá - Cheguei perto dela e abri o braços esperando um abraço.

Ela levantou a cabeça rindo.

-Caiu direitinho - disse ela, me abraçando, enquanto ríamos.

-Você é demais sabia?

-Sabia sim, na verdade.

-Convencida.

-Ah, vai. To brincando.

-Tá bom.

Ficamos em silêncio por um tempo.

-E... Sobre o que vocês falaram?

-Ah, sobre a Julia.

-Ahn, legal. Bom saber que você contou pra ela primeiro.

-Pô Lita. Para.

Talita caiu na risada de novo.

-Agora, sério. Se você acha que essa garota tem alguma coisa a ver com aquilo tudo, com o que você acha que ela estava envolvida. Quer dizer, quando será que ela teve participação, e porquê.

-Não sei. Não sei mesmo. Mas eu acho que a primeira coisa que agente tem que fazer é falar com o Lucas. Temos que visitá-lo.

O horário de visita era das 13 às 17 horas.

Fui com Talita, Mariana e Léo. Pedimos a Mariana que tentasse esconder do Rafael. Pois tínhamos que descobrir algumas coisas sobre a Julia antes de falar com ele.

Entramos do quarto os quatro juntos.

Lucas estava sentado na maca olhando para as cortinas cor de salmão da janela, que voavam com o vento. Estava vestido com uma roupa branca. Pelo tempo que estava lá, seus cabelos, outrora bem baixos e aparados, cresceram junto com o bigode e a barba, que provavelmente não era feita a algumas semanas.

Bati na porta. Lucas olhou para atrás e abriu um enorme sorriso.

=Talita. Meus amigos. Quanto tempo.

Chegamos perto, rindo. Entregamos algumas coisas que levamos: cestas de café da manhã, flores e livros.

-O Mikael que deu a ideia... Da cesta disse Talita.

-Obrigado a todos vocês. Fico aqui sozinho todos os dias e... Senti muita falta de vocês.

Ficamos conversando por um bom tempo.

Depois de longos minutos de conversa, Lucas simplesmente travou. Talita perguntou a ele o que ele estava achando de um biscoito que pegou na cesta e ele não respondeu. Ficou com o corpo totalmente parado, olhando para a janela.

Antes que eu pudesse pensar em olhar para a janela ele voltou ao normal.

Tentei ver o que era e só vi um vulto. Um vulto negro.

Não!

De novo não!

Olhei para Léo, ele também havia visto. Olhou para mim com cara de espanto e eu entendi que ele quis dizer.

-O que foi Lucas? O que era aquilo?

-Nada.

-Fala, o que era?

-Nada, tá bom?

Lucas pôs a mão em um bolso de sua roupa branca. Como se estivesse escondendo alguma coisa.

-O que tem aí?

-Aonde?

-No seu bolso.

-Nada.

-Nada mesmo?

-O que foi Mika - disse Talita. - Vai começar um interrogatório?

-Me fala o que tem aí - pedi, ignorando Talita.

-Não tem nada

Disfarcei por um tempo, olhei para o Léo e ele entendeu o que eu ia fazer. Olhou para mim e assentiu com a cabeça.

Esperei Lucas se distrair e enfiei a mão em seu bolso.

Ele quase teve um ataque do coração quando reparou que eu peguei o que estava no seu bolso.

Talita me encarou com uma expressão de quem queria me matar. Só parou quando percebeu o que estava na minha mão.

Era um bilhete. Li em voz alta.

Espero que goste do presentinho.Está no lugar de sempre.

Ass:HM

-Você também receb...

Talita se levantou rapidamente.

-Lucas. Me conta agora. Tudo o que está acontecendo. Quem é HM? Que presentinho é esse?

Lucas ficou bravo e abaixou a cabeça.

Talita se ajoelhou sobre ele.

-Olha, primo. Agente só tá tentando ajudar você. Você tem que nos dizer tudo.

Uma lágrima escorreu o rosto de Lucas.

Ele se levantou e por um momento pensei que ia nos enforcar até a morte, mas ele simplesmente levantou seu colchão e pegou um saquinho. Um saquinho de plástico cheio com um pó branco.

Ele entregou o saquinho para Talita e sentou de novo.

-O que é isso? - perguntei.

-Espera - disse Léo - Não pode ser.

-O quê? - perguntou Talita.

-Cocaína... Isso é cocaína.