Seria Ashley que transformaria meu coração em carne novamente? Foi o meu pensamento durante toda a manhã. Acordei animado para o sol que raiava lá fora. Foi o primeiro dia que levantei da minha cama, e não me senti um completo nada, obrigado a sobreviver e não a aproveitar a vida.

   Sorri o tempo todo enquanto fazia as coisas em casa. O que deixou Ashley mais linda do que era, não foi à maquiagem, e sim o seu bom humor que jamais imaginei que teria.

   Trocando de roupa, fui até a sala, onde percebi que meus pais estavam conversando ao meu respeito.

   — Ei, querido. Estávamos aqui discutindo qual seria a melhor universidade pra você. Você já perdeu muitos dias desde que chegamos. Não chegamos a uma conclusão ainda. Tem em mente alguma universidade de qual tenha ouvido falar? — Gesticulou minha mãe olhando para o meu pai logo em seguida.

   — Ouvi Ashley dizer que tem a Universidade de Nova York. É bem conceituada aqui em Manhattan.

   — Vou pegar o endereço na internet depois, e ligarei para o diretor para ver os programas estudantis que eles têm disponíveis. Vai querer continuar no futebol americano?

   — É, pode ser. Não estou na minha melhor forma, mas vou tentar um teste enquanto estiver lá.

   — Ok.

   — Precisam de mais alguma coisa? Caso contrário, vou descer até a cafeteria, — colocando a mão no abdômen digo — estou com fome, estou sem comer desde ontem.

   — Não querido, pode ir.

  Corri com o olhar em direção a mesa de centro e vi um jornal. Peguei e fui logo à porta. Chegando à cafeteria, peço um café e um pão francês. Não estou com o estômago nas melhores condições, e algo doce não cairia tão bem logo de manhã. Abrindo o jornal percebo que há uma noticia sobre a inauguração da casa noturna. Desço o olhar para umas fotos que se encontravam logo abaixo da noticia e percebo uma que me interessou, onde estou com Ashley e Mari, com uma legenda um tanto quanto engraçada: Ashley Rosson, Mariane Greyberg e (?) – Quem seria o gato que acompanhava as duas? — as últimas palavras me fizeram rir. Notei logo acima da noticia que parecia uma coluna de fofocas. Era apenas um forasteiro até ontem, e hoje pareço um famoso no jornal.

   Participando em festas assim, eu poderia ganhar uma reputação e status. Seria uma boa idéia se eu não dependesse de Ashley para afins — não que eu me importe com reputação, mas é algo bom em uma cidade grande como Manhattan.

   Universidade de Nova York ou Columbia? Refletir sobre qual universidade ingressar era difícil. Por um lado, imaginar o que poderia acontecer em ambas era divertido. Na pública eu teria que fazer novos amigos, e na Columbia eu já teria Ashley. E vendo pela condição monetária de meus pais, é bem provável que optem me colocar na Columbia.

   As coisas complicam quando tenho que decidir entre os cursos de Fisioterapia ou Engenharia Civil. Meus pais não são como os outros por aí. Nunca me obrigaram a escolher entre Arquitetura ou Direito — já que são suas respectivas profissões e quisessem criar um legado da família em algum ramo. Diziam-me que quando chegasse a hora, eu poderia decidir o que era melhor pra mim. Os negócios da minha mãe rendem um bom dinheiro. Sei que o sonho dela seria que eu tomasse conta depois que ela decidisse se aposentar, — o que ainda vai demorar um bom tempo — mas não acho que arquitetura seja bom pra mim. Criatividade e uma boa mão para desenho são essenciais — coisas que não se encontram em mim tão fácil.

    Estava tão distraído com meus pensamentos, que não tinha percebido que Ashley estava na minha frente.

   — Hey! — Estalando os dedos na frente do meu rosto me fez retornar em si.

   — Hey! — Retruquei fazendo uma careta engraçada logo em seguida — Você interrompeu meus pensamentos.

   — Me desculpe “Senhor da Filosofia” — ironizou ela enfatizando as ultimas palavras.

   — Quando chegou? Não tinha ido dormir na casa da Mari ontem?

   — Acabei de chegar. Percebi que você estava aqui na cafeteria e resolvi vir conversar. Estou morrendo de fome. Quando sai da casa da Mari ela estava completamente desmaiada na cama — Rindo completou — e como a conheço bem, quando alguém a acorda, fica mal humorada o dia inteiro. Para evitar isso, sai sem falar nada, mas deixei um bilhete na escrivaninha que tinha do lado da cama dela. Vou ali pegar um latte, se importa?

   — Não, pode ir.

   Deixando a bolsa na mesa, foi em direção ao balcão. Mesmo sem maquiagem, Ashley conseguia ser linda. O que a fazia conquistar as pessoas, não era a sua beleza, e sim o seu carisma, o seu humor. Era incrível perceber que mesmo sem conhecer o empregado da cafeteria, conversavam como se fossem amigos de décadas. Em alguns momentos, dava uma olhada de leve — talvez para conferir se eu ainda estava ali — sorrindo de leve. Colocando uma mecha de leve atrás da orelha, pegou o seu latte e voltou para mesa.

   — Demorei?

   — Nem um pouco.

   — Então, é... — fez uma pausa para dar uma bebericada em seu latte — escolheu sua futura universidade?

   — Estava pensando nisso quando chegou. Vou escolher Columbia. Não porque não acho as universidades públicas boas, mas quem vai pagar não sou eu, e bem provável que meus pais com certeza vão escolher a privada.

   — Liam, por favor, admite logo que você não quer a Universidade de Nova York porque não vai ter amigos.

   — Ta. Pode ser por esse motivo também. Que tal um passeio mais tarde, após o almoço?

   — Geralmente eu revogaria a proposta se caso eu tivesse trabalhos da faculdade pendentes. Mas como o dia está agradável para uma caminhada, e eu não tenho nenhum trabalho a fazer, acho que posso aceitar.

   — Ótimo. Você viu essa foto? — Aponto para nossa foto no jornal que ainda se encontrava na mesa. Rindo, aponto para a legenda logo embaixo.

   — Oh Meu Deus! — Colocando a mão na boca em sinal de espanto, arregala os olhos e continua — como sai horrorosa nessa foto. Como eles ousam colocar uma foto minha, h-o-r-r-e-n-d-a nesse jornal?

   — Para, você não está tão feia assim. Não exagere.

   — Claro que estou. Que ângulo de foto é esse? Que frizz é esse aqui no meu cabelo? — Brava, exclamou e apontou todos os defeitos na foto.

   — Na verdade, não era esse o objetivo que eu tinha. Preste bem atenção na legenda.

   Passando os olhos pelas palavras da frase, sorriu e olhou para mim.

   — Prevejo assedio de fãs em três, dois, um... — Riu Ashley.

   — Haha, qual é a graça?

   — Muitas. Agora você é o gato acompanhante de solteiras que ficou famoso em uma coluna de fofoca do jornal mais lido de Manhattan. Sites de fofocas devem estar procurando neste momento seus perfis nas redes sociais, a procura de fotos para a matéria.

   Sorrindo, abaixo minha cabeça e percebo que minhas bochechas começam a ficar quentes. Bochechas coradas? Como assim?  Percebendo isso, Ashley se aproveita da situação.

   — Acho que temos alguém com vergonha aqui. — Levanto o rosto ainda mantendo o sorriso — Desculpe, não podia perder a oportunidade.

    Terminando o seu copo de latte, Ashley o deixa em cima da mesa e se dirige até o balcão, pagando sua conta logo em seguida.

   — Estou morrendo de sono Liam. Mesmo depois de tomar todo aquele copo de Latte. Vou dormir um pouco antes do almoço para recuperar as energias para nossa caminhada. A que horas vamos sair?

   — Quatorze horas.

   — Ok. Prometo não me atrasar. Até mais tarde.

   Pegando a bolsa encima da mesa, saiu correndo em direção ao elevador que já estava quase se fechando. Entrando no elevador, pegou o celular dentro da bolsa e deu uma ultima olhada para mim antes da porta se fechar. Antes mesmo que pudesse me conter, percebi que estava sorrindo.

    Ultimamente, eu estava me sentindo tão leve, tão feliz, tão... Eu.