O Feiticeiro Parte I - O Livro de Magia escrita por André Tornado


Capítulo 3
I.2 Dois rapazes na universidade.




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Nos jardins do campus universitário os estudantes juntavam-se depois de terminado mais um período de aulas. Aproveitavam o intervalo de alguns minutos para descontrair, respirar ar puro, contar algumas piadas, por os mexericos em dia, conferir as relações de amizade e de rivalidade.

Pela escadaria do edifício principal desceu um grupo de rapazes e raparigas. Comentavam a matéria de cada disciplina e trocavam pedidos de apontamentos. No meio deles distinguia-se um bonito jovem de cabelos negros revoltos, corpo atlético, vestido de forma simples. Não falava e estava sério, em contraste com os alegres colegas. Os olhos, igualmente negros, procuravam alguém com insistência, como se não pertencesse ali e precisasse escapar depressa do grupo. Quando o encontrou, a boca abriu-se num sorriso de satisfação.

Miná… Já venho ter convosco – disse, acenando com a mão que não segurava livros e cadernos.

– Onde vais tu, Son Goten? – Perguntou uma rapariga de cabelos loiros encaracolados e olhos verdes. – Vais encontrar-te novamente com aquele teu amigo?

– Eh… Hai. Porquê?

– Sempre que te encontras com ele, faltas ao resto das aulas.

– E estás preocupada com isso? Se faltar às aulas, o problema é meu, não é teu…

– Faltas demasiado – protestou.

Ficou atrapalhado. Não esperava que ela se importasse com a sua próxima ausência.

– Não há problema – disse, a verificar se o amigo que descobrira há pouco não tinha desaparecido. – Logo estudo a matéria que for dada hoje.

– E quem é que te vai emprestar os apontamentos?

– Tu, claro! - E abriu um rasgado sorriso.

– Eu sei que sou eu. Sou sempre eu!

– Conto contigo, eh? Não me faltes… Até amanhã, Coralina.

E afastou-se para evitar mais explicações. Ultimamente, a Coralina andava muito em cima dele e os colegas já estavam a notar. Para onde quer que fosse, a Coralina seguia-o. Onde quer que estivesse, a Coralina estava. A rapariga era simpática, mas estava a tornar-se cansativa. Goten dirigiu-se ao amigo, chamando-o:

– Trunks-kun!

Os olhos azuis de Trunks brilharam por entre duas madeixas de cabelo comprido, que afastou com uma mão.

– Goten-kun! Ainda não te tinha visto hoje.

– O dia tem sido complicado. Aulas práticas de manhã, almocei a correr… Um trabalho de grupo no início da tarde. Mais aulas…

– Ser universitário custa! – Troçou Trunks rindo-se alto.

Goten forçou um sorriso.

– Pois custa…

– Nunca pensaste que fosse assim.

Negou com a cabeça. Não conseguiu responder, porque era-lhe difícil falar e manter o sorriso falsificado.

– Estás arrependido de me ter seguido até à universidade?

Tornou a negar com a cabeça.

– Não mintas. Não faz parte da tua natureza. – Trunks espreitou o relógio de pulso. – Hum… Já acabaste as aulas?

– Não. Ainda é cedo.

– Vamos.

– Onde?

– Dar uma volta. Apetece-me esticar as pernas.

Os dois rapazes rodearam o edifício principal à procura do sítio perfeito. Olharam uma última vez para todos os cantos, para se certificarem que ninguém os espreitava, reuniram o ki e elevaram-se nos ares. Trunks mais seguro, Goten, após um longo suspiro, aceitando a sugestão do amigo juntando-se-lhe no voo.

O vento batia-lhe de frente e Son Goten fechou os olhos. Se sentira remorsos por estar novamente a fazer gazeta às aulas da universidade – era a terceira vez naquela semana – foi descartando o sentimento como quem se despe de camada de roupa, após camada de roupa, quando se está demasiado agasalhado e se entra num sítio aquecido por um sol tropical, à medida que progredia pelos céus da cidade até ao bosque verdejante que se estendia nos arrabaldes. Voava ao lado de Trunks, o seu melhor amigo.

Confiava em Trunks, mesmo quando este o arrastava para longe das obrigações e o fazia esquecer das responsabilidades de jovem adulto e estudante universitário. Apesar de se esforçar para se enquadrar num estilo de vida típico dos rapazes da sua idade, Goten não era igual aos outros e estava longe de ser normal. Era filho de um extraterrestre, tinha uma força imensa, conhecia técnicas de luta fantásticas, possuía uma perceção fora do comum. Por ser tão extraordinariamente diferente, salvava-se do desânimo quotidiano de ter de ocultar permanentemente a sua verdadeira natureza seguindo Trunks, alguém que era igual a ele – filho de um extraterrestre, muito forte, excelente lutador.

O vento fresco a entrar por todos os poros da pele, como se fosse o sabor da liberdade, acalmava-o e devolvia-lhe a identidade, o rapaz anormal que existia debaixo do manto de fabricada normalidade que vestia em cada dia que frequentava a universidade. Não conseguia compreender por que razão teria de fingir ser alguém que não era. Tinha como exemplo, o pai, que sempre tinha feito o que quisera. Há três anos atrás, durante o último torneio de artes marciais em que tinham participado, enfrentara no tatami um rapazinho excecionalmente forte. Resolvera cuidar dele e treiná-lo, para que o poder que possuía não acabasse por ser nefasto para a Terra. Despedira-se dele, da mãe, do irmão, da neta e de todos os amigos. Colocara o rapazinho nos ombros e fora-se embora, sumindo-se no horizonte. Pedira-lhe e pedira a Trunks que continuassem a treinar, pois o rapazinho precisaria de ter neles o melhor dos exemplos. Torceu o nariz, lembrando-se, sentindo o peso dos livros nos braços. O pai não estaria a pensar, certamente, em estudos universitários.

Ou estaria? Estudar bastante, aprender mais ainda, conseguir um diploma também faria dele um exemplo, assim lhe dizia a mãe, que o comparava amiúde com o irmão mais velho, bem-sucedido na área académica.

Mas o que ele sentia balançava entre essas duas realidades – ser o que lhe estava no sangue e ser o que o mundo queria que fosse. Sentia-se confuso e inquieto. Trunks resgatava-o dessa sombra que mirrava o que ele era e, mesmo sabendo que estava a proceder mal, fazia o que o amigo lhe pedia. Era uma das formas que tinha de respirar, depois de suster o fôlego por tanto tempo. Nunca tivera coragem, porém, de perguntar se Trunks sentia as mesmas dúvidas.

Debaixo deles a cidade tinha dado lugar ao campo. A erva brilhava verde, as árvores estavam cobertas de farta folhagem, ouvia-se o piar alegre dos pássaros, um riacho de água límpida e fresca serpenteava por entre a vegetação. Os dois rapazes desceram assim que encontraram um lugar agradável para descansarem os músculos.

Trunks espreguiçou-se ruidosamente. Goten atirou os livros e cadernos para o lado sem cerimónias e estendeu-se no chão, cruzando os braços debaixo da cabeça. Trunks deitou-se ao lado dele, soltando um suspiro de satisfação.

– Estás demasiado calado.

A voz de Trunks arrancou-o da preguiça. Goten pestanejou.

– Hum?

– Não gosto de ti calado. Significa que estás a pensar, o que, no teu caso, é potencialmente perigoso. Fazes demasiadas asneiras, quando pensas.

– Mas não estou a pensar em nada de especial, Trunks-kun…

– Estás arrependido por estarmos a faltar às aulas?

– Não.

– Odeio a universidade.

A confissão era uma novidade. Goten sentiu-se desamparado, naquele instante. Entrara na universidade porque tinham feito uma aposta estúpida. Trunks desafiara-o, dizendo-lhe que ele não seria capaz de tirar um curso superior. Goten empertigara-se. Levara noites a fio a queimar as pestanas, pedira ajuda ao irmão. Fizera os exames todos e acabara por conseguir a nota mínima para entrar num dos cursos de relações internacionais. Escolhera essa formação sem pensar, qualquer coisa servia. Trunks entrara no curso de administração e gestão, para o qual estudara e que fora sempre o seu objetivo. Festejara intensamente, afirmando que cumpria um sonho.

– Pensava que gostavas de estudar – observou Goten, recordando-se do orgulho na voz do amigo quando lhe contara que estava na universidade.

– É apenas uma necessidade. Um dia, irei ser o presidente da Capsule Corporation e preciso exibir, na parede do escritório, um diploma, para que as pessoas que venha a receber vejam que sou realmente importante.

– Só isso?

– E chega. Na verdade, sabes muito bem que não preciso de ter curso nenhum. A presidência da Capsule Corporation é minha, por herança. Mas a minha mãe necessita estar sossegada e acreditar que deixa a companhia em excelentes mãos.

– Ah…

A conclusão era que, provavelmente, estaria a perder tempo. Seguira o amigo, enterrara-se em algo que não o motivava e, enquanto Trunks estava solto para se escapar do atoleiro, ele teria de prosseguir pois não tinha alternativas. O que podia ser, para além de filho de um extraterrestre?

– Mas a universidade tem o seu lado positivo – acrescentou Trunks.

– Tem?

– Conheces muitas raparigas na universidade!

Goten riu-se. Trunks tinha razão. Não se podiam queixar em relação a companhia feminina. As raparigas pareciam enlouquecer quando os viam. Sempre que passavam nos corredores, os dois juntos ou cada um por si, elas seguiam-nos com o olhar, desfaziam-se em sorrisos, cochichavam com as amigas, deixavam bilhetinhos, faziam cenas de ciúmes. Fora sempre assim, desde o liceu.

– Quem é a miúda que te segue para todo o lado?

Nani?

– A loira dos olhos verdes, Goten.

– A Coralina?

– Essa. Quando é que a vais convidar para sair?

– Nunca.

Trunks sentou-se.

– Nunca? Pensei que estavas interessada nela.

– Não estou. Ela é que está interessada em mim.

– E tu estás interessado em quem?

Corou, gaguejando:

– Em ninguém…

– Apanhei-te!

Goten também se sentou. Trunks pediu divertido:

– Conta-me. Quem é ela? Conheço?

– Por acaso… – encolheu-se de vergonha. – Por acaso, conheces.

Os olhos azuis de Trunks brilharam, aguardando pela revelação. Goten murmurou:

– Ela é… É a Maron.

– A Maron?!? A filha de Kuririn-san?

Hai

Trunks franziu a testa, exclamando:

– Ela é uma… É uma miúda ainda!

– Não é nada! – Protestou – Tem dezasseis anos. Não é propriamente uma miúda…

– Mas é muito mais nova que tu.

– Ela cresceu… já não é a menina que ainda chupava no dedo quando nós participámos no nosso primeiro torneio de artes marciais. Cresceu e eu também cresci. E… E acho que ela é muito interessante.

Na verdade, a filha de Kuririn era bonita, considerava Trunks agora que se punha a pensar nela. Loira, alta, com uns olhos escuros, doces e misteriosos. Não falava muito, era um defeito. Passava a maior parte do tempo calada. Bulma não lhe poupava elogios, dizendo que a rapariga era uma simpatia porque tinha puxado o carácter do pai, Kuririn, e a beleza da mãe, número 18. E quando Bulma precisava de alguém para tomar conta de Bra ou quando Gohan-san precisava de alguém para tomar conta da sua filha Pan, era Maron quem chamavam porque tinha muito jeito para lidar com crianças.

– Mesmo assim, não passa de uma miúda – concluiu Trunks. – Tem dezasseis anos, enquanto tu tens vinte. Não te percebo, Son Goten! Com tantas raparigas que andam atrás de ti na universidade, que são da tua idade, escolhes uma miúda do liceu!

– Mas a rapariga com quem vou casar deverá ser alguém que me conheça. Que sabe quem eu sou, para que não tenha de… inventar que sou um rapaz normal.

– Casar?!

Hai!

Trunks assobiou.

– A coisa é assim tão séria?

Goten corou ainda mais.

– Eu… gosto muito dela.

– E ela gosta de ti?

– Não sei…

– Não sabes? Ah, mas temos de remediar isso.

As entranhas começaram a ferver com o pânico que o assolou. Temendo as ideias de Trunks, que davam sempre mau resultado, Goten gritou:

– Não te metas no meu assunto com a Maron!

Trunks semicerrou os olhos.

– Bom, se estás interessado na Maron, mesmo sendo uma miúda de liceu, tudo bem para mim. Ainda bem que me dizes, para não resolver um dia convidá-la para sair comigo. Ela vai muitas vezes lá a casa, sabes? Para cuidar da minha irmã Bra…

Goten empalideceu. Trunks piscou-lhe o olho.

– Descansa! Não vou fazer nada. Não estou inclinado para a filha de Kuririn-san. Acredito que a rapariga certa para mim está na universidade. Será alguém que, embora não me conheça, passará a conhecer-me. Isto é, se eu confiar nela o suficiente. Percebes? Para que um dia possa ser verdadeiro ao lado dela. Tal como Gohan-san, o teu irmão, e Videl-san. Ela não sabia ao princípio que ele era saiya-jin.

– Pois…

– Ser saiya-jin atrapalha mais do que ajuda, nos tempos que correm…

Uma brisa quente encheu o ar do cheiro agradável a verde. Goten encolheu os ombros.

– Mas não deixamos de ser saiya-jin.

Trunks deu-lhe uma cotovelada.

– Eh… Gostarias de levar a vida de um verdadeiro saiya-jin?

– O que queres dizer?

– A minha mãe conta-me às vezes o que fazia o meu pai, antes deles se conhecerem. Diz-me que era muito desagradável, mas deixa-me sempre curioso. Devia ser emocionante viver no limite do desconhecido. Conquistar planetas, não saber se vamos ver o dia seguinte. Uma vez disse-me que não me devia orgulhar daquilo que o meu pai tinha feito quando era novo… Mas que sabe ela do que sente um saiya-jin?

– Hum… A minha mãe também me contou algumas coisas. Sabias que o meu pai tinha um irmão?

– Não, não sabia.

– É verdade, eu tinha um tio – contou Goten. – Veio um dia à Terra para convencer o meu pai a unir-se a ele para o ajudar a conquistar mais planetas para um qualquer para quem trabalhavam os saiya-jin. Nesta altura, eles já não agiam por conta própria, porque o planeta deles tinha sido destruído. Uma história muito esquisita, nunca a percebi bem. O meu pai nunca me explicou… Pois, como estava a dizer, esse meu tio veio à Terra e como o meu pai não quis ir com ele, raptou o meu irmão.

– O teu tio raptou Gohan-san?

Hai, raptou-o. Mas o meu pai e Piccolo-san foram em seu auxílio e salvaram-no. Acho que eliminaram o meu tio. A seguir, apareceu o teu pai. Vegeta-san veio para a Terra para a conquistar, não foi?

Hai. Foi o que a minha mãe me disse.

– Mas o meu pai, o meu irmão e todos os seus amigos impediram que isso acontecesse.

– Acho que foi o que aconteceu.

– E depois nascemos nós, certo?

– Hum-hum… Acho que, pelo meio, ainda houve uma viagem qualquer a um planeta onde aconteceu uma grande batalha e mais o torneio do Cell.

Trunks exclamou:

– Precisamos de uma nova aventura, Goten-kun!

E a alegria com que disse aquilo foi contagiante.

Hai! Uma nova aventura com adversários a sério!

– Com guerreiros que mereçam esse nome!

– E com um mistério qualquer pelo meio para procurarmos pelas bolas de dragão e invocarmos Shenron, o Dragão Sagrado, para que nos ajude a desvendar esse mistério!

– Com muita pancadaria pelo meio. Os meus punhos estão a ficar enferrujados – concluiu Trunks.

– E os meus também! - Acompanhou Goten, socando o ar.

Os dois começaram a rir, em uníssono. Encheram o campo com as suas gargalhadas sonoras e depois calaram-se a esfregar as lágrimas de alegria dos olhos. Goten sentia-se muito melhor. Após uns instantes de silêncio, Trunks levantou-se.

– Sabes uma coisa, Son Goten?

A seguir, relaxou os músculos, reuniu o ki, aumentou-o até uma aura dourada envolver-lhe o corpo. Os cabelos brilharam, os olhos tornaram-se verdes.

– Quero ver se és um verdadeiro saiya-jin! – Disse ameaçador. – Desafio-te para que mostres o teu poder, filho de Kakaroto!

Goten levantou-se e também se transformou em super saiya-jin.

– Vais arrepender-te dessas palavras, filho de Vegeta!

Os dois rapazes gritaram em uníssono à medida que a sua energia crescia sem limites. Espalhavam uma ventania medonha em redor que dobrava os ramos das árvores próximas. A relva revolvia-se debaixo dos pés. O ar enchia-se de pequenas faíscas. Depois, Trunks e Goten olharam um para o outro e chocaram violentamente, unindo as palmas das mãos. Avaliavam as forças um do outro, suspensos no ar, a escassos centímetros do chão.

– Estava a ver que nunca mais começavas – retorquiu Goten.

Trunks desenhou nos lábios um sorriso pleno de ironia que aprendera com o pai.

Então, os dois super saiya-jin começaram o combate.


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Notas finais do capítulo

Próximo capítulo:
A caverna da salvação.



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