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Quem diria... Acordar numa bela manhã de sol, como se fosse acordar pela primeira vez na vida. É um milagre!

Abrir os olhos nunca foi uma tarefa tão difícil quanto estava sendo naquela manhã de primavera. Os passarinhos cantavam no jardim, os empregados conversavam aleatoriamente pelo castelo e uma adorável mão passeava pela minha nuca alisando carinhosamente meus cabelos. Oh vida boa! Como senti falta disso! – sorri e abri lentamente meus olhos para deparar-me com um par de olhos cor de mel.

Não eram todas as manhãs que aquilo acontecia. Uma coisa rara de se ver e de se presenciar. Sesshoumaru raramente demonstrava seu lado... Digamos, meigo. Talvez, essa não fosse a palavra apropriada a defini-lo naquele momento, mas certamente outras palavras não se encontravam em meu dicionário para serem procuradas a fim de definir o estado de espírito do meu marido naquela ocasião. – Ele sorria... Timidamente, mas sorria! E eu não pude deixar de corresponder ao seu perfeito sorriso. Totalmente irresistível.

"Bom dia", ele limitou-se a dizer e voltar a sua pose de sério e totalmente inexpressível.

"Bom dia...", eu respondi um pouco acuada e envergonhada pela súbita mudança de humor dele.

Mordi os lábios, desviei o olhar e apertei os lençóis da cama. Agora tudo fazia certo sentido. Durante a noite anterior eu havia ido até seu quarto pedindo por ajuda e compreensão sobre minhas lembranças momentâneas. – suspirei – Noites como aquelas raramente aconteciam e eu, imprudente como era, acabei me exaltando. Choraminguei, em prantos como uma alma desesperada e corri para seus fortes braços. Conversamos por uns sóbrios minutos e eu caí no mais profundo sono.

"Arrume-se, Kagome já está procurando por você desesperada pelo castelo", Sesshoumaru pronunciava as palavras de forma quase que ofensivas e tão secas que realmente faziam-me sentir culpada.

Eu estava errada! Aquela não era uma bela manhã de sol com passarinhos cantando alegremente pelo jardim. Acabei que por me levantar e ajeitar o quimono que eu usava para dormir. Ele por outro lado já estava com seu habitual "uniforme" pronto para uma batalha a qualquer momento e isso era totalmente angustiante.

Não havia um só dia em que eu não pensasse em Sesshoumaru com carinho. Eu sabia através de Kagome e do próprio Sesshoumaru que eu fora uma pessoa boa de saúde e que realmente me recordava das coisas passadas. Então, a doença veio como uma praga sobre o castelo e eu fui atingida.

Poucas lembranças ainda restavam em minha mente e algumas adquiri com o tempo e com os tratamentos rigorosos de Kagome, outras com as belas histórias que Lorde Sesshoumaru contava para mim. – suspirei e levantei-me indo em direção a porta – Eu também me esforçava e aos pouco eu ia recuperando alguns fatos da minha vida sem ajuda de ninguém, pois eu acreditava em milagres. (...)

"Obrigada, por me deixar dormir com você.", eu falei num sussurro antes de sair quase que correndo daquele quarto.

Afinal, nem tivemos nossa conversa... Aquela conversa que ele me prometeu...

Nenhum deles sabiam, como eu sofria com minha própria situação e todos fingiam entender quando na verdade não queriam nem chegar perto de mim. Quando não queria me ajudar. – segurei algumas lágrimas e voltei para o meu aposento – Eu tenho inveja da "Lady Rin" que era boa de saúde. Ela fazia todos felizes, coisa que eu nem chego perto...

Arrumei-me, tomei meu desjejum e esperei Kagome no jardim como era de costume, porém ela não estava lá, na verdade ninguém passeava pelo castelo naquele momento e até achei um pouco estranho. Sentei-me no balanço debaixo da árvore de cerejeira e fiquei lá olhando para o nada por um longo período, esperando Kagome chegar e finalmente recomeçar os tratamentos intensivos.

"Pensando na morte da bezerra, Mi Lady?"

"Ah! Meu Deus!", assustei-me com aquela voz manhosa em meu ouvido. "Olá... Tudo bom?", tentei ser normal e cordial com a pessoa.

"Como está bela nessa manhã de sol, minha sonhora...!", sorriu novamente a moça alta de longos cabelos loiros.

"Você... É Satomi, certo?", perguntei nervosa e um pouco insegura.

"Que bom que se lembra de mim... Fico imensamente feliz!", ela novamente sorriu e acariciou meu rosto fitando-me profundamente querendo ler minha alma. "Eu reconheço uma alma desesperada quando vejo uma...", disse olhando-me seriamente. "Aconteceu alguma coisa? Pode desabafar...", deu de ombros sentando-se ao meu lado.

"Você gosta de mim?", perguntei sem saber direito por onde começar.

"Por que eu não gostaria? Eu amo você...", disse ainda olhando a paisagem a sua frente. "Quantas vezes tentei te roubar de Sesshoumaru-sama...? Nossa! Inúmeras vezes! Porém, eu sempre perdia... Sempre perco..."

"Hã? Espera... Quer dizer que você é...", eu não tive coragem para terminar aquela frase... Não mesmo!

"Sim. Eu gosto de mulheres. Homens nunca chamaram minha atenção.", ela me encarou com um sorriso travesso nos lábios pintados de carmim. "Mulheres são melhores... Na cama.", completou sem pudor.

"Eh... Bom então...", eu tentei não parecer chocada, apesar de ter percebido antes que ela era... Diferente.

"Mas continua falando sobre seu problema...", ela insistiu.

"Estou cansada de não saber nada!", disse balançando-me e olhando o horizonte. "Cansei de ser a 'senhora esquecida.'"

"Você está doente. Só isso."

"Eu quero ter uma vida normal como todos... Eu quero me lembrar do momento em que me apaixonei por Sesshoumaru, quero me lembrar das aventuras que vivi ao lado dele...", funguei um pouco mordendo os lábios numa tentativa em vão de não derramar lágrimas. "Eu quero ser normal."

"Você vai ser normal! Milagres acontecem quando a gente menos espera..."

"Não posso esperar mais, ta chato! E cada dia que passa parece que Lorde Sesshoumaru está desistindo de lutar por mim!"

"Ele nunca irá desistir, Mi Lady. Ele seria um tolo e ignorante se desistisse de você.", ela o defendeu.

"Ontem à noite eu tive pequenas recordações enquanto dormia e num ato desesperado eu corri para ele. Eu queria contar sobre minhas lembranças e pedir a opinião dele, mas eu estava cansada e acabei dormindo...", suspirei limpando as lágrimas de meus olhos.

"Deixa eu adivinhar, hoje ele amanheceu estranho. Sério, frio e distante...", ela disse tudo e apenas balancei a cabeça confirmando. "Lady Rin, essa é a verdadeira personalidade de Sesshoumaru-sama. Acredite, ele tem bons motivos para ficar de péssimo humor e não é sua culpa."

"Mas... Ele..."

"Nós estamos em guerra...", Satomi me interrompeu.

Eu simplesmente congelei quando ouvi aquilo. Não que eu entendesse sobre guerras, mas já tinha ouvido falar que as Terras do Oeste estava em momentos difíceis e todos precisavam entrar em combate. Todavia, isso não dava o direito a Sesshoumaru de me tratar com indiferença, mas por algum motivo divino eu teria que entender e até conseguia cogitar a ideia de pensar naquele absurdo com outros olhos.

"Eu não sabia..."

"Despeça-se de Sesshoumaru-sama. Hoje é o último dia dele aqui nesse castelo. Acredite Rin-sama, ele fez de tudo para ficar ao seu lado... Só que agora ele tem que enfrentar o campo de batalha...", disse Satomi levantando-se. "Na ausência dele eu vou te pedir um pequeno favor, leia o livro que ele escreveu pra você..."

"Como eu vou ler um livro que não tenho posse?"

"Isso é o de menos!", Satomi tirou de dentro de seu quimono um livro chamativo de capa vermelha que Sesshoumaru lia sempre que podia para mim.

"Você roubou?", perguntei pegando o livro e o olhando fixamente.

"Não!", disse ela sorrindo. "Veja isso como um empréstimo.", então ela começou a andar. "Devolva-me quando acabar de ler, na verdade, devolva-me quando nós voltarmos vitoriosos da guerra!"

Eu sorri e apertei o livro ao meu corpo esperando que aquele pequeno objeto me ajudasse.

Durante o dia eu segui a rixa os tratamentos em que Kagome sempre me metia. Almocei e depois fui para o meu quarto ler aquele magnífico livro. Reli a história quase que toda, uma emocionante aventura escrita por letras perfeitas do senhor daquele castelo até que chegou uma parte em que chamou minha atenção.

Foi a cena que apareceu em meus sonhos, o episódio em que eu caí da ponte quando fui atacada por um homem. E bem ali na minha frente estava o desfecho da história. Eu havia parado numa vila onde tinha várias crianças e o mesmo cara. Só que ele parecia ser bom, mas no fundo não passava de uma pessoa má... E percebi que eu havia sido capturada e estava sendo levada para o alto daquele monte, aparentemente uma armadilha. Mas no fim, tudo deu certo! O curandeiro maluco morreu graças a uma sacerdotisa estranha e Sesshoumaru-sama salvou-se mais uma vez. – sorri contente por descobrir o final.

Fechei o livro. (...)

Quando percebi já estava quase anoitecendo, tratei de me arrumar para o jantar e vesti o mais bonito quimono que eu tinha. Fui até o balanço da árvore de cerejeira e fiquei lá esperando ser encontrada pelo meu herói de longas madeixas prateadas. O que não demorou muito.

Fitei-o e sorri feliz.

"Eu vim me despedir.", eu falei levantando-me.

"Eu também...", num gesto rápido e quase impensável ele me puxou e me abraçou forte.

Eu não pude evitar a felicidade que tinha dentro do meu coração. Estava tudo perfeito. Até os vagalumes cooperavam para que aquele cenário ficasse impecável para uma cena romântica. – não pude evitar, chorei de emoção.

"Você vai voltar não é?", disse num sussurro ao pé de seu ouvido.

"Nunca perdi uma batalha...", ele falou convicto. "Não trarei esse desgosto a você.", completou arrancando-me de seus braços fortes e acariciando meu rosto. "Quando eu voltar, você vai está curada..."

"Eu também acredito em milagres, Sesshoumaru-sama.", e novamente, deixei que meus impulsos fossem a frente de minha razão e beijei-o.

E ele? Correspondeu...

Eu não estava mais triste e magoada por ele ter me tratado com indiferença mais cedo. Eu estava errada de novo, meu dia tinha sido perfeito sim... Por mais que ele, meu; Lorde, tivesse que partir, porém eu sabia que ele voltaria. – segurei suas mãos e cessei o beijo voltando a fitá-lo intensamente – Agora eu sabia e me recordava muito bem o porquê deu amar tanto aqueles olhos dourados...

"Tenho que partir Rin..."

"Tudo bem...", respondi soltando suas mãos.

Ele se afastou de forma angelical e começou a correr entre as folhas caídas do jardim para no final saltar e se transformar em um grande Cão Branco. Voando entre as poucas nuvens que existiam no céu sempre guiado pelas estrelas e sendo refletido através de uma penumbra sob a luz da lua. Era uma visão perfeita e eu sentia que ele voltaria.

Ele voltaria sim, não por ele, mas por mim também...

"Ele já foi?", perguntou Kagome chegando ao meu lado.

"Já... Já foi."

"Pelo visto você não contou a ele, não é mesmo?", ela sorriu de forma sapeca já prevendo meus pensamentos.

"Eu quero que ele acredite em milagres, assim como eu, assim como a nova vida que está sendo gerada dentro de mim..."

"Realmente você não contou nada?"

"Nem das lembranças, nem da gravidez...", respondi.

"Tudo bem, eu entendo o seu segredo, mas não vamos parar com os tratamentos ta?", Kagome-sama falou mais séria pegando em meu ombro.

"Não, não vamos, até porque eu ainda não me recordo de tudo... Só do momento em que eu o conheci, na floresta..."

"Veja pelo lado bom, isso já é um ótimo começo!"

"Sim Kagome-sama, já é um ótimo começo", falei sorrindo e voltando a andar com Kagome para podermos dormir tranquilamente.

Eu sabia, sabia sim... Milagres realmente existem... Eu me lembro... Agora sim eu me lembro...