Pull The Trigger escrita por Helena


Capítulo 1
Capítulo 1


Notas iniciais do capítulo

Escrevi quando passava por uma pseudo-depressão. A Amélia é fruto da minha imaginação fértil e a história é 100% minha. Não faço apologia a nada. Os avisos estão ai. Por favor não cometam nenhuma bobagem consigo mesmos. É isso, boa leitura (:



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Perfeita.

Era a palavra que martelava em sua cabeça. Perfeita. Perfeição. Perfeitinha.

“Não!” sua mente gritou.

Amélia era tudo, menos perfeita. Sempre comportada, com ótimas notas na escola, dedicada às aulas de piano. Carinhosa com todos, Amélia nunca fora malcriada ou respondona. Bonita, inteligente, engraçada e talentosa. Como não colocá-la no patamar de perfeita?

“Olha só, tão boazinha” diziam as vizinhas.

“Ainda estudando filha? Quanta dedicação” seu pai dizia constantemente.

“Como você está linda Amélia. Per-fei-ta!” sua mãe exclamava sorrindo.

“Não!” gritou para si.

Estava sentada no chão de seu banheiro naquele sábado à noite. Não fora para nenhuma festa. Não estava no clima. Na verdade há meses não estava nesse clima.

Amélia estava cansada de ser perfeita. Ela própria nunca se achara digna de ter esse título. Por trás dos sorrisos carinhosos ela pedia socorro. Por trás das piadas, ela escondia sua tristeza.

Chorava entre as quatro paredes. Chorava sozinha. Chorava escondida. Hábito comum e frequente. Dizem que ninguém pode se esconder de si mesmo. E somente Amélia conhecia a verdadeira Amélia.

“Fraca, chorona, gorda, infeliz, fodida mentalmente, feia, louca, inconsequente, drogada” ela se caracterizava com um sorriso débil nos lábios.

Os inúmeros cortes no corpo sempre ficaram escondidos por debaixo de roupas bonitas. Barriga, braços, pernas e onde mais fosse possível enfiar uma lâmina. Há meses ela não ligava mais. Não tinha mais medo de se cortar, não tinha mais medo de se drogar. Pelo contrário, comprava remédios variados na farmácia e tomava-os sem pensar. Rezava para sofrer alguma overdose e ir parar em um hospital.

"Ser vista."

Era o maior desejo dela. Era pedia para algum deus que ela fosse realmente vista. Que seus pais vissem o quanto ela odiava piano, que eles vissem as cicatrizes em seu corpo, que eles vissem as bulas de remédios, que eles vissem o quanto ela precisava de ajuda. Que eles vissem que ela não era perfeita.

Outro corte em seu braço enquanto chorava mais um pouco.

Os analgésicos haviam deixado de fazer efeito e agora ela sentia dor. Os cortes recentes ardiam como o diabo, mas Amélia sorria. Gostava da dor. Fazia-a sentir viva. Vista por alguém, mesmo que esse alguém fosse ela mesma.

Mas estava cansada. Cansada de chorar e ninguém ouvir, se cortar e ninguém ver. Cansada de sorrir para não chorar, morder os lábios para não gritar. Cansada de se fingir de feliz. Cansada de ver os outros felizes. Cansada de não poder mostrar a louca que ela era. Cansada de ser perfeita.

Então nesse sábado ela tomou sua decisão. Iria acabar com tudo. Acabar com as lágrimas, com os cortes, com as drogas, com a falsa felicidade, com os falsos sorrisos, com as malditas aulas de pianos, com a maldita perfeição.

“Acabar com tudo” ela repetia baixinho de olhos fechados segurando firme a arma que seu pai pensava ter escondido bem.

O cano frio encostando no alto de sua cabeça gerou um calafrio que percorreu suas costas. Sorriu raivosa, com o rosto molhados pelas lágrimas salgadas.

“Agora!” seus dedos envolveram o gatilho.

Ela já tinha imaginado essa cena infinitas vezes em sua cabeça. Estava tudo lá, o banheiro, a arma, a depressão, a vontade... Então porque ela não conseguia apertar a merda do gatilho?!

Lembrou de seu pai e de como ele sempre fora o maior herói que ela conhecera.

Lembrou de sua mãe e de como o colo dela sempre fora tão aconchegante.

Lembrou de seus irmãos e de como eles sempre estiveram lá, ao seu lado.

Lembrou de seus amigos e de como eles divertiam-na e a faziam se sentir jovem e indestrutível.

Lembrou de sua avó com seu sorriso doce e os melhores bolos do mundo.

Lembrou porque não conseguia apertar o gatilho.

Ela simplesmente não conseguia ser tão egoísta a ponto de machucar a todos eles. Ela pensava no quão doloroso seria para seus pais enterrar a sua filha que aparentemente era tão perfeita e não tinha motivos para se suicidar. Ela mesma não suportaria se um dos seus irmãos cometesse tal atrocidade. Ela não podia acabar com si sem acabar com toda a sua família. Ela deixou a arma cair, junto com as lágrimas. Chorou por medo. Medo de chegar tão perto da morte. E chorou por arrependimento.

“Desculpem-me por não ser perfeita. Desculpe por vir com um defeito. Desculpe por dar falsos sorrisos. Desculpe por ser tão fraca. Desculpe por desejar morrer. Desculpe por ser tão egoísta. Hoje não é o meu dia e essa não é a minha hora.”

E mesmo com todo o arrependimento, Amélia não pode deixar de se perguntar quando seria o dia em que nem sua família, ou seus amigos seriam o suficiente, para segurá-la nesse mundo. Quando nada fosse bom o bastante e ela realmente tomasse coragem para puxar o gatilho.

“Quando?”


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Notas finais do capítulo

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