Amor Inexistente. escrita por Sazy M


Capítulo 1
Capítulo único.




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- Você gosta mesmo de ficar aqui? –Perguntei mordendo minha maçã. Era hora do intervalo e eu estava em cima no terraço. Era ali que ela gostava de ficar e pintar. Como eu sempre a acompanhava isso também me agradava. Ali o vento era puro, gelado e trazia paz.

- Você sabe... É mais tranquilo que lá em baixo. E você sabe, eu não “existo”. –Disse ela fazendo aspas no ar. Sua voz quase não se ouvia. Era de uma suavidade encantadora, e parecia que mesmo se ela fizesse força, não seria possível sair um tom mais alto do que aquele.

Era confuso aquele sentimento. Misaki Mei era uma garota totalmente diferente das outras. Seus cabelos negros caídos sobre os olhos era algo lindo de se ver. Seu jeito de ser me impressionava. Há um tempo achei que esse sentimento fosse algo que todos temos por alguém que gostamos, por amigos ou parentes. Mas quando me dei conta que reparava nos olhares que ela lançava para alguém ou para alguma coisa, no tom da sua voz e até mesmo no movimento feito pelos cabelos sendo balançados pelo vento, pude perceber que estava apaixonado. Estranho para mim, aliás Mei, era alguém que “não existia” para o resto do mundo.

Nós iríamos sair mais sedo, a sensei havia dito que como já tínhamos feito os testes, poderíamos voltar para casa depois do recreio. Depois que havia tomado meu iogurte e comido minha maçã eu desci e arrumei minhas coisas dentro de minha bolsa. Eu iria com a Mei, mas percebi que ela já havia saído sem mim.

Eu sabia bem aonde ela ia. Nós dois costumávamos frequentar aquela loja de bonecas. Ela as adorava. Eram tão profundas as expressões guardadas naquelas bonecas, que ela quase falavam. Mei as amava, e dizia que ali ela encontrava um refugio. Claro que, se ela estava feliz eu também estaria, e mesmo se fosse algum sentimento que fosse somente “amizade” eu gostaria de ficar ali do mesmo jeito. Aquele lugar era calmo e podíamos pensar sem ter que aguentar qualquer critica.

- Ei, você esqueceu seu livro. –Disse eu apontando para ela. Ela estava entrando na loja quando me viu.

- Obrigada por trazê-lo. Você veio aqui para ficar também? –Ela perguntou olhando para mim.

- Sim... Eu gosto desse lugar, é tranquilo e gosto da sua companhia. –Disse eu corando.

- Fico feliz por isso! –Ela abriu um sorriso. Aquele era a primeira vez que eu via aquele lindo sorriso. Era tão bom vê-la sorrindo, era como se aquilo me gratificasse por séculos.

Quando entramos, a velha olhou fixamente para nós. Eu realmente não me surpreendi, aliás, já estava acostumado a olhares como esse. Eu não era uma pessoa digamos “afeiçoada”, as pessoas costumavam me olhar assim, por causa da Mei, mas eu não ligava.

Ela foi em direção a mesma boneca de sempre, ela tirava o cabelo dos olhos da boneca que, insistiam em voltar para o lugar como sinal de rebeldia.

- Você gosta de estar aqui? –Perguntou ela enquanto acariciava a cabeça da boneca.

- Sim... E gosto de estar com você! –Corei. Aquelas palavras me fizeram sentir uma ternura vinda do meu interior e uma vontade de abraçá-la, mas não o fiz.

- Fico feliz eu saber disso! –Ela abriu outro sorriso, e agora eu sabia que a causa dele era eu.

- Sakakibara-kun, tem um lugar que... Gostaria de visitar com você. É um bosque e, como esse lugar, ele é quieto, podemos pensar “juntos”. –Que colocação não? Mas, mesmo assim, me senti lisonjeado em ter sido convidado para sair.

- Ficaria feliz em ir com você. –Eu estava sendo ousado não?

- Bem então vamos. –Ela colocou a boneca em seu devido lugar, pegou sua bolsa e o livro que eu havia entregado e por fim levantou indicando que já estava pronta e eu a segui.

- Vocês devem ter cuidado, o morto desperta e irá vir atrás de vocês! –A velha disse. Coisa que ela não costumava falar. Mei não acreditava em nada que não pudesse ver então simplesmente bufou. Eu também não costumava em acreditar em muita coisa, mas, a palavra “morto” me fez lembrar da calamidade e que estava em um período próximo de seu inicio.

Nós estávamos caminhando, o caminho era um pouco escuro, mas, ainda assim podíamos enxergar bem. Mei tinha algumas coisas em sua bolsa como bolinhos de arroz, alguns sushis e até mesmo suco. Enquanto conversávamos comiamos algumas guloseimas e riamos. Sim, Mei costumava rir de minhas piadas, talvez a única pessoa que ela confiava para mostrar o sorriso fosse eu.

- Bem, chegamos. –Ela disse. Era um lugar muito bonito. Uma beleza sombria para ser exato. Uma mesa de pedra estava bem a nossa frente, e ao redor árvores secas e algumas com poucas folhas na copa enfeitavam o lugar. Entre as árvores um caminho levava até uma espécie de lago ou qualquer outra coisa, a água parecia turva e bem suja.

- E então, o que vamos fazer em um lugar belo como esse? –Sim, para mim ele era belo, eu realmente achava aquele lugar perfeito. O ar era menos carregado de mentiras, poluição de carros e falsidade.

- Podemos olhar, podemos cantar dançar... Podemos fazer o que quisermos. –Disse ela entusiasmada. E foi o que fizemos, colocamos nossas bolsas na mesa e fomos explorar o lugar, cantamos, dançamos, gritamos e até mesmo confessamos um pro outro.

- Mei, sabe... Há um tempo eu tenho percebido que eu me afeiçoei a você. Que eu realmente não me sinto bem se não conversar com você...

- E até que enfim você resolveu assumir isso. –Ela disse tirando a folha do galho. Acho que eu não sou muito bom em disfarçar não é?

- Por favor, diga algo a não ser isso... –Eu pedi. Estava olhando para baixo e estava corado, torcendo pela resposta, quando ela veio em minha direção e me deu um beijo de leve.

- Eu também sinto isso... Acho quase que óbvio, aliás, você é a única pessoa que não me ignora! –Ela disse olhando para mim. Ela também estava corada e isso me fez sentir menos “baka”.

- E então... Sobre o que a velha disse hoje... O que pensa? –Perguntei fitando as pétalas de flores que vinham com o vento. De onde será que elas vinham? Não tinha flores ao alcance de minha vista.

- Não sei ao certo... –Ela desviou o olhar para o laguinho- Vamos ver o que tem? –Ela não esperou que eu respondesse, simplesmente largou a bolsa no chão (que havia decidido não deixar na mesa de pedra) e correu em direção ao lago.

- Mei, espere... –Eu disse. Quando cheguei ao laguinho ela olhava fixamente para cima, onde havia uma espécie de penhasco ao algo do tipo. Um homem parecia infeliz, estava ali em cima, e iria se jogar. Quando reparei, percebi que era o zelador de nossa escola. Ele sempre limpava a sala e todas as vezes que eu chegava lá estava ele, assobiando, aparentemente feliz.

- Oh, não faça isso... Não importa o que tenha acontecido não se jogue! –Disse eu colocando a mão na boca para que minha voz saísse mais alta.

- Não vai adiantar... Quero morrer, mereço morrer! –Antes que eu dissesse alguma coisa ele se jogou. Ele bateu a cabeça em um galho que saía de dentro do laguinho e ficou ali se debatendo até morrer. Sangue foi espirrado a metros de distancia e a água foi manchada pelo liquido rubro.

- Mei, precisamos comunicar alguém... Vamos. –Quando eu a puxei uma luz invadiu nossos olhos. Era um raio que havia acabado de cair dentro do lago.

- Sakakibara, eu vejo... Meu olho vê! –Ela destampou o olho vermelho que via “coisas”.

- E o que você vê? –Perguntei me soltando dela e olhando fixamente o lago.

- Vejo a cor... A cor da morte! –Quando lancei um olhar em direção ao lugar onde o zelador havia morrido percebi que ele não estava mais lá. Onde ele foi? Alguém o tirou dali? Quem? Como? Para onde o levou?

- Mei, o que está acontecendo?

- É o que a velha disse o morto... A calamidade começa hoje. –Ela disse. Quando olhei novamente para o laguinho vi o zelador surgindo de dentro d’água banhado em sangue e musgo.

- Mei, precisamos sair daqui e já! –Eu olhei para ela.

- Não, precisamos matá-lo. –Ela voltou para onde a bolsa dela estava. Quando ela voltou, estava com uma faca em mãos pronta para matar o morto.

- O que vai fazer? –Perguntei com os olhos arregalados.

- O mantenha distraído. Enquanto eu for por trás e o apunha-lo ok? –Ela propôs. Eu não confiava em mim mesmo, não sabia o que poderia fazer, mas, iria tentar então, eu balancei a cabeça e lá foi ela.

- Ei, o que você é? –Disse eu. Não sabia fazer aquilo e isso só provava que eu era um idiota.

- Mate o morto... Mate... –Ele disse. Estava compulsivo e só queria matar... Que pena ele era o morto da história.

Ele estava caminhando em minha direção. Eu não tinha armas, nem mesmo para onde correr. Estava nervoso não podia mal falar. Era complicado servir de distração. Eu cai no chão e estava engatinhando. Onde Mei estava afinal?

- Mate o morto! –Disse ele de novo. Ele ainda estava com o calho espetado no pescoço. Quando eu achei que ele iria buscar alguma arma ou qualquer outra coisa, ele tirou o galho do pescoço espirrando sangue em mim.

- Sim, mate o morto! –Ouvi uma voz familiar dizendo. Só pude ver a faca saindo da barriga dele e espirrando ainda mais sangue em mim.

- Mei, conseguimos parar a calamidade antes mesmo de ela começar. –Disse limpando um pouco do sangue de meu rosto.

- Sim, estou nervosa. –Disse ela me ajudando a levantar.

- Eu também, mas, estou com você! –Disse eu dessa vez puxando-a pela cintura e tascando um beijo. Pela primeira vez eu senti o calor de Mei em meu corpo, o gosto de sua boca e a sensação que ela exalava. Era bom, eu podia parar, mas, não era o que eu queria e, tão pouco ela.

Depois daquele beijo tão terno e revelador nós voltamos para casa. Somente nós sabíamos o que havia acontecido e não iríamos contar a ninguém.  Era complexo aquilo e explicar como havíamos conseguido parar a calamidade.  Mas, ninguém iria ligar, agora que eu estava junto a Mei, eu havia deixado de existir também. Para mim uma escolha nada difícil de tomar. Eu estaria com quem eu mais amava e, sem os comentários banais de ninguém. Afinal, duas pessoas que não existem podem se amar livrimente.


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Notas finais do capítulo

É isso ai, espero que tenham gostado! Beijos



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