Feedback Song For a Dying Friend escrita por Morgana Black


Capítulo 1
Capítulo 1




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 Feedback Song For A Dying Friend


“O quadro de aflições que me consomem/ O próprio Pedro Américo não pinta...
Para pintá-lo, era preciso a tinta/ Feita de todos os tormentos do homem!”



Estar às portas da morte é como peregrinar em um túnel completamente escuro, onde o caminho é totalmente desconhecido e estranho. E também solitário. Muito solitário. Mas ele era uma criatura solitária, não era? Não era filho do negror e da escuridão? Ele deveria se acostumar com aquilo, ele deveria se acostumar com aquele lugar. Ele deveria...

Era frio, muito frio naquele lugar. Um frio tão intenso e sufocante quanto as vozes que sussurravam ao seu redor, quanto as vozes que sussurravam no escuro. Eram sussurros de súplica, gemidos e lamentos de dor e agonia. Ele, no entanto, já se habituara ao frio e à escuridão. E quanto às vozes? Sim, ele também já se acostumara com aquilo. “Estão todas aqui, dentro da minha cabeça”, sussurrava baixinho, enrodilhando-se em seu próprio corpo, como se fosse um animal ferido que se encolhe num canto para lamber as próprias feridas.

Mas daí a dizer que aquilo tudo era suportável era outra coisa. Porque nunca o seria. Nunca mais. Seria eternamente assim, intolerável e perturbador. Eternamente frio como se tudo ao seu redor fosse um enorme vazio e que ali aniquiladas estavam todas as suas esperanças.

O vácuo.

O nada.

O breu.

Momentos suspensos no tempo e no espaço, onde as lembranças bailavam em sua cabeça.

Porque as memórias permaneciam lá, intactas, como se não houvesse modo de dissipá-las ou torná-las toleráveis.

Lembrava-se de cada mínimo detalhe de sua tortuosa existência a ponto de sentir sua carne lacerada pela dor de seus muitos erros, como se estes fossem punhais em fogo a perfurar-lhe o coração.

As lembranças eram quebradas, girando e girando em sua mente. Alquebrado era o seu coração, tão cheio de amargura e ódio e culpa e erro, onde os sentimentos digladiavam-se pela posse de sua alma.


“Como um ladrão sentado numa ponte/ Espera alguém, armado de arcabuz,
Na ânsia incoercível de roubar a luz, / Estou à espera de que o Sol desponte!”



Lembrava-se de uma mulher de olhar frio despejando revolta ao saber que colocara no mundo um filho que estava longe de ser aquilo que ela gostaria e do filho perfeito o olhando com deboche.

-Eu nunca pensei que aquele chapéu esfarrapado fosse fazer isso à nossa família. Mas, talvez não seja culpa dele você ser um traidorzinho do sangue, um amigo da escória!
-Não foi minha culpa não ter ido pra Sonserina. Droga! Eu não queria!



Lembrava-se das mil aventuras e peças pregadas, dos quatro amigos que, em tão pouco tempo tornaram-se a sua verdadeira família...

“Os Srs. Aluado, Rabicho, Almofadinha e Pontas, fornecedores de recursos para bruxos malfeitores, têm a honra de apresentar O MAPA DO MAROTO”


A ansiedade em saber se todos aqueles meses de estudo não haviam sido em vão e que através de uma solução inusitada pudessem trazer conforto a um amigo...

-Animagia, Sirius? Você enlouqueceu?
-O Remus precisa de nós, Peter, e eu acho que essa é a única solução. Você está comigo, James?
-Claro que sim!
-Peter, e você? É pelo Remus e, além disso... pense nas possibilidades de se tornar um animago, no que nós poderemos descobrir assim.
-Ok, eu estou com vocês!



Depois veio a satisfação, o olhar emocionado que ele e os outros receberam.

-Eu nem sei como agradecer. Vocês não têm noção do quanto isso é importante para mim.
-Claro que nós sabemos, Aluado.



A alegria de poder dividir aquele novo segredo que os unira mais e mais.


Os quatro sorriram, sempre unidos, como uma família. Porque só ali ele aprendera, que os amigos eram a família que nos permitiam escolher.
“Juro Solenemente que não Pretendo fazer nada de bom”



Novamente a mulher de olhar frio a ameaçá-lo, mas ele não se importava. Proscrito. Lembrava-se claramente da sensação de liberdade após isso...

-Se você sair por aquela porta, não se considere mais meu filho. Você é uma vergonha ao nome nobre dos Black!
-Eu é que sinto vergonha de fazer parte dessa família que de nobre não tem nada!



O gosto de biscoitos de chocolate recém saídos do forno e olhos verdes lhe sorrindo em expectativa.

-Você é como se fosse um irmão para nós, Sirius. Você faz parte da nossa família!
-Sim, Lilly, nós sempre seremos uma família.



E então a honra de ser chamado para ser o padrinho do bebê que chegaria em breve... o bebê da profecia... o bebê que considerava como um filho...

-Não se preocupe Lilly, eu não vou deixar nada acontecer ao Harry, não vou deixar nada acontecer ao meu afilhado.


Mas depois veio o medo e a insegurança... traição... a dúvida, afinal, não era possível que fosse ser ele, justamente ele que unira os quatro, ele que parecia ser tão grato por ter aquela amizade...

“Não quero acreditar que seja o Remus. Não quero!”


Mais uma vez uma solução inusitada, um blefe. Fidelius. Julgava-se ser tão esperto...

-Não precisa ter medo, Peter. Os comensais virão atrás de mim, então você estará em segurança. Pense que isso é por James, Lilly e o pequeno Harry. Vai dar tudo certo!


Sofreu a dor do engano e do erro, seu grande e estúpido erro; tudo estava perdido... “Eu os matei. Um assassino”. - a vingança... a perda da liberdade e de sua própria sanidade.

-James e Lilly estão mortos... mortos... E é tudo culpa sua, Sirius. Como você pôde se juntar à Você-Sabe-Quem?
O riso ecoou pela rua, reverberando sinistramente como se outras tantas pessoas rissem daquilo que ele acabara de perder. A consciência de seu erro era mais do que ele podia suportar.
“Me perdoe, Lilly”
-Como você pôde, Sirius?
Sorriu quando viu o outro bruxo destruir uma rua inteira e reduzir a pó tantas outras pessoas que estavam ali. Ele não era louco, mas era absurdamente cômico ver o raciocínio rápido do outro. Fugiu como o rato que era, enquanto ele próprio permanecia ali, rindo da desgraça de sua vida. “Um assassino” riu-se outra vez e mais ainda, quando os aurores do Ministério da Magia começaram a cercá-lo. “Um assassino”.
“Me perdoe, James”
Ele aprendera que rir era bom, mas naquele momento ele descobrira que o seu riso era proporcional ao tamanho do seu desespero.



“Bati nas pedras dum tormento rude/ E a minha mágoa de hoje é tão intensa
Que eu penso que a Alegria é uma doença/ E a Tristeza é minha única saúde.”



Durante anos esteve mergulhado no frio e na escuridão. Mergulhado nas memórias. Exatamente como agora. Mas era diferente. Ele não sabia definir como, mas era. Igualmente insuportável, igualmente dolorido, mas era diferente. Total e completamente diferente.

Quantas vezes não lacerou a sua própria carne para sentir que estava vivo? Sentir o sangue aflorar e escorrer por sua pele e tingir de escarlate a realidade fria, cinzenta e lúgubre em que fora confinado. Dentro de sua mente doente a culpa o corroia e a única coisa que lhe restara era o seu desejo doentio de preservar a sua integridade. O seu bem mais precioso havia sido sugado pelas criaturas da escuridão. Todas as boas lembranças, todos os momentos de felicidade foram transformados em dor, em angústia, em desesperança.

“Eu sou inocente. Eu sou inocente. Eu sou inocente.”


Contudo, ele se preservou, cercando de muralhas de ódio a sua sanidade. Preservou o seu ódio para uma fuga desesperada em busca de vingança. Tantas noites em que planejou e maquinou fugir do inferno e ansiou sanar aquele desejo de vingança. Mas talvez fosse tarde, os novos olhos verdes o odiavam e ele precisava vingar a memória de seus amigos perdidos. Vingar a memória de sua vida perdida. A única coisa que lhe restava era o seu ódio.

Tanto ódio e tanta dor...

“Eu sou inocente. Eu sou inocente. Eu sou inocente.”


A revelação da verdade absurda e o reencontro com o amigo de tantos anos que agora acreditava em sua inocência, que não o odiava mais.

-Me perdoe, Remus.
-Tudo bem, Almofadinhas, meu velho amigo. E você me perdoa por acreditar que você fosse o espião?



Finalmente o alívio por ter sido perdoado pelos olhos verdes e âmbar. Porque nos seus delírios, olhos verdes e âmbar sempre o acusavam, sempre o interrogavam, sempre o perseguiam; e ele faria de tudo para alcançar o perdão deles.

-Acredite-me, Harry. Nunca traí James e Lilly. Teria preferido morrer a traí-los.


E novamente a fuga, o exílio e o retorno ao maldito covil, carregando o sentimento de inutilidade.

-Eu não gosto de estar aqui, eu nunca pensei que pudesse ficar preso nessa casa outra vez.

“Proscrito”, sua mente gritava. “Proscrito”, sua alma sangrava. “Proscrito”, sua sanidade se perdia.


“Ele não era como o pai”. Nem ele compreendia o quanto odiava estar preso no inferno, naquele lugar tão impregnado de lembranças e memórias e pecados e ruídos...

-Você é menos parecido com seu pai do que imaginei. O risco teria sido o que faria ser divertido para James.


Ah, e veio uma nova armadilha! O ministério, a batalha; o afilhado precisava dele, mais do que nunca...

-Sirius, você não pode sair daqui. Dumbledore disse...
-Eu quero que se dane o que Dumbledore disse, Remus! O Harry está em perigo, possivelmente nas mãos de Voldemort e eu não vou deixar nada acontecer com ele outra vez. Eu não vou ficar enfiado nesse inferno outra vez!
-Por favor, Sirius, seja razoável...
-Remus, eu estou sendo razoável. No meu lugar você agiria diferente? Claro que não. E o Harry só foi atraído para fora de Hogwarts por minha causa. Eu não vou decepcionar James e Lilly outra vez. Não vou.



Havia as duas mulheres duelando: a de olhos cor de gelo, que mais parecia um cadáver em vida e a outra, toda cores e vida como uma manhã de primavera... as cores sendo subjugadas pela mulher de olhos cor de gelo... A beleza fora transformada em insanidade, a loucura brilhava nos olhos tão frios quanto a voz que proferia as mais letais maldições e tudo o que restara na Guerreira da Escuridão era a alienação de suas crenças.

“Crucio. Crucio. Crucio.”


O sangue os tornara inimigos. “Crucio. Crucio. Crucio.”. O riso veio fácil, displicente. Ele ria das investidas dela, do quanto os dois eram parecidos e opostos. “Você é patética, Bella”. Ele queria saber, perguntar se ela lutava contra ele ou pelo seu Mestre.

-Vamos lá! Você pode fazer melhor que isso!


Mas não houve tempo para isso. Ele viu uma luz vermelha vindo em sua direção, os olhos verdes arregalando-se de horror e choque. Decepção, ele sentira por si mesmo. Medo, ele leu nos olhos verdes.

“Me perdoe, Harry!”


Culpado, mais uma vez. E seu coração chorou quando finalmente desabara, quando mergulhara no frio e na escuridão, com as vozes e os sussurros e os lamentos ao fundo.

E as memórias giravam e giravam em sua cabeça, repetindo-se, chocando-se e fundindo-se... eternamente insuportável e dolorido, com os sussurros agoniados ecoando em seus ouvidos.


“Seja esta minha queixa derradeira
Cantada sobre o túmulo de Orfeu/ Seja este, enfim, o último canto meu“



Mas, então, aconteceu algo: alguém o chamava. Eram as vozes, só podia ser isso. E chamou novamente, outra vez e mais outra... Seria finalmente o final derradeiro? Será que, enfim, alguém o chamava para atravessar o portal desejado e lhe permitisse esquecer a dor e as lembranças?

Os cantos de sua boca tremeram por um momento e curvaram-se um nada para cima, no que poderia ser chamado de sorrir. Um sorriso de alívio ou seria apenas a insanidade que lhe causasse isso?

“Eu não estou louco”

Contudo, a voz que o chamara era diferente de todos aqueles sussurros desesperados. O tom era firme, com um quê de ansiedade crescente.

Ainda era frio e escuro naquele lugar. Mas, ainda assim, ele sorrira e uma lágrima estranha e única brotou de seus olhos.

“James?”

Dedos firmes fecharam-se ao redor de seu pulso. Mas, ao contrário do que ele esperava, não eram dedos frios e nem sentira o hálito putrefeito do desespero; era um toque cheio de calor, um pouco úmido por causa do suor de nervosismo, mas, definitivamente, era um toque cheio de vida.

Ao menos era isso o que lhe parecia.

A “voz” disse para ele ficar calmo, que tudo iria dar certo, que ele iria sai dali. Ele aquiesceu, sem saber para onde e para quem. Iria ficar tudo bem, iria mesmo...

E ele teve a estranha sensação de estar emergindo das profundezas gélidas e sombrias de um pesadelo, quando foi guiado por aquela mão firme para algum lugar misterioso.

Depois veio a atordoação, o medo, o espanto; a vontade desesperada de se agarrar àquele braço firme que o libertaria da escuridão e faria os sussurros se calarem.

“Você está seguro, vai ficar tudo bem”, a “voz” firme lhe segredou baixinho, quando um lapso de consciência o envolvera.

“Lilly?”

Os músculos de seu rosto se contraíram e seus lábios curvaram-se num leve sorriso, quando percebera, em meio à penumbra, olhos verdes faiscarem. Tudo bem, ele não se importava. Qualquer lugar era melhor do que estar ali. Porque era solitário e era perturbador. E ele não gostava de relembrar tudo aquilo.

Aquilo machucava.

E então, um sentimento forte de que as coisas realmente estavam dando certo lhe envolveu. Novamente mergulhou no escuro, mas desta vez era diferente. Era uma escuridão agradável e aveludada, que lhe dava uma sensação de segurança, porque antes de se entregar completamente àquele negror tranqüilizante, ele vira, lá adiante, uma luz no fim do túnel.

“Nós te perdoamos, Sirius. Sempre.”


“As minhas roupas, quero até rompê-las! / Quero, arrancado das prisões carnais,
Viver na luz dos astros imortais, / Abraçado com todas as estrelas!”



Porque metade de teu ser é a loucura da escuridão, mas a outra metade brilha como faíscas de estrelas.


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Notas finais do capítulo

1- Os trechos em negrito são do poema “Queixas Noturnas” de Augusto dos Anjos. Os versos não estão ordenados como no texto original, para fizesse um pouco mais de sentido dentro do texto.
2- A intenção era deixar o texto realmente “desordenado”, tentando seguir o fluxo de pensamentos/lembranças do Sirius, entremeados com trechos dos livros “Harry Potter e o Prisioneiro de Azkaban” e “Harry Potter e a Ordem da Fênix”.
3-Comentários me fazem feliz =)



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