“Esconda suas asas! Não se misture demais! Não se apaixone!”
Há 10 anos eu havia sido transformada. Há 10 anos eu escutava essas regras e há 10 anos eu as seguia rigorosamente...
Com uma exceção!
–X-X-X-X-X-X-X-X-
Era dezembro, eu acho, não tenho muita certeza. Só sei que nevava e eu e meu criador nos mudamos para Nova York há poucos meses. Fica complicado esconder que você não envelhece depois de 10 anos.
Sou ruiva, sou mulher e sou um anjo massacrante. Os poucos da nossa espécie que conheciam a minha história chamavam-me de Nemesis*. Meu criador me chamava de Kleine Blume, pequena flor em alemão, minha língua natal. Mas apara os mortais eu era Engel. E foi como Engel que eu o conheci.
Alto, loiro e olhos escuros. Seu nome era Nick (um nome aparentemente comum naquela cidade); ele tinha 28 anos e nos encontramos pela primeira vez em uma lanchonete. Um acidente envolvendo um copo de café e uma blusa manchada.
Logo estávamos nos encontrando todos os dias; em pouco tempo eu deixava seus braços me embalarem, seus lábios acariciarem os meus e me esquecia de todos os traumas e regras.
Tudo era perfeito e a cada dia eu me via mais e mais apegada a ele. Até que as coisas começaram a mudar. Não havia tantos carinhos; os sorrisos eram escassos e o sexo inexistente.
Eu já vi esse filme antes.
–X-X-X-X-X-X-X-X-X-
–Kleine Blume o que houve? Teu brinquedo mortal não mais te satisfaz?
–Erschaffer*, eu tenho uma confissão. – sussurrei-lhe completamente envergonhada.
–Você se apaixonou e ele a traiu...
–Como você sabe?!
–Ora, pequena flor! Eu a transformei... Sei tudo sobre você. Tudo! E eu sei também que você já resolveu o assunto de forma... Excepcional!
A mão que acariciava minha nuca de repente tornou-se bruta e mais uma lição me foi ensinada.
–Lembre-se: amar é um erro! Deixa-te bobo, sensível e patético. Ame e morra; não ame e viverás eternamente!
–X-X-X-X-X-X-X-X-
Duas horas antes.
–QUE DIABOS VOCÊ PENSA QUE ESTÁ FAZENDO?!
Cena clássica. Nick na cama com outra.
–O que?! Você achou mesmo que eu fosse me satisfazer apenas com você? Pelo amor! Olhe-se no espelho, sim?! De preferencia um bem longe da minha casa porque eu não quero ter que olhar para as suas lagrimas!
A vagabunda seminua ria e se esfregava naquele que um dia me jurara amor eterno. A raiva começava a me inundar.
Sem conseguir me controlar minhas asas se abriram. Grandes, negras e apavorantes. A piranha gritou aterrorizada. Previsível.
–Que droga é você?!
Ele também estava apavorado. Eu estava começando a me divertir.
–Ah Nick! Porque você teve que ser um garoto mau, hein? Mas não se preocupe, eu vou ensinar você a se comportar direitinho!
Sangue, lágrimas gritos sufocados. Dor, medo, suplicas para deixá-los viver. Aquilo era um balsamo para mim. Eu me sentia poderosa, invencível! Era o melhor espetáculo; a melhor diversão.
E mais uma vez a cena da minha vingança era consumida pelas chamas. Sem pistas. Sem desconfianças. Um simples e trágico acidente.
Ah! Os humanos e sua recém-descoberta inocência. Era o melhor quadro-vivo que eu já havia visto... E eu queria explorá-lo mais!!