Eu não sabia dizer, quem na verdade estava mais surpreso com aquilo. Se era eu, ou Dimitri. Seus olhos passaram por mim, mas pousaram furiosamente em Vicky. Me senti ainda mais desconfortável.

-Não é mesmo Dimka? – Ela arriscou, mordendo seus lábios. –Você ficou de bancar o aniversário da sua afilhada, filha da Sônia.

-Sônia? – Perguntei sem sequer me conter. Eu estava ficando muito boa nisso. Automaticamente me repreendi pela curiosidade.

-Minha irmã mais velha – Dimitri respondeu sem me ver. Seus olhos estavam em Vicky, como se temesse algo que ela pudesse fazer ou até mesmo falar. Ele não parecia nem um pouco feliz, enquanto ela parecia estranhamente aliviada.

-Ah claro – Comentei me mexendo um pouco. – Acho melhor eu ir. – Disse depois de uma longa pausa. Tentei me levantar, mas Vicky me puxou para sentar novamente na cadeira, em um gesto inusitado.

-Eu sei que está trabalhando, mas que horas sai? – Ela me perguntou em tom infantil, que me fez questionar qual era sua verdadeira idade. Claramente ela era mais nova que Dimitri, mas sua idade ao certo, ainda era uma incógnita.

-As sete – Respondi confusa tanto pela pergunta, quanto pelo gesto.

-Perfeito. Dimitri tem tickets para o Fantasma da Opera as vinte e duas horas, mas estava contando a ele, que infelizmente não vou poder acompanha-lo. Você sabe como são tias corujas não é? Tenho uma festa para preparar para o próximo final de semana. – Ela piscou com intimidade para mim, me deixando ainda mais confusa. – Se puder me fazer o favor de acompanha-lo, eu prometo não reclamar.

Lancei instintivamente um olhar para Dimitri, que agora estava tão nervoso quanto eu. Sua pele estava bastante corada e ele tinha o aspecto similar a de um avestruz, procurando um buraco para enfiar sua cabeça. Minha cabeça girava com tanta força, que precisei firmar minhas mãos na borda da mesa.

-Eu... bom... – Não consegui pensar em uma resposta coerente. Por que diabos ela não chamava a esposa dele? Por que ele não está com ela. Uma parte bem mesquinha da minha mente repetia a mim mesma, mesmo que eu soubesse que aquilo não era verdade. Pelo tempo que eu não o via, provavelmente ele deveria estar casado já a um par de meses e pior, poderia ter uma criança envolvida.

-Não se sinta obrigada Rose – Dimitri cortou minha linha de pensamentos suicida, me fazendo abrir um pouco meus olhos, enquanto encarava aqueles profundos olhos castanhos. – Vicky esquece que as vezes que precisamos perguntar antes as pessoas, se elas têm interesse – Ele deu ênfase na última palavra, me fazendo engolir seco. Vicky o ignorou completamente, percebi. Cansando de ficar entre eles, resolvi falar.

-Eu tenho um jantar com uma amiga na minha casa – Comecei a falar, tentando me desviar daquilo, mas Vicky voltou a me interromper.

-Ótimo! Dimitri adoraria se enturmar. – Ela então selou suas mãos em concordância. – Pode levar sua amiga também.

-Eu.... – Me voltei a ele em busca de um suporte, mas Dimitri que tinha os olhos fechados agora. Eu não sabia dizer se era de nervoso por ela estar falando como uma tagarela, ou se era por estar se sentindo constrangido na minha frente. Talvez ambos. – Esta bem – Soltei as palavras tão inesperadamente, que Dimitri abriu seus olhos para me encarar, surpreso. – De qualquer forma, estávamos pensando em algo mesmo para depois do jantar. – Arrisquei um sorriso, pensando comigo mesma, como que diabos eu havia chegado nessa conclusão. Eu estava maluca em aceitar essa coisa toda.

-Perfeito. Vocês podem conversar também, de como será sua participação do aniversário da Sara. – Minha cabeça dava voltas e mais voltas, conforme Vicky despejava as palavras sem piedade. Toquei meu pescoço, como se algo estivesse entalado de verdade ali.

-Creio que já encerramos por aqui Vicky – Dimitri então se levantou e esperou impaciente que sua irmã fizesse o mesmo. Vicky se levantou respirando pesadamente.

-Rose esse é o telefone dele – Ela então tirou uma caneta da bolsa e escreveu na minha mão um número. – Assim que sair, pode ligar para ele e passar seu endereço. – Ela voltou a sorrir radiante, me deixando sem graça. Eu não entendia como Vicky podia lidar daquela forma com as coisas. Era estava ignorando completamente o irmão e quaisquer argumentos que ela achava desnecessários, vindos de mim e ele. Era como se no fundo não estivéssemos realmente presentes.

-Pode deixar – Mal terminei de responder, Vicky já estava lá fora, me deixando sozinha com Dimitri.

-Rose não se sinta na obrigação – Ele pediu, se sentindo desconfortável com aquilo. – Vicky apenas é muito impulsiva às vezes. – Dimitri coçou a cabeça desconfortavelmente.

-Às vezes? – Questionei e ele riu, assim como eu. Não era uma risada totalmente aberta de ambos, pois sabíamos bem lá no fundo, que aquilo não era certo de forma alguma. Ele tinha segredos assim como eu. Mal conseguíamos nos encarar diretamente agora. Era um momento constrangedor.

-Ela gostou de você – Dimitri disse depois de uma longa pausa. – Espero não ter causado má impressão.

-Eu também gostei dela – Sorri e dessa vez era de verdade. Sem mais sentimentos nublados por detrás. Era apenas natural.

-Bom então eu vou indo. – Dimitri deu um passo à frente como se quisesse se aproximar, mas logo voltou com ele para trás, de uma forma quase engraçada, de tão esquisito que aquilo pareceu. Não evitei soltar uma risada e ele também o fez. Quando isso aconteceu, meu coração deu um salto no peito.

-Até mais Rose – Ele apenas sorriu, indo em direção a sua irmã, do lado de fora.

=X=

Resolvi deixar a rotisserie um pouco mais cedo e segui para o escritório de Lissa, torcendo para que ela me ajudasse. Para não correr o risco de perder, havia anotado o telefone de Dimitri em um papel e o joguei na bolsa. Lissa estava em sua sala no telefone, quando eu entrei. Seus olhos verdes cruzaram com os meus e como se visse algo neles, ela logo se desfez da outra pessoa na linha.

-O que você aprontou? – Lissa perguntou intrigada, quando me viu. – Você parece que viu um fantasma.

-Na verdade eu acho que aprontaram para mim – Fiz uma careta, me lembrando do rosto sorridente da irmã de Dimitri.

-Estou por fora do assunto ham? – Lissa então se levantou, indo em direção a maquina de café. De lá, puxou dois expressos. Um para mim e um para ela.

-Você não vai acreditar em quem foi a rotisserie hoje – Peguei o copo plástico que ela me ofereceu e sentei em seu sofá.

-Andrew? – Ela sugeriu rindo um pouco. Com isso, percebi que trombar com ele hoje, não havia sido tão aleatório assim. Resolvi ignorar isso.

-Além de Andrew – Disse como se fosse básico aquilo.

-Não sei. – Lissa sentou a minha frente, ajeitando seu cabelo platinado com uma mão. Ela estava muito bem vestida hoje. Seu conjunto de saia e blazer, denunciava que ela estivera visitando clientes importantes hoje.

-Dimitri – Fechei com olhos, me sentindo como se uma adaga estivesse atravessando meu coração naquele momento. Do caminho da rotisserie para o escritório de Lissa, não fiz nada além do que pensar em como o destino estava sendo malditamente irônico comigo.

-O médico? – Abri meus olhos quando notei o tom surpreso de Lissa. Eu estava certa. Seus olhos estavam brilhando como duas joias. Era um mal sinal.

-Ele mesmo – Desviei o olhar, sem saber ao certo como explicar a ela, a ideia maluca da irmã mais nova de Dimitri. Aquilo era quase que insano.

-E então? Saíram? Se beijaram? Estou ansiosa! – Lissa se mexeu como uma criança no sofá. Eu apenas suspirei.

-Não fizemos nada disso que está pensando – Resmunguei, encarando seu vaso de margaridas na mesa de centro.

-Você é doida sabia? – Lissa voltou a se levantar e dessa vez, pegou uma caixa de chocolates. –Pega um aqui. – Ela me ofereceu, mas prontamente eu recusei, enjoada demais para aceitar comer alguma coisa. –Estava reclamando que tinha o perdido e quando tem a chance de se jogar nos braços dele, não o faz.

-Não é assim tão simples. Ele estava noivo lembra? Já deve estar provavelmente casado. Isso não é certo Liz. –Cruzei minhas pernas, depositando meu pulso em meu queixo.

-Ele estava com quem quando apareceu na rotisserie? Sozinho? – Lissa voltou a sentar na minha frente esperando.

-Estava com sua irmã mais nova – Fiz uma careta, me lembrando sobre minha dúvida sobre a verdadeira idade de Vicky.

-E? – Lissa instigou.

-E ela de alguma forma louca, me convidou para ajudar no aniversário de sua sobrinha. – Soltei as palavras de uma vez só, como se aquilo pesasse dentro de mim.

-Uau! – Lissa agora tocou seu peito de forma lisonjeada. – Aceite e será feliz! – Ela bateu palmas uma vez. Quando Lissa notou minha expressão perturbada, ela voltou a falar. – Você aceitou não é? – Ela perguntou de forma duvidosa.

-Na verdade, não tive como recusar – Senti minhas bochechas quentes com a declaração. – A irmã dele me ofereceu para ir no lugar dela, a uma peça de teatro hoje com ele.

-Marcamos outro dia nosso jantar. Combinado. – Ela me interrompeu.

-Na verdade eu avisei que tinha um compromisso marcado para hoje. – Fiz uma careta. – E eu não posso voltar atrás, quando eu o convidei para jantar junto de nós. – Não era bem daquele jeito que as coisas aconteceram, mas eu acreditava ser o suficiente para ela naquele momento.

-Preciso chamar Christian – Lissa se levantou e pegou seu celular da mesa.

-Não! Não é um jantar de casais! – A interrompi antes que ligasse para seu namorado. –Oh merda! – Toquei minha testa com culpa, me lembrando que também havia convidado Andrew-Eu chamei Andrew – Fechei meus olhos com força.

-Que horas está marcado o jantar? – Lissa me observou de forma bastante calma e calculista agora. Provavelmente, ela tinha um plano em sua mente.

-Eu sei lá – Cocei minha cabeça confusa. – Fiquei de ligar para ele.

-Pois bem me escute. – Lissa pegou minhas mãos nas suas. – Não é como se eu não tivesse marcado também, um encontro com dois namorados ao mesmo tempo. – Ela riu e eu cerrei meus olhos. –Você vai ligar para Andrew e avisar que apareceu um compromisso de última hora e não poderá arcar com o jantar.

Ergui uma sobrancelha desconfiada para ela, que pareceu ignorar aquilo.

-E logo em seguida, vai ligar para Dimitri e avisar que o jantar fica pronto às oito.

-Eu não gosto dessa ideia. – Gesticulei com a cabeça.

-Você vai me ouvir! Vai ligar e falar exatamente o que eu disse para os dois me ouviu? – Lissa apertou minhas mãos. Seus olhos brilhavam e eu percebi que não teria escapatória.

-Está bem. Mas você vai me prometer que vai também! – Foi minha vez de apertar suas mãos. –Não pode me deixar sozinha com ele.

Lissa virou os olhos.

-Prometa! – Insisti.

-Está bem! Eu vou! Mas não vou para o teatro com vocês. – Ela disse entediada consigo mesmo, por ter aceitado.

-Fechado! – Sorri em agradecimento, mesmo não sabendo como eu iria conseguir sair dessa.