A Canção De Hohen escrita por MrMartins


Capítulo 10
Cidade Vazia - Parte III


Notas iniciais do capítulo

Oh, quem diria que eu realmente ia conseguir fazer algo por duas semanas seguidas, eh? Bom, eu mantive uma boa periodicidade com Chantel, então não deveria estar tão surpreso.
uh? Vocês estão lendo isso?
eeeeh?
O capítulo está ali embaixo e não aqui!



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De pé entre Hart e o Gew, segurando em sua mão direita uma espada, estava Ellienne.

— O que você está fazendo? — Hart gritou diante da cena. — Você tem que fugir!

— Não há para onde correr — a princesa respondeu. — E não creio que você esteja em condições de lutar.

Do corpo do Gew começou a sair um ruído longo, grosso, profundo, uma tentativa ofensiva de risada. Contorcendo-se devagar, o assassino se abriu num abraço desafiador.

— É isso? — rugiu. — Você não viu o que eu fiz com esse daí? E ainda assim acha que vai conseguir durar mais que um segundo contra mim? Você…

A frase foi interrompida pelo sibilar agudo da espada de Ellienne projetando-se contra o corpo do Gew. Num salto ágil, o assassino recuou.

— Levante a sua guarda e me enfrente — Ellienne falou. — Ou quem sabe você está assustado demais para isso. Não se sinta mal por me temer. Qualquer outro no seu lugar sentiria o mesmo.

No rosto vítreo e vazio do Gew, pareceu surgir o semblante de um sorriso escarnecedor.

— Que seja — sibilou. — Me divirta, princesa.

O Gew avançou veloz, seu corpo esguio rasgando o ar em direção a Ellienne. Suas garras metálicas se projetaram para rasgar a carne, porém não mais que o vazio encontraram. A espada saltou, desceu qual um relâmpago, e explodiu no chão. Sem atraso, novamente subiu, um arco reverso, leve e afiado, parado pelo aço das mãos. Faíscas explodiram quando, sangue jorrou.

Num pulo, o Gew abriu distância de seu atacante. Sua postura predatória impassível, seus olhos ainda brilhando com o rubro voraz, contudo agora em suas mãos havia sangue. Não de sua vítima, mas dele próprio.

— Como… — ele disse olhando para suas mãos feridas. — Que tipo de arma é essa?

Com um balanço leve, Ellienne limpou da lâmina o sangue negro.

— Você sabe como uma família se torna a governante de uma nação, Gew? — Ellienne falou.

— O quê?

— Essa vai ser sua última conversa, achei que fosse querer aprender algo interessante antes de morrer. Uma família se torna a governante dominando todas as outras. Algumas fazem isso com dinheiro, outras com política. A minha? Há quinhentos anos meus antepassados tomaram essas terras com aço, magia e sangue.

Ellienne estendeu a mão para o Gew, revelando na palma um corte do qual escorria um filete do sangue.

— Essa espada foi forjada do meu sangue; o sangue dos conquistadores de Hohen. Não importa que metal seja esse que cobre seu corpo, essa espada irá cortá-lo. Desista agora, vá embora e eu vou fingir que isso jamais aconteceu. Caso contrário, espero que esteja preparado para morrer.

A mesma risada inumana saiu do corpo do Gew, porém agora tingida com notas de insana alegria, enquanto seu corpo se contorcia e se dobrava para frente, projetando garras e cabeça qual um predador.

O que viria a seguir era óbvio.

— Como quiser, princesa.

Uma flecha cinza rasgando o ar. Do momento em que o Gew se atirou para frente até aquele suas garras explodiram contra o metal da espada de Ellienne não passou sequer um instante. Dezenas de metros galgados numa fração de segundo. O primeiro estrondo do encontro do metal com o metal pareceu se estender por intermináveis horas, qual o próprio tempo estivesse sendo ali destroçado. Hart via os músculos se dobrando para gerar força. As írises se expandindo diante do lume das faíscas. O tecido recuando diante do impacto. O reflexo na face vítrea do assassino. Imagens cortadas gravadas lentamente em sua cabeça, detalhando cada ínfimo movimento da cena. A dança de forças, a batalha sutil por equilíbrio, o leve mover dos pés e das costas para aumentar a energia em cada lado.

Apenas o primeiro impacto.

A seguir ressoou a sinfonia ardente, brutal, veloz das espadas e garras se cruzando com a fúria assassina de lobos, dançando no ar, atirando faíscas, iluminando e aquecendo com lampejos de morte a noite infinitamente estática, cantando hinos de sangue e fúria aos deuses guerreiros, homenageando-os com cada movimento que mirava em rasgar a garganta, destruir os olhos, penetrar o coração, rasgar a coluna ou o ventre do adversário. Cem golpes de cada lado desferidos no espaço ridículo de segundos.

Diante de seus olhos, Hart não via um embate entre uma princesa e um assassino ou mesmo entre uma humana e um Gew. Não, o que ali ocorria era um duelo entre seres que estavam além daquilo que um mero humano poderia sonhar em alcançar, perto dos grandes heróis, de pé em chão igual aos maiores daquele mundo. Não era um embate entre mortais, mas entre aqueles que se tocavam o território das lendas.

O poder de transcender além da própria humanidade, de estar acima de todos os demais. Esse era o poder que pertencia à Rainha de Hohen. Um sorriso rasgou no rosto de Hart uma expressão mista de satisfação, desejo, obstinação e loucura.

Aquele era o poder que ele almejava.

Parando em pleno avanço, o Gew se abaixou e girou o corpo, lançou as garras contra o corpo de Ellienne. A princesa apenas sorriu. Seu inimigo deixara o próprio peito desprotegido. Bastaria apenas baixar a lâmina e…

Um furo. Na palma da mão direita do Gew havia um furo. Assim que o viu, Ellienne tentou recuar, mas era tarde. Ouviu o estampido e viu o lampejo da bala atirada contra sua cabeça.

— Acabou — riu-se o Gew.

Ellienne caiu no chão.

O Gew se levantou devagar, sua postura irritada, suas garras tremendo.

Hart se levantou rápido, correu em direção a Ellienne. Tinha de haver alguma coisa que pudesse ser feita. Tinha que haver.

Um arco.

Saltando para trás, o Gew evitou o golpe iminente. À sua frente, de pé, Ellienne.

— Como você está viva? Eu atirei a queima roupa! Uma parede de concreto não aguentaria aquele tiro!

— Eu sei — Ellienne falou apontando a espada para o Gew. — Por isso eu cortei a bala.

— Ridículo! Você entende quão ridículo é isso que você falou?

— Ridículo é você acreditar que a Rainha por direito de Hohen seria fraca a ponto de cair para algo tão deselegante e covarde. Mas palavras para um moribundo são desperdiçadas. Vamos, terminemos com isso!

Ellienne avançou em ofensiva, desferiu um golpe diagonal, evitado pelo Gew, seguido de mais um, dois três quatro seis golpes igualmente esquivados. A cada investida, o assassino era forçado a recuar, perdia chão e equilíbrio. E então ele reagiu. Um ataque cruzado, as duas garras mirando a cabeça de Ellienne. Abaixando-se, ela evitou o acerto fatal enquanto contra-atacava com agilidade, atingindo o abdome do inimigo, riscando no metal um traço preto e fundo.

O Gew tentou se afastar, a princesa seguiu com um novo golpe horizontal, desferido da esquerda para a direita. Num movimento rápido, o Gew estendeu a mão, agarrou a arma deixando-a cortá-lo, enquanto abria a outra mão para rasgar a garganta da princesa.

O golpe veio antes disso.

— Acabou — riu-se Ellienne.

Leve, rápido, desferido pela mão direita, cruzando limpamente a distância na altura do pescoço do Gew. Ellienne girou e se pôs em guarda, duas espadas idênticas em suas mãos.

Não havia sangue em nenhuma delas.

Longe dali, agachado, arfando, estava o Gew.

— Essa foi por pouco… — ele falou. — Você quase me matou, princesa. Muito bom esse seu truque.

— Como você escapou? — Ellienne retrucou, irritada.

— Você não é a única que tem truques. E já que você é tão cheia deles, acho que eu também vou mostrar mais alguma coisa.

Com sua mão direita, o Gew tocou a própria face, afundando pouco a pouco as garras no metal logo abaixo da superfície de vidro negro. Metal estalou ao se partir, carne tremeu ao ser rasgada. Uma a uma, as placas metálicas despencaram do corpo da criatura, caindo pesadas no chão, revelando abaixo delas a carne preta, dura, lisa, o corpo esguio no centro do qual se estendiam longas marcas brancas e um único orbe branco encravado no peito, enquanto das costas brotavam espinhos e asas longas e grossas. Por fim a máscara caiu e detrás da impassibilidade de vidro surgiram seis olhos de selvagem vermelho sob uma boca faminta. A criatura longa e magra estendeu seus braços que tocavam o chão, estalou seu pescoço sólido e abriu um sorriso que ia de ponta a ponta em seu rosto.

— Bem melhor. Pronta para continuar?


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Notas finais do capítulo

E mais Gew.
Talvez alguém possa apontar um excesso de combates ou ainda para cenas de combate longas demais (de oito capítulos dois não tiveram nada do tipo). Bom, não dá para dizer que não é um bom ponto.
Isso provavelmente vai diminuir assim que o foco sair um pouco dos atuais protagonistas e muito mais depois do fim do arco da Cidade Vazia, o que deve acontecer em alguns capítulos.
Essa vai ser uma história bem longa, então sem pressa.
Bom, até o/