Um Gatinho escrita por Silver Lady


Capítulo 1
Um Gatinho


Notas iniciais do capítulo

 Essa história pode chocar quem gosta de animais, mas aconteceu de verdade,  e provavelmente alguns dos leitores já passaram pela mesma coisa. Se você é muito sensível ou não quer se deprimir, é melhor não ler mesmo.  



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  Um Gatinho

Era um gatinho magro, o pêlo branco com uma mancha preta. Mais vulgar não podia ser, nem o acontecido, pois volta e meia apareciam gatos abandonados naquela rua. Raisa o encontrou quando ia fazer sua caminhada matinal. Um miadinho junto ao portão, um focinhito claro através de uma moita de folhagem. Tão magrinho que conseguira passar pelas grades do portão _ mas como conseguira enganar os cachorros?

Preta soltou um bufo excitado. O gato velho também se aproximou. Dois cachorros e um gato na casa, muitos gastos com ração, o pai ainda traumatizado pela morte do outro gato. Qualquer outro lugar menos aqui.

O corpinho quente se debatia nas mãos, impotente e revoltado, enquanto ela saía para a rua. Ele ainda não aprendera a unhar. Raisa largou-o na grama em frente às casas da rua por onde costumava caminhar. Era uma chance em mil a dele de ser adotado: pouquíssimas pessoas gostavam de gatos naquela zona. Uma morte lenta pela fome, ou rápida por atropelamento, eram os destinos mais prováveis. Talvez fosse menos cruel acabar já. Um pescocinho quebrado... Não.

Afastou-se, já tirando o gatinho do pensamento. Imprecações miadas a seguiram.

Na volta, pela mesma rua, a bolinha branca não estava à vista, apenas os miados. Estava encolhido junto ao muro de um condomínio. Quando viu Raisa, correu e atravessou a grade do portão, e lá ficou.

De madrugada, miados fortes anunciaram seu retorno. Consciência? Mas não podia fazer mais nada.

De manhã cedo, a busca pelo jornal. Um pelinho branco na folhagem do canteiro, a detestada confirmação. Os cachorros latindo, um de cada lado. Jogue-o por cima do portão! Está louca?! É muito alto! A corrida pra pegar a chave, talvez uma vassoura, amaldiçoar sua estupidez: achava que os cachorros iam esperar?

Já não havia mais problema, nem responsabilidade, nem sofrimento. Já não havia mais gato, apenas um trapinho branco, preto e vermelho, disputado em cabo-de-guerra (cachorros adoram essa brincadeira). O cocker ganhou a disputa, a vassoura martelando nas costas arrebatou-lhe o troféu. Uma mortalha de jornal, um saco plástico, a lixeira lá fora; fim miserável porém mais digno que se tivesse morrido na rua, com as moscas como companhia.

Um gatinho vulgar, um destino vulgar. Alguns recebem todas as chances mesmo antes de nascer; outros, jamais as tiveram. Muitos nascem e morrem sem que sequer os outros saibam, e é o mesmo que não tivessem nascido. Aos olhos do gato, Raisa talvez fosse a vilã, mas recebera dela mais atenção do que tivera no resto de sua vidinha meteórica. Ela fora, talvez, a única a saber que ele existia.

                                                                      

                                                                            Fim

                                                                 


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