Quatro Estações escrita por AnaNataly


Capítulo 2
II - A Viajem




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/270267/chapter/2

♪ "O mundo vai acabar
E ela só quer dançar
O mundo vai acabar
E ela só quer dançar, dançar, dançar.
Pneus de carros cantam
Thuru, Thuru, Thuru, Thururu..." ♫

(Capital Inicial - Natasha)

            Canto enquanto dirijo, na verdade praticamente grito. O vento que atravessa a janela aberta faz meu cabelo esvoaçar e me proporciona uma sensação de liberdade maravilhosa. Pela primeira vez em muito tempo me sinto verdadeiramente livre. Sinto que finalmente vou poder começar a viver, sem receios.  A paisagem é maravilhosa e apesar da temperatura escaldante o dia não poderia estar mais bonito ou agradável.

            Já faz mais de cinco horas que sai de Alambrado e por mais que a sensação de felicidade me preencha o último encontro com minha família ainda paira no ar. O olhar de reprovação da minha mãe, a decepção estampada nos gestos do meu pai, o adeus emocionado de Amora, a indiferença de João e Felipe e o apoio do Joaquim ainda mexem comigo. Certamente esse foi o segundo momento mais difícil que eu vivi após a minha decisão. Gostaria que tudo tivesse sido diferente, que eu não os tivesse machucado, mas infelizmente nesse momento eu tenho que pensar em mim.

            Ao longe vejo uma silhueta sugestiva de um posto de gasolina e finalmente percebo que estou varada de fome, desesperada por comida, praticamente não comi nada no café. Ao olhar pro painel do carro vejo que estou duplamente feliz, meu carro precisa ser reabastecido.

            Estaciono próximo ao restaurante ao lado de uma caminhonete preta e caminho em direção a entrada. Antes que eu pudesse abrir a porta um verdadeiro herói grego sai do restaurante, um Aquiles personificado, cabelos loiros na altura do ombro, barba rala, olhos verdes, músculos (que me fariam estudar anatomia por noites inteiras) molhados de suor e o melhor de tudo, sem camisa. Praticamente tive uma vertigem, subiu um calor desconhecido e certamente fiquei com cara de pomboalesaiada, me vi de boca aberta e com a mão levantada em direção a maçaneta mesmo porta já estando aberta. A barroada foi inevitável, principalmente pelo meu total estado de estupor frente a essa mitologia grega ambulante.

- Foi mal, desculpa mesmo, não te vi - diz ele ao me segurar pra evitar minha queda. Realmente ele não deve ter me visto já que foi saindo de costas pra porta enquanto falava com alguém dentro restaurante.

- Amham, não se preocupe eu vi por mim e por você - Respondo com um suspiro baixo. Surpresa como é que aquele conjunto poderia ter ficado ainda melhor com a voz de locutor que emanava daquele Monumento ambulante.

- O quê você falou? Não entendi - me pergunta ele com um sorriso que me mostra seus dentes perfeitos.

Percebendo que havia pensando alto de mais. Tento emendar uma desculpa qualquer mas acabo me atrapalhando e trocando tudo.

- Bem, certo... tu tudo tudo certo. Eeeeeé eu que não... quer dizer, tava com a cabeça longe. Foi mal.

            Ele me olha como se imaginasse que garota louca. Sem dizer muito mais, mas ainda com o seu perfeito sorriso segura a porta enquanto entro no restaurante.

            Já dentro vejo uma mesa no canto, próximo a janela que vai me permite ver todo o movimento no posto fora do restaurante. É nela que eu me sento. Demora ainda alguns minutos para que eu retorne ao meu basal. É lógico que logo após me sentar o sigo com o olhar através da janela. E é no meio dessa observação e no devaneio que a segue que sou interrompida pela chegada do garçom.

- Outro? - Falo sem querer ao observar o improvável diante de mim outro Deus grego?! Tá explicado a falta de homem bonito em Alambrado estavam todos escondidos nesse posto no meio do nada só pode.

- Como, responde o garçom sem entender minha reação. Ele era tão bonito quanto o outro mas ambos eram totalmente diferente desde a beleza a postura. O Garçom era moreno dos olhos azuis um pouco mais baixo que o primeiro, mas ainda bem maior do que eu. Tinha cabelo curto, compartilhava os mesmo músculos devaniantes que aquele, entretanto este estava vestido(Uma pena!!), tinha uma postura mais comedida, uma certa timidez e uma voz menos contagiante mas não menos perturbadora.

- Moça, moçaaa, moça - foi na terceira tentativa dele que voltei a terra e me toquei de era comigo que ele estava falando.

            Peguei o cardápio que ele me oferecia e surrei um desculpe seguido de um obrigado. Suas sobrancelhas franzidas me fizeram suspeitar que assim como Monumento Ambulante (O galego tdb) também estava me achando no mínimo estranha. A fim de terminar logo com aquela situação desconfortável dei uma rápida olhada no cardápio e pedi um suco e uma lasanha. Lhe devolvi o cardápio agradecendo.

            Aproveitei pra da uma olhada nas pessoas dentro do restaurante e a pensar em como seriam as pessoas de Assunção, será que alguma delas frequentava aquela cidade também. Seria muito improvável Assunção ainda estava a praticamente 2 a 3 horas de viajem dali.

            Vi que a minha esquerda estavam sentados um casal de idosos bonito de se observar e involuntariamente me lembrei de Erick. A forma como o senhor olhava para sua esposa era semelhante a forma como Erick me olhava. Tudo teria sido tão mais fácil se eu tivesse certeza que era ele, se me sentisse tão segura quanto ele de que havíamos sido feitos um para outro, almas gêmeas, mas não me sentia assim. Quanto mais o casamento se aproximava maior era a incerteza, com mais dúvidas eu ficava. Não sei em que momento tudo mudou. Não sei quando comecei a gostar dele se quer me recordo de como ou quando nós começamos. Minha mãe disse que mal engatinhávamos quando todos já observavam nosso jeito apegado, diz ela que o primeiro beijo não tínhamos nem dois anos. Nunca beijei outra pessoa. Isso mesmo apesar de ter 25 anos nunca beijei outro cara. Erick foi meu primeiro namorado, meu primeiro tudo. Talvez esse tenha sido o problema. Sempre tive ele do meu lado. Nunca tivemos real concorrência. Tudo sempre foi acertado. Todos já tinha certeza do nosso futuro menos eu.

            E com um suspiro mudo a direção do meu olhar é melhor não pensar nisso. Estou em busca de coisas novas e relembrar o passado não é uma boa opção.

            Continuo minha inspeção pelo salão e vejo um grupo de jovens perto de uma sinuca, 7 pessoas, três garota e quatro rapazes. Praticamente todos muito bonitos. Começo a pensar que há algo de muito estranho. Nunca vi tanta gente bonita por m² antes. Vejo que o "Garçom beldade" se aproxima deles, devem ser amigos pelo jeito como agem. Provavelmente era com eles que o "Monumento" devia esta falando.

            Mesmo noiva nunca fui cega, mas também nunca tinha me sentido tão empolgada/mexida assim antes. E embora em Alambrado não hajam tantos Homens lindos por m², existem Homens muito Bonitos. O Vinícius que estudava comigo era muito lindo, muitooo mesmo. Mas nunca fiquei abestalhada do lado dele, nem mesmo no primeiro dia de aula quando o conheci. Será que todo esse efeito é por causa do meu novo estado civil? Será isso uma das sensações que a liberdade traz??

            Sou novamente interrompida do meu devaneio pela chegada do garçom. Não o mesmo. Dessa vez era um adolescente parecido com o primeiro, mas mais simpático e espontâneo, O "Garçom Beldade" continuava com o grupo de Jovens na sinuca. Sorriu, me serviu e perguntou se eu desejava mais alguma coisa. Diante da minha negativa me desejou um bom almoço e saiu.

            A comida tinha um tempero maravilhoso, não sei se era a fome, mas certamente foi uma das melhores refeições que eu fiz. Ao ir pagar a conta adivinhem quem eu encontrei no caixa o "Garçom Beldade", dessa vez já preparada pra toda aquela irradiação de beleza me comportei mais dignamente, pedi para levar meu parabéns ao cozinheiro pela excelente comida e aproveitei pra sorrir diversas vezes, pois todos sempre disseram que meu sorriso com meus olhos castanhos eram meu cartão de boas vindas. Enquanto falava com ele observei que ele tava incomodado com alguma coisa e por mais de uma vez passou a o dedo pelo seu dente de uma maneira esquisita. Dessa vez foi a minha vez de achar o comportamento dele estranho. Agradeci mais uma vez pelo atendimento e aproveitei para ir ao banheiro, ainda tinha um longo caminho até Assunção e não queria ter que parar novamente nem anoitecer na estrada. Ao me olhar no espelho quase me assusto ou melhor choro com o que vejo, um pedaço gigante de alface grudado no meu dente e gengiva que mais pareciam um biofilme. Na mesma hora entendo o comportamento "estranho" do "Garçom Beldade" e a extrema e suprema vergonha se apoderam de mim. Rapidamente escovo os dentes e uso o banheiro. Queria deixar aquele estabelecimento o mais rápido possível. Meu primeiro momento social na minha nova fase tinha que ser marcado por um King Kong histórico.

            Saiu do banheiro como um foguete de cabeça baixa, com tanta vergonha e sem jeito que não percebo que alguém derrubou suco no chão e como não basta um macaquinho eu preciso de um zoológico inteiro escorrego caindo em cima de nada mais nada menos que o " Sr. Monumento" levando ao chão junto comigo. Todos no restaurante olham em nossa direção e posso ouvir o som das gargalhadas. Eu não consigo mensurar o meu nível de vergonha naquele momento e pra piorar enquanto o "Monumento" se levanta o "Garçom Beldade" me oferece ajuda. Ao tentar me por de pé vou em direção ao chão novamente só então percebo que o salto da minha sandália quebrou. Ainda no chão e praticamente com lágrima nos olhos de tanta vergonha tiro a sandália. Agora ambos, o Garçom Beldade e o Monumento Ambulante, me ajudam a levantar.

- Você de novo? Foi mal moça, realmente estou distraído hoje - diz o "Monumento" ao me reconhecer.

- Não a culpa foi minha, eu que tenho que me desculpar - respondo de maneira quase inaudível.

- Você tá bem? Consegue dirigir?- me pergunta o Garçom Beldade.

- Obrigada, tô sim - digo soltando os seus braços e tentando ir em direção a porta. Tudo o que eu queria era ir embora dali. Foi muita vergonha pra um dia só. Mas infelizmente eu não dou nem um passo completo em direção a porta quando meu passo falceia pela dor no tornozelo e ambos voltam a me segurar.

- Acho que você vai precisar de uma ajudinha Sim - diz Monumento ao passar a mão pela minha cintura e me levar a uma espécie de poltrona que tinha perto do balcão - Leo traga gelo - pede ele ao garçom mais jovem enquanto examina meu calcanhar.

             Após 30 minutos de gelo e um gel milagroso volto a ter condições de caminhar e o mais importante de dirigir. Descobri que Monumento na realidade se chama Eduardo. Ele ainda se ofereceu pra me levar até Assunção (acreditem ele mora lá) e deixar sua caminhonete preta, aquela mesma que eu estacionei do lado, pra um de seus amigos levar. Juro que a oferta foi tentadora mas estava tão envergonhada e já haviam sido tantas emoções no dia que declinei a oferta  e retornei sozinha pra Assunção.

            O resto do trajeto foi tranquilo exceto pela dor que agora com o sangue frio não se limitava apenas ao pé. Meu primeiro dia de independência e já uma verdadeira aventura. Inacreditável!!

             Aproveitei o resto da viajem pra refletir em todo o meu dia e especialmente em todas as informações que os 30 minutos de conversa me proporcionaram descobrir.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Quatro Estações" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.